Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6074915-05.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 29/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. SENTENÇA E ACORDÃO CITRA PETITA. ANULAÇÃO
DE OFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. TRABALHO AGROPECUÁRIO. MOTORISTA DE CAMINHÃO.
CERAMISTA. RUÍDO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS
REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Sentença e acórdão citra petita anulados de ofício. Julgamento com base no artigo 1.013, § 3º,
II, do CPC.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) indicam o exercício de
atividades em "estabelecimentos agropecuários", enquadrando-se nos exatos termos do código
2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964. Precedentes do STJ.
- Depreende-se do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) coligido aos autos o exercício da
atividade de "motorista de caminhão", fato que permite o reconhecimento de sua natureza
especial apenas pelo enquadramento profissional (até 28/4/1995), nos termos dos códigos 2.4.4
do anexo do Decreto n. 53.831/1964 e 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/1979.
- Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) aponta o labor de "ceramista” (CBO 89210),
em indústria de cerâmica, situação que possibilita o enquadramento perseguido, nos termos do
código 2.5.2 do anexo do Decreto 53.831/1964.
- Comprovada a exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores ao limite de
tolerância previsto na legislação previdenciária à época da prestação do serviço (80 decibéis), o
que viabiliza a contagem diferenciada requerida em conformidade com o código 1.1.6 do anexo
do Decreto n. 53.831/1964.
- É inviável o reconhecimento do trabalho desenvolvido pela parte autora como "motorista", por
não se enquadrar aos termos dos anexos dos Decretos n. 53.831/1964 ou 83.080/1979, os quais
contemplam penosidade na condução unicamente de caminhões de carga ou ônibus no
transporte de passageiros.
- Período em que o autor trabalhou no cargo de "serviços gerais em olaria" não pode ser
reconhecido como especial, pois o referido ofício apontado em Carteira de Trabalho e Previdência
Social (CTPS), não está contemplado nos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979.
- Não obstante o autor tenha atuado como "trabalhador agrícola", não foi coligida aos autos
qualquer prova de que a atividade rurícola desempenhada era exclusivamente de natureza
agropecuária (código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964), situação que impossibilita
qualquer tentativa de reconhecimento do seu labor como especial. Precedentes do STJ e do
TRF3.
- A ocupação profissional de "padeiro" não encontra previsão na lista de atividades insalubres dos
decretos regulamentadores a possibilitar o enquadramento como especial do interstício até a data
de 28/4/1995, cabendo ao segurado a demonstração da exposição a fatores de risco, situação
esta também não verificada nos autos.
- O enquadramento por categoria profissional (como "motorista de caminhão/ônibus") só era
possível até 28/4/1995. Após esta data, a parte autora deveria demonstrar exposição, com
habitualidade, aos agentes nocivos, via formulários ou laudos técnicos certificadores das
condições insalutíferas do labor, indicando a exposição com permanência e habitualidade, ônus
do qual não se desincumbiu quando instruiu a peça inicial (art. 373, I, do CPC).
- Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPP) apresentados indicam a exposição a níveis de
ruído inferiores aos limites de tolerância previstos na legislação previdenciária à época da
prestação do serviço (90 decibéis até 18/11/2003 e 85 decibéis para período subsequente).
- A postura inadequada (risco ergonômico), o risco de queda e o acidente de trânsito
correspondem a agentes não previstos nos decretos regulamentadores como aptos a conferir
caráter insalubre à atividade desenvolvida.
- O autor não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça inicial, qual
seja: carrear prova documental descritiva das condições insalubres às quais permaneceu exposto
no ambiente laboral, como formulários padrão, laudo técnico individualizado e Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP).
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, por
estarem ausentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da
Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Ocorrência de sucumbência recíproca desproporcional (artigo 85, caput e § 14, do CPC).
Condena-se o INSS ao pagamento de honorários ao advogado da parte contrária em 3% (três por
cento) sobre o valor atualizado da causa, e a parte autora fica condenada a pagar honorários de
advogado à autarquia, fixados em 7% (sete por cento) sobre a mesma base de cálculo, suspensa,
porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se
de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS e embargos de declaração da parte autora prejudicados.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6074915-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLOVIS PIRES DE MORAES
Advogado do(a) APELADO: CARLA ROSSI GIATTI - SP311072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6074915-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLOVIS PIRES DE MORAES
Advogado do(a) APELADO: CARLA ROSSI GIATTI - SP311072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração interpostos pela parte autora em face do acórdão proferido
por esta Nona Turma que deu parcial provimento à apelação do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS).
