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Data da publicação: 08/08/2024, 19:45:19

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CPC/2015. CURSO TÉCNICO INTEGRADO COM O ENSINO MÉDIO. BUROCRACIA DA EDUCAÇÃO. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. Trata-se de AGRAVO INTERNO interposto por GIOVANNA ALVES CALSE, nos termos do artigo 1.021 do CPC/2015, contra decisão monocrática proferida em 27/7/2020 que deu provimento à apelação do INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO, com o fim de reformar a r. sentença de procedência, e indeferir o pedido de matrícula da autora em curso técnico integrado com o ensino médio. 2. Restou demonstrado nos autos que a agravante, no propósito de não atrasar a sua trajetória escolar e não ser prejudicada em sua formação educacional, cursou somente o primeiro ano do ensino fundamental em escola privada, no ano de 2010, por conta da negativa de acesso à rede pública municipal ensejada pela burocracia da educação, sendo um verdadeiro absurdo que, muitos anos depois, o Poder Público lhe negue acesso à instituição federal de ensino médio-técnico por esse motivo. 3. Se a menor foi matriculada em fevereiro de 2019 no curso de duração máxima de três anos, é óbvio que até a data presente (29.04.2021) ela já se encontra bem avançada no período escolar, não tendo qualquer sentido truncar a vida discente de uma jovem que confiou no tirocínio do Judiciário. Não há o menor sentido em, quase dois anos depois, expurgá-la do corpo discente da instituição escolar federal, negando-lhe o direito de completar seus estudos, obrigando-a a sair à cata de outros lugares para estudar, sabido que se trata de moça de origem humilde, a quem o Estado deve amparar e não prejudicar. 4. Agravo interno provido. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000673-37.2019.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 02/06/2021, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

5000673-37.2019.4.03.6105

Relator(a) para Acórdão

Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO

Relator(a)

Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO

Órgão Julgador
6ª Turma

Data do Julgamento
02/06/2021

Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2021

Ementa


E M E N T A


PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CPC/2015. CURSO TÉCNICO
INTEGRADO COM O ENSINO MÉDIO. BUROCRACIA DA EDUCAÇÃO. PRINCÍPIO DA
SEGURANÇA JURÍDICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO.
1. Trata-se de AGRAVO INTERNO interposto por GIOVANNA ALVES CALSE, nos termos do
artigo 1.021 do CPC/2015, contra decisão monocrática proferida em 27/7/2020 que deu
provimento à apelação do INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
DE SÃO PAULO, com o fim de reformar a r. sentença de procedência, e indeferir o pedido de
matrícula da autora em curso técnico integrado com o ensino médio.
2. Restou demonstrado nos autos que a agravante, no propósito de não atrasar a sua trajetória
escolar e não ser prejudicada em sua formação educacional, cursou somente o primeiro ano do
ensino fundamental em escola privada, no ano de 2010, por conta da negativa de acesso à rede
pública municipal ensejada pela burocracia da educação, sendo um verdadeiro absurdo que,
muitos anos depois, o Poder Público lhe negue acesso à instituição federal de ensino médio-
técnico por esse motivo.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

3. Se a menor foi matriculada em fevereiro de 2019 no curso de duração máxima de três anos, é
óbvio que até a data presente (29.04.2021) ela já se encontra bem avançada no período escolar,
não tendo qualquer sentido truncar a vida discente de uma jovem que confiou no tirocínio do
Judiciário. Não há o menor sentido em, quase dois anos depois, expurgá-la do corpo discente da
instituição escolar federal, negando-lhe o direito de completar seus estudos, obrigando-a a sair à
cata de outros lugares para estudar, sabido que se trata de moça de origem humilde, a quem o
Estado deve amparar e não prejudicar.
4. Agravo interno provido.

Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000673-37.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: G. A. C.

REPRESENTANTE: EDSON CALSE

Advogado do(a) APELANTE: LUIGGI ROGGIERI - SP342895-A

APELADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DE SAO
PAULO


OUTROS PARTICIPANTES:






APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000673-37.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: G. A. C.
REPRESENTANTE: EDSON CALSE
Advogado do(a) APELANTE: LUIGGI ROGGIERI - SP342895-A
APELADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DE SAO
PAULO

OUTROS PARTICIPANTES:





