Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0039383-43.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 19/08/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. MÁXIMAS DA EXPERIÊNCIA. ARTIGOS 335 DO
CPC/1973 E 375 DO CPC/2015. REINGRESSO COM IDADE AVANÇADA. RECOLHIMENTOS
APENAS NOS MESES ANTERIORES AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DO
BENEFÍCIO. REALIZAÇÃO DE INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS CORRETIVAS EM 2004 E 2008.
ELEMENTOS SUFICIENTES QUE ATESTAM O INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA
ANTERIOR AO REINGRESSO NO RGPS. FILIAÇÃO OPORTUNISTA. INTELIGÊNCIA DOS
ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA LEI Nº 8.213/91.APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE
VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO.
GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - In casu, segundo a narrativa desenvolvida na petição inicial, a parte autora trabalhava como
doméstica e foi acometida de patologia cardíaca que a impediu de trabalhar a partir de 2012.
9 - No laudo médico elaborado em 14 de janeiro de 2016, o perito judicial constatou ser a
demandante portadora de "cardiopatia grave", que a incapacita para o trabalho, de forma total e
permanente, desde 26 de agosto de 2013. Cumpre registrar que, na data da perícia, a autora
contava com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
10 - O Cadastro Nacional de Informações Sociais, por sua vez, demonstra que ela efetuou
recolhimentos previdenciários, como segurada empregada, de 01/04/1981 a 30/06/1981 e de
15/09/1982 a 30/12/1982, e como contribuinte individual, de 01/03/1985 a 31/05/1985 e de
01/07/1986 a 30/09/1986. Após mais de vinte cinco anos sem recolhimentos previdenciários e já
com 51 (cinquenta e um) anos de idade, a demandante reingressou na Previdência Social, agora
como segurada facultativa, efetuando contribuições de 01/10/2011 a 31/12/2011, de 01/02/2012 a
31/01/2013 e de 01/03/2013 a 30/09/2013 (ID 102066922 - p. 61-62).
11 - Não se afigura crível, no entanto, que o mal mencionado no laudo pericial, tenha tornado a
autora incapaz para o trabalho pouco após o seu reingresso, como segurada facultativa, no
RGPS.
12 - Neste sentido, segundo as informações colhidas junto à demandante para a elaboração do
histórico clínico, ela "realizou duas cirurgias cardíacas devido a troca de válvula mitral data
12/10/2004 Comissurotomia Mitral 16/05/2008 troca de válvula em posição Mitral Biológica
BRAILE Nº 31" (ID 102066922 - p. 125).
13 - No mais, examinando a relação dos documentos médicos analisados pelo vistor oficial (ID
102066922 - p. 126), constata-se a importante ausência do Ecodopplercardiograma com
mapeamento de fluxo em cores, realizado em 16/09/2010, no qual já se notava "aumento da
cavidade do átrio esquerdo de grau importante" (ID 102066922 - p. 21/22).
14 - Conforme bem salientou o assistente técnico do INSS em seu parecer, "a autora NÃO
APRESENTA PIORA EVOLUTIVA, pois o laudo de ECODOPPLER datado de 26/08/2013, fls. 22
a 24, também indica ritmo cardíaco e funções de bombeamento cardíacos DENTRO da
NORMALIDADE, inclusive com FRAÇÃO de EJEÇÃO (FE) de 57,9% (normal de 53 a 77%) assim
como PRÓTESE BIOLÓGICA em posição VALVAR MITRAL com ASPECTO e
FUNCIONAMENTO NORMAIS e AUSÊNCIA de SINAIS de HIPERTENSÃO PULMONAR. No
entanto, da mesma forma que o exame data de 16/09/2010, o ecocardiograma de 26/08/2013
mantém o registro de AUMENTO da CAVIDADE do ÁTRIO ESQUERDO de GRAU
IMPORTANTE, alteração que continua sendo a responsável pela presença de ARRITMIA, com
necessidade de uso de antiarritmico, AMIODARONA, e pelos sintomas de cansaço e falta de ar
aos esforços" (ID 102066922 - p. 137-138).
15 - Realmente, além de ter feito duas cirurgias cardíacas, entre 2004 e 2008, a autora postulou
junto ao INSS, em 02/04/2008, a concessão do benefício de amparo social ao deficiente (ID
102066922 - p, 64), o que é mais um indício de que ela já se encontrava com problemas graves
de saúde desde então. O referido beneplácito só foi indeferido por descumprimento do requisito
previsto no artigo 20, §3º, da Lei n. 8.213/91.
