
| D.E. Publicado em 20/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, afastar a preliminar e julgar procedente o pedido de rescisão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055 |
| Nº de Série do Certificado: | 6F9CE707DB6BDE6E6B274E78117D9B8F |
| Data e Hora: | 13/09/2016 14:53:28 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0017074-57.2014.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora). Demanda ajuizada em 10.7.2014 com base no inciso V do artigo 485 do Código de Processo Civil, objetivando desconstituir pronunciamento monocrático da lavra do Desembargador Federal Fausto de Sanctis (7ª Turma) que, ao dar parcial provimento ao apelo autárquico contra a sentença de procedência para reformá-la especificamente no tocante à isenção de custas processuais e fixação dos juros em atendimento ao previsto na Lei 11.960/2009, conservou a condenação à concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural sob o fundamento de que "A documentação do esposo da autora não pode lhe aproveitar, pois ele passou a exercer atividade urbana a partir de 1979 (CNIS - fl. 61), mas, tendo o início de prova material em nome da autora iniciado em 1956 e as testemunhas corroborado seu labor rural até pelo menos 1962, restou comprovado o período de carência exigido em lei para a concessão do benefício que, no caso, são 60 meses" (fl. 160).
Aduz-se a ocorrência de violação a literal disposição de lei, mais precisamente, ao artigo 143 da Lei 8.213/91, dada a "inexistência de atividade rural no período imediatamente anterior ao preenchimento da idade mínima necessária à aposentadoria" (fl. 03), sobretudo porque "a autora completou a idade mínima para a concessão do benefício em 1992, eis que nascida em 27/07/1937 e seria bastante razoável exigir-se o trabalho em período imediatamente anterior, até mesmo com descontinuidade de alguns anos" (fl. 04).
Sustenta-se que "o fato da lei autorizar que o trabalho em meio rural possa ter sido exercido de forma descontínua no tempo não significa, em hipótese alguma, que possa ter sido exercido a qualquer tempo, de nada servindo eventual comprovação de tempo de serviço rural, entre 1956 e 1962" (fl. 05).
Que "o legislador, obviamente, quando instituiu a aposentadoria rural, no artigo 143 da Lei 8.213/91, preocupou-se com aqueles que exerciam a atividade rural até a idade mínima e poderiam se encontrar em situação de extrema vulnerabilidade, ante a rigorosa natureza desta atividade e assim poderiam ter a devida proteção securitária. Mas quem não exerceu atividade rural até ao menos período próximo ao preenchimento da idade mínima não pode ser agraciado com tal benesse, nem aqueles que a abandonaram décadas antes, como foi o caso da autora" (fl. 05).
Assim, segundo alegado, "no caso concreto, não se mostra razoável a concessão de aposentadoria rural, pois comprovado que a atividade rural não foi mais exercida pela autora, desde o ano de 1962, quando tinha apenas 25 anos de idade e passou a exercer a atividade do lar" (fl. 06).
Requer-se "a) a antecipação da tutela, em caráter excepcional, para o fim de suspender o curso da execução, e suspensa a aposentadoria rural concedida à autora até final decisão da ação rescisória", bem como "b) seja a ação ora proposta julgada TOTALMENTE PROCEDENTE, com o fim de RESCINDIR o julgado anterior, prolatando-se nova decisão, com fiel observância dos dispositivos legais aqui apontados como violados, a fim de que seja julgado improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural, veiculado nos autos 472.01.2012.003909-2, da 2ª Vara de Porto Ferreira" (fl. 09).
Por força de decisão que restou irrecorrida, deferiu-se o pedido de tutela antecipada nos termos abaixo (fls. 208/209):
Contestação às fls. 217/229, arguindo-se, preliminarmente, a inadmissibilidade do feito em razão da "falta de prequestionamento do dispositivo tido como violado", ou, caso assim não se entenda, "espera ver julgada improcedente a presente ação rescisória".
Despacho à fl. 234, de seguinte teor:
Réplica à fl. 234, verso, 201/211, batendo-se pela rejeição da tese defensiva e insistindo no sucesso da pretensão.
Encaminhado julgamento conforme o estado do processo, in verbis (fl. 242):
A Procuradoria Regional da República opinou "pelo conhecimento e procedência da presente ação rescisória" (fls. 244/247).
É o relatório.
À revisão.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA:10035 |
| Nº de Série do Certificado: | 1AA09283FFF4EAA5 |
| Data e Hora: | 12/05/2015 13:37:34 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0017074-57.2014.4.03.0000/SP
VOTO
Por primeiro, esclareço que ratifiquei o relatório de fls. 249/251, da lavra da eminente Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, de quem sou sucessor.
Passo ao voto.
A alegação trazida em contestação, atinente à inadmissibilidade do feito em razão da ausência de prequestionamento, esbarra no entendimento consolidado na Súmula 514 do Supremo Tribunal Federal, "verbis":
"Admite-se a ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenham esgotados todos os recursos".
