Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5020994-75.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
26/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA.REVISÃO DE BENEFÍCIO.
DIREITO AO CÁLCULO DO BENEFÍCIO DE ACORDO COM A LEI VIGENTE À ÉPOCA DA
IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS PARA A SUA CONCESSÃO. DECADÊNCIA. VIOLAÇÃO
DE LEI. ERRO DE FATO. CONFIGURADOS. JUÍZO RESCISÓRIO. DECADÊNCIA
RECONHECIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 630.501 sob o regime da repercussão geral,
assentou o entendimento de preservação do direito adquirido ao melhor benefício previdenciário,
desde que não configurada a decadência/prescrição.
- O julgado rescindendo reconheceu o direito à revisão do ato de concessão do benefício em
ação ajuizada depois de superado o prazo decadencial previsto no artigo 103 da Lei n.
8.213/1991, à luz do entendimento firmado em Repercussão Geral no RE n. 626.489, restando
configurada a hipótese de desconstituição do julgado prevista no artigo 966, V, do CPC.
- Ao deixar de reconhecer de ofício a questão atinente à decadência, o julgado rescindendo
também incorreu em erro de fato.
- Em sede de juízo rescisório, reconhecida a decadência, impõe-se a extinção do processo, nos
termos do artigo 487, II, do CPC.
- Honorários de advogado, em desfavor da parte ré,arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais),
consoante entendimento desta Terceira Seção
- Ação rescisória procedente.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5020994-75.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: NELSON CILENSE
Advogado do(a) REU: ROSE MARY GRAHL - SP212583-S
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5020994-75.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: NELSON CILENSE
Advogado do(a) REU: ROSE MARY GRAHL - SP212583-S
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação rescisória, proposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em face de
NELSON CILENSE, objetivando, com fundamento no artigo 966, inciso V e VII, do Código de
Processo Civil (CPC), desconstituir o v. acórdão da Egrégia Sétima Turma desta Corte, o qual,
em juízo de retratação positivo, assegurou ao ora réu o direito à revisão de sua de aposentadoria
por tempo de contribuição, com aplicação da legislação vigente na data do preenchimento dos
requisitos, nos termos do decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em repercussão geral,
no RE n. 630.501/RS.
O INSS alegaque o referido julgado violou manifestamente a norma prevista no artigo 103 da Lei
n. 8.213/1991, bem como incorreu em erro de fato, ao deixar de reconhecer a decadência do
direito à revisão pleiteada. Aduz que no julgamento da repercussão geral há disposição expressa
sobre a observância do instituto da decadência, e que o acórdão rescindendo nada dispôs sobre
a questão, conquanto o pedido de revisão tenha sido formulado após o decurso do prazo previsto
na legislação previdenciária.
Pretende a rescisão do julgado e a improcedência do pedido originário, com a decretação da
decadência do direito à revisão pretendida.
Pleiteia, ademais, a concessão da tutela provisória de urgência, a fim de suspender a execução, a
qual foi deferidaàfl. 450.
A parte ré foi citada e apresentou contestação na qual sustenta a ausência da alegada violação à
norma jurídica, bem como da ocorrência de erro de fato, na medida em que a aplicação do art.
103 da Lei n. 8.213/1991 se trata de matéria controvertida, sendo, pois, inadequada a rescisão do
julgado.
Por tratar-se de matéria unicamente de direito e por estarem presentes todos os elementos
necessários ao exame desta rescisória, foi dispensada a dilação probatória, bem como a abertura
de vista às partes para razões finais.
O DD. Órgão doMinistério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento da ação.
Dispensada a revisão, consoante o disposto no artigo34 do Regimento Interno desta Corte, com a
redação da Emenda Regimental n. 15/2016.
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5020994-75.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: NELSON CILENSE
Advogado do(a) REU: ROSE MARY GRAHL - SP212583-S
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De início, assinalo não ter sido superado o biênio imposto à propositura da ação (artigo 975 do
CPC), pois o ajuizamento desta rescisória deu-se em 19/08/2019 e o trânsito em julgado
dodecisum, em 15/02/2018.
A ação rescisória constitui medida excepcional para fins de desconstituição da coisa julgada, esta
última peça fundamental da garantia da segurança jurídica, à luz do artigo 5º, XXXVI, da
Constituição Federal.