16 - Não se trata de desconsideração das conclusões do perito judicial. O que aqui se está a
fazer é interpretar-se aquilo deixado em aberto, eis que o experto se baseou, para emitir sua
conclusão técnica, não em conhecimentos científicos, mas sim, com exclusividade, na entrevista
pessoal e nos exames apresentados pela própria parte autora, que, por sua vez, indicavam
somente aquilo que lhe interessava.
17 - Frise-se que, para concluir como leigo, não necessita o juízo de opinião técnica, eis que o
julgador pode muito bem extrair as suas convicções das máximas de experiências subministradas
pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015).
18 - Destarte, parece pouco crível que a patologia mencionada, de natureza degenerativa, tenha
tornado a autora incapaz pouco após o período em que ela havia recuperado a qualidade de
segurada facultativa.
19 - Note-se que a autora somente veio a promover recolhimentos junto à Previdência Social,
para fins de reingresso no sistema, após vinte e cinco anos sem contribuir, na qualidade de
segurada facultativa, quando já possuía 51 (cinquenta e um) anos de idade o que, somado aos
demais fatos relatados, reforça a conclusão de que os males são preexistentes a sua refiliação, o
que revela seu notório caráter oportunista.
20 - A incapacidade da parte autora é preexistente ao tempo em que reingressou no sistema de
seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a Seguridade Social brasileira
está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de modo que a seguro social
depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos por toda sociedade e também
para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao
custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser recolhidas mesmo quando o
trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
21 - Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou
facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, e se esses
trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças
incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei 8.213/1991 e da
própria lógica constitucional da Previdência.
22 - Destarte, verificada a preexistência da incapacidade laboral, de rigor o indeferimento do
pedido, razão pela qual merece reforma a sentença de 1º grau de jurisdição.
23 - Invertido os ônus sucumbenciais, deve ser condenada a autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
das custas e honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor
atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50,
reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015.
24 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
25 - Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de valores.
Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de
pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0039383-43.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA CRISTINA BENEDITO GOMES
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO DOS SANTOS - SP200361-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0039383-43.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA CRISTINA BENEDITO GOMES
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO DOS SANTOS - SP200361-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em
ação ajuizada por MARIA CRISTINA BENEDITO GOMES, objetivando a concessão dos
benefícios de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença.
A r. sentença, prolatada em 24/02/2017, julgou procedente o pedido deduzido na inicial e
condenou o INSS a implantar, em favor da autora, o benefício de aposentadoria por invalidez,
pagando os atrasados, desde a data do requerimento administrativo (03/10/2013), acrescidos
de correção monetária e de juros moratórios. Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez
por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da prolação da sentença, nos
termos da Súmula 111 do C. STJ.
Deferida a tutela de urgência, houve a implantação do benefício em 01/07/2017, com renda
mensal equivalente a um salário mínimo.
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma do r. decisum, ao fundamento de que a
demandante não preencheu os requisitos para a concessão do benefício, pois sua incapacidade
laboral é preexistente ao reingresso na Previdência Social.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este
Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0039383-43.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA CRISTINA BENEDITO GOMES
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO DOS SANTOS - SP200361-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
In casu, segundo a narrativa desenvolvida na petição inicial, a parte autora trabalhava como
doméstica e foi acometida de patologia cardíaca que a impediu de trabalhar a partir de 2012.
No laudo médico elaborado em 14 de janeiro de 2016, o perito judicial constatou ser a
demandante portadora de "cardiopatia grave", que a incapacita para o trabalho, de forma total e
permanente, desde 26 de agosto de 2013.
Cumpre registrar que, na data da perícia, a autora contava com 55 (cinquenta e cinco) anos de
idade.
O Cadastro Nacional de Informações Sociais, por sua vez, demonstra que ela efetuou
recolhimentos previdenciários, como segurada empregada, de 01/04/1981 a 30/06/1981 e de
15/09/1982 a 30/12/1982, e como contribuinte individual, de 01/03/1985 a 31/05/1985 e de
01/07/1986 a 30/09/1986. Após mais de vinte cinco anos sem recolhimentos previdenciários e já
com 51 (cinquenta e um) anos de idade, a demandante reingressou na Previdência Social,
agora como segurada facultativa, efetuando contribuições de 01/10/2011 a 31/12/2011, de
01/02/2012 a 31/01/2013 e de 01/03/2013 a 30/09/2013 (ID 102066922 - p. 61-62).
