Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5006072-68.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA.
INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE
TOTAL E PERMANENTE. CARÊNCIA CUMPRIDA. CONCESSÃO DEVIDA. TERMO INICIAL DA
BENESSE. CUSTAS PROCESSUAIS.
- Nos termos da contestação apresentada pelo INSS, foi expendida manifestação acerca da
prescindibilidade da prova testemunhal, à míngua do correspondente início de prova material.
Vislumbra-se, portanto, que a parte ré se insurge em face de eventual prejuízo por ela
ocasionado, adotando evidente comportamento contraditório, sendo de rigor, portanto, a rejeição
da preliminar arguida. Precedente.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a
data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento administrativo, e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
- Nada obstante, a r. sentença cuidou de estabelecer a DIB na DII (04/09/2019), razão por que,
tendo apenas o INSS apresentado apelação, requerendo a fixação do referido termo inicial na
data de juntada do laudo que constatou a incapacidade, o correspondente estabelecimento na
DER redundaria em inegável reformatio in pejus.
- Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis
Estaduais sul-mato-grossenses nºs 1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº
3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas
naquele Estado.
- Apelação não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006072-68.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ANTENOR RIBEIRO CUEVAS
Advogado do(a) APELADO: KENNEDI MITRIONI FORGIARINI - MS12655-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006072-68.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ANTENOR RIBEIRO CUEVAS
Advogado do(a) APELADO: KENNEDI MITRIONI FORGIARINI - MS12655-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):
Cuida-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença
proferida em demanda previdenciária que julgou procedente o pedido de concessão de
aposentadoria por invalidez desde o início da incapacidade, fixada em 04/09/2019, à míngua de
documentos diversos que demonstrem tal circunstância em período anterior. Houve a
condenação do INSS, ainda, ao pagamento de custas processuais, porquanto a isenção que lhe
era aplicável foi revogada pela Lei nº 3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º).
O INSS suscita, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, já que não teria havido
a produção de prova testemunhal, tida por essencial à demonstração da verdade dos fatos.
No mérito, sustenta, em síntese, que não houve a comprovação do exercício de labor rural pelo
período de 12 (doze) meses de carência, já que “O fato da autora residir em imóvel rural não
necessariamente faz com que se reconheça o exercício de atividade rural, mormente quando a
segurada TEM VÍNCULO COMO EMPREGADA URBANA NO CNIS”.
Subsidiariamente, requer (i) que a DIB seja fixada na data da juntada da perícia médica que
comprove a existência de incapacidade laboral, pois tal circunstância não teria sido demonstrada
nas datas de requerimento administrativo ou de cessação administrativa, e (ii) que seja excluída
qualquer condenação no que tange ao pagamento de custas processuais, nos termos do art. 4, I,
da Lei nº. 9.289/96, do art. 24.A, da Lei nº. 9.028/95, com a redação dada pelo art. 3º da MP nº
2.180-35/01, e do art. 8º, §1º, da Lei nº. 8.620/93.
Apresentadas as contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte Regional.
É o relatório.
ms
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006072-68.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ANTENOR RIBEIRO CUEVAS
Advogado do(a) APELADO: KENNEDI MITRIONI FORGIARINI - MS12655-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
Do cerceamento de defesa
Insurge-se o apelante a fim de arguir a ocorrência de cerceamento de defesa em razão da
ausência da colheita de prova testemunhal, o que teria tolhido a “oportunidade de o magistrado
ou às partes questionarem a respeito das alegações das testemunhas, prejudicando a
demonstração da verdade dos fatos”.
Entretanto, nos termos da contestação por ele apresentada, foi expendida manifestação acerca
da prescindibilidade da prova testemunhal, à míngua do correspondente início de prova material
(140680639 - Pág. 10):
“(...) ante a clarividente ausência de início de prova material, nem mesmo eventuais depoimentos
de testemunhas em audiência de instrução possuem o condão de comprovar o exercício de
atividade rural em regime de economia familiar, visto ser impossível sua caracterização com
base, tão somente, em prova testemunhal”
Vislumbra-se, portanto, que a parte ré se insurge em face de eventual prejuízo por ela
ocasionado, adotando evidente comportamento contraditório, sendo de rigor, portanto, a rejeição
da preliminar arguida.