Superada a matéria preliminar, é cediço que a rescisória é ação que objetiva derrubar a coisa julgada já formada. Busca impugnar decisão atingida pela coisa julgada material. Passada em julgado e a salvo de qualquer recurso. Sua finalidade não é rescindir todo e qualquer julgado. As hipóteses são restritas e taxativas, por se estar diante da autoridade da coisa julgada, de decisão que produziu, a todas as luzes, eficácia completa, no dizer de Pontes de Miranda, "como se não fosse rescindível" (In: Comentários ao código de processo civil, t. VI. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 177). Medida excepcional e cabível apenas dentro das hipóteses restritas trazidas pela lei processual (Ada Pellegrini Grinover, Ação rescisória e divergência de interpretação em matéria constitucional, Revista de Processo 87/37), porquanto esgotados os recursos, chega-se à imutabilidade da decisão de mérito, sem que se possa declará-la justa ou injusta, daí se permitindo, tudo isso, no dizer de Sálvio de Figueiredo Teixeira, "um imperativo da própria sociedade para evitar o fenômeno da perpetuidade dos litígios, causa de intranqüilidade social que afastaria o fim primário do Direito, que é a paz social" (In: Ação rescisória, Apontamentos, RT 646/7).
Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por inteiro do texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de mérito sido proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
José Frederico Marques refere-se a "afronta a sentido unívoco e incontroverso do texto legal" (Manual de Direito Processual Civil, vol. III, Bookseller, 1ª edição, p. 304). Vicente Greco Filho, a seu turno, leciona que "a violação de lei para ensejar a rescisória deve ser frontal e induvidosa" (Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., Saraiva, 5ª edição, p. 385). Também Ada Pellegrini Grinover (obra citada), ao afirmar que a violação do direito em tese, para sustentar a demanda rescisória, há de ser clara e insofismável.
Ainda, a respeito, a anotação de THEOTONIO NEGRÃO (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Saraiva, 38ª edição, pp. 567-568), ilustrando a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto:
Constata-se também o fato de o dispositivo resguardar não apenas a literalidade da norma, mas seu sentido, sua finalidade, muitas vezes alcançados mediante métodos de interpretação (Sérgio Rizzi, Ação Rescisória, São Paulo, RT, 1979, p. 105-107).
José Carlos Barbosa Moreira, criticando a expressão "literal disposição de lei", pondera: "O ordenamento jurídico evidentemente não se exaure naquilo que a letra da lei revela à primeira vista. Nem é menos grave o erro do julgar na solução da quaestio iuris quando afronte norma que integra o ordenamento sem constar literalmente de texto algum" (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V, Rio de Janeiro, Forense, 11ª edição, 2003, p. 130).
Igualmente, Flávio Luiz Yarshell: "Tratando-se de error in iudicando ainda paira incerteza acerca da interpretação que se deve dar ao dispositivo legal. Quando este fala em violação a 'literal' disposição de lei, em primeiro lugar, há que se entender que está, aí, reafirmando o caráter excepcional da ação rescisória, que não se presta simplesmente a corrigir injustiça da decisão, tampouco se revelando simples abertura de uma nova instância recursal, ainda que de direito. Contudo, exigir-se que a rescisória caiba dentro de tais estreitos limites não significa dizer que a interpretação que se deva dar ao dispositivo violado seja literal, porque isso, para além dos limites desse excepcional remédio, significaria um empobrecimento do próprio sistema, entendido apenas pelo sentido literal de suas palavras. Daí por que é correto concluir que a lei, nessa hipótese, exige que tenham sido frontal e diretamente violados o sentido e o propósito da norma" (Ação Rescisória: juízos rescindente e rescisório, São Paulo, Malheiros, 2005, p. 323).
Conclui-se ser inadmissível a desconstituição do julgado com base em mera injustiça, em interpretações controvertidas, embora fundadas. A rescisória não se confunde com nova instância recursal. Exige-se mais, que o posicionamento adotado desborde do razoável, que agrida a literalidade ou o propósito da norma.
Pois bem, no caso dos autos, a r. decisão rescindenda foi assim fundamentada (fls. 156/161):
"[...] tendo o início de prova material em nome da autora iniciado em 1956 e as testemunhas corroborado seu labor rural até pelo menos 1962, restou comprovado o período de carência exigido em lei para a concessão do benefício que, no caso, são 60 meses" (fl. 160).
A segurada nasceu em 27.07.1937 (fl. 32), somente tendo atingido a idade mínima para aposentação por idade em 27.07.1992, quando completou 55 anos.
Ora, considerando que a r. decisão rescindenda reconheceu haver provas materiais e testemunhais de que a segurada trabalhou nas lides campesinas tão somente até o ano de 1962, pois, após, exerceu apenas atividades como "do lar" e em 1979 mudou-se para o meio urbano, onde seu esposo passou a trabalhar, resulta claro o descumprimento ao requisito da imediatidade, porquanto, como visto, entre o ano de 1962, quando a segurada deixou as lides campesinas, ou mesmo de 1979, quando mudou-se para a cidade, até o ano de 1992, quando ela completou a idade mínima para aposentar-se por idade, passaram-se, respectivamente, trinta anos, ou no mínimo treze anos, a desconstituir a imediatidade prevista no artigo 143 da Lei nº 8.213/91, "verbis":
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício" - grifei.