Lembro, por oportuno, que prevalece no direito processual civil brasileiro o livre convencimento
motivado. Ademais, o magistrado não está adstrito ao laudo.
Não se me afigura crível, no entanto, que o mal mencionado no laudo pericial, tenha tornado a
autora incapaz para o trabalho pouco após o seu reingresso, como segurada facultativa, no
RGPS.
Neste sentido, segundo as informações colhidas junto à demandante para a elaboração do
histórico clínico, ela "realizou duas cirurgias cardíacas devido a troca de válvula mitral data
12/10/2004 Comissurotomia Mitral 16/05/2008 troca de válvula em posição Mitral Biológica
BRAILE Nº 31" (ID 102066922 - p. 125).
No mais, examinando a relação dos documentos médicos analisados pelo vistor oficial (ID
102066922 - p. 126), constata-se a importante ausência do Ecodopplercardiograma com
mapeamento de fluxo em cores, realizado em 16/09/2010, no qual já se notava "aumento da
cavidade do átrio esquerdo de grau importante" (ID 102066922 - p. 21/22).
Conforme bem salientou o assistente técnico do INSS em seu parecer, "a autora NÃO
APRESENTA PIORA EVOLUTIVA, pois o laudo de ECODOPPLER datado de 26/08/2013, fls.
22 a 24, também indica ritmo cardíaco e funções de bombeamento cardíacos DENTRO da
NORMALIDADE, inclusive com FRAÇÃO de EJEÇÃO (FE) de 57,9% (normal de 53 a 77%)
assim como PRÓTESE BIOLÓGICA em posição VALVAR MITRAL com ASPECTO e
FUNCIONAMENTO NORMAIS e AUSÊNCIA de SINAIS de HIPERTENSÃO PULMONAR. No
entanto, da mesma forma que o exame data de 16/09/2010, o ecocardiograma de 26/08/2013
mantém o registro de AUMENTO da CAVIDADE do ÁTRIO ESQUERDO de GRAU
IMPORTANTE, alteração que continua sendo a responsável pela presença de ARRITMIA, com
necessidade de uso de antiarritmico, AMIODARONA, e pelos sintomas de cansaço e falta de ar
aos esforços" (g. n.) (ID 102066922 - p. 137-138).
Realmente, além de ter feito duas cirurgias cardíacas, entre 2004 e 2008, a autora postulou
junto ao INSS, em 02/04/2008, a concessão do benefício de amparo social ao deficiente (ID
102066922 - p, 64), o que é mais um indício de que ela já se encontrava com problemas graves
de saúde desde então. O referido beneplácito só foi indeferido por descumprimento do requisito
previsto no artigo 20, §3º, da Lei n. 8.213/91.
Não se trata de desconsideração das conclusões do perito judicial. O que aqui se está a fazer é
interpretar-se aquilo deixado em aberto, eis que o experto se baseou, para emitir sua conclusão
técnica, não em conhecimentos científicos, mas sim, com exclusividade, na entrevista pessoal e
nos exames apresentados pela própria parte autora, que, por sua vez, indicavam somente
aquilo que lhe interessava.
Frise-se que, para concluir como leigo, não necessita o juízo de opinião técnica, eis que o
julgador pode muito bem extrair as suas convicções das máximas de experiências
subministradas pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015).
Destarte, parece pouco crível que a patologia mencionada, de natureza degenerativa, tenha
tornado a autora incapaz pouco após o período em que havia recuperado a qualidade de
segurada facultativa.
Note-se que a autora somente veio a promover recolhimentos junto à Previdência Social, para
fins de reingresso no sistema, após vinte e cinco anos sem contribuir, na qualidade de segurada
facultativa, quando já possuía 51 (cinquenta e um) anos de idade o que, somado aos demais
fatos relatados, reforça a conclusão de que os males são preexistentes a sua refiliação, o que
revela seu notório caráter oportunista.