Segundo Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:
“Ação rescisória é uma ação que visa a desconstituir a coisa julgada. Tendo em conta que a coisa
julgada concretiza no processo o princípio da segurança jurídica – substrato indelével do Estado
Constitucional – a sua propositura só é admitida em hipóteses excepcionais, devidamente
arroladas de maneira taxativa pela legislação (art. 966, CPC). A ação rescisória serve tanto para
promover a rescisão da coisa julgada (iudicium rescindens) como para viabilizar, em sendo o
caso, novo julgamento da causa (iudicium rescissorium) (art. 968, I, CPC). A ação rescisória é um
instrumento para a tutela do direito ao processo justo e à decisão justa. Não constitui instrumento
para tutela da ordem jurídica, mesmo quando fundada em ofensa à norma jurídica. Em outras
palavras, a ação rescisória pertence ao campo da tutela dos direitos na sua dimensão particular –
e não ao âmbito da tutela dos direitos na sua dimensão geral.” (in:Código de Processo Civil
Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 900)
Essas são as balizas, estreitas, que nortearão a análise da pretensão deduzida.
Segundo o INSS, o acórdão rescindendo incorreu emviolação à norma jurídica e erro de fato, ao
reconhecer o direito à revisão do benefício, embora já superado o prazo decenal previsto no art.
103 da Lei n. 8.213/1991.
No que toca à violação ànorma jurídica, a doutrina, analisando o tópico à luz do disposto no art.
485, inciso V, do Código de Processo Civil de 1973, mas ainda pertinente, sustenta ser questão
relevante saber se a decisão rescindenda qualifica os fatos por ela julgados de forma inadequada,
a violar, implícita ou explicitamente,norma jurídica.
Ensina Flávio Luiz Yarshell:
"Tratando-se de error in iudicando ainda paira incerteza acerca da interpretação que se deve dar
ao dispositivo legal. Quando este fala em violação a 'literal' disposição de lei, em primeiro lugar,
há que se entender que está, aí, reafirmando o caráter excepcional da ação rescisória, que não
se presta simplesmente a corrigir injustiça da decisão, tampouco se revelando simples abertura
de uma nova instância recursal, ainda que de direito. Contudo, exigir-se que a rescisória caiba
dentro de tais estreitos limites não significa dizer que a interpretação que se deva dar ao
dispositivo violado seja literal, porque isso, para além dos limites desse excepcional remédio,
significaria um empobrecimento do próprio sistema, entendido apenas pelo sentido literal de suas
palavras.Daí por que é correto concluir que a lei, nessa hipótese, exige que tenham sido frontal e
diretamente violados o sentido e o propósito da norma".(g.n.,in: Ação rescisória . São Paulo:
Malheiros, 2005, p. 323)
Sobre o erro de fato,preleciona a doutrina (g. n.):
"O texto é de difícil compreensão. Senão houvepronunciamento judicial sobre o fato, como é
possível ter havido o erro?O erro é exatamente o acolhimento de um fato inexistente como
existente, ou o contrário. O que a lei quer dizer, porém, é o seguinte: oerro de fato, para ensejar a
rescisória, não pode ser aquele que resultou de uma escolha ou opção do juiz diante de uma
controvérsia. O erro, no caso relevante, é o que passou desapercebido pelo juiz, o qual deu como
existente um fato inexistente ou vice-versa. Se a existência ou inexistência do fato foi ponto
controvertido e o juiz optou por uma das versões, ainda que erradamente, não será a rescisória
procedente. E tal restrição tem razão de ser. Os graus de jurisdição, os recursos, têm por
finalidade precípua a resolução de fatos controvertidos, de modo que, se qualquer erro pudesse
tornar a sentença rescindível, ficaria seriamente abalada a estabilidade propiciada pela coisa
julgada. O erro de fato refere-se, apenas, a questões não resolvidas pelo juiz. Porque também,
mesmo sem ter havido controvérsia, se o juiz examinou a questão explicitamente e concluiu que
tal fato existia, ou não, a sentença permanece."(GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil
Brasileiro, 11. ed., v. II. São Paulo: Saraiva, 1996, pp. 426-427)
Na ação subjacente, ajuizada em 26/10/2009, a então parte autora, ora ré, pleiteou a revisão de
sua aposentadoria por tempo de contribuição, concedida em 25/09/1991 (DIB), com o recálculo
da sua renda mensal inicial em conformidade com a legislação anterior ao advento da Lei n.
8.213/1991, considerado o teto de 20 (vinte) salários mínimos, a teor do disposto na Lei n.
6.950/1981, em respeito ao direito adquirido.
Em primeira instância o pedido foi julgado improcedente e, nestaCorte, em juízo de retratação
positivo, a Sétima Turma, em sessão realizada em 26/06/2017, deu provimento aos Embargos de
Declaração ofertados pelo autor e condenou o INSS a proceder à revisão do benefício nos
seguintes termos:
“PREVIDENCIÁRIO. ENTENDIMENTO DO STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543 -B, § 3º, DO CPC. REVISÃO DE
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE NA DATA DO
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO .
- A divergência a ser dirimida diz respeito ao RE nº 630.501/RS, que assentou entendimento no
sentido de fazer jus o segurado à concessão ou revisão de seu benefício de acordo com a
legislação vigente na data do cumprimento de todos os requisitos necessários à sua concessão,
ainda que não a tenha requerido naquele momento e tenha permanecido em atividade laboral,
visando à obtenção do melhor benefício possível.
- Deve ser reconhecida a possibilidade de revisão da RMI de aposentadoria concedida na
vigência da Lei 8.213/91, para que seja calculada com base no teto de 20 salários mínimos (Lei
6.950/81), por ter o segurado preenchido as condições necessárias ao benefício antes do advento
da Lei 7.787/89.
- Em se tratando de benefício de prestação continuada concedido no período denominado
"buraco negro", compreendido entre 05/10/1988 a 05/04/1991, a renda mensal inicial deve ser
recalculada de acordo com as regras estabelecidas na Lei 8.213/91 (art. 144).
- O termo inicial dos efeitos financeiros desta revisão é a citação, nos termos do artigo 219 do
Código de Processo Civil e artigo 240 do Novo CPC, quando se tornou litigiosa a coisa.
- Os juros de mora e a correção monetária sobre as diferenças apuradas devem ser aplicados na
forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
em vigor na data da presente decisão, sem prejuízo da legislação superveniente, observando-se,
ainda, quanto à correção monetária o disposto na Lei n. 11.960/2009 (RE n. 870.947,
16.04.2015).
- Eventuais diferenças que tenham sido pagas administrativamente deverão ser descontadas por
ocasião da liquidação.
- O INSS arcará com os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação,
computada até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Embargos de Declaração providos em sede de retratação positiva.”
Na espécie, o segurado buscou o recálculo da renda mensal inicial (RMI) de sua aposentadoria
deferida em 1991, sendo que a demanda subjacente somente restou aforada em 2009.
De fato, diante do longo tempo transcorrido entre a concessão do benefício e o pedido de revisão
desse ato, impõe-se analisar se haveria óbice ao recálculo pretendido em função da decadência.
Sobre o instituto, dispõe o artigo 103 da Lei n. 8.213/1991:
"É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou
beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês
seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar
conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo."
O prazo decadencial para o segurado requerer a revisão ou a alteração de sua Renda Mensal
Inicial (RMI)foi introduzido no direito positivo em 27/6/1997, data da entrada em vigor da Medida
Provisória (MP) n. 1.523-9/1997.
Essa medida provisória criou a decadência do direito de requerer a revisão do ato de concessão
do benefício previdenciário, inicialmente com prazo estipulado em 10 (dez) anos, passando a 5
(cinco) anos em 20/11/1998, e voltando a 10 (dez) anos em 20/11/2003.
Até tempos atrás, muitos entendiam que a MPn. 1.523-9/1997 não poderia ser aplicada aos
benefícios concedidos anteriormente à sua vigência, com base em decisões proferidas
noSuperior Tribunal de Justiça (STJ).
Todavia, melhor ponderando, compreendeu-se que não adotar a regra decadencial aos
benefícios deferidos antes de 1997 seria eternizar as demandas revisionais, violando,
inegavelmente, a segurança jurídica.
Evidentemente que não se pode prejudicar os segurados anteriores por norma posterior,
acabando abruptamente com a possibilidade de revisão.
Assim, harmonizando o direito em questão de modo a assegurar a isonomia entre os segurados,
o STJ, no julgamento dosREsp Repetitivosn. 1.309.529/PR (j. 28/11/2012, DJe 4/6/2013) e
1.326.114/SC (j. 28/11/2012, DJe 13/5/2013), firmou o seguinte entendimento:
"Incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória
1.523-9/1997, convertida na Lei 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou
indeferidos anteriormente a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência
(28.6.1997)."
No mesmo sentido, o Plenário doSupremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE n.
626.489 (j. 16/10/2013, DJe 23/9/2014), sob regime de repercussão geral,fixouas seguintes teses
sobre a questão (Tema n. 313):
“I – Inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário; II – Aplica-se
o prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefícios concedidos, inclusive os anteriores
ao advento da Medida Provisória 1.523/1997, hipótese em que a contagem do prazo deve iniciar-
se em 1º de agosto de 1997.”
Especificamente quanto à preservação do direito adquirido sempre que preenchidos os requisitos
para o gozo de determinado benefício, a Suprema Corte também consolidou esse entendimento
sob o regime da repercussão geral (RE n. 630.501), ressalvando expressamente a observância
dos institutos da decadência e da prescrição.
