
| D.E. Publicado em 11/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para estabelecer que os valores em atraso serão corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, mantidos os outros ditames da r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006412-54.2011.4.03.6106/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por ANA PAULA SILVA, objetivando o reconhecimento de labor especial, com vistas à revisão dos critérios de concessão da "aposentadoria por tempo de contribuição" lhe concedida (em âmbito administrativo), para "aposentadoria especial".
A r. sentença prolatada, parcialmente modificada por força de embargos de declaração (fls. 228/231, 246 e verso, e 254 e verso), julgou parcialmente procedente a ação, reconhecendo a especialidade do intervalo laborativo de 29/04/1995 a 02/05/2011, assim condenando o INSS no pagamento de "aposentadoria especial" (totalizados 29 anos e 09 dias de labor), a partir da data do requerimento administrativo (08/09/2011), com incidência de correção monetária e juros de mora sobre o montante em atraso, respeitados a prescrição quinquenal e o desconto dos valores já adiantados a título doutro beneficio, devendo ser considerados como salário-de-contribuição, no período de janeiro a dezembro/1999, os valores constantes dos demonstrativos acostados às fls. 219/224. Condenada a autarquia no pagamento da verba advocatícia estipulada em R$ 500,00, restando isenta das custas de processo, em virtude da gratuidade sob a qual tramitam os autos (fl. 76).
Insatisfeito, o INSS apelou (fls. 236/240, ratificadas em fl. 258), alegando que não houve demonstração da exposição a agentes nocivos durante a prática laboral, salientando a ausência de laudo contemporâneo, aduzindo a imprestabilidade do laudo acostado às fls. 176/182, porquanto consignadas duas datas no documento. Asseverou que a parte autora não contaria com tempo suficiente à concessão de "aposentadoria especial", sendo que, se diverso deste o entendimento, afirma a autarquia que não haveria atrasados a serem creditados em nome da segurada, haja vista sua permanência em atividade insalubre, até tempos recentes (consoante pesquisa ao sistema CNIS, fl. 187), ao contrário: o caso seria, não de percepção de valores, mas sim, de devolução. Numa hipótese última, requer a fixação do início da "aposentadoria especial" na data de afastamento do trabalho insalubre.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões pela autora (fls. 249/253), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 23/09/2011 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 12/01/2012 (fl. 80) e a prolação da r. sentença aos 19/10/2012 (fl. 231vº), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Conforme narrada na peça vestibular, a pretensão autoral cinge-se ao reconhecimento do labor especial desempenhado desde 01/05/1982 até tempos hodiernos, visando à transformação da "aposentadoria por tempo de contribuição" concedida aos 08/09/2011 (sob NB 157.295.987-5, fl. 13), em "aposentadoria especial" (sem incidência do fator previdenciário), sendo, ademais, considerados os salários-de-contribuição - relativos aos meses de janeiro a dezembro/1999 - de acordo com os informes fornecidos pelo empregador, trazidos aos autos.
Insta salientar que o intervalo especial correspondente a 01/05/1982 a 28/04/1995 já se encontra devidamente reconhecido pelo INSS, na esfera administrativa (fl. 207). Assim, a controvérsia ora paira sobre o intervalo de 29/04/1995 em diante.
Da remessa tida por interposta
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a reconhecer tempo laborativo especial, e transmutar o benefício concedido à autora em "aposentadoria especial". E não havendo como se apurar, nesta fase processual, com exatidão, o valor condenatório, considera-se a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
No mais, verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Da atividade especial.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso em tela.
Os autos foram instruídos com documentos (fls. 07/68, 74/75 e 219/224), dentre os quais cópia de CTPS (fls. 08/10), revelando detalhadamente o percurso laborativo da parte autora.
Para além, cópia do procedimento administrativo de benefício (fls. 197/214), do resultado de pesquisa ao sistema informatizado CNIS/Plenus (fls. 107/167 e 186/196), e das tabelas confeccionadas pelo INSS (fls. 25 e 205/207).
Por sua vez, coexistem documentos específicos - PPP (fls. 11 e verso e 203/204) e laudo técnico (fls. 176/182) fornecidos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São José do Rio Preto - cujo exame percuciente comprova o labor excepcional da postulante, desde 29/04/1995 até 02/05/2011 (data de emissão do documento), na condição de técnica de enfermagem (no setor centro cirúrgico), submetida a agente infecto contagioso - bactérias e vírus, sem uso de EPI eficaz, possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.3.2 e 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64, 1.3.4 e 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79, 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Da aposentadoria especial
Assim sendo, conforme tabela que acompanha o presente decisum, o cômputo de todos os interstícios laborativos notadamente especiais, até a data da postulação administrativa, em 08/09/2011, alcança 29 anos e 02 dias de labor, número além do necessário à consecução da "aposentadoria especial" vindicada.
Certo é o aproveitamento do período especial de 29/04/1995 a 02/05/2011, para fins de revisão da aposentadoria da parte autora, de "aposentadoria por tempo de contribuição" para "aposentadoria especial".
Como marco inicial dos efeitos financeiros da revisão, resta preservada a data da postulação administrativa, em 08/09/2011 (fl. 12), salientando-se, aqui, a data do aforamento da demanda em 23/09/2011 (fl. 02).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos.
Ressalto que os embargos de declaração opostos contra referido acórdão tem por escopo a modulação dos seus efeitos - atribuição de eficácia prospectiva -, sendo que a concessão de efeito suspensivo não impede o julgamento do presente recurso, haja vista que o quanto lá decidido deverá ser observado apenas no momento da liquidação deste julgado.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Repilo a alegação do INSS, no sentido de que sejam descontados valores relativos a competências em que a parte autora auferira remuneração, porque a norma contida no art. 57, §8º, da Lei de Benefícios, ao proibir o exercício de atividade especial quando o segurado estiver em gozo do benefício correspondente, visa proteger a integridade física do empregado, não devendo ser invocada em seu prejuízo, por conta da resistência injustificada do INSS.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para estabelecer que os valores em atraso serão corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, mantidos os outros ditames da r. sentença.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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