Assim, observo que a incapacidade da parte autora é preexistente ao tempo em que
reingressou no sistema de seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a
Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de
modo que a seguro social depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos
por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que
as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser
recolhidas mesmo quando o trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou
facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, e se esses
trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças
incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei 8.213/1991 e da
própria lógica constitucional da Previdência.
Destarte, verificada a preexistência da incapacidade laboral, de rigor o indeferimento do pedido,
razão pela qual merece reforma a sentença de 1º grau de jurisdição.
Observo, por fim, que foi concedida a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória
deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado,
conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema
cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo
(STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia
constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o
derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo
ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo
juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento
das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos
honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa,
ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de
insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária
gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo
§3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau e
julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a revogação da tutela anteriormente
concedida, delegando-se à fase de liquidação a discussão acerca da devolução dos valores
recebidos a esse título, e condenar a parte autora no pagamento das custas e despesas
processuais, bem como nos honorários advocatícios, observada a Lei nº 1.060/50.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Com fundamento na
ausência de incapacidade para a atividade habitual, o Ilustre Relator votou no sentido de
reformar a sentença que concedeu a aposentadoria por invalidez.
E, a par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no
caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual
por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício
provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por
invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está
dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de
qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e
afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da
carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 14/01/2016constatou que a parte
autora, faxineira, idade atual de 60 anos, é portadora de Cardiopatia grave, estando
incapacitada de forma total e permanente para o trabalho desde 26/08/2013, como se vê do
laudo constante de fls. 107/118:
"A Autora é portadora de cardiopatia com DID há seis meses antes de realizar cirurgia cardíaca
no ano de 2004, ficando afastada por tempo determinado. Após realizou transplante de válvula
data 16/05/2000. Aos exames apresentados houve evolução da doença caracterizado na data
26/0812013 pelo exame de ecocardiograma. A avaliação da capacidade funcional do coração
permite a distribuição dos pacientes em classes ou graus, o autor encontra-se na classe: de
acordo com atestado medico a Autora apresenta cardiopatia de GRAU II: pacientes podadores
de doenças cardíacas com teve limitação da atividade física. Estes pacientes sentem-se bem
em repouso, porém os grandes esforços provocam fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de
peito; considerando evolução da doença para cardiopatia grave conclui-se que a doença
caracteriza incapacidade laborativa total e permanente. Limitado a exercer grandes esforços
físicos DII 26/08/2013. Considerei o exame de ecocardiograma apresentado." (fl. 115)
E, nesse ponto, não há controvérsia, limitando-se o inconformismo do INSS, manifestado em
razões de apelo, à alegação de preexistência da incapacidade.
A parte autora, quando reingressou no regime, em outubro de 2011, contava com idade de 51
anos, condição esta que, se demonstrado que o início da incapacidade laborativa é posterior à
nova filiação à Previdência, não é suficiente para afastar o seu direito à obtenção do benefício
por incapacidade.
Ao contrário, o perito judicial afirmou expressamente, em seu laudo, que, não obstante a parte
autora já estivesse doente desde o ano de 2003, a sua incapacidade laborativa só teve início
em 26/08/2013 ou seja, após a nova filiação, como se vê do laudo constante de fls. 107/108.
Evidente, pois, que a incapacidade resultou de agravamento e progressão da doença,
aplicando-se, ao caso, a exceção às regras contida no parágrafo 2º do artigo 42 e no parágrafo
único do artigo 59, ambos da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. (...).
Parágrafo 2º. A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral
de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
Art. 59. (...).
Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de
Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício,
salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa
doença ou lesão.
A esse respeito, confiram-se os seguintes julgados desta Egrégia Corte:
... não merece prosperar a tese de doença preexistente pois, no presente caso, a segurada
enquadra-se na hipótese exceptiva de incapacidade sobrevinda pela progressão ou
agravamento da doença ou lesão (art. 42 da Lei 8.213/91).
(AC nº 0024680-10.2017.4.03.9999/SP, 8ª Turma, Relator Desembargador David Dantas, DE
19/10/2017)
Não há que se falar em doença preexistente à refiliação do autor aos quadros da previdência,
pois se observa do conjunto probatório que a incapacidade decorreu do agravamento de sua
moléstia, hipótese excepcionada pelo § 2º, do art. 42 da Lei nº 8.213/91.