R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo interno interposto porGIOVANNA ALVES CALSE, contra a decisão
monocrática prolatada nos seguintes termos:
"Trata-se deapelaçãodo INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
DE SÃO PAULO, nos autos de ação ordinária objetivando que o réu, ora recorrente, promova a
matrícula da autora emCurso Técnico integrado com o Ensino Médio.
A r. sentença de origem julgou procedente o pedido, confirmando a tutela antecipada
anteriormente deferida, para condenar o Instituto a efetuara matrícula daautora no Curso
Técnico de Informática Integrado com o Ensino Médio e a franquear o acesso às aulas e
demais atividades acadêmicas, promovendo o seu registro de presença e notas. Condenou o
réu ao pagamento de honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa. Sem reexame
necessário. Custasex lege.
É o relatório. Decido.
De início, cumpre explicitar que o art. 932, IV e V do CPC de 2015 confere poderes ao Relator
para, monocraticamente, negar e dar provimento a recursos.
Ademais, é importante clarificar que, apesar de as alíneas dos referidos dispositivos elencarem
hipóteses em que o Relator pode exercer esse poder, o entendimento da melhor doutrina é no
sentido de que o mencionado rol émeramente exemplificativo.
Manifestando esse entendimento, asseveram Marinoni, Arenhart e Mitidiero:
“Assim como em outras passagens, o art. 932 do Código revela um equívoco de orientação em
que incidiu o legislador a respeito do tema dos precedentes. O que autoriza o julgamento
monocrático do relator não é o fato de a tese do autor encontrar-se fundamentada em
"súmulas" e "julgamento de casos repetitivos" (leia-se, incidente de resolução de demandas
repetitivas, arts. 976 e ss., e recursos repetitivos, arts. 1.036 e ss.) ou em incidente de
"assunção de competência". É o fato de se encontrar fundamentado em precedente do
Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em jurisprudência formada nos
Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais em sede de incidente de resolução de
demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência capaz de revelar razões
adequadas e suficientes para solução do caso concreto. O que os preceitos mencionados
autorizam, portanto, é o julgamento monocrático no caso de haver precedente do STF ou do
STJ ou jurisprudência firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em
incidente de assunção de competência nos Tribunais de Justiça ou nos Tribunais Regionais
Federais. Esses precedentes podem ou não ser oriundos de casos repetitivos e podem ou não
ter adequadamente suas razões retratadas em súmulas.” ("Curso de Processo Civil", 3ª e., v. 2,
São Paulo, RT, 2017).
Os mesmos autores, em outra obra, explicam ainda que"a alusão do legislador a súmulas ou a
casos repetitivos constitui apenas um indício - não necessário e não suficiente - a respeito da
existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida.O que interessa para

incidência do art. 932, IV, a e b, CPC, é que exista precedente sobre a matéria - que pode ou
não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos
repetitivos"("Novo Código de Processo Civil comentado", 3ª e., São Paulo, RT, 2017, p. 1014,
grifos nossos).
Também Hermes Zaneti Jr. posiciona-se pela não taxatividade do elenco do art.932, incisos IV
e V (Poderes do Relator e Precedentes no CPC/2015: perfil analítico do art.932, IV e V, in "A
nova aplicação da jurisprudência e precedentes no CPC/2015: estudos em homenagem à
professora Teresa Arruda Alvim", Dierle José Coelho Nunes, São Paulo, RT, 2017, pp. 525-
544).
Nessa linha, o STJ, antes mesmo da entrada em vigor do CPC/2015, aprovou a Súmula 568
com o seguinte teor:"O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar
ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema".
Veja-se que a expressãoentendimento dominanteaponta para a não taxatividade do rol em
comento.
Além disso, uma vez que a decisão singular do relator é recorrível por meio de agravo interno
(art. 1.021, caput, CPC/15), não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode
ser provocada a se manifestar por meio do referido recurso. Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, DO CPC). APOSENTADORIA
ESPECIAL. APLICAÇÃO DO ART. 932 DO CPC PERMITIDA. TERMO INICIAL FIXADO NA
DATA DA CITAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA COM LAUDO JUDICIAL.
INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO SINGULAR DO RELATOR. CABIMENTO. - O
denominado agravo interno (artigo Art. 1.021 do CPC/15) tem o propósito de impugnar
especificadamente os fundamentos da decisão agravada e, em caso de não retratação, possa
ter assegurado o direito de ampla defesa, com submissão das suas impugnações ao órgão
colegiado, o qual, cumprindo o princípio da colegialidade, fará o controle da extensão dos
poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida, não se
prestando, afora essas circunstâncias, à rediscussão, em si, de matéria já decidida, mediante
reiterações de manifestações anteriores ou à mingua de impugnação específica e
fundamentada da totalidade ou da parte da decisão agravada, objeto de impugnação. - O termo
inicial do benefício foi fixado na data da citação, tendo em vista que a especialidade da
atividade foi comprovada através do laudo técnico judicial, não havendo razão para a
insurgência da Autarquia Federal. - Na hipótese, a decisão agravada não padece de qualquer
ilegalidade ou abuso de poder, estando seus fundamentos em consonância com a
jurisprudência pertinente à matéria devolvida a este E. Tribunal. - Agravo improvido.”
(ApReeNec 00248207820164039999, DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN,
TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/10/2017)
Assim, passo a proferir decisão monocrática, com fulcro no artigo 932, IV e V do Código de
Processo Civil de 2015.
O apelo comportaprovimento.
Cinge-se a controvérsia sobre a negativa de matrícula em instituição de ensino federal, em
razão deter a autora cursado partedo ensino fundamental em escola particular.
De acordo com o art. 4º da Lei 12.711/12, as instituições federais de ensino médio

