
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5051193-51.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CARLOS MACIEL
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
APELADO: JOSE CARLOS MACIEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5051193-51.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CARLOS MACIEL
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
APELADO: JOSE CARLOS MACIEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos trabalhados em atividades especiais.
A sentença, prolatada em 12.01.2021, julgou parcialmente procedente o pedido, conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação promovida por JOSÉ CARLOS MACIEL em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS para reconhecer o período de 02/07/1984 a 01/11/1986, 02/05/1987 a 14/06/1988, 11/08/1988 a 09/09/1989, 07/06/1999 a 01/09/1999, 16/10/2000 a 17/01/2003 e 22/11/2016 a 28/03/2017 como de labor especial e determinar a averbação pelo instituto requerido; e assim o faço com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil. Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 800,00, nos termos do art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil. Na hipótese de interposição de apelo, por não haver mais o juízo de prelibação nesta Instância (Art. 1.010 do Código de Processo Civil), sem necessidade de nova conclusão, intime-se a parte recorrida para oferecer contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. Em havendo recurso adesivo, também deverá ser intimado o adverso para resposta em 15 (quinze) dias. Após tais providências, remetam-se os autos ao Egrégio Juízo ad quem com as nossas homenagens. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, observadas as formalidades das NSCGJ. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.I.C.”
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, requerendo, preliminarmente, o recebimento de seu recurso no efeito suspensivo. No mérito, alega que o autor não comprovou o exercício de atividade especial, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido. Subsidiariamente, requer a fixação dos efeitos financeiros a partir da sentença, o afastamento da especialidade do período em que foi concedido o auxílio-doença e o afastamento da verba de sucumbência.
Apela a parte autora requerendo o reconhecimento de períodos de trabalho especial não apreciados na sentença, bem como a concessão da aposentadoria especial. Subsidiariamente, pugna pela anulação da sentença e retorno dos autos ao juízo de origem para análise dos períodos faltantes.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5051193-51.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CARLOS MACIEL
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
APELADO: JOSE CARLOS MACIEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANDRE TOSHIO ISHIKAWA - SP370511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Inicialmente, verifico que a sentença proferida (ID 257486016) decidiu pretensão aquém daquela pleiteada nos presentes autos.
Da leitura da petição inicial depreende-se que a parte autora formulou pedido de cunho declaratório, visando o reconhecimento de períodos laborados em atividades especiais, bem como de conteúdo condenatório, qual seja, a concessão da aposentadoria especial e consectários legais.
Ocorre que, detidamente analisando os autos, verifico que, de fato, o Magistrado a quo deixou de apreciar a especialidade do trabalho de grande parte dos períodos requeridos pelo autor em sua peça inicial.
Desta feita, restando claro o julgamento citra petita, de rigor o reconhecimento da nulidade da sentença.
É firme a jurisprudência desta Corte Regional no sentido de que, estando o feito em condições de julgamento, e prestigiando-se os princípios da celeridade e economia processual, o feito poderia ser apreciado nesta instância, na forma do artigo 1.013, §3º, III do CPC/2015.
Todavia, embora tenham as partes se manifestado sobre a lide, bem como sobre as provas produzidas até o momento, observo que o feito não se encontra suficientemente instruído para o seu imediato deslinde.
A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
Especificamente sobre o agente nocivo ruído, assinalo que considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85dB.
A fim de comprovar a especialidade do labor exercido a parte autora carreou aos autos e Perfis Profissiográficos Previdenciários – PPP (ID 257485930 - Pág. 11/32) que apontam exposição ao agente nocivo ruído, todavia, não indica a unidade de medida e o método de aferição. Também há referência à agentes biológicos, sem indicação de agente patogênico.
Assim verifica-se a imprescindibilidade do Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho – LTCAT, documento que embasa o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP.
Ressalto que o laudo pericial produzido em juízo não possui o condão de complementar o PPP, posto que sequer aponta a incidência do agente nocivo ruído. E mais, diverge do PPP quanto às atribuições do autor e deixa de apresentar medidas referentes aos agentes pelo perito reconhecidos.
