D.E. Publicado em 26/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da União e dar parcial provimento à apelação do autor para conceder-lhe a gratificação por trabalhos com raio-x, até a data de sua aposentadoria, respeitada a prescrição quinquenal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010613-11.2015.4.03.6119/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):
Trata-se de Apelações interpostas pelo autor e pela União contra sentença de fls. 112/114 e 119, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para condenar a ré "ao pagamento do adicional de insalubridade até a aposentadoria do autor (fevereiro de 2014), calculado da mesma forma que ocorria até sua cessação, com correção monetária e juros moratórios (desde citação), observada a prescrição quinquenal". Condenada a ré ao pagamento de honorários advocatícios fixados no percentual mínimo do §3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação/proveito econômico obtido pela parte autora; condenada a parte autora ao pagamento de honorários de 10% sobre metade do valor da causa, observada a gratuidade de justiça.
Em suas razões recursais (fls. 122/130), o autor requer a condenação da União ao pagamento da gratificação de raio-x, pois como médico radiologista trabalhava em ambiente sujeito a radiação ionizante, realizava exames de raio-x. Pretende indenização por danos morais, porque a suspensão do pagamento do adicional de insalubridade provocou-lhe "lesões que extrapolam os parâmetros do simples aborrecimento, constrangendo-o, diminuindo sua renda, sujeitando a condições sociais mais difíceis, não se olvidando do enriquecimento ilícito, o que justifica a reparação ao patrimônio imaterial".
Em suas razões recursais (fls. 133/143), a União alega que o autor não faz jus ao adicional de insalubridade, porque "o servidor deve ter sua exposição aos agentes físicos, químicos ou biológicos de forma permanente ou habitual", e que a supressão da verba pode ocorrer a qualquer momento, desde que verificada a inexistência de circunstâncias fáticas exigidas para a percepção. Requer a alteração da verba honorária a que condenada a parte autora, para que a condenação seja de 10% sobre o valor total da causa. Subsidiariamente, requer observância ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/2009, para a incidência da correção monetária.
Com as contrarrazões de fls. 144/151, subiram os autos a este E. Tribunal Regional.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):
Tempestivas as apelações, delas conheço.
Analiso as apelações conjuntamente, por tópicos.
Da prescrição
Conforme dispõe o artigo 1º Decreto nº 20.910/32, as dívidas da Fazenda Pública prescrevem em cinco anos.
Deve-se observar, entretanto, que se a dívida for de trato sucessivo, não há prescrição do todo, mas apenas da parte atingida pela prescrição, conforme o artigo 3º daquele ato normativo:
Na jurisprudência, a questão foi pacificada após o STJ editar a Súmula de n. 85, de seguinte teor:
Prevalece no âmbito da jurisprudência do STJ, pela sistemática do artigo 543-C do CPC, esse entendimento:
Dessa forma, o prazo prescricional é quinquenal.
Por outro lado, o requerimento administrativo tem o condão de interromper o curso do prazo prescricional, até que sobrevenha a resposta ao pedido.
Desta feita, o requerimento administrativo para o restabelecimento do adicional de insalubridade (fls. 34), datado de 23.04.2013 e recebido em 25.04.2013, fez interromper o lapso prescricional.
No entanto, dos documentos dos autos não se verifica a existência de resposta ao pedido administrativo (sendo certo que o documento de fls. 87, emitido pelo Ministério da Saúde, afirma que desde a retirada do adicional não houve o restabelecimento do pagamento), pelo que a prescrição não voltou a correr quanto ao pedido de restabelecimento do adicional de insalubridade.
Dessa forma, não há parcelas prescritas para o adicional de insalubridade, considerada a cessação de pagamento em janeiro/2010 (documento de fls. 87, 92 e 93) e o pedido administrativo em abril/2013, quando transcorreram pouco mais de três anos do lapso prescricional.
O ajuizamento da ação é de 06.11.2015 (fls. 02).
No tocante ao pedido de gratificação por trabalhos com raio-x (inexistente pedido administrativo), a prescrição quinquenal atinge as parcelas anteriores ao quinquídio legal contado da propositura da ação, ou seja, parcelas anteriores a 06.11.2010.
Do adicional de insalubridade
Não se entrevê argumentação recursal plausível para a reversão da sentença.
