Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5004597-38.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
02/04/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 07/04/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. MATÉRIA
PRELIMINAR. QUALIDADE DE SEGURADO. HIPÓTESE DE PRORROGAÇÃO DO PERÍODO
DE "GRAÇA". SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. INOBSERVÂNCIA DO § 2º DO ARTIGO 15 DA
LEI N. 8.213/91. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE COMPROVADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA. MANUTENÇÃO DA
QUALIDADE DE SEGURADO. VALOR DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - A possibilidade de se eleger mais de uma interpretação à norma regente, em que uma das
vias eleitas viabiliza o devido enquadramento dos fatos à hipótese legal descrita, desautoriza a
propositura da ação rescisória, a teor da Súmula n. 343 do STF.
III - A r. decisão rescindenda se respaldou no art. 15, II, da Lei n. 8.213/91, para concluir pela
perda da qualidade de segurado, todavia acaba olvidando o preceito inserto no § 2º do aludido
dispositivo legal, que prevê a possibilidade de prorrogação do período de "graça" por mais 12
(doze) meses, além daquele estabelecido no inciso II, no caso de o segurado comprovar que se
encontrava desempregado, desde que esta condição estivesse documentada pelo registro no
órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
IV - Malgrado a r. decisão rescindenda tenha abordado o tópico relativo à qualidade de segurado,
não realizou o debate acerca das hipóteses legais que permitiam a extensão do período de
“graça”, deixando, pois, de valorar o conjunto probatório para fins de sua comprovação ou não,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
notadamente aquela concernente à situação de desemprego, ainda mais considerando que a
autora sempre exerceu atividade remunerada como empregada.
V - À época da prolação do acórdão rescindendo (05/2018), o e. STJ já havia firmado
entendimento no sentido de que a situação de desemprego pode ser comprovada por outros
elementos probatórios, não se restringindo unicamente ao registro em órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
VI - Consoante se depreende da leitura do relatório da sentença proferida na ação subjacente, os
depoimentos testemunhais prestados no Juízo de Origem abordaram as circunstâncias
vivenciadas pela autora a partir do ano de 2013, com enfoque especial em seu estado de saúde e
nas atividades por ela desempenhadas, de modo a traçar um panorama de sua situação de
trabalho no período em que se questiona a sua qualidade de segurado. Importante destacar que
a prova oral se presta, igualmente, para fins de comprovação da condição de desemprego
VII - No caso dos autos, verifica-se a ocorrência da hipótese prevista no art. 966, V, do CPC, em
face da inobservância do preceituado no art. 15, §2º, da Lei n. 8.213/91, ensejando, assim, a
abertura da via rescisória.
VIII - O laudo médico-pericial, elaborado em 12.09.2016, revela que a autora é portadora de
neoplasia maligna de encéfalo, o que a torna incapacitada de forma total e permanente para o
trabalho. Assinala ainda o expert que a enfermidade se iniciou no ano de 2013 e a incapacidade
para o labor restou demonstrada a contar de março de 2016.
IX - Depreende-se do exame do extrato do CNIS que a ora demandante possuí vínculos
empregatícios interpolados no período compreendido entre 01.11.2009 e 31.03.2014, tendo
cumprido a carência de 12 meses de contribuições mensais, não se verificando nesse interregno,
outrossim, a perda da qualidade de segurado.
X - O lapso temporal transcorrido entre o término de seu último vínculo laboral (31.03.2014) e a
data de início da incapacidade firmada pelo perito judicial (03/2016) suplanta os 12 meses do
período de “graça” previsto no art. 15, II, a indicar, em tese, a perda da qualidade de segurado.
Todavia, conforme explanado anteriormente, há que se perquirir se incidem no caso vertente as
hipóteses legais de prorrogação do período de “graça” previstas no art. 15, §§1º e 2º, da Lei n.
8.213/91.
XI - Os depoimentos testemunhais transcritos na sentença proferida nos autos subjacentes são
categóricos no sentido de que a ora demandante, a partir do ano de 2013, buscava exercer
atividade remunerada (“ antes trabalhava em abatedouro”; “fazia bico fazendo salgado”), contudo,
em virtude de seu adoecimento (“desde este tempo teve convulsão”), não conseguia manter seu
trabalho. Importante destacar que o laudo pericial corrobora os depoimentos testemunhais
anteriormente reportados, pois consigna com data de início da doença o ano de 2013, além do
que relaciona as crises convulsivas que acometiam a autora ao seu quadro clínico da neoplasia
de encéfalo.