A propósito, confira-se o trecho do v. acordão (g. n.):
"Atribuo os efeitos de repercussão geral ao acolhimento da tese do direito adquirido ao melhor
benefício, assegurando-se a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou
revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial possível no cotejo entre
aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem
requerido o beneficio em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria
proporcional, com efeitos financeiros a contar do desligamento do emprego ou da data de entrada
do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às
prestações vencidas".
Nesse contexto, evidencia-se violação à norma jurídica, porquanto o julgado rescindendo
determinou arevisão da RMI (NB: 088.297.002-0), com base no direito adquirido ao melhor
benefício,em ação ajuizada depois de superado o prazo decadencial previsto no artigo 103 da Lei
n. 8.213/1991.
Vale dizer: considerado o início da contagem do prazo em1º/8/1997 (RE n. 626.489), constata-se
que na data do ajuizamento (2009) o direito àrevisãodo benefício já haviadecaído.
O tema trazido à discussão nesta rescisória já foi enfrentado por esta Terceira Seção, conforme
se extrai do seguinte julgado:
"AGRAVO INTERNO. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO À
LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI (ARTS. 103, 122, LEI N. 8.213/91). REVISÃO DE ATO
CONCESSÓRIO. DECADÊNCIA. DIREITO ADQUIRIDO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.
IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO. PRECEDENTES DAS CORTES SUPERIORES EM
JULGAMENTO DE RECURSOS REPETITIVOS. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Em que pese a
afetação, pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, do tema 966 ("incidência ou não do
prazo decadencial previsto no caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991 para reconhecimento de
direito adquirido ao benefício previdenciário mais vantajoso"), em que foi determinada a
suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que
versem acerca da questão delimitada e tramitem no território nacional (REsp n.ºs 1.631.021 e
1.612.818), não se reconhece sua aplicabilidade, a priori, quanto à ação rescisória, haja vista que
eventual tese a ser futuramente proferida sobre o tema somente teria incidência no âmbito do
juízo rescisório, não podendo ser adotada para fins de desconstituição do julgado, em juízo
rescindendo, dada a incidência do enunciado de Súmula n.º 343 do e. Supremo Tribunal Federal.
2. A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal
e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta.
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do
enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal
disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação
controvertida nos tribunais". 3. Para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa
julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido
controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente
ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva
para a conclusão do decidido. Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou
documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação
subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-
lo. 4. Discutiu-se na demanda subjacente a ocorrência da decadência da pretensão revisional do
ato de concessão do benefício previdenciário, considerando-se direito adquirido ao benefício mais
vantajoso. 5. O julgado rescindendo se encontra fundamentado em acórdãos proferidos pelo E.
Supremo Tribunal Federal e pelo C. Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
representativos de controvérsia repetitiva, de sorte que não há qualquer respaldo para
reconhecimento de violação literal da lei. Ressalta-se a distinção estabelecida nos votos
condutores dos ilustres Ministros Roberto Barroso e Herman Benjamin, no julgamento,
respectivamente, do Recurso Extraordinário n.º 626.489 e do Recurso Especial n.º 1.309.529. 6.
Além de se encontrar amparado nas teses amplamente supramencionadas relativas à
legitimidade do instituto da decadência para revisão do ato concessório, o julgado rescindendo se
alinhou estritamente à tese específica quanto ao tema ora versado, qual seja o direito adquirido
ao benefício mais vantajoso, firmada pelo Plenário do e. Supremo Tribunal Federal em
21.02.2013, no julgamento do Recurso Extraordinário, autuado sob n.º 630.501/RS, com
repercussão geral reconhecida: "Para o cálculo da renda mensal inicial, cumpre observar o
quadro mais favorável ao beneficiário, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em
data posterior ao implemento das condições legais para a aposentadoria, respeitadas a
decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas". 7. A matéria da
decadência sempre foi tratada sob o aspecto da possibilidade da norma supostamente atingir ato
jurídico perfeito e direito adquirido. Assim, reveste-se de natureza nitidamente constitucional a
possibilidade de aplicação do prazo decadencial revisional, tanto a benefícios concedidos
anteriormente à alteração legislativa que introduziu tal prazo no ordenamento jurídico, como em
relação à discussão sobre direito adquirido ao melhorbenefício. Revestida de natureza
constitucional, a questão foi sedimentada pela Suprema Corte, tanto para firmar a
constitucionalidade do instituto da decadência da pretensão revisional do ato concessório de
benefício, quanto, especificamente, para determinar sua observância inclusive em situações que
tratem do direito adquirido ao melhorbenefício, tal como discutido no caso concreto. 8.
