
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002839-58.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEMIR CELESTINO
Advogado do(a) APELADO: VANDIR JOSE ANICETO DE LIMA - SP220713-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002839-58.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEMIR CELESTINO
Advogado do(a) APELADO: VANDIR JOSE ANICETO DE LIMA - SP220713-A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS em que a parte autora objetiva a revisão da renda mensal de um benefício de auxílio-doença, convertido em aposentadoria por invalidez, na forma do art. 29, II, da Lei n. 8.213/91.
A sentença (id 274795765 - Pág. 46/53) julgou procedente o pedido para condenar o INSS a revisar o “salário-de-benefício da aposentadoria concedida à autora e, consequente sua RMI, para o fim de observar o disposto no artigo 29, inciso II, da Lei 8.213/91, diante da ilegalidade do § 20 do artigo 32 do Decreto 3.048/99, utilizando-se a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo”.
O INSS interpôs recurso de apelação (id 74795765 - Pág. 60/68) em que requer a reforma da r. sentença ao argumento, em síntese, de descaber a revisão do benefício tal como requerido pela parte autora, tendo em vista tratar-se de segurado especial. Subsidiariamente, pugna pelo recálculo do benefício conforme art. 48, §4o, da Lei no 8.213/91 e art. 30, § 2o, da Lei no 9.876/99.
Com contrarrazões.
É o relatório.
vn
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002839-58.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEMIR CELESTINO
Advogado do(a) APELADO: VANDIR JOSE ANICETO DE LIMA - SP220713-A
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
Requer a parte autora, em sua inicial, o recálculo de um benefício de auxílio-doença, convertido em aposentadoria por invalidez, conforme regra prevista no art. 29, II, da Lei n. 8213/91.
Referido artigo estabelece:
“Art. 29. O salário-de-benefício consiste:
(...)
II - para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo”.
As alíneas mencionadas no Inciso acima transcrito referem-se aos benefícios que requer a parte autora a revisão, vejamos:
“Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
I - quanto ao segurado:
a) aposentadoria por invalidez;
(...)
e) auxílio-doença”.
No tocante ao segurado especial, atividade exercida pela parte autora à época da concessão de seu benefício (pescador artesanal), vale identificar sua previsão na lei de benefícios.
“Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
(...)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida”.
O artigo 29, II, da Lei 8.213/91, acima registrado, descreve a forma de cálculo dos salários de benefício a ser adotada referente aos benefícios por incapacidade, contudo, há ressalva expressa constante do § 6º do mesmo artigo relacionada ao segurado especial, in verbis:
“§ 6º O salário-de-benefício do segurado especial consiste no valor equivalente ao salário-mínimo, ressalvado o disposto no inciso II do art. 39 e nos §§ 3o e 4o do art. 48 desta Lei.” (grifei).
A fim de melhor elucidar a situação do segurado especial e a ressalva constante do parágrafo acima, transcrevo o texto do art. 39 do mesmo diploma legal:
“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou
II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social.” (grifei).
DO CASO CONCRETO
Trata-se de pedido de revisão de aposentadoria por invalidez (concedida em 17/07/2014), conforme regra prevista no art. 29, II, da Lei n. 8.213/91, através da utilização, no cálculo do aludido benefício, dos salários de contribuição quando ostentou vínculos empregatícios, anotados em CTPS, nos lapsos de 01/07/1980 a 17/02/1981 (pedreiro); de 03/05/1982 a 06/01/1983 (balconista) e de 14/11/1983 a 09/03/1999 (manobrador).
A parte autora, quando do requerimento administrativo do benefício de auxílio-doença (05/03/2013), que precedeu a aposentadoria por invalidez (17/07/2014), obteve a concessão da benesse em consequência do reconhecimento, pela autarquia federal, de sua condição de segurado especial, visto ter exercido a função de pescador artesanal no período de 21/02/2005 a 04/03/2013, conforme se depreende do termo de homologação de atividade rural acostado aos autos (id 274795764 - Pag. 42), valendo destacar a inexistência de contribuições ao sistema no lapso mencionado. O benefício de auxílio-doença foi concedido no valor de um salário-mínimo mensal (id 274795764 - Pag. 49).
Assim, o benefício foi concedido na forma do art. 29, da Lei n. 8.213/91, em atenção à ressalva discriminada em seu § 6º, eis que a parte autora demonstrou sua condição de segurado especial, no valor de um salário-mínimo mensal.
O cerne da questão ora em debate, refere-se ao direito de cômputo das contribuições previdenciárias que foram recolhidas, como empregado, no cálculo da renda mensal inicial do benefício de auxílio-doença posteriormente convertido em aposentadoria por invalidez.
Dispõe art.194, parágrafo único, II, da Constituição Federal:
“A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”
Parágrafo único. Compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
(...)
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
(...)”
Desta forma, tem-se que a Carta Magna estabelece a paridade de tratamento das populações urbanas e rurais no tocante aos serviços e benefícios, assim, deve o trabalhador rural fazer jus às mesmas condições inerentes aos segurados empregados que possuem vínculos urbanos, incluindo o direito de ser computado, no cálculo de sua renda mensal inicial, as contribuições que foram vertidas como empregado.
