
| D.E. Publicado em 13/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014923-89.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de sua filha Isadora, em 03/03/2014.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria, sem registro em CTPS.
Juntou documentos.
A autora apresenta como início de prova material a CTPS do companheiro, Ivan Francisco da Silva, com vínculo de natureza rural registrado de 22/08/2009 a 13/04/2014.
Concedida a gratuidade da justiça/citação/contestação. Indeferida a tutela antecipada.
O juízo determinou fossem juntadas aos autos declarações com firma reconhecida de, ao menos, duas testemunhas que descrevam os períodos de atividade rural da autora, bem como outras informações pertinentes, dispensada assim a designação de audiência.
Ciente o advogado da autora em 16/09/2014 (fls. 30), pleiteou o sobrestamento do processo por 30 dias (fls. 31). Deferido o pedido às fls. 32.
Novo pedido de sobrestamento pelo mesmo prazo (fls. 34), após escoado o anterior. Deferido às fls. 35. Determinou o juízo que, no silêncio, a prova será declarada preclusa.
Ciência do despacho em 15/05/2015, fls. 35.
Mandado de cobrança, busca e apreensão dos autos, que estavam em poder do advogado da autora. Não cumprido por não ter sido localizado.
Novo despacho do juízo às fls. 38.
A autora requereu a extinção do processo sem resolução do mérito. O INSS não concordou com o pedido. A ação prosseguiu.
Designada audiência de instrução e julgamento para 06/02/2017, devendo a autora apresentar o rol de testemunhas e comparecer à audiência, trazendo suas testemunhas, independentemente de intimação.
Na data da audiência, compareceram o advogado e o Procurador do INSS, ausente a autora e as testemunhas. O advogado da autora reiterou o pedido de desistência, que não foi aceito pelo INSS.
O juízo de primeiro grau declarou preclusa a prova testemunhal e julgou improcedente a ação, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa.
Sentença proferida em 09/02/2017.
A autora apelou, alegando existência de início de prova material e pleiteando a anulação da sentença, com o prosseguimento da instrução processual com oitiva de testemunhas. Alega que requereu prazo para justificar a ausência da autora e de suas testemunhas.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada - empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
É antes crer que o legislador haja querido exprimir o consequente e adequado à espécie do que evidentemente injusto, descabido, inaplicável, sem efeito. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretação que conduza a melhor consequência para a coletividade.
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento dos filhos, a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
O art. 16, § 6º, do Decreto 3.048/1999 define a união estável como aquela verificada entre homem ou mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem. É situação que a seguridade social não pode desconsiderar a ponto de negar proteção aos dependentes.
Quanto ao início de prova material, a CTPS do companheiro da autora e pai da criança, Ivan Francisco da Silva, atesta a condição de trabalhador rural empregado quando do nascimento (vínculo de 22/08/2009 a 13/04/2014).
Nos termos de iterativa jurisprudência, a condição de rurícola do companheiro se estende à autora, para fins de concessão do benefício.
Existente início de prova material em nome do companheiro.
Porém, imprescindível a prova testemunhal para a extensão e confirmação do início de prova material do trabalho rural.
A prova testemunhal não foi produzida em função da negligência da autora, que teve franqueada a possibilidade de apresentar as testemunhas, mas se manteve inerte. A autora não apresentou o rol de testemunhas no prazo estipulado de dez dias (fls. 38). Ao contrário, sua manifestação foi no sentido de desistência do pedido.
A audiência de instrução e julgamento foi marcada com, praticamente, dois anos de antecedência.
A autora e as testemunhas não compareceram à audiência. Não houve pedido de justificativa de ausência, como alegado, e sim a reiteração de pedido de desistência a respeito do qual a autarquia já havia se manifestado anteriormente.
A motivação da ausência poderia ter sido apresentada em apelação.
O processo foi conduzido com a observância das garantias do devido processo legal, não havendo qualquer vício no ato do juiz que importasse em cerceamento de defesa ou vulneração da garantia do contraditório. A insuficiência de provas teve como causa exclusiva a omissão da autora.
Evidenciada a insuficiência do corpo probatório para a demonstração do alegado na peça inicial, a única solução possível para o caso é a improcedência do pedido.
Nesse sentido, a AC 0005212-22.2005.4.03.6106/SP, Relator Desembargador Federal Carlos Delgado, julgamento em 18/09/2017:
NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
OTAVIO PORT
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