
| D.E. Publicado em 22/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dar-lhe provimento, assim como à remessa necessária, para reformar a r. sentença de 1º grau, julgando improcedente o pleito revisional, com revogação da tutela anteriormente concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse título, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 13/03/2019 13:39:35 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002478-17.2012.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por SIDNEY ZERBINI FRIAS, objetivando o reconhecimento de labor especial e a transformação de sua "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição" (concedida em âmbito administrativo) em "aposentadoria especial". Noutra hipótese, a majoração do percentual relativo à Renda Mensal Inicial (RMI) daquela primeira.
A r. sentença (fls. 142/146) julgou procedente a ação, reconhecendo a especialidade do intervalo de 06/03/1997 a 13/10/2010, condenando o INSS a converter a "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição" concedida ao autor em "aposentadoria especial", desde a data do requerimento administrativo (13/10/2010), com incidência de juros de mora e correção monetária sobre o total vencido, enfatizando-se que os valores recebidos administrativamente deverão ser compensados na fase de execução. Outrossim, os honorários advocatícios foram arbitrados em 15% sobre o valor condenatório, destacando-se, por outro lado, a isenção de que gozaria a autarquia, no tocante às custas processuais. Por fim, foram determinados o reexame obrigatório do julgado e a antecipação dos efeitos da tutela.
Na sequência, apelou o INSS (fls. 152/160), de início postulando a suspensão da tutela adiantada, conforme art. 558, parágrafo único, do CPC. No mérito, defendendo a reforma total do julgado, à mingua de comprovação da especialidade do labor, eis que, não apenas há informação acerca do uso de EPI eficaz, como também nota-se, dos autos, a ausência de laudo técnico (LTCAT). Noutra hipótese, pugna pelas: a) redução do percentual honorário para 10%; b) correção monetária incidente a partir do ajuizamento da ação; e c) isenção das custas processuais.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (fls. 165/175), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 28/03/2012 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 19/04/2012 (fl. 104) e a prolação da r. sentença aos 28/02/2013 (fl. 145), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Na peça vestibular, descreve a parte autora seu histórico laborativo, defendendo o aproveitamento do período laborativo de 06/03/1997 a 13/10/2010 como sendo de caráter especial, para fins de revisão de sua "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição" para "aposentadoria especial", desde a data do requerimento administrativo formulado em 13/10/2010 (sob NB 122.718.879-7) ou, pelo menos, a elevação da RMI correspondente àquela aposentadoria já constituída (considerados, à época, 41 anos e 12 dias de tempo total de serviço, fl. 58).
Sobressai o interstício já adotado como especial pela autarquia previdenciária, em sede administrativa, vale dizer, de 01/08/1977 a 05/03/1997 (fl. 93).
Não merece ser conhecido o apelo do INSS, na parte em que reclama a isenção das custas processuais, por lhe faltar interesse recursal, porquanto a r. sentença assim já o decidira.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Do labor especial.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Do caso em tela.
Os autos contêm documentos (fls. 55/101), dentre os quais:
* cópias de CTPS (fls. 62/75), cujas anotações de emprego são passíveis de conferência junto às laudas de pesquisa ao CNIS (fls. 130/135), cotejáveis, ainda, com as tabelas confeccionadas pelo INSS (fls. 91vº e 92, 94vº e 95);
* íntegra do procedimento administrativo de benefício (fls. 80/101);
* documentação específica, correspondente ao PPP fornecido pela empresa Ford Motor Company Brasil Ltda. (fls. 61 e 86), cuja finalidade precípua seria a de demonstrar a sujeição do litigante a agentes nocivos, durante a prática laboral.
E após análise detida de toda a documentação retro exposta, a conclusão a que se chega é a de inviabilidade do reconhecimento do tencionado labor insalubre, na medida em que indicado no PPP, como único fator de risco a que submetido o trabalhador, nível de ruído equivalente a 84 dB(A), abaixo dos limites de tolerância impostos pela Legislação de regência da matéria à época.
Em suma: in casu, não se pode acolher o intervalo laborativo de 06/03/1997 a 13/10/2010, como de natureza especial.
Da aposentadoria especial.
Eis que, sem o reconhecimento da especialidade pretendida nesta demanda, a periodização de índole especial resume-se a, unicamente, o interregno de 01/08/1977 a 05/03/1997 (especialidade acolhida na via administrativa, como dito alhures). E sob este prisma, constata-se, de maneira induvidosa, número de anos de serviço aquém do necessário à consecução da "aposentadoria especial", restando, pois, improcedente a demanda quanto ao pleito de transmutação do benefício de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição" para "aposentadoria especial".
Imperiosa, portanto, a reforma da r. sentença, na íntegra.
Observo que a sentença concedeu a tutela antecipada. Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 103), a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe provimento, assim como à remessa necessária, para reformar a r. sentença de 1º grau, julgando improcedente o pleito revisional, com revogação da tutela anteriormente concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse título.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 13/03/2019 13:39:32 |
