
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002011-23.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: SERGIO MASTELLINI - SP135087-N
APELADO: MARLENE FERNANDES PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: EDILSON CARLOS DE ALMEIDA - SP93169-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002011-23.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: SERGIO MASTELLINI - SP135087-N
APELADO: MARLENE FERNANDES PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: EDILSON CARLOS DE ALMEIDA - SP93169-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação ajuizada por MARLENE FERNANDES PEREIRA, objetivando o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 68/71-verso julgou procedente o pedido inicial, para reconhecer o labor rural no período de 04/02/1974 a 18/04/1992, condenando o INSS no pagamento 10% do valor da causa a título de honorários advocatícios.
Em razões recursais de fls. 74/78-verso, alega o INSS, preliminarmente, a ocorrência de sentença extra petita e a incompetência absoluta do juízo. Quanto ao mérito, pugna pela reforma da sentença, uma vez que a parte autora não apresentou início de prova material, não sendo possível o reconhecimento do labor rural para fins de carência, com a consequente necessidade de recolhimento das contribuições para que seja averbado período de atividade campesina. Sustenta, ainda, que não é possível o reconhecimento de labor rural ao menor de 14 anos. Por fim, prequestiona a matéria.
Contrarrazões da parte autora (fls. 84/87).
Devidamente processado o recurso foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002011-23.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: SERGIO MASTELLINI - SP135087-N
APELADO: MARLENE FERNANDES PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: EDILSON CARLOS DE ALMEIDA - SP93169-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Da remessa necessária, tida por interposta
Inicialmente, verifico que a sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 18/05/2015, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
§1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.
§3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente."
No caso, o INSS foi condenado a reconhecer período de labor rural.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo retro mencionado e da Súmula nº 490 do STJ.
Da preliminar de sentença extra petita
Na realidade, há erro material lançado no dispositivo da sentença, que reconheceu como labor rural o período de 04/02/1974 a 18/04/1992. De fato, de acordo com a fundamentação (fl. 71), fora reconhecido o labor campesino no período de
04/02/1974 a 18/04/1982
. Corrige-se, portanto, o dispositivo da sentença.Da preliminar de incompetência absoluta
Sem razão o INSS ao alegar incompetência absoluta em razão de eventual disparidade entre o domicílio informado pela autora e o indicado pela autarquia.
De fato, trata-se de questão de competência
territorial
e, portanto,relativa
, conforme o art. 63 do CPC (art. 111 do CPC/73).Ademais, a incompetência do juízo não fora alegada no momento oportuno, ou seja, em preliminar de contestação, nos termos do art. 64 do CPC (ou por exceção – art. 112 do CPC/73), prorrogando-se, portanto, a competência territorial, conforme o art. 65 do CPC (art. 114 do CPC/73).
Passo ao exame do mérito.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS.
1. (...).
3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2) Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória.
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor exercido antes da Lei 8.213/1991
.(...)"(EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira Seção.
Ação rescisória procedente"
(AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015 - grifos nossos).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de carência.(...)
"(AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).
Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99,
in verbis
:"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de 1991;"
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
"ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATORIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS. MENOR DE DOZE ANOS QUE PRESTAVA SERVIÇOS A UM EMPREGADOR, SOB A DEPENDÊNCIA DESTE, E MEDIANTE SALARIO. TENDO SOFRIDO O ACIDENTE DE TRABALHO FAZ JUS AO SEGURO PRÓPRIO. NÃO OBSTA AO BENEFÍCIO A REGRA DO ART. 165-X DA CARTA DA REPUBLICA, QUE FOI INSCRITA NA LISTA DAS GARANTIAS DOS TRABALHADORES EM PROVEITO DESTES, NÃO EM SEU DETRIMENTO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS CONHECIDOS E PROVIDOS."
(RE nº 104.654/SP, Relator Ministro Francisco Rezek, 2ª Turma, DJ 25/04/1986) (grifos nossos).
"Agravo de instrumento.
2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes.
3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte.
4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86.
5. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(AI nº 529.694/RS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJ de 11/03/2005) (grifos nossos).
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.
(...)
- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 - doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte autora."
(AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, Rel. Des. Federal Fausto de Sanctis, DJe 16/03/2017).
"PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. POSSIBILIDADE. DISPENSA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES.
(...)
4. É possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado já aos 12 (doze) anos de idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores.