A parteembargante alega contradição na fundamentação do julgado, quanto ao não
reconhecimento da especialidade do período de 23/12/1980 a 28/4/1995, exercido na atividade de
motorista de caminhão. Acrescenta que o referido intervalo não foi mencionado no dispositivo do
decisum recorrido e alega o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício
de aposentadoria por tempo de contribuição integral, na regra 85/95.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6074915-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLOVIS PIRES DE MORAES
Advogado do(a) APELADO: CARLA ROSSI GIATTI - SP311072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em razão da oposição destes embargos de declaração e com a reanálise dos presentes autos,
constata-se que o Juízo a quo, no exercício da atividade jurisdicional, proferiu sentença citra
petita (não observado pelo acórdão ora impugnado), pois deixou de apreciar o pedido de
reconhecimento da atividade especial de intervalos indicados na exordial e, consequentemente,
do acréscimo no tempo de serviço especial e a conversão em tempo comum, para fins de
obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.
Nesse caso, estando a decisão contaminada de vício que afeta sua eficácia, deve ser anulada,
conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
"PROCESSUAL CIVIL. JULGAMENTO CITRA-PETITA. NULIDADE. DECRETAÇÃO DE OFÍCIO
PELO TRIBUNAL. POSSIBILIDADE.
- "A nulidade da sentença que deixa de apreciar pretensão material que integra o pedido
formulado na inicial, decidindo citra-petita, pode ser decretada de ofício pelo Tribunal ad quem"
(Resp 243.294-SC, Ministro Vicente Leal, DJ 24/4/2000). - Recurso especial não conhecido."
(STJ, Quarta Turma, RESP 180442/SP, proc. 1998/0048352-7, DJU 13.11.2000, pg. 145, rel. Min.
CESAR ASFOR ROCHA, v.u.)
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CITRA PETITA.
ANULAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A Eg. Terceira Seção desta Corte, pelas Turmas que a compõem, firmou entendimento no
sentido de que a decretação de nulidade da sentença citra petita pode ser realizada de ofício pelo
Tribunal ad quem. Nesse caso, o recurso de apelação não está condicionado à prévia oposição
de embargos de declaração. 2. Recurso especial improvido."
(STJ, Sexta Turma, RESP 243988/SC, proc. 1999/0120502-6, DJU 22.11.2004, pg. 393, rel. Min.
HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, v.u.).
Assim, a sentença e o julgado ora recorrido estão eivados de nulidade.
Nesse passo, estando o feito em condições de imediato julgamento, não há óbice a que o
julgador passe à análise do mérito propriamente dito.
Esse entendimento decorre do artigo 1.013, § 3º, II, do CPC:
"§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
(...)
II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da
causa de pedir;
(...)".
Assim, passo à apreciação da matéria de fundo.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt
no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado
pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade
sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
De início, ressalta-se que já houve enquadramento administrativo dos períodos de 25/7/1977 a
27/10/1977 e de 8/12/1986 a 13/2/1989, restando, portanto, incontroversos.
No caso vertente, em relação aos intervalos de 10/3/1980 a 13/1/1981 e de 21/12/1981 a
2/6/1982, há anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), as quais indicam o
exercício de atividades em "estabelecimentos agropecuários", enquadrando-se nos exatos termos
do código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
Nesse sentido: STJ, AINTARESP – Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial - 860631
2016.00.32469-5, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
16/6/2016; RESP – Recurso Especial - 1309245 2012.00.30818-2, Rel. Ministro SÉRGIO
KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJE 22/10/2015.
No tocante ao período de 1º/6/1983 a 27/11/1986, depreende-se do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) coligido aos autos o exercício da atividade de "motorista de caminhão", fato
que permite o reconhecimento de sua natureza especial apenas pelo enquadramento profissional
(até 28/4/1995), nos termos dos códigos 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/1964 e 2.4.2 do
anexo do Decreto n. 83.080/1979.
Especificamente ao interstício de 10/2/1992 a 17/2/1992, consta, em sua carteira de trabalho, a
indicação do CBO 89210, que corresponde ao exercício do ofício de "ceramista", em indústria de
cerâmica, situação que possibilita o enquadramento perseguido, nos termos do código 2.5.2 do
anexo do Decreto 53.831/1964.