O adicional de insalubridade é vantagem garantida ao trabalhador pela Carta Magna, em seu artigo 7º, inciso XXIII.
Sobre o adicional postulado pela parte autora, dispõe a Lei n. 8.112/1990:
Por outro lado, a Lei n. 8.270/1991 assim dispõe:
Regulamentando a matéria, o Decreto n. 97.458/1989 disciplina:
A razão determinante da incidência do adicional é a constante, habitual e permanente sujeição a agentes agressivos, físicos, químicos ou biológicos, à saúde, sendo a finalidade desta gratificação compensar os riscos inerentes ao exercício da atividade exercida.
Colhe-se dos documentos anexados aos autos, quais sejam, perfil profissiográfico previdenciário datado de 13.09.2010 (fls. 24/25), laudo técnico individual datado de 02.12.2013 (fls. 26/28) e laudo técnico das condições ambientais do trabalho datado de 16.06.2011 (fls. 29/32) que o trabalho do autor envolve exposição a agentes agressivos (biológicos) à saúde.
O que importa para a percepção do adicional é a efetiva exposição a agentes nocivos, devidamente demonstrada pela prova documental robusta.
Portanto, descortinado pelo sólido conjunto probatório a exposição do apelado a agentes nocivos à sua saúde, o que dá ensejo ao recebimento do adicional de insalubridade.
Nesse sentido:
Logo, devido o adicional de insalubridade desde a cessação em janeiro/2010 (documentos de fls. 92 e 93) até a aposentadoria do autor, em fevereiro/2014.
Por derradeiro, cumpre salientar que a Administração submete-se, obviamente, ao princípio da legalidade e, nessa senda, suprimir adicional instituído por lei em desrespeito ao comando normativo expressa atentado a referido princípio.
Da gratificação por trabalhos com raio-x
A Lei nº 1.234/50 estabelece o direito ao recebimento de gratificação por servidores que operam com raios-x e substâncias radioativas:
Por outro lado, o artigo 12, §1º da Lei 8.270/91 discrimina o percentual para pagamento da gratificação por trabalhos com raio-x:
A gratificação de raio-x constitui pagamento específico aos que atuam expostos diretamente ao risco de radiação.
No caso dos autos, a exposição do autor a risco de radiação é demonstrada pelos seguintes documentos: perfil profissiográfico previdenciário datado de 13.09.2010 (fls. 24/25), laudo técnico individual datado de 02.12.2013 (fls. 26/28) e laudo técnico das condições ambientais do trabalho datado de 16.06.2011 (fls. 29/32).
Logo, é de se assegurar a percepção da gratificação por trabalhos com raio-x, até a aposentadoria do autor, pelo que reformo a sentença quanto ao ponto.
Nesse sentido:
Portanto, reformo a sentença para condenar a ré ao pagamento de gratificação por trabalho com raio-x, até a aposentadoria do autor, respeitada a prescrição quinquenal.
Do dano moral
A prova produzida leva à conclusão de que não estão presentes os elementos necessários à responsabilização da ré no caso concreto, quais sejam: conduta ilícita, resultado danoso e nexo de causalidade.
Dano moral, de acordo com a melhor doutrina e com o entendimento sedimentado nas cortes superiores, é a lesão a direito da personalidade. Em outros termos: corresponde a toda violação ao patrimônio imaterial da pessoa no âmbito das suas relações de direito privado. Não se confunde, no entanto, e nem poderia, sob pena de banalização do instituto, com acontecimentos cotidianos que, apesar de incomodarem, não têm aptidão para atingir, de forma efetiva, direitos da personalidade. Tais acontecimentos têm sido tratados, com acerto, pela jurisprudência, como "meros aborrecimentos", inafastáveis na sociedade contemporânea, devendo ser suportados por seus integrantes, ou punidos administrativamente, para que o instituto do dano moral não perca seu real sentido, sua verdadeira função: compensar o lesado pela violação à sua personalidade.
O autor não demonstrou a ocorrência de lesão a seu direito da personalidade, porquanto embora tenha a Administração deixado de pagar as verbas questionadas judicialmente, a situação fática não leva a um quadro de violação de direito da personalidade.
Com a devida vênia, a questão enseja a reparação material, nos termos da solução adotada neste voto.