XII - Diante do quadro probatório acima exposto, é de se concluir que a autora, que sempre atuou
como segurada empregada, encontrava-se em situação de desemprego, conferindo-lhe, assim, o
direito à prorrogação do período de “graça” por mais 12 meses, a teor do art. 15, §2º, da Lei n.
8.213/91, de modo que, no momento do surgimento de sua incapacidade (03/2016), ainda
ostentava a qualidade de segurado, ante a observância do prazo de 24 meses contado do
término de seu último vínculo laboral (31.03.2014).
XIII - Tendo em vista a patologia apresentada pela ora demandante, revelando sua incapacidade
total e permanente para o labor, não há como se deixar de reconhecer a inviabilidade de seu
retorno ao trabalho, bem como a impossibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que
lhe garantisse a subsistência, razão pela qual deve ser concedido o benefício de aposentadoria
por invalidez, nos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
XIV - O valor do benefício em comento deve ser apurado segundo os critérios insertos no art. 44
da Lei n. 8.213/91.
XV - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do processamento do requerimento
administrativo (19.04.2016), nos termos firmados na petição inicial da ação subjacente.
XVI - A correção monetária e os juros de mora devem ser calculados nos termos da lei de
regência.
XVII - A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde às prestações vencidas até a
data do presente julgamento, fixando-se o percentual no importe de 15%, a teor do art. 85, §2º,
do CPC.
XVIII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Ação subjacente cujo
pedido se julga procedente.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5004597-38.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
AUTOR: MICHELE CRISTINA CANALLE
Advogados do(a) AUTOR: GUSTAVO CESAR PEREIRA BUDIN - SP415298, PRISCILA MARIZA
FORTUNATO - SP107133
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5004597-38.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
AUTOR: MICHELE CRISTINA CANALLE
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RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Cuida-se de ação rescisória,
sem pedido de concessão de tutela provisória de urgência, intentada com fulcro no art. 966, inciso
V, do CPC, por MICHELE CRISTINA CANALLE em face do INSTITUTO NACIONAL DE
SEGURO SOCIAL - INSS, visando desconstituir acórdão proferido pela 7ª Turma deste Tribunal,
que deu provimento à apelação interposta pelo INSS, para julgar improcedente o pedido da
autora, que objetivava a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez. A r. decisão
rescindenda transitou em julgado em 28.06.2018 e o presente feito foi distribuído em 27.02.2019.
Na petição inicial, alega a parte autora que havia ajuizado ação previdenciária em que buscava o
reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, tendo seu pedido sido
acolhido em Primeira Instância; que interposta apelação pelo INSS, este Tribunal deu-lhe
provimento, julgando improcedente o pedido, sob o fundamento de que, por ocasião do início da
incapacidade em 03/2016, a autora não mais ostentava a qualidade de segurada, tendo em vista
o término de seu último vínculo empregatício ocorrido em 04/2014; que a r. decisão rescindenda
não observou o comando inserto no art. 15, II, §2º, da Lei n. 8.213/91, que estabelece o
acréscimo de 12 (doze) meses ao período de “graça” para o segurado desempregado; que
considerando que a última contribuição se deu em abril de 2014 e dada a situação de
desemprego, seu período de “graça” foi prorrogado por mais 12 meses, até abril de 2016; que
uma vez fixada sua incapacidade em março de 2016, faz jus à concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez, uma vez que restou comprovada a sua incapacidade laboral. Requer
seja desconstituído o v. acórdão prolatado Apelação Cível/Remessa Necessária n.
2018.03.99.001727-0, para que, em novo julgamento, seja julgado procedente o pedido formulado
na ação subjacente, com a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, desde
19.04.2016.
Deferidos os benefícios da Justiça Gratuita (id. 63908567 – pág. 1).