Quanto aos intervalos de 7/5/1992 a 9/11/1993 (empresa "Kondor Indústria e Comércio de
Acumuladores Ltda.") e de 18/6/1996 a 5/3/1997 (“motorista de caminhão”), a parte autora logrou
demonstrar, via laudo técnico e Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), exposição habitual e
permanente a ruído em níveis superiores ao limite de tolerância previsto na legislação
previdenciária à época da prestação do serviço, o que viabiliza a contagem diferenciada requerida
em conformidade com o código 1.1.6 do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
Contudo, inviável o reconhecimento da natureza especial dos lapsos de 24/8/1976 a 12/11/1976
("motorista"), de 10/6/1982 a 25/5/1983 ("motorista"), de 1º/8/1990 a 30/3/1991 ("serviços gerais
em olaria"), de 5/8/1994 a 18/8/1994 ("serviços gerais rural/motorista"), de 1º/10/1994 a 8/9/1995
("padeiro"), de 6/3/1997 a 5/5/1997, de 3/5/1999 a 12/11/1999, de 7/5/2001 a 18/12/2001, de
2/5/2003 a 20/3/2004, de 2/8/2004 a 9/12/2004, de 10/2/2005 a 30/9/2006 e de 5/12/2008 a
6/4/2017 (DER).
No que tange aos interstícios de 24/8/1976 a 12/11/1976, de 10/6/1982 a 25/5/1983 e de 5/8/1994
a 18/8/1994, a parte autora não logrou comprovar o labor como "motorista de caminhão" ou
"ônibus".
Nessas circunstâncias, é inviável o reconhecimento do trabalho desenvolvido pela parte autora
como "motorista" durante esses lapsos, por não se enquadrar aos termos dos anexos dos
Decretos n. 53.831/1964 ou 83.080/1979, os quais contemplam penosidade na condução
unicamente de caminhões de carga ou ônibus no transporte de passageiros.
No mesmo sentido: TRF3, AC 2000.03.99.069410-9/SP, 9ª Turma, Relatora Juiz Convocado
Hong Kou Hen, Julgado em 18/8/2008, DJF3 17/9/2008; TRF3 - Proc. 2000.03.00.000468-4/SP -
3ª Seção - Rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta - DJF3 13.03.2009 - p. 184.
Do mesmo modo o intervalo de 1º/8/1990 a 30/3/1991, laborado no cargo de "serviços gerais em
olaria", não pode ser reconhecido como especial, pois o referido ofício apontado em Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS) não está contemplado nos Decretos n. 53.831/1964 e
83.080/1979.
Acerca do tema, trago à colação o seguinte julgado (g. n.):
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO. TEMPO URBANO RECONHECIDO EM PARTE. TEMPO ESPECIAL NÃO
RECONHECIDO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
DECISÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. I - Agravo legal interposto da decisão
monocrática que restringiu o reconhecimento do labor urbano, sem registro em CTPS, ao
interregno de 01/01/1958 a 31/07/1962, excluindo da condenação o reconhecimento da
especialidade desta atividade e julgando improcedente o pedido de aposentadoria por tempo de
serviço. II - Sustenta o requerente que o exercício de labor urbano e de atividades especiais
restou devidamente demonstrado durante todos os períodos pleiteados, fazendo jus ao benefício.