(AC nº 0034596-20.2007.4.03.9999, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo
Saraiva, e-DJF3 Judicial 1 22/01/2014)
O afastamento do trabalho deu-se em razão da progressão ou do agravamento de sua doença,
fato este que afasta a alegação de doença preexistente e autoriza a concessão do benefício,
nos termos do parágrafo 2º, do art. 42, da Lei nº 8.213/91.
(AC nº 0011381-73.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio
Nascimento, e-DJF3 Judicial 1 22/01/2014)
E, se discordava da conclusão do perito judicial, deveria o INSS impugnar o laudo e, através de
seu assistente técnico, demonstrar o contrário, o que não ocorreu.
Ademais, estivesse a parte autora, antes do seu ingresso no regime, realmente incapacitada
para o trabalho, como alega o INSS, este não teria negado o benefício requerido em
03/10/2013, embasando-se na ausência de incapacidade (vide fl. 26)
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta
Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento
pacificado nos Tribunais Superiores.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto nesta decisão, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Não obstante a matéria que trata dos honorários recursais tenha sido afetada pelo Temanº
1.059 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que determinou a suspensão do processamento
dos feitos pendentes que versem sobre essa temática, é possível, na atual fase processual,
tendo em conta o princípio da duração razoável do processo, que a matéria não constitui objeto
principal do processo e que a questão pode ser reexaminada na fase de liquidação,a fixação do
montante devido a título de honorários recursais, porém, deixando a sua exigibilidade
condicionada à futura deliberação sobre o referido tema, o que será examinado oportunamente
peloJuízo da execução.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015.
Ante o exposto, divergindo do voto do Ilustre Relator, para manter a concessão de
aposentadoria por invalidez, NEGO PROVIMENTO ao apelo, condenando o INSS ao
pagamento de honorários recursais, na forma antes delineada, e DETERMINO, DE OFÍCIO, a
alteração de juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos nesta declaração de
voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença apelada.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PROCESSUAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. MÁXIMAS DA EXPERIÊNCIA. ARTIGOS 335 DO
CPC/1973 E 375 DO CPC/2015. REINGRESSO COM IDADE AVANÇADA. RECOLHIMENTOS
APENAS NOS MESES ANTERIORES AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DO
BENEFÍCIO. REALIZAÇÃO DE INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS CORRETIVAS EM 2004 E
2008. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE ATESTAM O INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA
ANTERIOR AO REINGRESSO NO RGPS. FILIAÇÃO OPORTUNISTA. INTELIGÊNCIA DOS
ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA LEI Nº 8.213/91.APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE
VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO.
GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - In casu, segundo a narrativa desenvolvida na petição inicial, a parte autora trabalhava como
doméstica e foi acometida de patologia cardíaca que a impediu de trabalhar a partir de 2012.
9 - No laudo médico elaborado em 14 de janeiro de 2016, o perito judicial constatou ser a
demandante portadora de "cardiopatia grave", que a incapacita para o trabalho, de forma total e
permanente, desde 26 de agosto de 2013. Cumpre registrar que, na data da perícia, a autora
contava com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
10 - O Cadastro Nacional de Informações Sociais, por sua vez, demonstra que ela efetuou
recolhimentos previdenciários, como segurada empregada, de 01/04/1981 a 30/06/1981 e de
15/09/1982 a 30/12/1982, e como contribuinte individual, de 01/03/1985 a 31/05/1985 e de
01/07/1986 a 30/09/1986. Após mais de vinte cinco anos sem recolhimentos previdenciários e já
com 51 (cinquenta e um) anos de idade, a demandante reingressou na Previdência Social,
agora como segurada facultativa, efetuando contribuições de 01/10/2011 a 31/12/2011, de
01/02/2012 a 31/01/2013 e de 01/03/2013 a 30/09/2013 (ID 102066922 - p. 61-62).
11 - Não se afigura crível, no entanto, que o mal mencionado no laudo pericial, tenha tornado a
autora incapaz para o trabalho pouco após o seu reingresso, como segurada facultativa, no
RGPS.
12 - Neste sentido, segundo as informações colhidas junto à demandante para a elaboração do
histórico clínico, ela "realizou duas cirurgias cardíacas devido a troca de válvula mitral data
12/10/2004 Comissurotomia Mitral 16/05/2008 troca de válvula em posição Mitral Biológica
BRAILE Nº 31" (ID 102066922 - p. 125).
