
| D.E. Publicado em 14/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, (i) conhecer parcialmente do recurso do INSS; (ii) dar parcial provimento à parte conhecida do apelo autárquico e ao reexame necessário, a fim de (a) extirpar da condenação a obrigação do INSS recalcular a renda mensal inicial do benefício do autor, incluindo o período em gozo de auxílio-doença; (b) afastar o enquadramento, como especiais, dos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995, mantendo, contudo, o enquadramento do interstício de 01.10.1996 a 30.07.1997; (c) afastar a condenação do INSS à revisão do benefício concedido ao autor em razão do enquadramento dos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995; (d) fixar o termo inicial do pagamento das parcelas atrasadas em decorrência da revisão da aposentadoria do autor, em razão do enquadramento, como especial, do interstício de 01.10.1996 a 30.07.1997, na data da citação; e (e) reconhecer a sucumbência recíproca, condenando ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios na forma delineada no voto; e (iii) determinar, de ofício, a alteração da correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000008-06.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de remessa necessária e apelação interposta contra a sentença de fls. 259/260 que julgou procedentes os pedidos deduzidos na inicial, apresentando a seguinte conclusão:
ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE a ação para CONDENAR INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a: |
a) a proceder à conversão do tempo de serviço trabalhado pelo autor em atividade especial entre 12.06.1989 à 30.07.1997; pelo índice 1,4; |
b) a RECALCULAR a renda mensal inicial do benefício do autor, incluindo o tempo de serviço decorrente da conversão do tempo de atividade especial em comum e o período em gozo de auxílio-doença. A renda mensal inicial não será superior ao valor do limite máximo do salário de contribuição na data do início do benefício (Lei nº 8.213/91, artigo 29, parágrafo 2º); |
c) a PAGAR ao autor as diferenças devidas em razão da revisão, corrigidas monetariamente a partir do vencimento de cada parcela, nos termos da Lei nº 6.899/81, e acrescidas de juros moratórios de um por cento ao mês, calculados nos termos do artigo 1º-F, da Lei nº 9.497/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09; devidos a partir da citação (Súmula 204, do Superior Tribunal de Justiça), respeitada a prescrição qüinqüenal, contada da distribuição da ação. |
Pela sucumbência, CONDENO O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ao pagamento de honorários advocatícios da parte adversa, os quais fixo em quinze por cento do débito existente até esta data, a teor do artigo 20, parágrafo 3º, do CPC. |
Em conseqüência, JULGO EXTINTO O PROCESSO DE CONHECIMENTO, com julgamento do mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil. |
Sentença sujeita a reexame necessário, nos termos do artigo 10, da Lei nº 9.469/97. |
O INSS interpôs apelação, argumentando, em síntese, o seguinte: (i) prescrição; (ii) nulidade da sentença quanto ao à condenação para incluir como tempo de serviço o período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença; (iii) decadência do direito a eventual revisão de aposentadoria; (iv) o uso de EPI impede o reconhecimento do labor especial; (v) o nível de ruído a que o autor ficava exposto era abaixo do limite de tolerância; (vi) a exposição a eletricidade era intermitente; (vii) os honorários advocatícios não devem ser fixados em patamar superior a 10%; (viii) os juros e correção monetária devem ser calculadas na forma da Lei 11.960/09; (ix) o termo inicial da condenação deve ser fixada na data da citação.
Contrarrazões da parte autora (fls. 294/303).
Na sequência, subiram os autos a esta Corte.
É o breve relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA DECADÊNCIA
O artigo 103, da Lei 8.213/91, prevê o prazo decadencial de 10 anos para que o segurado exerça o direito de revisar o benefício que lhe foi concedido pelo INSS, fazendo-o nos seguintes termos:
Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 10.839, de 2004) |
Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil. |
Tal dispositivo legal foi considerado constitucional pelo E. STF, conforme se infere da ementa do RE 626489/SE, no qual foi reconhecida a repercussão geral do tema:
RECURSO EXTRAODINÁRIO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. 1. O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário. 2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse em evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário. 3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição. 4. Inexiste direito adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido. |
Em tal oportunidade, foram firmadas duas teses pelo E. STF: "I - Inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário; II - Aplica-se o prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefícios concedidos, inclusive os anteriores ao advento da Medida Provisória 1.523/1997, hipótese em que a contagem do prazo deve iniciar-se em 1º de agosto de 1997".