Devidamente citado, ofertou o réu contestação, arguindo, em sede de preliminar, a carência de
ação, posto que a autora pretende, apenas, a rediscussão do quadro fático-probatório produzido
na lide originária, buscando, em realidade, a renovação da lide subjacente, procedimento
inadequado nas ações rescisórias. No mérito, sustenta que a perda da condição de segurado
consistiu em ponto controvertido dos autos, em que o Tribunal Regional fez juízo de valor
diferente do qual pretendia a autora; que o v. acórdão rescindendo analisou a questão da
qualidade de segurada da autora considerando tanto a sua CTPS quanto os lançamentos do
CNIS, tendo concluído que esta, quando foi acometida de doença incapacitante para o trabalho,
em 03/2016, não detinha mais qualidade de segurada, em virtude de seu último vínculo
empregatício ter sido em 03/2014; que a ausência de anotação laboral na CTPS, a falta de
assento no CNIS, não são, por si sós, suficientes para comprovar a situação de desemprego do
segurado; que a reapreciação do conjunto fático-probatório acerca da condição de segurada da
autora, no momento da incapacitação, não se mostra possível pela via rescisória, não havendo
que se falar em violação ao art. 15, II, §2º, da Lei n. 8.213/91. Requer, por fim, seja acolhida a
preliminar suscitada, com a extinção do processo, sem resolução do mérito, ou, se superada a
preliminar, seja julgado improcedente o pedido deduzido na presente rescisória.
Réplica (id. 89845051 – págs. 1/5).
Rejeitada a preliminar de carência de ação suscitada em contestação, foram as partes intimadas
para que apresentassem as provas que pretendiam produzir, tendo o INSS se manifestado pelo
desinteresse em produzir outras provas e a parte autora se quedado inerte.
Na sequência, a parte autora apresentou suas razões finais, trazendo aos autos documento id.
93131442 – pág. 1.
Manifestação do réu acerca do documento trazido pela parte autora (id. 107766948 – pág. 1).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5004597-38.2019.4.03.0000
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De início, repiso a fundamentação constante do despacho id. 89920208 – pág. 1, no sentido de
que a preliminar relativa à carência de ação arguida pelo réu confunde-se com o mérito e com
este será apreciada.
Não havendo dúvida quanto à tempestividade do ajuizamento da presente ação rescisória, passo
ao juízo rescindens.
I - DO JUÍZO RESCINDENS
Dispõe o art. 966, V, do CPC:
Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V – violar manifestamente norma jurídica;
Verifica-se, pois, que para que ocorra a rescisão respaldada no inciso destacado deve ser
demonstrada a violação à lei perpetrada pela r. decisão de mérito, consistente na inadequação
dos fatos deduzidos na inicial à figura jurídica construída pela decisão rescindenda, decorrente de
interpretação absolutamente errônea da norma regente.
De outra parte, a possibilidade de se eleger mais de uma interpretação à norma regente, em que
uma das vias eleitas viabiliza o devido enquadramento dos fatos à hipótese legal descrita,
desautoriza a propositura da ação rescisória. Tal situação se configura quando há interpretação
controvertida nos tribunais acerca da norma tida como violada. Nesse diapasão, o E. STF editou
a Súmula n. 343, in verbis:
Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se
tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.
No caso dos autos, a r. decisão rescindenda esposou o entendimento no sentido de que a ora
autora havia perdido a qualidade de segurado no momento em que foi comprovada a sua
incapacidade para o labor, conforme se verifica do seguinte excerto, que abaixou transcrevo:
".....o beneficiário de auxílio-doença mantém a condição de segurado, nos moldes estampados no
art. 15 da Lei nº 8.213/91; o desaparecimento da condição de segurado sucede, apenas, no dia
16 do segundo mês seguinte ao término dos prazos fixados no art. 15 da Lei nº 8.213/91 (os
chamados períodos de graça); eventual afastamento do labor, em decorrência de enfermidade,
não prejudica a outorga da benesse, quando preenchidos os requisitos, à época, exigidos;
durante o período de graça, a filiação e consequentes direitos, perante a Previdência Social,
ficam mantidos.
O laudo pericial realizado em 12/09/2016 (fls. 44/46), concluiu que a autora é portadora de
‘neoplasia maligna de encéfalo’, concluindo pela sua incapacidade laborativa total e permanente a
partir de 03/2016.