Pede, em juízo de retratação, que a decisão proferida seja reavaliada, para dar provimento ao
recurso e que, caso não seja esse o entendimento, requer que o presente agravo seja
apresentado em mesa. III - Embora o autor alegue o labor urbano, como oleiro/operário, no
interstício de 02/06/1951 a 30/06/1958 e como operário, de 01/07/1958 a 31/07/1962, os únicos
documentos carreados são: a) cédula de identidade e CPF, indicando o nascimento em
02.06.1939 (fls. 13); b) título de eleitor, expedido em 21.06.1958, atestando sua profissão de
oleiro (fls. 15); c) certidão expedida pela Prefeitura Municipal de Conchas, em 08.07.2003,
informando que a empresa Reineiro Donato Pastina, com ramo de olaria, estabelecida nos
subúrbios do município de Conchas, esteve inscrita no Livro de Indústrias e Profissões, durante o
período de 1948 até 1960 (fls. 16); d) certidão de casamento, realizado em 19.07.1958, atestando
a profissão de operário (fls. 17); e) discriminação de pagamento emitida pelo Departamento de
Estrada de Rodagem do Estado de São Paulo, indicando recebeu pagamentos de salários e
abonos, nos meses de 07/58, 01/59, 04/60, 06/61 e 07/62 (fls. 18/22), não restando demonstrado,
através de prova material, o labor urbano durante toda aquela época, sendo inadmissível a prova
exclusivamente testemunhal. IV - A legislação de regência exige a demonstração do trabalho
exercido em condições especiais, através do formulário emitido pela empresa empregadora e,
tratando-se de exposição ao ruído, não se prescinde do respectivo laudo técnico a revelar o nível
de ruído ambiental a que estaria exposto o autor. V - Neste caso, tem-se que o requerente juntou
os formulários DSS-8030, de fls. 41/50, indicando que exerceu a função de oleiro, em diversas
empresas no município de Conhas, informando de maneira genérica que estava sujeito aos
agentes agressivos ruídos (motor/maromba), calor (fornos e temperatura externa), luminosidade
(fornos), poeira, vento e chuva, no entanto, não foi carreado o laudo técnico, documento
indispensável para comprovar a insalubridade do labor, em se tratando de pressão sonora. VI -
De se observar que calor, luminosidade, poeira, vento e chuva não são hábeis, por si só, para
configurar a especialidade da atividade.VII - Cumpre esclarecer que o laudo técnico judicial de fls.
140/171, embora aponte a presença do agente agressivo ruído de 88 dB(A), na função de oleiro,
o perito informa que o estudo foi realizado em função paradigma, na região da cidade de São
José dos Campos, conforme descrito a fls. 141 e 167, não sendo hábil, dessa forma, para
comprovar a especialidade da atividade nas olarias do município de Conchas, locais de labor do
requerente. VIII - Além do que, a profissão do autor, como oleiro, não está entre as categorias
profissionais elencadas pelo Decreto nº 83.080/79 (Quadro Anexo II). IX - A decisão monocrática
com fundamento no art. 557, caput e § 1º-A, do C.P.C., que confere poderes ao relator para
decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo ou contrário a
jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal
Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao CPC ou aos
princípios do direito. X - É assente a orientação pretoriana no sentido de que o órgão colegiado
não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não
estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for
passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte. XI - In casu, a decisão está
solidamente fundamentada e traduz de forma lógica o entendimento do Relator, juiz natural do
processo, não estando eivada de qualquer vício formal, razão pela qual merece ser mantida. XII -
Agravo improvido." (APELREEX 00048045520064039999, DESEMBARGADORA FEDERAL
MARIANINA GALANTE, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/07/2012)
No tocante ao intervalo de 5/8/1994 a 18/8/1994, embora o autor tenha atuado como "trabalhador
agrícola" (CBO: 62120), não foi coligida aos autos qualquer prova de que a atividade rurícola
desempenhada era exclusivamente de natureza agropecuária (código 2.2.1 do anexo do Decreto
n. 53.831/1964), situação que impossibilita qualquer tentativa de reconhecimento do seu labor
como especial (STJ - AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1595250
2016.01.04669-2, HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJE: 18/8/2016, AGRESP -
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 1084268 2008.01.86008-6, SEBASTIÃO
REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJE: 13/3/2013).
Nessa esteira: TRF-3 - AC: 35126 SP 0035126-48.2012.4.03.9999, Relator Desembargador
Federal Baptista Pereira, Julgamento de: 14/10/2014, 10ª Turma; AC n. 2001.03.99.013747-0/SP;
3ª Seção; Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos; J 11.05.2005; DJU 14.07.2005, p.
167.
Não se olvida de que a ausência de previsão em regulamento específico não constitui óbice à
comprovação do caráter especial da atividade laboral. Esse é o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça (STJ, 5ªT, REsp 227946, Rel. Min. Gilson Dipp, v.u., julgado em 8/6/2000, DJ
1º/8/2000, p. 304).
Igualmente, a ocupação profissional de "padeiro" não encontra previsão na lista de atividades
insalubres dos decretos regulamentadores a possibilitar o enquadramento como especial do
interstício de 1º/10/1994 até a data de 28/4/1995 (possibilidade de enquadramento por categoria
profissional), cabendo ao segurado a demonstração da exposição a fatores de risco, situação
esta também não verificada nos autos.