Considerando que (i) a presente ação foi ajuizada em 31.08.2011 e que (ii) o autor não pode ter tomado ciência da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo da sua pretensão antes de 21.03.2002, data em que o seu requerimento de revisão ainda estava em trâmite na Divisão de Benefícios da Gerência Executiva em Sorocaba, conforme fl. 128, conclui-se que não houve o transcurso do prazo decadencial, considerando o disposto no artigo 103, in fine, da Lei 8.213/91.
Posto isso, rejeito a alegação de decadência.
DA PARCIAL NULIDADE DA SENTENÇA EM RAZÃO DA INCLUSÃO COMO TEMPO DE SERVIÇO DO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA - INEXISTÊNCIA DE PEDIDO
Alega o INSS que a sentença seria nula, no que se refere à condenação pra incluir como tempo de serviço o período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença, pois não fora formulado pedido nesse sentido.
A pretensão do INSS deve ser acolhida.
Na petição inicial, o autor requereu que o INSS fosse condenado a "reconhecer o tempo trabalhado nas empresas Brasital [...] de 01/06/1989 a 31/10/1995; Atra [...] de 01/10/1996 a 30/07/1997".
Já o CNIS de fl. 152 revela que o autor gozou de benefício previdenciário no período compreendido entre 23.11.1999 e 08.01.2000, o qual não está contido no intervalo de tempo que o recorrido pediu que fosse reconhecido como especial.
Logo, deve ser extirpada a condenação do INSS para RECALCULAR a renda mensal inicial do benefício do autor, incluindo o período em gozo de auxílio-doença.
Posto isso, dou provimento no particular, reconhecendo a nulidade da sentença nesse ponto, afastando da condenação a obrigação de o INSS recalcular a renda mensal inicial do benefício do autor, incluindo o período em gozo de auxílio-doença.
DO NÃO CONHECIMENTO DE PARTE DO RECURSO DO INSS. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.
O INSS sustenta que a exposição a eletricidade era intermitente, motivo pelo qual tal agente nocivo não poderia justificar o reconhecimento do labor especial.
Verifica-se, contudo, que a decisão apelada não reconheceu a especialidade do labor desenvolvido pelo autor em razão da sua exposição a eletricidade.
Por conseguinte, o INSS não tem interesse recursal nesse ponto, motivo pelo qual não conheço do recurso autárquico no particular.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição da MP 1.523, de 11.10.1996, tornou-se legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico.
Acresça-se que, para se comprovar a atividade insalubre a partir de 10.12.1997, a Lei 9.528 passou a exigir laudo técnico, elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, para demonstrar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, sendo certo que os agentes ruído e calor sempre exigiram a apresentação de laudo.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Considerando que a Lei 9.032/95 não previu a exigência de LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) como requisito para a concessão da aposentadoria especial, consolidou-se o entendimento de que referido laudo só é exigível a partir de 11/10/06 (MP 1.523-10) e que a menção a EPI ou EPC somente é exigível após 14.12.98 (Portaria MPS 5.404/99).
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Feitas tais ponderações iniciais, já se pode analisar o caso dos autos.
DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Delineado esse quadro normativo, já se pode analisar cada um dos períodos sub judice.
Os formulários de fls. 39 e 40 revelam, respectivamente, que, nos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995, o autor "estava exposto esporadicamente a agentes agressivos nos setores de Fiação e Tecelagem: ruído (95 dB)".
Logo, não há como se considerar esse período especial, eis que a exposição não era habitual, permanente, não ocasional nem intermitente.
Nesse sentido, a jurisprudência desta C. Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO / CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. |
[...] |
- A exposição esporádica ao agente frio impede o reconhecimento da especialidade do labor, uma vez que a Lei nº 8.213/91 exige, para o acolhimento da pretensão, que a submissão ocorra de forma habitual, permanente, não ocasional nem intermitente. |
- Negado provimento ao recurso de apelação da parte autora. |
(TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2169029 - 0062200-21.2009.4.03.6301, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 08/08/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/08/2016 ) |
Friso que, apesar de os formulários de fls. 83 e 84 consignarem que o segurado "permanecia na seção Fiação e Tecelagem onde funcionam as máquinas, em caráter habitual e permanente", não há como se concluir, a partir daí, que a exposição do autor a agente nocivo fosse habitual.