Cumpre averiguar, ainda, a existência da qualidade de segurada da autora quando do início da
incapacidade laborativa.
Isso porque a legislação previdenciária exige, para a concessão de benefício previdenciário, que
a parte autora tenha adquirido a qualidade de segurado (com o cumprimento da carência de doze
meses para obtenção do benefício – artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91), bem como que a
mantenha até o início da incapacidade, sob pena de incidir na hipótese prevista no artigo 102 da
Lei nº 8.213/91.
A autora acostou aos autos cópia da CTPS (fls. 19/22), com registro em 24/03/2014 a 11/04/2014,
corroborado pelo extrato do sistema CNIS/DATAPREV.
Destarte, uma vez fixada sua incapacidade na data do laudo em 03/2016, esta ocorreu quando a
parte autora já não ostentava sua condição de segurado, não fazendo jus ao benefício. Ainda
neste sentido, não demonstrou o autor impossibilidade de contribuição anterior em decorrência de
doença incapacitante, devendo-se concluir pela perda da qualidade de segurado..”.
A r. decisão rescindenda se respaldou no art. 15, II, da Lei n. 8.213/91, para concluir pela perda
da qualidade de segurado, todavia acaba olvidando o preceito inserto no § 2º do aludido
dispositivo legal, que prevê a possibilidade de prorrogação do período de "graça" por mais 12
(doze) meses, além daquele estabelecido no inciso II, no caso de o segurado comprovar que se
encontrava desempregado, desde que esta condição estivesse documentada pelo registro no
órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
De fato, malgrado a r. decisão rescindenda tenha abordado o tópico relativo à qualidade de
segurado, não realizou o debate acerca das hipóteses legais que permitiam a extensão do
período de “graça”, deixando, pois, de valorar o conjunto probatório para fins de sua comprovação
ou não, notadamente aquela concernente à situação de desemprego, ainda mais considerando
que a autora sempre exerceu atividade remunerada como empregada.
De outra parte, cumpre ressaltar que à época da prolação do acórdão rescindendo (05/2018), o e.
STJ já havia firmado entendimento no sentido de que a situação de desemprego pode ser
comprovada por outros elementos probatórios, não se restringindo unicamente ao registro em
órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Nessa linha, confira-se a jurisprudência:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, IX E §1º, CPC. ERRO DE FATO
CONFIGURADO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO MANTIDA.
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA PROCEDENTE.
I - O § 2º do art. 15 da Lei n. 8.213/91 enuncia que o prazo de doze meses previsto no inciso II do
dispositivo será acrescido de mais doze meses para o segurado desempregado, desde que
comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da
Previdência Social.
II - A Terceira Seção consolidou entendimento segundo o qual o registro mencionado no
dispositivo em comento ‘não pode ser tido como o único meio de prova da condição de
desempregado do segurado’, porquanto o preceito ‘deve ser interpretado de forma a proteger não
o registro da situação de desemprego, mas o segurado desempregado’ (Pet 7115/PR, Rel.
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, DJe de 06.04.2010)
(...)
(STJ; AR. N. 2006.00.61993-7; 3ª Seção; Rel. Ministro Nefi Cordeiro; j. 25.02.2015; DJE
05.03.2015)
Por outro lado, consoante se depreende da leitura do relatório da sentença proferida na ação
subjacente, os depoimentos testemunhais prestados no Juízo de Origem abordaram as
circunstâncias vivenciadas pela autora a partir do ano de 2013, com enfoque especial em seu
estado de saúde e nas atividades por ela desempenhadas, de modo a traçar um panorama de
sua situação de trabalho no período em que se questiona a sua qualidade de segurado.
Importante destacar que a prova oral se presta, igualmente, para fins de comprovação da
condição de desemprego, conforme se vê dos seguintes precedentes, que abaixo transcrevo:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO.
ART. 15 DA LEI 8.213/91. CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. SITUAÇÃO QUE PODE SER
DEMONSTRADA NÃO SÓ POR MEIO DO REGISTRO NO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO DO
TRABALHO, MAS TAMBÉM POR OUTRAS PROVAS EXISTENTES NOS AUTOS.
COMPROVAÇÃO. SÚMULA 7/STJ.