De fato, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a
peça inicial, qual seja: carrear prova documental como formulários padrão, laudo técnico
individualizado e PPP - documentos aptos a individualizar a situação fática do requerente e
comprovar a especificidade ensejadora do reconhecimento de possível agressividade, durante os
períodos acima apontados, inviabilizando, portanto, o enquadramento pretendido.
Da mesma forma, não lhe socorre o pleito de enquadramento dos interregnos de 3/5/1999 a
12/11/1999, de 7/5/2001 a 18/12/2001, de 2/5/2003 a 20/3/2004, de 2/8/2004 a 9/12/2004 e de
10/2/2005 a 30/9/2006, por não ter logrado apresentar elementos elucidativos à prova da
atividade especial, de modo que devem ser contados como tempo comum.
Isso porque o enquadramento por categoria profissional (como "motorista de caminhão/ônibus")
só era possível até 28/4/1995, conforme acima explanado.
Após esta data, a parte autora deveria demonstrar exposição, com habitualidade, aos agentes
nocivos, via formulários ou laudos técnicos certificadores das condições insalutíferas do labor,
indicando a exposição com permanência e habitualidade, ônus do qual não se desincumbiu
quando instruiu a exordial (art. 373, I, do CPC).
Assim, constata-se que não foram juntados documentos hábeis a demonstrar a pretendida
especialidade ou o alegado trabalho nos moldes previstos nos instrumentos normativos
supramencionados.
Do mesmo modo, não prospera a contagem excepcional dos intervalos controversos de 6/3/1997
a 5/5/1997 e de 5/12/2008 a 6/4/2017 (DER), porquanto os Perfis Profissiográficos
Previdenciários (PPP) apresentados indicam a exposição a níveis de ruído inferiores aos limites
de tolerância previstos na legislação previdenciária à época da prestação do serviço (90 decibéis
até 18/11/2003 e 85 decibéis para período subsequente).
Cumpre acrescentar, ainda, que quanto ao interregno de 5/12/2008 a 6/4/2017, o mencionado
PPP aponta além da presença do ruído abaixo dos limites de tolerância estabelecidos nos
decretos, a sujeição a outros fatores de risco incapazes de ensejar o reconhecimento da
especialidade do período.
Com efeito, a postura inadequada (risco ergonômico), o risco de queda e o acidente de trânsito
correspondem a agentes não previstos nos decretos regulamentadores como aptos a conferir
caráter insalubre à atividade desenvolvida.
O agente ergonômico não legitima a caracterização do trabalho como especial, porque o esforço
físico é inerente à profissão, que atua sobre o trabalhador em níveis normais, não autorizando a
conclusão de que causa danos à saúde.
Assim, incabível se afigura o reconhecimento da excepcionalidade do ofício desempenhado
nesses intervalos, à míngua de comprovação do exercício da atividade em condições
degradantes.
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas
apenas dos interregnos de 10/3/1980 a 13/1/1981, de 21/12/1981 a 2/6/1982, de 1º/6/1983 a
27/11/1986, de 10/2/1992 a 17/2/1992, de 7/5/1992 a 9/11/1993 e de 18/6/1996 a 5/3/1997.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, restou preenchido o requisito da carência, em conformidade com o artigo 142
da Lei n. 8.213/1991.
Contudo, somados os lapsos incontroversos ao tempo especial ora reconhecido (devidamente
convertido), a parte autora não conta 35 anos na data do requerimento administrativo, de modo
que não estão presentes todos os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição integral (artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal,
com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998).
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, sendo vedada a compensação pela
novel legislação, deverá ser observada a proporcionalidade à vista do vencimento e da perda de
cada parte, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do CPC.
Assim, condeno o INSS a pagar honorários ao advogado da parte contrária, que arbitro em 3%
(três por cento) sobre o valor atualizado da causa, e também condeno a parte autora a pagar
honorários de advogado ao INSS, fixados em 7% (sete por cento) sobre a mesma base de
cálculo, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto
processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, de ofício, anulo a sentença e o acórdão embargado e, nos termos do artigo
1.013, § 3º, III, do CPC, julgo parcialmente procedente o pedido para, nos termos da
fundamentação: (i) enquadrar como atividade especial e converter em comum os períodos de
10/3/1980 a 13/1/1981, de 21/12/1981 a 2/6/1982, de 1º/6/1983 a 27/11/1986, de 10/2/1992 a
17/2/1992, de 7/5/1992 a 9/11/1993 e de 18/6/1996 a 5/3/1997; (ii) fixar a sucumbência recíproca
desproporcional. Apelação do INSS e embargos de declaração da parte autora prejudicados.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. SENTENÇA E ACORDÃO CITRA PETITA. ANULAÇÃO
DE OFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. TRABALHO AGROPECUÁRIO. MOTORISTA DE CAMINHÃO.