13 - No mais, examinando a relação dos documentos médicos analisados pelo vistor oficial (ID
102066922 - p. 126), constata-se a importante ausência do Ecodopplercardiograma com
mapeamento de fluxo em cores, realizado em 16/09/2010, no qual já se notava "aumento da
cavidade do átrio esquerdo de grau importante" (ID 102066922 - p. 21/22).
14 - Conforme bem salientou o assistente técnico do INSS em seu parecer, "a autora NÃO
APRESENTA PIORA EVOLUTIVA, pois o laudo de ECODOPPLER datado de 26/08/2013, fls.
22 a 24, também indica ritmo cardíaco e funções de bombeamento cardíacos DENTRO da
NORMALIDADE, inclusive com FRAÇÃO de EJEÇÃO (FE) de 57,9% (normal de 53 a 77%)
assim como PRÓTESE BIOLÓGICA em posição VALVAR MITRAL com ASPECTO e
FUNCIONAMENTO NORMAIS e AUSÊNCIA de SINAIS de HIPERTENSÃO PULMONAR. No
entanto, da mesma forma que o exame data de 16/09/2010, o ecocardiograma de 26/08/2013
mantém o registro de AUMENTO da CAVIDADE do ÁTRIO ESQUERDO de GRAU
IMPORTANTE, alteração que continua sendo a responsável pela presença de ARRITMIA, com
necessidade de uso de antiarritmico, AMIODARONA, e pelos sintomas de cansaço e falta de ar
aos esforços" (ID 102066922 - p. 137-138).
15 - Realmente, além de ter feito duas cirurgias cardíacas, entre 2004 e 2008, a autora postulou
junto ao INSS, em 02/04/2008, a concessão do benefício de amparo social ao deficiente (ID
102066922 - p, 64), o que é mais um indício de que ela já se encontrava com problemas graves
de saúde desde então. O referido beneplácito só foi indeferido por descumprimento do requisito
previsto no artigo 20, §3º, da Lei n. 8.213/91.
16 - Não se trata de desconsideração das conclusões do perito judicial. O que aqui se está a
fazer é interpretar-se aquilo deixado em aberto, eis que o experto se baseou, para emitir sua
conclusão técnica, não em conhecimentos científicos, mas sim, com exclusividade, na
entrevista pessoal e nos exames apresentados pela própria parte autora, que, por sua vez,
indicavam somente aquilo que lhe interessava.
17 - Frise-se que, para concluir como leigo, não necessita o juízo de opinião técnica, eis que o
julgador pode muito bem extrair as suas convicções das máximas de experiências
subministradas pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015).
18 - Destarte, parece pouco crível que a patologia mencionada, de natureza degenerativa,
tenha tornado a autora incapaz pouco após o período em que ela havia recuperado a qualidade
de segurada facultativa.
19 - Note-se que a autora somente veio a promover recolhimentos junto à Previdência Social,
para fins de reingresso no sistema, após vinte e cinco anos sem contribuir, na qualidade de
segurada facultativa, quando já possuía 51 (cinquenta e um) anos de idade o que, somado aos
demais fatos relatados, reforça a conclusão de que os males são preexistentes a sua refiliação,
o que revela seu notório caráter oportunista.
20 - A incapacidade da parte autora é preexistente ao tempo em que reingressou no sistema de
seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a Seguridade Social brasileira
está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de modo que a seguro social
depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos por toda sociedade e
também para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que as contribuições
necessárias ao custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser recolhidas mesmo
quando o trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
21 - Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou
facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, e se esses
trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças
incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei 8.213/1991 e da
própria lógica constitucional da Previdência.
22 - Destarte, verificada a preexistência da incapacidade laboral, de rigor o indeferimento do
pedido, razão pela qual merece reforma a sentença de 1º grau de jurisdição.
23 - Invertido os ônus sucumbenciais, deve ser condenada a autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
das custas e honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor
atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada
a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015.
24 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
25 - Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de
valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência.
Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O
DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E O DES. FEDERAL DAVID DANTAS, VENCIDOS A
DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA E O JUIZ CONVOCADO FERNANDO MENDES QUE
NEGAVAM PROVIMENTO AO APELO E DETERMINAVAM, DE OFÍCIO, A ALTERAÇÃO DE
JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA
LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