1. Consoante o entendimento da Terceira Seção do STJ, a ausência de registro no Ministério do
Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprida quando for comprovada a situação de
desemprego por outras provas constantes dos autos, inclusive pela testemunhal (AgRg n Pet
8.694/PR, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 26.9.2012, DJe 9.10.2012).
(STJ; REsp n. 1831630; 2ª Turma; Rel. Ministro Herman Benjamin; j. 01.10.2019; DJE
11.10.2019)
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO POR MORTE. DESEMPREGO DO DE
CUJUS. REGISTRO NO ÓRGÃO PRÓPRIO. EXTENSÃO DO PERÍODO DE GRAÇA.
MANUTENÇÃO D QUALIDADE DE SEGURADO. VIOLAÇÃO E JULGAMENTO EXTRA PETITA
NÃO CONFIGURADOS. RECONVENÇÃO. NULIDADE NÃO RECONHECIDA.
IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.
(...)
II - A alegação de que o desemprego, para fins de prorrogação do período de graça, não restou
comprovado nos autos, em razão da ausência de registro no órgão próprio do Ministério do
Trabalho e da Previdência Social, não merece subsistir, uma vez que tal comprovação não se dá
com exclusividade por meio de registro naquele órgão.
III - Situação de desemprego corroborada pelas testemunhas ouvidas pelo MM. Juiz a quo, em
audiência a que o INSS, embora intimado, não compareceu, tampouco produziu a autarquia, ora
autora, à época oportuna, prova em sentido contrário.
(...)
(TRF-3ª Região; AR. N. 0008083-92.2014.4.03.0000; 3ª Seção; Rel. Des. Fed. Gilberto Jordan; j.
14.09.2017; e-DJF-3 06.10.2017)
Em síntese, verifica-se a ocorrência da hipótese prevista no art. 966, V, do CPC, em face da
inobservância do preceituado no art. 15, §2º, da Lei n. 8.213/91, ensejando, assim, a abertura da
via rescisória.
II - DO JUÍZO RESCISSORIUM
A autora, nascida em 21.08.1982, pleiteia o benefício de aposentadoria por invalidez, o qual está
previsto no art. 42, da Lei 8.213/91 que dispõe:
A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será
devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-
lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
O laudo médico-pericial, elaborado em 12.09.2016, revela que a autora é portadora de neoplasia
maligna de encéfalo, o que a torna incapacitada de forma total e permanente para o trabalho.
Assinala ainda o expert que a enfermidade se iniciou no ano de 2013 e a incapacidade para o
labor restou demonstrada a contar de março de 2016.
De outra parte, depreende-se do exame do extrato do CNIS que a ora demandante possuí
vínculos empregatícios interpolados no período compreendido entre 01.11.2009 e 31.03.2014,
tendo cumprido a carência de 12 meses de contribuições mensais, não se verificando nesse
interregno, outrossim, a perda da qualidade de segurado.
Por outro lado, o lapso temporal transcorrido entre o término de seu último vínculo laboral
(31.03.2014) e a data de início da incapacidade firmada pelo perito judicial (03/2016) suplanta os
12 meses do período de “graça” previsto no art. 15, II, a indicar, em tese, a perda da qualidade de
segurado.
Todavia, conforme explanado anteriormente, há que se perquirir se incidem no caso vertente as
hipóteses legais de prorrogação do período de “graça” previstas no art. 15, §§1º e 2º, da Lei n.
8.213/91.
Nesse passo, os depoimentos testemunhais transcritos na sentença proferida nos autos
subjacentes são categóricos no sentido de que a ora demandante, a partir do ano de 2013,
buscava exercer atividade remunerada (“ antes trabalhava em abatedouro”; “fazia bico fazendo
salgado”), contudo, em virtude de seu adoecimento (“desde este tempo teve convulsão”), não
conseguia manter seu trabalho.
Importante destacar que o laudo pericial corrobora os depoimentos testemunhais anteriormente
reportados, pois consigna como data de início da doença o ano de 2013, além do que relaciona
as crises convulsivas que acometiam a autora ao seu quadro clínico da neoplasia de encéfalo.
Diante do quadro probatório acima exposto, é de se concluir que a autora, que sempre atuou
como segurada empregada, encontrava-se em situação de desemprego, conferindo-lhe, assim, o
direito à prorrogação do período de “graça” por mais 12 meses, a teor do art. 15, §2º, da Lei n.