CERAMISTA. RUÍDO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS
REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Sentença e acórdão citra petita anulados de ofício. Julgamento com base no artigo 1.013, § 3º,
II, do CPC.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) indicam o exercício de
atividades em "estabelecimentos agropecuários", enquadrando-se nos exatos termos do código
2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964. Precedentes do STJ.
- Depreende-se do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) coligido aos autos o exercício da
atividade de "motorista de caminhão", fato que permite o reconhecimento de sua natureza
especial apenas pelo enquadramento profissional (até 28/4/1995), nos termos dos códigos 2.4.4
do anexo do Decreto n. 53.831/1964 e 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/1979.
- Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) aponta o labor de "ceramista” (CBO 89210),
em indústria de cerâmica, situação que possibilita o enquadramento perseguido, nos termos do
código 2.5.2 do anexo do Decreto 53.831/1964.
- Comprovada a exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores ao limite de
tolerância previsto na legislação previdenciária à época da prestação do serviço (80 decibéis), o
que viabiliza a contagem diferenciada requerida em conformidade com o código 1.1.6 do anexo
do Decreto n. 53.831/1964.
- É inviável o reconhecimento do trabalho desenvolvido pela parte autora como "motorista", por
não se enquadrar aos termos dos anexos dos Decretos n. 53.831/1964 ou 83.080/1979, os quais
contemplam penosidade na condução unicamente de caminhões de carga ou ônibus no
transporte de passageiros.
- Período em que o autor trabalhou no cargo de "serviços gerais em olaria" não pode ser
reconhecido como especial, pois o referido ofício apontado em Carteira de Trabalho e Previdência
Social (CTPS), não está contemplado nos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979.
- Não obstante o autor tenha atuado como "trabalhador agrícola", não foi coligida aos autos
qualquer prova de que a atividade rurícola desempenhada era exclusivamente de natureza
agropecuária (código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964), situação que impossibilita
qualquer tentativa de reconhecimento do seu labor como especial. Precedentes do STJ e do
TRF3.
- A ocupação profissional de "padeiro" não encontra previsão na lista de atividades insalubres dos
decretos regulamentadores a possibilitar o enquadramento como especial do interstício até a data
de 28/4/1995, cabendo ao segurado a demonstração da exposição a fatores de risco, situação
esta também não verificada nos autos.
- O enquadramento por categoria profissional (como "motorista de caminhão/ônibus") só era
possível até 28/4/1995. Após esta data, a parte autora deveria demonstrar exposição, com
habitualidade, aos agentes nocivos, via formulários ou laudos técnicos certificadores das
condições insalutíferas do labor, indicando a exposição com permanência e habitualidade, ônus
do qual não se desincumbiu quando instruiu a peça inicial (art. 373, I, do CPC).
- Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPP) apresentados indicam a exposição a níveis de
ruído inferiores aos limites de tolerância previstos na legislação previdenciária à época da
prestação do serviço (90 decibéis até 18/11/2003 e 85 decibéis para período subsequente).
- A postura inadequada (risco ergonômico), o risco de queda e o acidente de trânsito
correspondem a agentes não previstos nos decretos regulamentadores como aptos a conferir
caráter insalubre à atividade desenvolvida.
- O autor não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça inicial, qual
seja: carrear prova documental descritiva das condições insalubres às quais permaneceu exposto
no ambiente laboral, como formulários padrão, laudo técnico individualizado e Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP).
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, por
estarem ausentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da
Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Ocorrência de sucumbência recíproca desproporcional (artigo 85, caput e § 14, do CPC).
Condena-se o INSS ao pagamento de honorários ao advogado da parte contrária em 3% (três por
cento) sobre o valor atualizado da causa, e a parte autora fica condenada a pagar honorários de
advogado à autarquia, fixados em 7% (sete por cento) sobre a mesma base de cálculo, suspensa,
porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se
de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS e embargos de declaração da parte autora prejudicados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, anular a sentença e o acórdão embargado e, nos termos do
artigo 1.013, § 3º, III, do CPC, julgar parcialmente procedente o pedido. Apelação do INSS e
embargos de declaração da parte autora prejudicados, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
