
| D.E. Publicado em 08/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, afastar as preliminares, e, em juízo rescindendo, por maioria, julgar improcedente a presente ação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0019422-77.2016.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória proposta pelo INSS visando à desconstituição do julgado que concedeu o benefício de auxílio-doença à autora da ação originária, ora requerida.
Alega o INSS que a coisa julgada produzida na lide subjacente (reexame necessário nº 0001049-47.2011.403.9999, nos autos do processo nº 0000754-91.2007.8.26.0067, com trâmite perante a Comarca de Borborema/SP) está em patente violação com o disposto no art. 59, parágrafo único, da Lei 8.213/91, eis que se trata de benefício concedido à segurada que, por ocasião de seu reingresso ao Regime Geral de Previdência Social, já estava incapacitada para o trabalho.
Nesse sentido, argumenta que a autora reingressou ao regime previdenciário, em janeiro de 2006, quando efetuou o recolhimento de exatamente 04 (quatro) contribuições, na qualidade de contribuinte individual e no valor teto, caracterizando-se claramente sua finalidade de, apenas e tão somente, readquirir a qualidade de segurado e supostamente cumprir a carência mínima para a concessão do benefício de auxílio-doença.
Sustenta que, embora a autora tenha obtido a concessão administrativa do benefício em julho de 2006, este foi deferido por "erros/equívocos administrativos", alegando que "certamente, é notório, as doenças descritas no laudo pericial são todas anteriores ao ano de 2006. Com a devida vênia, não é sequer necessário conhecimento na área médica para se chegar a esta conclusão, basta analisar a natureza de tais males e a idade da interessada."
Pleiteia a concessão de tutela antecipada, com vistas a suspender, até decisão final da presente rescisória, a execução do título judicial proferido na lide subjacente, liquidado em R$ 140.693,06, até 08/2016.
Aduz que, além da verossimilhança das alegações, conforme argumentos acima expendidos, está presente o periculum in mora, eis que o pagamento de valores, a título de atrasados de benefício previdenciário, com o respectivo levantamento pela exequente, causará danos de difícil reparação, além de atentar contra o princípio da moralidade, trazendo sérios prejuízos à coisa pública.
Ao final, requer seja julgada procedente a presente ação para que seja desconstituída a coisa julgada formada na lide subjacente, com fundamento no artigo 966, V, do Novo Código de Processo Civil, declarando-se, por consequência, a improcedência da pretensão contida nos autos nº 000754-91.2007.8.26.0067.
Por decisão de fls. 84/87 o pedido de tutela antecipada foi indeferido.
Citada, a parte requerida apresentou contestação (fls. 93/103), arguindo inépcia da inicial e inadequação da via eleita. Quanto ao mérito, requer a improcedência da ação.
As partes não especificaram provas e, em razões finais, o INSS reiterou os termos da inicial, enquanto a parte ré não as apresentou.
Em manifestação de fls. 126 e verso, a Procuradoria Regional da República entendeu inexistir interesse público a justificar a sua intervenção nestes autos.
É relatório.
Peço dia.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0019422-77.2016.4.03.0000/SP
VOTO
Por primeiro, verifico que a presente ação foi ajuizada dentro do prazo decadencial, uma vez que o trânsito em julgado no feito originário deu-se em 15/10/2015 e a inicial foi distribuída em 19/10/2016 (fls. 02 e 78).
Ainda, não há falar-se em inépcia da inicial, porquanto os fatos foram narrados de forma clara pelo INSS, sendo possível deles se extrair o pedido formulado, garantindo ao réu o contraditório e a ampla defesa.
Por fim, afasto a arguição de inadequação da via eleita, pois o cabimento da ação rescisória está vinculado à análise do próprio mérito da ação.
Passo ao mérito.
A rescisória é ação que objetiva derrubar a coisa julgada já formada. Busca impugnar decisão atingida pela coisa julgada material. Passada em julgado e a salvo de qualquer recurso. Sua finalidade não é rescindir todo e qualquer julgado. As hipóteses são restritas e taxativas, por se estar diante da autoridade da coisa julgada, de decisão que produziu, a todas as luzes, eficácia completa, no dizer de Pontes de Miranda, "como se não fosse rescindível" (In: Comentários ao código de processo civil, t. VI. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 177). Medida excepcional e cabível apenas dentro das hipóteses restritas trazidas pela lei processual (Ada Pellegrini Grinover, Ação rescisória e divergência de interpretação em matéria constitucional, Revista de Processo 87/37), porquanto esgotados os recursos, chega-se à imutabilidade da decisão de mérito, sem que se possa declará-la justa ou injusta, daí se permitindo, tudo isso, no dizer de Sálvio de Figueiredo Teixeira, "um imperativo da própria sociedade para evitar o fenômeno da perpetuidade dos litígios, causa de intranqüilidade social que afastaria o fim primário do Direito, que é a paz social" (In: Ação rescisória, Apontamentos, RT 646/7).
Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por inteiro do texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de mérito sido proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
José Frederico Marques refere-se a "afronta a sentido unívoco e incontroverso do texto legal" (Manual de Direito Processual Civil, vol. III, Bookseller, 1ª edição, p. 304). Vicente Greco Filho, a seu turno, leciona que "a violação de lei para ensejar a rescisória deve ser frontal e induvidosa" (Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., Saraiva, 5ª edição, p. 385). Também Ada Pellegrini Grinover (obra citada), ao afirmar que a violação do direito em tese, para sustentar a demanda rescisória, há de ser clara e insofismável.
Ainda, a respeito, a anotação de THEOTONIO NEGRÃO (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Saraiva, 38ª edição, pp. 567-568), ilustrando a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto:
Art. 485: 20. 'Para ser julgado procedente, o pedido rescindendo deduzido em ação rescisória fulcrada no inc. V do art. 485 do CPC depende, necessariamente, da existência de violação, pelo v. acórdão rescindendo, a literal disposição de lei. A afronta deve ser direta - contra a literalidade da norma jurídica - e não deduzível a partir de interpretações possíveis, restritivas ou extensivas, ou mesmo integração analógica' (STJ-2ª Seção, AR 720-PR-EI, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 9.10.02, rejeitaram os embs., v.u., DJU 17.2.03, p. 214).
'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416). No mesmo sentido: RT 634/93.
'Ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei. Justifica-se o 'judicium rescindens', em casos dessa ordem, somente quando a lei tida por ofendida o foi em sua literalidade, conforme, aliás, a expressão do art. 485-V do CPC. Não o é ofendida, porém, dessa forma, quando o acórdão rescindendo, dentre as interpretações cabíveis, elege uma delas e a interpretação eleita não destoa da literalidade do texto de lei' (RSTJ 40/17). No mesmo sentido: STJ-RT 733/154."
Constata-se também o fato de o dispositivo resguardar não apenas a literalidade da norma, mas seu sentido, sua finalidade, muitas vezes alcançados mediante métodos de interpretação (Sérgio Rizzi, Ação Rescisória, São Paulo, RT, 1979, p. 105-107).
José Carlos Barbosa Moreira, criticando a expressão "literal disposição de lei", pondera: "O ordenamento jurídico evidentemente não se exaure naquilo que a letra da lei revela à primeira vista. Nem é menos grave o erro do julgar na solução da quaestio iuris quando afronte norma que integra o ordenamento sem constar literalmente de texto algum" (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V, Rio de Janeiro, Forense, 11ª edição, 2003, p.130).
Igualmente, Flávio Luiz Yarshell: "Tratando-se de error in iudicando ainda paira incerteza acerca da interpretação que se deve dar ao dispositivo legal. Quando este fala em violação a 'literal' disposição de lei, em primeiro lugar, há que se entender que está, aí, reafirmando o caráter excepcional da ação rescisória, que não se presta simplesmente a corrigir injustiça da decisão, tampouco se revelando simples abertura de uma nova instância recursal, ainda que de direito. Contudo, exigir-se que a rescisória caiba dentro de tais estreitos limites não significa dizer que a interpretação que se deva dar ao dispositivo violado seja literal, porque isso, para além dos limites desse excepcional remédio, significaria um empobrecimento do próprio sistema, entendido apenas pelo sentido literal de suas palavras. Daí por que é correto concluir que a lei, nessa hipótese, exige que tenham sido frontal e diretamente violados o sentido e o propósito da norma" (Ação Rescisória: juízos rescindente e rescisório, São Paulo, Malheiros, 2005, p. 323).
Conclui-se ser inadmissível a desconstituição do julgado com base em mera injustiça, em interpretações controvertidas, embora fundadas. A rescisória não se confunde com nova instância recursal. Exige-se mais, que o posicionamento adotado desborde do razoável, que agrida a literalidade ou o propósito da norma.
Pois bem, no caso da presente ação, o INSS alega violação a literal disposição de lei pela r. decisão rescindenda, porquanto condenou o INSS à concessão do benefício de auxílio-doença.
Analisando os documentos colacionados aos autos, verifica-se que a autora ajuizou a demanda nº 0000754-91.2007.8.26.0067, que tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Borborema/SP, objetivando o restabelecimento do auxílio-doença c.c. conversão de auxílio-doença em aposentadoria por invalidez.
A presente demanda foi ajuizada em 11/05/2007. Anteriormente à sua propositura, no período de 03/07/2006 a 31/10/2006, a segurada obteve a concessão administrativa do auxílio-doença, cuja cessação decorreu da não constatação, pela perícia administrativa do INSS, de incapacidade laborativa.
Na fase instrutória, houve a elaboração de perícia médica judicial que atestou que "a reclamante apresenta quadro clínico compatível com artrite reumatoide, depressão recorrente grave e fibromialgia", caracterizando-se sua incapacidade total e temporária para o trabalho, tendo fixado a data de início da incapacidade, desde o ano de 2006 (fls. 30/31).
A sentença, entendendo pela presença dos requisitos ensejadores do auxílio-doença, julgou parcialmente procedente o pedido, tendo submetido a sentença à remessa necessária (fls. 46/48).