5. De acordo com os documentos anexados aos autos, corroborados pela prova testemunhal, a autora comprovou o exercício de atividade rural no período de 07/1975 a 07/1988, devendo ser procedida a contagem do referido tempo de serviço, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/91.
6. Apelação provida."
(AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017).
Do caso concreto.
As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo da autora nos períodos de
04/02/1974 (quando completou 12 anos) a 18/04/1982 (data anterior ao primeiro registro em CTPS)
:a) Declaração de matrícula em escolas rurais nos anos de 1969 a 1972 (fl. 11);
b) Requerimento de matrícula no ano de 1977, no qual consta a profissão do pai como lavrador (fl. 12);
c) Certidão de Casamento da autora, em 1981, na qual consta a profissão do marido como lavrador (fl. 13) e
d) Notas Fiscais de Produtor Rural, em nome do pai da autora, dos anos de 1993, 1995, 1996, 1997 e 1998 (fls. 14/18).
Como se vê dos elementos de prova carreados aos autos, a parte autora traz documentos em que apenas seu pai e seu marido são qualificados como lavradores. Nesse particular, entendo que a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, o que é o caso dos autos.
Com exceção dos documentos descritos nos itens “a” e “d”, verifica-se que a autora apresentou início de prova material, corroborado pela prova testemunhal (mídia – ID 138836606) colhida em audiência realizada em 22/09/2014 (fl. 58).
Olicio Jovino de Lima afirmou que conhece a autora desde criança e que ela começou a trabalhar por volta dos 7 anos. O pai tinha um sítio no bairro São João, no qual trabalhava a família no plantio de algodão, feijão e amendoim. Não tinham empregados. A autora teria trabalhado com os pais até o ano de 1980 ou 1982, pois se mudou para a cidade.
Por sua vez, Genivaldo Silva Santos afirmou que conhece a autora há 40 anos e que ela começou a trabalhar ainda criança. Estudou nas escolas rurais com os filhos do depoente. Trabalhou na lavoura de amendoim e de algodão, no sítio dos pais, localizado no bairro São João. Não tinham empregados. A autora teria trabalhado até mais ou menos o ano de 1980 ou 1985.
Sendo assim, é possível o reconhecimento do período de labor rural de
04/02/1974 a 18/04/1982
, exceto para fins de carência, nos termos do art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.Ante o exposto,
dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta,
para corrigir erro material no dispositivo da sentença, para considerar reconhecido o período rural de 04/02/1974 a 18/04/1982,e nego provimento à apelação do INSS,
mantida, na íntegra, a r. sentença de primeiro grau.Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. REMESSA NECESSÁRIA TIDA POR INTERPOSTA. ERRO MATERIAL NO DISPOSITIVO DA SENTENÇA. COMPETÊNCIA RELATIVA. ATIVIDADE RURAL. RECONHECIMENTO. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer período de labor rural. Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo retro mencionado e da Súmula nº 490 do STJ.
2 - Há erro material lançado no dispositivo da sentença, que reconheceu como labor rural o período de 04/02/1974 a 18/04/1992. De fato, de acordo com a fundamentação (fl. 71), fora reconhecido o labor campesino no período de
04/02/1974 a 18/04/1982
. Corrige-se, portanto, o dispositivo da sentença.3 - Sem razão o INSS ao alegar incompetência absoluta em razão de eventual disparidade entre o domicílio informado pela autora e o indicado pela autarquia.
4 - De fato, trata-se de questão de competência
territorial
e, portanto,relativa
, conforme o art. 63 do CPC (art. 111 do CPC/73). Ademais, a incompetência do juízo não fora alegada no momento oportuno, ou seja, em preliminar de contestação, nos termos do art. 64 do CPC (ou por exceção – art. 112 do CPC/73), prorrogando-se, portanto, a competência territorial, conforme o art. 65 do CPC (art. 114 do CPC/73).5 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
6 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
7 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
8 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
9 - A parte autora pretende o reconhecimento do labor rural, sem registro em CTPS, de
04/02/1974 (quando completou 12 anos) a 18/04/1982 (data anterior ao primeiro registro em CTPS)
.10 - Com exceção dos documentos descritos nos itens “a” e “d”, verifica-se que a autora apresentou início de prova material, corroborado pela prova testemunhal (mídia – ID 138836606) colhida em audiência realizada em 22/09/2014 (fl. 58).
11 - Possível o reconhecimento do período de labor rural de
04/02/1974 a 18/04/1982
, exceto para fins de carência, nos termos do art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.12 - Apelação do INSS desprovida. Remessa necessária, tida por interposta, parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