Neste sentido:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO
CARACTERIZADO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. NÃO CONHECIMENTO DA
REMESSA OFICIAL. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS. - Evidencia-se
que a ré se insurge contra prejuízo ao qual ela mesma deu causa, adotando, assim,
comportamento contraditório. De rigor a rejeição da preliminar. - Na hipótese dos autos, embora a
sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa
não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se perfeitamente à norma insculpida no
parágrafo 3º, I, artigo 496 do NCPC, razão pela qual se impõe o afastamento do reexame
necessário. - É assegurado o benefício da aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais, na
forma da Lei n. 8.213/91, ao segurado que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem ou
55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher mediante a comprovação do exercício da atividade rural,
ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos do art.
26, III, e art. 142 do referido texto legal. - Conjunto probatório que demonstra o cumprimento do
período de carência e a permanência nas lides campesinas até momento imediatamente anterior
ao implemento do requisito etário. - Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação
do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
(TRF3 - ApReeNec 5065524-77.2018.4.03.9999. RELATOR: Desembargador Federal GILBERTO
RODRIGUES JORDAN, 9ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/07/2019)
Da aposentadoria por invalidez e do auxílio-doença
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 da LBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 15 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 15 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
No caso vertente, insurge-se o INSS acerca do cumprimento do período de carência necessário à
concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
Consoante se depreende das informações constantes do extrato previdenciário (CNIS), a parte
autora ostentou diversos vínculos empregatícios no período compreendido entre 01/09/1990 a
09/2003, verteu contribuições, na condição de contribuinte individual, entre 01/01/2015 e
31/08/2015 e, por fim, possui período de atividade como segurado especial de 01/10/2015 a
16/07/2019.
Sob tal perspectiva, conquanto tenha sido determinado, nos termos do laudo pericial, o início da
incapacidade em 04/09/2019, é razoável concluir, com base nos documentos médicos acostados
aos autos, que referem moléstias idênticas àquelas aferidas pelo d. perito (Insuficiência Renal
Crônico – CID10N05), que a parte se afastou da faina campestre em decorrência da limitação ora
constatada, estando, consequentemente, incapacitada no momento em que formulado o
requerimento administrativo, em 15/08/2019 (ID 140680638 – Págs. 23, 29, 33/35 e 37, ID
140680639 - Pág. 43).
Com efeito, oportuno considerar que o laudo pericial orienta o livre convencimento do Juiz quanto
aos fatos alegados pelas partes não servindo, necessariamente, como parâmetro para fixar termo
inicial de aquisição de direitos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. A
PREEXISTÊNCIA DE DOENÇA OU LESÃO NÃO IMPEDE A CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE, SE COMPROVADA QUE A INCAPACIDADE DECORREU DO
AGRAVAMENTO OU PROGRESSÃO DA DOENÇA OU LESÃO. LAUDO MÉDICO NÃO PODE
SER USADO PARA FIXAR O MARCO INICIAL DA AQUISIÇÃO DE DIREITOS. O TERMO
INICIAL DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CORRESPONDE AO DIA SEGUINTE À
CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO ANTERIORMENTE CONCEDIDO OU DO PRÉVIO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SUBSIDIARIAMENTE, QUANDO AUSENTES AS
CONDIÇÕES ANTERIORES, O MARCO INICIAL PARA PAGAMENTO SERÁ A DATA DA
CITAÇÃO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. Os benefícios por incapacidade foram idealizados com o intuito de amparar o Trabalhador em
situações excepcionais, quando, por eventos cujas ocorrências não podem ser controladas, o
Segurado tem reduzida sua capacidade para exercer sua atividade de trabalho. Concretizam,
assim, a proteção garantida ao Trabalhador no contrato de seguro firmado com a Previdência
Social.
2. Importante a compreensão de que o requisito legal para a concessão do benefício é a
existência de incapacidade para exercício da atividade laboral e que tal incapacidade não seja
preexistente à filiação do Segurado ao Regime Geral de Previdência. 3. Assim, não há óbice que
a doença que atinge o Segurado seja preexistente à sua filiação, desde que tal enfermidade não
interfira em sua capacidade para o trabalho e fique comprovado que a incapacidade se deu em
razão do agravamento ou da progressão da doença ou lesão que já acometia o segurado.