Do conjunto probatório apresentado, não se pode aferir, de forma inequívoca o eventual direito do autor, pelo que se conclui que o feito não se encontra suficientemente instruído para o seu julgamento e a devida prestação jurisdicional.
Desta feita, a fim de se evitar o cerceamento de defesa e a supressão de instância, o processo deve retornar ao Juízo de origem para que seja realizada a sua devida instrução e prolação de nova sentença.
Nesse sentido, confira-se a jurisprudência deste Tribunal:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULAÇÃO DE OFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE ATIVIDADE EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA DEFICIENTE. REABERTURA. NECESSIDADE.
- Ao julgar procedente a demanda, com o reconhecimento do tempo rural sem registro e a concessão de aposentadoria por idade híbrida, a r. sentença não se pronunciou sobre os demais pedidos formulados na inicial, notadamente quanto ao reconhecimento da especialidade do trabalho no período de 14/05/2003 a 13/11/2019 e à possibilidade de concessão do benefício conforme as regras de transição veiculadas pelo artigo 16 da EC n. 103/2019, incorrendo em julgamento citra petita, passível de anulação, de ofício, por ausência de prestação jurisdicional.
- Embora a Autarquia Previdenciária tenha se manifestado sobre o mérito da lide, inclusive em sede de apelação, observo que o feito não se encontra maduro o suficiente para seu deslinde imediato.
- A parte autora, além do tempo rural outrora reconhecido, a declaração da especialidade do trabalho no período de 14/05/2003 a 13/11/2019 em razão da exposição ao agente físico ruído em nível superior ao limite previsto em lei.
- O reconhecimento do exercício de trabalho sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, por sua vez, depende dos níveis de pressão sonora durante o desempenho da atividade laboral, dos meios de prova, da habitualidade e permanência do labor e da metodologia, cuja aferição deve observar as normas de regência vigentes ao tempo da prestação do serviço, conforme os precedentes obrigatórios do C. STJ, especialmente cristalizados nos Temas 534, 694 e 1083/STJ.
- Para o agente físico ruído, sempre foi e continua sendo imprescindível a comprovação de sua efetiva exposição mediante apresentação de laudo técnico indicativo da insalubridade, exceto na hipótese de apresentação do PPP, por força da orientação firmada pelo C. STJ no Incidente de Uniformização de Jurisprudência,Petição 10.262, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, DJe 16/02/2017.
- Em relação à especialidade do trabalho no período de 14/05/2003 a 13/11/2019, a parte autora não apresentou cópia do PPP ou do LTCAT correspondente, não colacionou aos autos cópia integral do processo administrativo relativo ao benefício pleiteado em 26/10/2021 e também não foi autorizada qualquer perícia técnica visando a sua comprovação, não existindo documentos que pudessem comprovar a efetiva exposição ao agente agressor.
- A mera reprodução de trechos do PPP na exordial não se mostra suficiente para avaliação do labor especial vindicado, sendo imprescindível a integralidade do documento para se perquirir com convicção acerca das condições laborativas, inclusive para avaliar se as informações foram lançadas de acordo com os registros ambientais previstos em laudo elaborado por responsável técnico devidamente habilitado.
- A ausência de provas relativas à especialidade do trabalho no período em questão demonstra de forma inequívoca que o presente feito não se encontra devidamente instruído para julgamento, impondo-se, no caso, o retorno dos autos ao Juízo de origem, com vistas à reabertura da instrução processual e à correta prestação jurisdicional.
- O cerne do problema a ser enfrentado decorre da necessidade de deliberar sobre a aplicação de dois princípios constitucionais fundamentais de igual importância e relevância para a solução do presente recurso e que, no presente caso, estão em oposição: o devido processo legal, instruído pelo contraditório e a ampla defesa, (artigo 5º, LIV e LV, da CR), e a celeridade processual (artigo 5º, LXXVIII, da CR).
- Sob o pálio do devido processo legal, é preciso ressaltar que a prova se destina ao processo, e não somente ao juiz de primeira instância, razão pela qual também é objeto de apreciação pelo segundo grau de jurisdição, viabilizando o julgamento dos recursos interpostos, razão por que não há que se cogitar de preclusão.