8.213/91, de modo que, no momento do surgimento de sua incapacidade (03/2016), ainda
ostentava a qualidade de segurado, ante a observância do prazo de 24 meses contado do
término de seu último vínculo laboral (31.03.2014).
Dessa forma, tendo em vista a patologia apresentada pela ora demandante, revelando sua
incapacidade total e permanente para o labor, não há como se deixar de reconhecer a
inviabilidade de seu retorno ao trabalho, bem como a impossibilidade de reabilitação para o
exercício de atividade que lhe garantisse a subsistência, razão pela qual deve ser concedido o
benefício de aposentadoria por invalidez, nos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
O valor do benefício em comento deve ser apurado segundo os critérios insertos no art. 44 da Lei
n. 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do processamento do requerimento
administrativo (19.04.2016), nos termos firmados na petição inicial da ação subjacente.
A correção monetária e os juros de mora devem ser calculados nos termos da lei de regência.
A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde às prestações vencidas até a data do
presente julgamento, fixando-se o percentual no importe de 15%, a teor do art. 85, §2º, do CPC.
III - DO DISPOSITIVO DA RESCISÓRIA
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar suscitada em contestação e, no mérito,julgo
procedente o pedido deduzido na presente ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão
proferido nos autos da AC. n. 2018.03.99.001727-0, com base no art. 966, inciso V, do Código de
Processo Civil, e, no juízo rescissorium, julgo procedente o pedido formulado pela parte autora na
ação subjacente, para condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por
invalidez, no valor a ser apurado segundo o regramento traçado pelo art. 44 da Lei n. 8.213/91, a
contar da data de 19.04.2016. As verbas acessórias serão calculadas na forma retro explicitada.
Honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor das prestações vencidas até a data do
presente julgamento.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e.mail ao INSS, instruído com os devidos
documentos da parte autora MICHELE CRISTINA CANALLE, a fim de serem adotadas as
providências cabíveis para que seja o benefício de APOSENTADORIA POR INVALIDEZ
implantado de imediato, com data de início - DIB em 19.04.2016, e renda mensal inicial no valor a
ser apurado pelo INSS, tendo em vista o caput do artigo 497 do CPC.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. MATÉRIA
PRELIMINAR. QUALIDADE DE SEGURADO. HIPÓTESE DE PRORROGAÇÃO DO PERÍODO
DE "GRAÇA". SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. INOBSERVÂNCIA DO § 2º DO ARTIGO 15 DA
LEI N. 8.213/91. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE COMPROVADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA. MANUTENÇÃO DA
QUALIDADE DE SEGURADO. VALOR DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - A possibilidade de se eleger mais de uma interpretação à norma regente, em que uma das
vias eleitas viabiliza o devido enquadramento dos fatos à hipótese legal descrita, desautoriza a
propositura da ação rescisória, a teor da Súmula n. 343 do STF.
III - A r. decisão rescindenda se respaldou no art. 15, II, da Lei n. 8.213/91, para concluir pela
perda da qualidade de segurado, todavia acaba olvidando o preceito inserto no § 2º do aludido
dispositivo legal, que prevê a possibilidade de prorrogação do período de "graça" por mais 12
(doze) meses, além daquele estabelecido no inciso II, no caso de o segurado comprovar que se
encontrava desempregado, desde que esta condição estivesse documentada pelo registro no
órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
IV - Malgrado a r. decisão rescindenda tenha abordado o tópico relativo à qualidade de segurado,
não realizou o debate acerca das hipóteses legais que permitiam a extensão do período de
“graça”, deixando, pois, de valorar o conjunto probatório para fins de sua comprovação ou não,
notadamente aquela concernente à situação de desemprego, ainda mais considerando que a
autora sempre exerceu atividade remunerada como empregada.