Em face do decisum, a autora manejou recurso de apelação objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez. Sobreveio a prolação de decisão monocrática que negou seguimento à apelação da autora, com fundamento no art. 557 do Código de Processo Civil de 1973 (fls. 58/60).
Após certificado seu trânsito em julgado, o INSS ajuizou ação rescisória nº 2012.03.00.010719-0, alegando, em síntese, a ocorrência de violação literal aos artigos 17 da Lei 10.910/04, e art. 6º da Lei 9.028/97, eis que, após proferida sentença, não houve intimação pessoal e específica de um Procurador Federal, caracterizando-se, outrossim, ofensa aos arts. 42 e 59, parágrafo único, da Lei 8.213/91, por estar claro que a incapacidade do segurado é preexistente ao reingresso ao RGPS (fls.63-verso/72).
Em decisão monocrática de lavra da Desembargadora Federal Relatora Therezinha Cazerta, a ação foi julgada extinta, sem resolução do mérito, fundamentando-se na ausência de pressuposto genérico de rescindibilidade, porquanto a não submissão da sentença ao reexame necessário caracteriza a inexistência do trânsito em julgado (fls. 79/80-verso).
Por força dessa decisão, houve a prolação de nova decisão monocrática, de lavra do Desembargador Federal Relator Newton de Lucca (Reexame Necessário Cível nº 2011.03.99.001049-8), que, com fundamento no art. 557 do Código de Processo Civil de 1973, deu parcial provimento à remessa oficial, tida por interposta, tão somente, para reformar a sentença no tocante aos índices de correção monetária e juros de mora.
Trata-se de decisão, sobre a qual se operaram os efeitos da coisa, em 05/10/2015, para a autora da lide originária, e, em 15/10/2015, para o INSS.
A respeito dos requisitos ensejadores da concessão do auxílio-doença, a decisão monocrática em referência foi expressa ao consignar:
Com efeito, verifica-se que a interpretação dada pela decisão rescindenda está consonância com o conjunto probatório produzido na lide originária.
Da análise dos extratos CNIS juntados na lide originária, verifica-se que a autora verteu contribuições ao regime previdenciário, nos períodos de 11/1986 a 02/1987, de 04/1987 a 06/1988, de 09/1988 a 10/1988, de 12/1988 a 01/1989, de 10/2003 a 01/2004, em 08/2004 e de 01/2006 a 04/2006 (fls. 43/44), tendo recebido benefício previdenciário, no período de 03/07/2006 a 31/10/2006 (fl. 18 e fl. 19).
A perícia judicial fixou a data de início da incapacidade desde 2006, ou seja, quando a autora ostentava sua qualidade de segurado.
Descabe cogitar-se de violação literal à disposição de lei, dada a consonância da coisa julgada com os preceitos contidos nos artigos 42 e 59, ambos da Lei n. 8.213/91.
A simples alegação autárquica quanto à ocorrência de incapacidade preexistente ao reingresso da segurada ao regime previdenciário, ao fundamento de que a natureza da enfermidade e idade da postulante conduzem a essa conclusão, sem qualquer base probatória, não é apta a caracterizar a alegada violação.
Mesmo, na via administrativa, quando o INSS cessou o benefício de auxílio-doença anteriormente concedido, ele não o fez com base nas razões ora invocadas, ou seja, preexistência da incapacidade, mas sim por não ter sido constatada a incapacidade da segurada para o trabalho (fls. 19-verso/20).
É certo que, não concordando à época com as conclusões firmadas na lide originária, caberia à autarquia o manejo do recurso adequado visando à reforma do julgado, não se prestando, para esse fim, a ação rescisória.
É clara a pretensão autárquica de reanálise do quadro fático probatório, inexistindo, contudo, qualquer violação literal à norma jurídica apta a ensejar a desconstituição, com amparo no inciso V do artigo 966 do novo CPC.
Ora, a decisão aqui hostilizada, ainda que contrária aos interesses da autarquia, é dotada de fundamentos suficientes ao enquadramento nas balizas estabelecidas pelos dispositivos de lei que regem a matéria e em parâmetros consolidados na jurisprudência desta Corte Regional.
Em situações análogas à presente, a Terceira Seção deste Tribunal posiciona-se, de modo pacífico, pela improcedência da ação rescisória, in verbis:
Outrossim, como se observa, o que pretende verdadeiramente a autarquia com a presente ação é nova análise do caso. Independentemente, porém, do acerto ou do desacerto da tese firmada pela decisão rescindenda, o fato é que o deslinde conferido não desbordou do razoável, adotando o julgador uma dentre as soluções possíveis, conforme demonstrado nos julgados acima citados, os quais revelam predominante entendimento jurisprudencial desta Corte Regional.
Dessa forma, entendo ausentes as condições para a ação rescisória, com lastro no inciso V do artigo 966 do CPC/2015, pois não houve violação aberrante ao sistema jurídico pátrio, pela r. decisão rescindenda.
Ante todo o exposto, afasto as preliminares, e, em juízo rescindendo, julgo improcedente a presente ação.
Condeno o INSS no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), conforme entendimento desta E. Terceira Seção.
É o voto.
LUIZ STEFANINI
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