
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010710-32.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
AGRAVANTE: ANGELA SCAVAZZINI MARCONDES CORREIA
Advogados do(a) AGRAVANTE: ELENICE PAVELOSQUE GUARDACHONE - PR72393-A, JOSI PAVELOSQUE - SP357048-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010710-32.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
AGRAVANTE: ANGELA SCAVAZZINI MARCONDES CORREIA
Advogados do(a) AGRAVANTE: ELENICE PAVELOSQUE GUARDACHONE - PR72393-A, JOSI PAVELOSQUE - SP357048-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo de instrumento interposto por ANGELA SCAVAZZINI MARCONDES CORREIA em face de r. decisão que, em sede de ação previdenciária, indeferiu o pedido de concessão aos benefícios da assistência judiciária gratuita.
Na minuta recursal, aduz a agravante que, apresentada a declaração de hipossuficiência nos termos dos artigos 98 e seguintes do CPC, é impositiva a concessão do benefício pleiteado. Argumenta que o magistrado somente poderia ter deixado de deferir a gratuidade de justiça caso estivesse comprovada nos autos as condições da agravante arcar com as despesas processuais. Sustenta não terem sido considerados a idade, os documentos juntados, e demais critérios socioeconômicos que englobam a vida da autora. Indica Lei estadual do Rio de Janeiro (Lei estadual nº 3.350/1999) para apontar os critérios a serem observados no presente caso.
Requereu a concessão de efeito suspensivo e o provimento do presente agravo.
Conforme decisão ID 293676468, a antecipação de tutela recursal foi indeferida.
Devidamente intimado, o INSS deixou de ofertar contraminuta.
É o relato do essencial.
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010710-32.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
AGRAVANTE: ANGELA SCAVAZZINI MARCONDES CORREIA
Advogados do(a) AGRAVANTE: ELENICE PAVELOSQUE GUARDACHONE - PR72393-A, JOSI PAVELOSQUE - SP357048-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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V O T O
Da decisão agravada, destacam-se os seguintes fundamentos:
“Indefiro a AJG.
A parte autora aufere mensalmente proventos de pensão por morte de R$ 4.911,10, aposentadoria de R$ 1.477,83 e recolhe na qualidade de contribuinte individual observando o salário de contribuição de R$ 1.412,00, num total superior a R$ 7.700,00, conforme CNIS.
Diante da ausência de regra específica para ações previdenciárias deve ser aplicada a analogia (art. 4º, LINDB), o que atrai a incidência do artigo 790 da CLT, que estabeleceu como parâmetro objetivo para a concessão da AJG a percepção de salário em valor igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, o que atualmente equivale ao montante de R$ 3.114,40.
(...)
Dessa maneira, determino a intimação do representante judicial da parte autora, a fim de que, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, caso não haja desistência da ação, proceda ao recolhimento de custas processuais, sob pena de indeferimento da exordial e cancelamento da distribuição.
Após, voltem conclusos.”
Pois bem.
O artigo 5º, LXXIX, da Constituição da República estendeu, de forma ampla, a fruição da gratuidade judiciária por todos aqueles que comprovarem insuficiência de recursos.
O Código de Processo Civil veicula, em seu artigo 98, que a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos ao pagamento das custas, das despesas processuais e dos honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
A prova da situação de insuficiência, necessária à gratuidade da justiça, deve observar o disposto pelos §§ 2º e 3º do artigo 99 do CPC. É possível aceitar a declaração da pessoa natural no sentido de que não pode arcar com os custos do processo sem comprometer o sustento de sua família (artigo 99, § 3º, CPC), presumindo-a verdadeira.
Trata-se, à evidência, de presunção relativa (juris tantum), pois a própria lei processual prevê que o magistrado - a quem cabe repelir fraudes e deslealdades processuais – pode perscrutar o merecimento da gratuidade, sobremaneira porque a Constituição Federal reserva o benefício aos que realmente necessitam.
Segundo o artigo 99, §3º, do CPC, a declaração de pobreza subscrita por pessoa natural tem presunção de veracidade, com a desnecessidade de prévia comprovação, comportando relativização em duas hipóteses: a) de imediato pelo juiz, quando houver indícios substanciais de rendimento incompatível, após a dedução objetiva de despesas próprias a um médio padrão de vida (alimentação, vestuário, saúde, educação, entre outras); e b) mediante demonstração de capacidade financeira pela parte contrária, em sede de impugnação formal ao pedido de justiça gratuita.
Assim, o simples volume da renda não é suficiente para destruir a presunção de veracidade que cerca a declaração de pobreza. Ele precisa ser flagrante para que o juiz indefira de imediato o pedido ou exija documentação comprobatória da carência de recursos.