V - À época da prolação do acórdão rescindendo (05/2018), o e. STJ já havia firmado
entendimento no sentido de que a situação de desemprego pode ser comprovada por outros
elementos probatórios, não se restringindo unicamente ao registro em órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
VI - Consoante se depreende da leitura do relatório da sentença proferida na ação subjacente, os
depoimentos testemunhais prestados no Juízo de Origem abordaram as circunstâncias
vivenciadas pela autora a partir do ano de 2013, com enfoque especial em seu estado de saúde e
nas atividades por ela desempenhadas, de modo a traçar um panorama de sua situação de
trabalho no período em que se questiona a sua qualidade de segurado. Importante destacar que
a prova oral se presta, igualmente, para fins de comprovação da condição de desemprego
VII - No caso dos autos, verifica-se a ocorrência da hipótese prevista no art. 966, V, do CPC, em
face da inobservância do preceituado no art. 15, §2º, da Lei n. 8.213/91, ensejando, assim, a
abertura da via rescisória.
VIII - O laudo médico-pericial, elaborado em 12.09.2016, revela que a autora é portadora de
neoplasia maligna de encéfalo, o que a torna incapacitada de forma total e permanente para o
trabalho. Assinala ainda o expert que a enfermidade se iniciou no ano de 2013 e a incapacidade
para o labor restou demonstrada a contar de março de 2016.
IX - Depreende-se do exame do extrato do CNIS que a ora demandante possuí vínculos
empregatícios interpolados no período compreendido entre 01.11.2009 e 31.03.2014, tendo
cumprido a carência de 12 meses de contribuições mensais, não se verificando nesse interregno,
outrossim, a perda da qualidade de segurado.
X - O lapso temporal transcorrido entre o término de seu último vínculo laboral (31.03.2014) e a
data de início da incapacidade firmada pelo perito judicial (03/2016) suplanta os 12 meses do
período de “graça” previsto no art. 15, II, a indicar, em tese, a perda da qualidade de segurado.
Todavia, conforme explanado anteriormente, há que se perquirir se incidem no caso vertente as
hipóteses legais de prorrogação do período de “graça” previstas no art. 15, §§1º e 2º, da Lei n.
8.213/91.
XI - Os depoimentos testemunhais transcritos na sentença proferida nos autos subjacentes são
categóricos no sentido de que a ora demandante, a partir do ano de 2013, buscava exercer
atividade remunerada (“ antes trabalhava em abatedouro”; “fazia bico fazendo salgado”), contudo,
em virtude de seu adoecimento (“desde este tempo teve convulsão”), não conseguia manter seu
trabalho. Importante destacar que o laudo pericial corrobora os depoimentos testemunhais
anteriormente reportados, pois consigna com data de início da doença o ano de 2013, além do
que relaciona as crises convulsivas que acometiam a autora ao seu quadro clínico da neoplasia
de encéfalo.
XII - Diante do quadro probatório acima exposto, é de se concluir que a autora, que sempre atuou
como segurada empregada, encontrava-se em situação de desemprego, conferindo-lhe, assim, o
direito à prorrogação do período de “graça” por mais 12 meses, a teor do art. 15, §2º, da Lei n.
8.213/91, de modo que, no momento do surgimento de sua incapacidade (03/2016), ainda
ostentava a qualidade de segurado, ante a observância do prazo de 24 meses contado do
término de seu último vínculo laboral (31.03.2014).
XIII - Tendo em vista a patologia apresentada pela ora demandante, revelando sua incapacidade
total e permanente para o labor, não há como se deixar de reconhecer a inviabilidade de seu
retorno ao trabalho, bem como a impossibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que
lhe garantisse a subsistência, razão pela qual deve ser concedido o benefício de aposentadoria
por invalidez, nos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
XIV - O valor do benefício em comento deve ser apurado segundo os critérios insertos no art. 44
da Lei n. 8.213/91.
XV - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do processamento do requerimento
administrativo (19.04.2016), nos termos firmados na petição inicial da ação subjacente.
XVI - A correção monetária e os juros de mora devem ser calculados nos termos da lei de
regência.
XVII - A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde às prestações vencidas até a
data do presente julgamento, fixando-se o percentual no importe de 15%, a teor do art. 85, §2º,
do CPC.
XVIII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Ação subjacente cujo
pedido se julga procedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar suscitada em contestação e, no mérito, julgar
procedente o pedido deduzido na ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão, com base no
art. 966, V, do CPC, e, no juízo rescissorium, julgar procedente o pedido formulado pela parte
autora na ação subjacente, para condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria
por invalidez, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