É que além dos formulários de fls. 39 e 40 atestarem exatamente o contrário, os formulários de fls. 83 e 84 indicam que o recorrido trabalhava durante a sua jornada, na Oficina Elétrica - Engenharia e Manutenção, assim descrita: "Oficina de manutenção elétrica, que contava com bancada de serviço dos eletricistas, motores em estoque e em reparo, armários de material elétrico e aparelhos para testes. Área de produção onde estão instalados transformadores, motores, painéis e linhas de alta tensão".
Portanto, a análise conjunta de tais documentos conduz à conclusão de que o autor não se expunha de forma habitual a ruído de 95 dB, o que impede o reconhecimento do labor especial nos intervalos de tempo de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995.
Por outro lado, o formulário de fl. 42 registra que, de 01.10.1996 a 30.07.1997, o "segurado executava suas tarefas sobre o nível de pressão sonora de 91,0 dB de modo habitual e permanente" e que a empresa não possui laudo pericial avaliando o grau de intensidade.
Nada obstante, veio aos autos o laudo técnico de fls. 243/250, o qual revela que, nesse período, o autor ficava exposto, habitual e permanentemente, a níveis de ruído de 91 a 95 dB.
Logo, o trabalho desenvolvido pelo recorrido nesse intervalo de tempo - de 01.10.1996 a 30.07.1997 - deve ser considerado especial.
No que diz respeito ao uso do EPI, o E. STF, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Portanto, no caso de ruído, ainda que haja registro de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Pelo exposto, deve a sentença ser parcialmente reformada, afastando-se o enquadramento, como especiais, dos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995, mantendo-se, contudo, o enquadramento do interstício de 01.10.1996 a 30.07.1997.
DO DIREITO À REVISÃO.
Considerando o reconhecimento como especial do labor do recorrido no intervalo de tempo de 01.10.1996 a 30.07.1997, o INSS fica condenado a revisar a aposentadoria concedida ao recorrido.
O termo inicial de tal revisão é fixado na data da citação, eis que a documentação que permitiu o enquadramento do labor especial apenas foi apresentada neste feito.
Friso que a documentação que o autor apresentou na esfera administrativa não autorizava o reconhecimento do labor especial no período de 01.10.1996 a 30.07.97, eis que o formulário consignava expressamente que a empresa não possuía laudo pericial de aferição do ruído.
Por tais razões, fixo o termo inicial da repercussão financeira da revisão a data da citação. Por conseguinte, não há prescrição há ser reconhecida.
DA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento parcial do pedido de reconhecimento de trabalho em condições especiais, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca, motivo pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as partes, na forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas honorárias, por se tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, § 14, do CPC/15).
Por tais razões, com base no artigo 85, §§2° e 3°, do CPC/15, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INSS, que fixo em R$2.000,00 (dois mil reais), considerando que não se trata de causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço, e que o valor atribuído à causa é irrisório.
Suspendo, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
Por outro lado, vencido o INSS no que tange ao reconhecimento como especial de parte do período pleiteado na inicial e à revisão da aposentadoria da parte autora, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios no particular, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Não pode ser acolhido, portanto, o apelo do INSS.
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Assim, como a sentença determinou a aplicação de critérios de correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/PE, pode esta Corte alterá-la, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, voto por (i) conhecer parcialmente do recurso do INSS; (ii) dar parcial provimento à parte conhecida do apelo autárquico e ao reexame necessário, a fim de (a) extirpar da condenação a obrigação do INSS recalcular a renda mensal inicial do benefício do autor, incluindo o período em gozo de auxílio-doença; (b) afastar o enquadramento, como especiais, dos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995, mantendo, contudo, o enquadramento do interstício de 01.10.1996 a 30.07.1997; (c) afastar a condenação do INSS à revisão do benefício concedido ao autor em razão do enquadramento dos períodos de 01.06.1989 a 31.03.1994 e de 01.04.1994 a 23.08.1995; (d) fixar o termo inicial do pagamento das parcelas atrasadas em decorrência da revisão da aposentadoria do autor, em razão do enquadramento, como especial, do interstício de 01.10.1996 a 30.07.1997, na data da citação; e (e) reconhecer a sucumbência recíproca, condenando ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios na forma delineada no voto; e (iii) determinar, de ofício, a alteração da correção monetária, nos termos expendidos no voto.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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