- A interpretação sistemática e teleológica do artigo 370 do CPC conduz, basicamente, à necessidade de identificação dos elementos probatórios que, a uma, não se prestam a elucidar a verdade dos fatos relacionados ao mérito da lide, e, a duas, tenham por fito causar delongas no andamento processual.
- No que toca especificamente à prova pericial, a sua produção poderá ser indeferida ou dispensada quando “for desnecessária em vista de outras provas produzidas”, na forma dos artigos 464, II, e 470 do CPC.
- Nas lides que têm por escopo perscrutar o alegado exercício de labor especial sob o efeito de agentes nocivos, objetivando o reconhecimento ou não da especialidade da atividade no âmbito previdenciário, a realização de prova pericial é essencial para que, juntamente com a prova documental trazida aos autos, seja viabilizada a fundamentação da decisão acerca da natureza comum ou especial do labor exercido, sob pena de se caracterizar cerceamento de defesa, em prejuízo às partes, por debilidade do conjunto probatório. Precedentes.
- Assim, a invocação dos princípios da celeridade e economia processuais, mediante o julgamento antecipado ou do indeferimento de determinada produção de prova técnica, pode conduzir nesses casos ao cerceamento de defesa, em prejuízo às partes, na medida em que o indeferimento do ingresso de provas nos autos conduz à debilidade do conjunto probatório.
- Com efeito, para a solução do conflito entre os princípios constitucionais, as máximas da razoabilidade e da proporcionalidade estão a ensejar a preponderância, no caso concreto, do devido processo legal sobre os princípios da celeridade e economia processuais, em face da necessidade de se preservar o valor da justiça da prestação jurisdicional.
- Ainda, considerando-se a tese fixada pelo C. STJ no Tema 1083/STJ, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, é mister realizar o distinguishing ampliativo com o fito de aplicar à presente lide a ratio decidendi do Tema 1083/STJ, acrescida da compreensão emanada dos Embargos de Declaração, no sentido de que a demonstração do labor submetido a quaisquer agentes agressivos à saúde, e não somente ao ruído, deve ser realizada na seara previdenciária.
- No caso, observa-se que, em relação à especialidade do trabalho no período de 14/05/2003 a 13/11/2019, a parte autora não apresentou cópia do PPP ou do LTCAT correspondente, não colacionou aos autos cópia integral do processo administrativo relativo ao benefício pleiteado em 26/10/2021 e também não foi ordenada qualquer perícia técnica visando a sua comprovação.
- A ausência de provas relativas à especialidade do trabalho no período em questão demonstra de forma inequívoca que o presente feito não se encontra devidamente instruído para julgamento, impondo-se, no caso, o retorno dos autos ao Juízo de origem, com vistas à reabertura da instrução processual e à correta prestação jurisdicional.
- Sentença anulada de ofício e apelação do INSS prejudicada.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000856-24.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 13/03/2024, DJEN DATA: 18/03/2024)”
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação da parte autora para, com fulcro no caput do art. 492 do CPC, declarar nula a sentença citra petita e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular seguimento do feito e, consequentemente, julgo PREJUDICADA a apelação do INSS, nos termos da fundamentação supra.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CÍVEL. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA DEFICIENTE. ART. 1.013, §3º, III, CPC. INAPLICABILIDADE.
1. Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos trabalhados em atividades especiais.
2. Sentença que julgou aquém do pedido inicial. Citra petita. Nulidade na forma do caput do artigo 492 do CPC/2015.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
4. Conjunto probatório deficitário. Impossibilidade do julgamento do feito no estando em que se encontra. PPP incompleto. Ausência de LTCAT. Laudo pericial não se coaduna com os documentos apresentados.
5. Devolução dos autos para o juízo de origem para que seja realizada a devida instrução e prolação de nova sentença, evitando-se o cerceamento de defesa, bem como a supressão de instância.
6. Apelação da parte autora parcialmente provida. Sentença anulada. Apelação do INSS prejudicada.
