Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6236840-10.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/05/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AFASTAMENTO DO ÓBICE DA COISA JULGADA. PREVIDENCIÁRIO.
MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA
RECONHECIDA. POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE
AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO.
- Reconhecida alteração do quadro fático, com a concessão de benefício previdenciário no âmbito
administrativo, não há que se falar na ocorrência de litispendência, sobretudo na presente
demanda, ajuizada em data anterior à segunda, ou mesmo de litigância de má-fé.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses) -
é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com as
condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora atestadas,
ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada pela lei a
realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para que se avalie
a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei n.º 8.213/91.
- Recurso improvido.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6236840-10.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO MOREIRA BANDEIRA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6236840-10.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO MOREIRA BANDEIRA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença
previdenciário, desde a data do requerimento administrativo (9/11/2015).
O juízo a quo julgou procedente o pedido para conceder ao autor o benefício de auxílio-doença
previdenciário, desde a data do requerimento administrativo, deferindo a antecipação dos
efeitos da tutela. Determinou o pagamento das prestações vencidas de uma só vez, corrigidas
monetariamente “desde a data em que os valores deveriam ter sido pagos de acordo com a
Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e acrescido de juros legais de
mora desde a citação previstos pelo artigo 1º-Fda Lei nº 9494/97, haja vista que o STF declarou
inconstitucional por arrasto o art. 5º da Lei 11.960/09 somente quanto à expressão "índice oficial
de remuneração básica da caderneta de poupança", de modo que quanto aos juros a
disposição que remete à taxa praticada no regime das cadernetas de poupança permanece
hígida (cf. STJ, AgRg AResp. 550.200 - PE)”. Por fim, condenou o INSS ao pagamento de
honorários advocatícios arbitrados em dez por cento “do valor atualizado da causa”.
Apela, o INSS, suscitando, preliminarmente, o reconhecimento da coisa julgada, em virtude de
ajuizamento anterior de processo análogo junto ao Juizado Especial Federal (n.º 0001453-
09.2017.4.03.6307) e, no mérito, a integral reforma da sentença, sustentando, em síntese, o
não cumprimento dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, pleiteia a
modificação do termo de início do benefício, dos índices fixados para correção monetária e
juros de moro e a redução da verba honorária.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6236840-10.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO MOREIRA BANDEIRA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Preliminarmente, no tocante ao reconhecimento da coisa julgada ou litispendência, anote-se
que a autora ajuizou a presente demanda em 20/5/2016 e, posteriormente, com a concessão
administrativa do benefício de auxílio-doença previdenciário n.º 614.983.694-4, com DIB em
06/07/2016 (Id. 110449383, p. 8), ingressou com nova ação no Juizado Especial Federal de
Botucatu objetivando a conversão deste em aposentadoria por invalidez (n.º 000143-
09.2017.4.03.6307).
Assim, embora tenham sido ajuizadas duas ações em virtude de potencial incapacidade
laborativa que acomete a autora, em curto espaço de tempo, possível extrair dos elementos de
provas acostados aos autos que houve alteração no quadro fático.
Nos termos do art. 505 do Código de Processo Civil, tratando-se de relação jurídica
continuativa, caso sobrevenha modificação no estado de fato ou de direito a parte pode pedir
revisão do disposto na sentença.
In casu, com a concessão administrativa do benefício de auxílio-doença, em data posterior ao
ajuizamento da presente demanda, houve nítida alteração no estado de fato, razão pela qual
não há que se falar na ocorrência de litispendência, muito menos de litigância de má-fé.
De rigor, portanto, a rejeição da preliminar ventilada, sem prejuízo de nova avaliação da
questão, pelo juízo natural do feito de registro n.º 000143-09.2017.4.03.6307, ajuizado
posteriormente.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e
seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de
segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do
cumprimento da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e
definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação
habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a
possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu
durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE
MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos
arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado
no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102
da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de
continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa.
Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível o recolhimento de, pelo
menos, seis meses, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos
do art. 27-A da Lei de Benefícios.
Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma
lei, a saber:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social
depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
DO CASO DOS AUTOS (INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA)
Para comprovar o requisito da qualidade de segurada, a autora acostou CTPS da qual se infere
o registro de contratos de trabalho nos períodos de 21/8/1986 a 27/9/1988, 1º/4/1990 a
30/11/1991, 3/12/1991 a 6/10/1994, 1º/2/1995 a 30/8/2003, 3/5/2004 a 30/4/2008 e de
24/4/2008 a 29/1/2015 (Id. 110449349).
Informações colhidas do extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) e do
Sistema Único de Benefícios DATAPREV, por sua vez, revelam que o autor recebeu benefício
previdenciário de auxílio-doença de 26/9/2003 a 9/2/2004, 15/8/2004 a 12/1/2007 e de
9/10/2009 a 22/11/2009 (Id. 110449350).
Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando
demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurada, nos termos do art. 15, inciso II,
§ 1.º, da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 20/5/2016.
Demonstrado, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de doze contribuições
previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91).
No concernente à incapacidade, consta do laudo médico pericial acostado aos autos em
10/3/2017, que o autor apresenta quadro clínico de “convulsão, varizes de membros inferiores e
cifoescoliose leve”, registrando, o Sr. Perito, tratar-se de “autor de 49 anos, com histórico de
epilepsia de difícil controle, ainda sob investigação, não apresenta no momento capacidade
para trabalho devendo ser reavaliado posteriormente com exame complementar solicitado pelo
neurologista e diagnóstico definitivo”. Deixou de fixar o termo de início da incapacidade
laborativa, asseverando a inexistência de elementos de prova a subsidiar as alegações do
examinando sobre sua incapacidade para o exercício de atividades laborativas desde 2003 (Id.
110449368).
Desse modo, constatada a incapacidade temporária para o exercício de atividades laborativas,
o conjunto probatório restou suficiente para reconhecer o direito da parte autora ao auxílio-
doença.
O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora
atestadas, ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada
pela lei a realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para
que se avalie a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do artigo 101 da
Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (9/11/2015),
ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data
do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do
Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para
Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a
rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
À vista do quanto previsto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença
ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com
observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como
no art. 86 do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência
(STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em
sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou
acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.
O benefício é de auxílio-doença previdenciário, com renda mensal correspondente a 91%
(noventa e um por cento) do salário-de-benefício e DIB em 9/11/2015 (data do requerimento
administrativo).
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e nego provimento ao recurso.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AFASTAMENTO DO ÓBICE DA COISA JULGADA. PREVIDENCIÁRIO.
MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA
RECONHECIDA. POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE
AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO.
- Reconhecida alteração do quadro fático, com a concessão de benefício previdenciário no
âmbito administrativo, não há que se falar na ocorrência de litispendência, sobretudo na
presente demanda, ajuizada em data anterior à segunda, ou mesmo de litigância de má-fé.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses)
- é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com
as condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora
atestadas, ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada
pela lei a realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para
que se avalie a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei
n.º 8.213/91.
- Recurso improvido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e negar provimento ao recurso, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