O Superior Tribunal de Justiça, embora tenha afetado controvérsia relativa à validade do uso de critérios puramente objetivos para a aferição da hipossuficiência na concessão de gratuidade da justiça (Tema 1.178), já tinha precedentes que descartam o emprego da renda como fator exclusivo de análise:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUSTIÇA GRATUITA. CRITÉRIOS OBJETIVOS FIXADOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. RENDA LÍQUIDA MENSAL. INADEQUAÇÃO. RETORNO DOS AUTOS. NECESSIDADE DE PARTICULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO DA PARTE.
I - o Tribunal de origem adotando critério objetivo, qual seja, a renda líquida da ora embargante, sem aferir outros eventuais gastos, afastou a concessão da assistência judiciária gratuita.
II - Esse entendimento está em confronto com os mais recentes julgados desta Corte Superior, no sentido de que a hipossuficiência financeira da parte deve ser aferida de acordo com um conjunto de condições factualmente aferíveis, de acordo com a situação particular de cada litigante, mediante exame do contexto fático, não podendo-se estipular parâmetros objetivos, como a faixa de renda percebida, tão somente (EDcl no REsp n. 1.803.554/CE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 12/5/2020; AgRg no AREsp n. 239.341/PR, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 27/8/2013, DJe 3/9/2013).
III - Embargos acolhidos, com efeitos modificativos, para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que, aferindo-se a situação concreta da parte litigante, particularize os motivos do deferimento ou indeferimento da assistência judiciária gratuita, como lhe aprouver, nos termos da fundamentação deste acórdão.
(Edcl no AgInt no AResp 1538432, Segunda Turma, DJ 29/11/2021).
A Décima Turma deste Tribunal possui também precedentes na mesma direção:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. ANÁLISE INDIVIDUALIZADA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE.
1) Para o deferimento do benefício almejado, mostra-se inadequada a utilização de critérios exclusivamente objetivos, sendo de rigor realizar uma avaliação concreta e individualizada da situação econômica da parte requerente.
2) Para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, basta que a parte interessada apresente declaração no sentido de não possuir condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, cabendo à parte contrária o ônus de elidir a presunção de veracidade daí surgida, mediante instauração do incidente de impugnação à AJG.
3) No caso em tela, além de ter sido apresentada declaração de pobreza, os documentos acostados aos autos revelam que o autor se encontra desempregado e que os rendimentos líquidos decorrentes do benefício previdenciário de que é titular não possuem valor expressivo, não havendo qualquer elemento que demonstre a inexistência da alegada insuficiência financeira para custeio da demanda, deve ser concedido o benefício da Justiça gratuita.
4) Agravo de instrumento da parte autora provido.
(AI 5006067-31.224.4.03.0000, DJ 26/06/2024).
Em exame da decisão agravada, verifica-se que o Juízo de Origem relativizou a declaração de pobreza e indeferiu o pedido de justiça gratuita com base na mera obtenção de renda mensal que gira em torno de R$ 7.700,00. Não se trata, porém, de rendimento flagrantemente incompatível com o benefício quando consideradas as despesas que um médio padrão de vida impõe objetivamente – educação, saúde, alimentação, vestuário.
Assim, à míngua de outros elementos que infirmem a declaração de pobreza, o que poderá ser realizado pela parte adversa, se o caso, a concessão da gratuidade de justiça é medida cabível na espécie.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para conceder a gratuidade de justiça, na forma da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. JUSTIÇA GRATUITA. DEFERIMENTO. RECURSO PROVIDO.
1. A declaração de pobreza subscrita por pessoa natural tem presunção de veracidade, com a desnecessidade de prévia comprovação, comportando relativização em duas hipóteses: a) de imediato pelo juiz, quando houver indícios substanciais de rendimento incompatível, após a dedução objetiva de despesas próprias a um médio padrão de vida (alimentação, vestuário, saúde, educação, entre outras); e b) mediante demonstração de capacidade financeira pela parte contrária, em sede de impugnação formal ao pedido de justiça gratuita.
2. O simples volume da renda não é suficiente para destruir a presunção de veracidade que cerca a declaração de pobreza. Ele precisa ser flagrante para que o juiz indefira de imediato o pedido ou exija documentação comprobatória da carência de recursos.
3. O Superior Tribunal de Justiça, embora tenha afetado controvérsia relativa à validade do uso de critérios puramente objetivos para a aferição da hipossuficiência na concessão de gratuidade da justiça (Tema 1.178), já tinha precedentes que descartam o emprego da renda como fator exclusivo de análise
4. À míngua de outros elementos que infirmem a declaração de pobreza, o que poderá ser realizado pela parte adversa, se o caso, a concessão da gratuidade de justiça é medida cabível na espécie.
5. Agravo de instrumento provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