Assim, conclui-se que a r. decisão rescindenda vai de encontro à previsão legal contida no artigo 143 da Lei 8.213/91 (redação dada pela Lei 9.063/95), viabilizando-se o decreto de rescisão na esteira de precedentes da Corte Superior e desta própria 3ª Seção, que têm admitido a ocorrência de ofensa à legislação previdenciária em situações como a presente:
Confira-se, a propósito, o teor dos julgados proferidos no Superior Tribunal de Justiça a respeito da questão, primeiro o colhido na 3ª Seção em sede de incidente de uniformização e os demais nas Turmas responsáveis pela matéria previdenciária:
No mesmo sentido, ainda mais recentemente, decisão proferida pela 2ª Turma do STJ reiterando a orientação em questão, "[...] apontando-se como violados o art. 55, § 3º e art. 143, ambos da Lei 8.213/1991, figurando como questão central a tese no sentido de que a atividade rural deve ser comprovada no período imediatamente anterior ao requerimento":
Permanecem arraigadas as exigências do artigo 143 da Lei 8.213/91 à concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, na medida em que os benefícios de valor mínimo pagos aos rurícolas em geral possuem disciplina própria, em que a carência independe de contribuições mensais, daí que obrigatória, mesmo de forma descontínua, a prova do efetivo exercício da atividade no campo.
Embora comportando temperamentos, via de regra, o abandono do posto de lavradora anteriormente ao implemento do requisito etário ou formulação do requerimento administrativo ou judicial, mormente quando contemporâneo ao emprego em atividade urbana do cônjuge que empresta à esposa requerente a qualidade de segurado, ou mesmo o afastamento completo da vida laborativa após o casamento, consoante se apresenta a hipótese dos autos, segundo reconhecido pelo próprio julgado rescindendo, acaba obstando por completo o deferimento da benesse postulada.
É caso, pois, de desconstituir o julgado, cumprindo salientar - e já laborando em sede de iudicium rescissorium, pois, no presente caso, acabam por se confundir, quanto aos fundamentos, as etapas que perfazem o instituto da ação rescisória, imprescindível, para a constatação de erro de julgamento, no iudicium rescindens, aferir sobre a correta interpretação conferida à norma previdenciária disposta no artigo 143 da Lei 8.213/91 - que "entender o contrário desvirtuaria completamente o caráter da aposentadoria em tela, destinada ao amparo dos trabalhadores rurais que permaneceram nas lides agrícolas até o momento próximo ao do implemento da idade. Por isso, não é possível a concessão de aposentadoria rural por idade quando não comprovado o desempenho de atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, com base no artigo em foco, ou da formulação do requerimento na via administrativa"; conforme explicitado acima, "O Superior Tribunal de Justiça foi provocado para manifestar-se sobre a questão, em incidente de uniformização suscitado contra acórdão da Turma Nacional de Uniformização (art. 14, § 4º, da Lei nº 10.259/01). A alegação da parte autora era de que o entendimento do STJ inclinava-se no sentido de não ser necessário, para a aposentadoria por idade, que os requisitos fossem implementados simultaneamente. Entendeu a 3ª Seção do STJ que não é possível conjugar a norma do § 1º do art. 3º da Lei nº 10.666/03, que permitiu a dissociação da comprovação dos requisitos para os benefícios que pressupõem contribuição, com a regra em comento relativa ao trabalhador rural que permaneceu no campo" (Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 12ª edição. São Paulo: Atlas, 2014, p. 610-611).
Nesse sentido:
Outrossim, tendo havido, no caso da ação subjacente, descumprimento manifesto ao artigo 143 da Lei nº 8.213/91 - posto que não observada a imediatidade do exercício de atividade campesina quando do cumprimento da idade mínima -, concluo pela procedência do pedido rescindendo, devendo ser desconstituída a coisa julgada formada na ação subjacente, e, em sede de juízo rescisório, o caso é de improcedência do pedido formulado no feito originário, pelas razões supra expendidas.
Ante todo o exposto, rejeito a matéria preliminar e julgo procedente o pedido formulado na presente demanda, para, com fundamento no inciso V do artigo 485 do Código de Processo Civil, desconstituir o pronunciamento monocrático proferido no feito subjacente, e, em sede de juízo rescisório, reconhecer a improcedência da pretensão originária.
Sem condenação em verba honorária, por ser a parte ré beneficiária da assistência judiciária gratuita, consoante o entendimento consolidado no âmbito desta 3ª Seção.
É o voto.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055 |
| Nº de Série do Certificado: | 6F9CE707DB6BDE6E6B274E78117D9B8F |
| Data e Hora: | 08/07/2016 16:45:09 |