O conjunto fático-probatório demonstra que não houve abuso por parte do réu (ilícito objetivo ou abuso de direito, segundo a melhor doutrina), o que poderia, caso constrangesse a autora em sua personalidade de forma efetiva, caracterizar o dano moral (art. 187 do Código Civil - CC).
Sobre a distinção entre meros dissabores cotidianos e dano moral, este como lesão relevante a direitos da personalidade, já se pronunciaram o Superior Tribunal de Justiça e este Tribunal Regional Federal da Terceira Região:
Logo, rejeito o pedido de indenização por dano moral.
Da correção monetária e dos juros moratórios
No que tange à correção monetária e aos juros de mora, adoto o entendimento no sentido de que, sobrevindo nova lei que altere os respectivos critérios, a nova disciplina legal tem aplicação imediata, inclusive aos processos já em curso.
Contudo, essa aplicação não tem efeito retroativo, ou seja, não alcança o período de tempo anterior à lei nova, que permanece regido pela lei então vigente, nos termos do que foi decidido pelo STJ no REsp n. 1205946/SP, DJE 02/02/2012.
Assim, as parcelas em atraso devem ser acrescidas de juros moratórios, incidentes desde a citação, e atualizadas monetariamente da seguinte forma:
a) até a MP n. 2.180-35/2001, que acresceu o art. 1º-F à Lei n. 9.494/97, deve incidir correção monetária, desde os respectivos vencimentos, pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, e juros de mora à razão de 1% ao mês;
b) a partir da MP n. 2.180-35/2001 e até a edição da Lei n. 11.960/2009 deve incidir correção monetária, desde os respectivos vencimentos, pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, e juros de mora à razão de 0,5% ao mês;
c) a partir de 01/07/2009, nos casos de condenação da Fazenda Pública oriunda de relação jurídica não-tributária, adoto o entendimento do e. Supremo Tribunal Federal, que no julgamento do RE 870.947, recurso em que se reconheceu repercussão geral, declarou a constitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, no que alude à fixação de juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, porém, na parte em que disciplina a atualização monetária, reconheceu sua inconstitucionalidade por ser inadequada a capturar a variação de preços da economia, aplicando, portanto, o índice IPCA-E, previsto no Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal e que melhor reflete a inflação acumulada no período.
Da verba sucumbencial
Custas ex lege.
Cada parte deve arcar com os honorários sobre o montante de sua sucumbência.
O autor fez três pedidos na inicial: pagamento de adicional de insalubridade, de gratificação por trabalho com raio-x e de indenização por dano moral.
A União deve suportar os honorários advocatícios sobre os valores devidos ao autor a título de adicional de insalubridade (desde a cessação do pagamento em janeiro/2010 até a aposentadoria do autor em fevereiro/2014) e a título de gratificação por trabalhos com raio-x (de 06.11.2010 até a data da aposentadoria em fevereiro/2014).
Dessa forma, considerando também a vitória do autor em sede recursal acerca do pedido de pagamento da gratificação por trabalhos com raio-x, majoro os honorários estipulados na sentença para 15% sobre os valores devidos ao autor a título de adicional de insalubridade e a título de gratificação por trabalhos com raio-x, nos termos do art. 85, §3º, I, e §11º do CPC/2015.
Os honorários devidos pelo autor referem-se à manutenção de sua sucumbência acerca do pedido indenizatório por dano moral.
A petição inicial não indica sequer um montante mínimo de dano moral, pretendendo o autor que o Juízo o arbitre.
Dessa forma, o valor do dano moral revela-se inestimado, a fazer incidir o §8º do art. 85 do CPC/2015, ensejando a fixação dos honorários advocatícios de maneira equitativa.
Assim, diante do trabalho do causídico e do tempo dispendido para o labor, estabeleço os honorários advocatícios devidos pelo autor em R$ 2.000,00 (dois mil reais).
Dispositivo
Ante o exposto, nego provimento à apelação da União e dou parcial provimento à apelação do autor para conceder-lhe a gratificação por trabalhos com raio-x, até a data de sua aposentadoria, respeitada a prescrição quinquenal.
É o voto.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | HELIO EGYDIO MATOS NOGUEIRA:10106 |
Nº de Série do Certificado: | 68D9614EDFBF95E3 |
Data e Hora: | 21/03/2018 14:35:23 |