Relembrando-se que o c. Superior Tribunal de Justiça procedeu à afetação do tema para
julgamento sob a égide dos recursos representativos de controvérsia (tema 966), não é demais
ressaltar que, ainda que se forme tese em sentido contrário àquela já firmada pela Suprema
Corte, com repercussão geral reconhecida, cumpriria apreciar a ocorrência no julgado
rescindendo de violação literal à ordem constitucional, cuja análise, evidentemente, deveria ser
norteada pela interpretação já conferida pela e. Corte Constitucional, sob pena de infringência à
força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional
(nesse sentido: STF, 2T, AI 555806, relator Ministro Eros Grau, DJe 17.04.2008). 9. Por todos os
ângulos analisados resta evidenciada a inocorrência de violação direta à lei, razão pela qual, em
juízo rescindendo, imperativa a liminar improcedência da presente rescisória, haja vista que o
julgado rescindendo se funda em precedentes firmados pelas cortes superiores em julgamento de
recursos repetitivos. 10. Não demonstrado equívoco, abuso ou ilegalidade na decisão recorrida,
de rigor sua manutenção. 11. Agravo interno improvido."(AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 11307 / SP,
0014571-92.2016.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, Data do
Julgamento 25/10/2018, Data da Publicação/Fonte: e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/11/2018).
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça findou por reafirmar a incidência da decadência em
relação aos pedidos de reconhecimento de direito adquirido ao benefício mais
vantajoso,conforme a seguinte tese firmada na apreciação doTema Repetitivo n. 966:
"Incide o prazo decadencial previsto no caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991 para
reconhecimento do direito adquirido ao benefício previdenciário mais vantajoso" (REsp n.
1.631.021, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgamento em13/02/2019, DJe
de 13/03/2019).
Dessa forma, está configurada a hipótese prevista no artigo 966, V, do CPC, a ensejar a
desconstituição do julgado.
Sobeja reconhecer, ademais, que a questão atinente à decadência é de ser reconhecida “ex
officio” e que o julgado rescindendo, ao deixar de considerá-la, incorreu também em erro de fato.
De outro lado, nojuízo rescisório, pelas razões já exposta no juízo rescindendo, cabe apenas
reconhecer haver se esvaído a potestade revisional pelo decurso do prazo decadencial, impondo-
se a improcedência do pedido, com fulcro no art. 487, II, do CPC.
Diante do exposto,julgo procedenteo pedido formulado nesta ação rescisória, para, em juízo
rescindente, desconstituir ojulgado e, em juízo rescisório, pronunciar a decadência do direito à
revisão do benefício e julgar extinto o processo, nos termos do artigo 487, II, do CPC.
Condeno a parte ré ao pagamento de honorários de advogado, os quais arbitro em R$ 1.000,00
(um mil reais), consoante entendimento desta Terceira Seção
Oficie-seao Juízo da causa originária, informando o inteiro teor deste julgado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA.REVISÃO DE BENEFÍCIO.
DIREITO AO CÁLCULO DO BENEFÍCIO DE ACORDO COM A LEI VIGENTE À ÉPOCA DA
IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS PARA A SUA CONCESSÃO. DECADÊNCIA. VIOLAÇÃO
DE LEI. ERRO DE FATO. CONFIGURADOS. JUÍZO RESCISÓRIO. DECADÊNCIA
RECONHECIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 630.501 sob o regime da repercussão geral,
assentou o entendimento de preservação do direito adquirido ao melhor benefício previdenciário,
desde que não configurada a decadência/prescrição.
- O julgado rescindendo reconheceu o direito à revisão do ato de concessão do benefício em
ação ajuizada depois de superado o prazo decadencial previsto no artigo 103 da Lei n.
8.213/1991, à luz do entendimento firmado em Repercussão Geral no RE n. 626.489, restando
configurada a hipótese de desconstituição do julgado prevista no artigo 966, V, do CPC.
- Ao deixar de reconhecer de ofício a questão atinente à decadência, o julgado rescindendo
também incorreu em erro de fato.
- Em sede de juízo rescisório, reconhecida a decadência, impõe-se a extinção do processo, nos
termos do artigo 487, II, do CPC.
- Honorários de advogado, em desfavor da parte ré,arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais),
consoante entendimento desta Terceira Seção
- Ação rescisória procedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu julgar procedente o pedido formulado nesta ação rescisória, para, em juízo
rescindente, desconstituir o julgado e, em juízo rescisório, pronunciar a decadência do direito à
revisão do benefício e extinguir o processo, nos termos do artigo 487, II, do CPC, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