Destaco que o disposto no artigo 143 da Lei n. 8.213/1991, que determina a fixação da renda mensal inicial – RMI no valor pré-estabelecido de um salário-mínimo, não se aplica in casu, pois destina-se aos trabalhadores rurais que não verteram contribuições à Previdência Social, sendo-lhes garantido um rendimento mínimo.
Desta forma, verificado o recolhimento de contribuições previdenciárias como empregado, os respectivos salários de contribuição deverão ser computados para o cálculo da RMI do benefício da parte autora.
Nesse sentido, trago à colação precedente desta E. Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL COMPROVADA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. RENDA MENSAL INICIAL (RMI)
- O direito à aposentadoria por idade rural é devido aos 60 (sessenta) anos, se homem, e aos 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, conforme o artigo 201, § 7º, II, da CR, e, ainda, o artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII, c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei n. 8.213, de 24/07/1991.
- O labor campesino, ainda que descontínuo, deve ser demonstrado pelo tempo correspondente à carência do benefício, atualmente 180 (cento e oitenta) meses, observados os artigos 142 e 143 da LBPS.
- A comprovação da atividade rural deve ser realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991.
- No caso vertente, a prova testemunhal ratificou e fortaleceu o início de prova material, apresentada na forma da legislação aplicável, o que vai ao encontro dos precedentes judiciais obrigatórios contidos na Súmula 149/STJ e no REsp 1.321.493, Tema 554/STJ.
- Preenchidos os requisitos legais, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural pleiteado.
- No tocante à fixação da renda mensal inicial do benefício no valor de um salário mínimo, verifica-se que a norma prevista no artigo 143, da Lei n. 8.213/1991 destina-se aos trabalhadores rurais que não verteram contribuições à Previdência Social. Todavia, comprovado o recolhimento de contribuições previdenciárias como empregado rural, os respectivos salários de contribuição deverão ser considerados para o cálculo da RMI, na forma dos artigos 29, I e 50 da Lei n. 8.213/1991.
- A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2021.
- Apelação do INSS desprovida e apelação da parte autora provida
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL – 5004193-21.2023.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Leila Paiva Morrison, julgado em 27/09/2023, Intimação via sistema DATA: 02/10/2023)
Destarte, procede o pleito do segurado para que seja recalculada a renda mensal inicial de seu benefício de auxílio-doença, com base nos salários de contribuição, nos termos do artigo 29 da L. 8.213/91 então vigente.
Por outro lado, entendo aplicável ao caso o artigo 48, §4º, da Lei nº 8.213/91, sendo que durante o período de atividade como segurado especial (pescador) em que o autor não verteu contribuições ao sistema, deve ser considerado o salário-de-contribuição de um salário-mínimo no cálculo do referido benefício.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação autárquica, para que seja considerado o valor de um salário-mínimo no cálculo do benefício durante o período de atividade como segurado especial da parte autora sem contribuições, observados os honorários advocatícios, na forma acima explicitada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. REVISÃO DE BENEFÍCIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SEGURADO ESPECIAL. SALÁRIO-MÍNIMO. ART. 29, § 6º. RECÁLCULO CABÍVEL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O artigo 29, II, da Lei 8.213/91 descreve a forma de cálculo dos salários de benefício a ser adotada referente aos benefícios por incapacidade, contudo, há ressalva expressa constante do § 6º do mesmo artigo relacionada ao segurado especial de que “o salário-de-benefício do segurado especial consiste no valor equivalente ao salário-mínimo, ressalvado o disposto no inciso II do art. 39 e nos §§ 3o e 4o do art. 48 desta Lei”.
- A parte autora, quando do requerimento administrativo do benefício de auxílio-doença que precedeu a aposentadoria por invalidez, obteve a concessão da benesse em consequência do reconhecimento, pela autarquia federal, de sua condição de segurado especial, visto ter exercido a função de pescador artesanal, valendo destacar a inexistência de contribuições ao sistema no lapso da referida atividade.
- O benefício foi concedido na forma do art. 29, da Lei n. 8.213/91, em atenção à ressalva discriminada em seu § 6º, eis que a parte autora demonstrou sua condição de segurado especial, no valor de um salário-mínimo mensal.
- A Carta Magna, conforme art. 194, parágrafo único, II, estabelece a paridade de tratamento das populações urbanas e rurais no tocante aos serviços e benefícios, assim, deve o trabalhador rural fazer jus às mesmas condições inerentes aos segurados empregados que possuem vínculos urbanos, incluindo o direito de ser computado, no cálculo de sua renda mensal inicial, as contribuições que foram vertidas como empregado.
- Verificado o recolhimento de contribuições previdenciárias como empregado, os respectivos salários de contribuição deverão ser computados para o cálculo da RMI do benefício da parte autora.
-Procede o pleito do segurado para que seja recalculada a renda mensal inicial de seu benefício de auxílio-doença, com base nos salários de contribuição, nos termos do artigo 29 da L. 8.213/91 então vigente.
Por outro lado, entendo aplicável ao caso o artigo 48, §4º, da Lei nº 8.213/91, sendo que durante o período de atividade especial (pescador) em que o autor não verteu contribuições ao sistema, deve ser considerado o salário-de-contribuição de um salário-mínimo no cálculo do referido benefício.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015 e, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
- Apelação autárquica provida em parte.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