4. Na hipótese dos autos, a Corte de origem, com base no acervo probatório dos autos, concluiu
que a incapacidade da Segurada é decorrente do agravamento progressivo da patologia que
apresenta, não merecendo, assim, qualquer reparo o acórdão neste ponto.
5. O laudo pericial ou o laudo da junta médica administrativa norteiam somente o livre
convencimento do Juiz quanto aos fatos alegados pelas partes, portanto, não servem como
parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos.
6. O termo inicial da aposentadoria por invalidez corresponde ao dia seguinte à cessação do
benefício anteriormente concedido ou do prévio requerimento administrativo; subsidiariamente,
quando ausentes as condições anteriores, o marco inicial para pagamento será a data da citação.
Precedentes: AgInt no AREsp. 915.208/SC, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe
19.12.2016; AgInt no AREsp 980.742/SP, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 3.2.2017; e AgRg no
REsp.
1.521.928/MG, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 19.6.2015.
7. Agravo em Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.
Recurso Especial da Segurada provido para fixar o termo inicial do benefício na data do
requerimento administrativo.
(STJ - REsp 1471461/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 03/04/2018, DJe 16/04/2018)
Assim, depreende-se que a parte autora se desincumbiu de demonstrar o cumprimento da
carência quando do requerimento administrativo, sendo, portanto, devida a aposentadoria por
invalidez.
Data de início do benefício (DIB)
É cediço que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no
sentido de que a data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento
administrativo, e apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
Com efeito, consoante estabelecido pelo C. Superior Tribunal de Justiça por ocasião do
julgamento do Recurso Especial nº 1.369.165/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos
(Tema 626), “a citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal
e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez
concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação administrativa”.
Posteriormente, houve a edição da Súmula 576 do STJ, com a seguinte redação: “ausente
requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por
invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida”.
Desta feita, afere-se dos autos que a parte autora reunia os requisitos necessário à concessão de
aposentadoria por invalidez na data do requerimento administrativo, razão por que seria de rigor a
fixação da DIB a partir desta data (15/08/2019).
Entretanto, depreende-se que a r. sentença cuidou de estabelecer a DIB na DII (04/09/2019),
razão por que, tendo apenas o INSS apresentado apelação, requerendo a fixação do referido
termo inicial na data de juntada do laudo que constatou a incapacidade, o correspondente
estabelecimento na DER redundaria em inegável reformatio in pejus.
Das custas processuais
O INSS, como autarquia federal, é isento do pagamento de custas na Justiça Federal, por força
do artigo 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/1996.
Da mesma forma, em face do disposto no artigo 1º, § 1º, da referida lei, combinado com o
estabelecido pelo artigo 6º da Lei Estadual paulista nº 11.608, de 2003, também está isento nas
lides aforadas perante a Justiça Estadual de São Paulo no exercício da competência delegada.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis
Estaduais sul-mato-grossenses nºs 1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº
3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas
naquele Estado.
Ante o exposto, rejeito a preliminar arguida e nego provimentoà apelação o INSS, nos termos da
fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA.
INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE
TOTAL E PERMANENTE. CARÊNCIA CUMPRIDA. CONCESSÃO DEVIDA. TERMO INICIAL DA
BENESSE. CUSTAS PROCESSUAIS.
- Nos termos da contestação apresentada pelo INSS, foi expendida manifestação acerca da
prescindibilidade da prova testemunhal, à míngua do correspondente início de prova material.
Vislumbra-se, portanto, que a parte ré se insurge em face de eventual prejuízo por ela
ocasionado, adotando evidente comportamento contraditório, sendo de rigor, portanto, a rejeição
da preliminar arguida. Precedente.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a
data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento administrativo, e
apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
- Nada obstante, a r. sentença cuidou de estabelecer a DIB na DII (04/09/2019), razão por que,
tendo apenas o INSS apresentado apelação, requerendo a fixação do referido termo inicial na
data de juntada do laudo que constatou a incapacidade, o correspondente estabelecimento na
DER redundaria em inegável reformatio in pejus.
- Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis
Estaduais sul-mato-grossenses nºs 1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº
3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas
naquele Estado.
- Apelação não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu afastar a preliminar arguida e negar provimento à apelação, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