técnicoreservarão, em cada concurso, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas
somente para estudantes que cursaramintegralmenteo ensino fundamental em escolas
públicas.
Assim dispõe a Lei 12.711/2012:
Art. 4º As instituições federais de ensino técnico de nível médio reservarão, em cada concurso
seletivo para ingresso em cada curso, por turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas
vagas para estudantes que cursaram integralmente o ensino fundamental em escolas públicas.
Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata ocaputdeste artigo, 50% (cinquenta
por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou
inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio)per capita.
Pois bem.
Sendo critério imprescindível para concorrer a uma vaga na instituição federala realização do
ensino fundamentalintegralmente em escolas públicas, se não preenchido o requisitoa
candidatanãoencontra respaldo paraingressar nas vagas destinadas às cotas sociais.
O C. STJ já firmou entendimento nessesentido:
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. SISTEMA DE COTAS. AUTONOMIA
UNIVERSITÁRIA. ALUNO QUE CURSOU MAIS DA METADE DO ENSINO FUNDAMENTAL
EM ESCOLA PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE DE CRIAÇÃO DE SITUAÇÕES SUBJETIVAS
PELO JUDICIÁRIO. PRECEDENTES.Orientação adotada pela jurisprudência do STJ é no
sentido de que as normas que regulam o sistema de reserva de vagas e impõem como critério a
realização do ensino fundamental e médio exclusivamente em escola pública não podem ser
interpretadas extensivamente para abarcar instituições de ensino particulares, sob pena de
inviabilizar o fim buscado por meio da ação afirmativa.Precedentes.Agravo regimental
improvido.(AgRg no REsp 1453356/PB, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, julgado em 21/10/2014, DJe 29/10/2014)
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. INSTITUIÇÃO PRIVADA DE ENSINO. ALUNO
BOLSISTA. SISTEMA DE COTAS. INDEFERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE
EQUIPARAÇÃO.1. Hipótese em que o Tribunal local decidiu que aquele que frequentou
instituição privada de ensino, mesmo na condição de bolsista, não foi prejudicado pela baixa
qualidade do ensino das escolas públicas de nível médio e fundamental, razão pelo qual
indeferiu o benefício de cotas. 2. Orientação adotada pelo Tribunal de origem está em
consonância com a jurisprudência do STJ, de que as normas que regulam o sistema de reserva
de vagas e impõem como critério a realização do ensino fundamental e médio exclusivamente
em escola pública não podem ser interpretadas extensivamente para abarcar instituições de
ensino particulares, sob pena de inviabilizar o fim buscado por meio da ação afirmativa.3.
Agravo Regimental não provido. (AGResp 1443440/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin,
SEGUNDA Turem, JULGADO EM 20/05/2014, DJe 20/06/2014)
In casu, é incontroverso o fato daautora ter cursado o primeiro ano do ensino fundamental em
escola particular, de modo que não há ilegalidade na recusa em efetivar a matrículana referida
instituição.
Nesse sentido também os julgados desta E. Corte Regional,verbis:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. ART. 557 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ENSINO

SUPERIOR.ALUNOQUE CURSOU ENSINO MÉDIO COMOBOLSISTAEM ENTIDADE
PRIVADA. VAGA POR MEIO DOSISTEMADECOTAS.IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO
DESPROVIDO.1. A Lei n.º 12.711, de 29 de agosto de 2012 - que define a política decotasnas
instituições de ensino superior por meio da reserva de vagas - estabelece como critério para
concorrer nessesistemaque o estudante tenha realizado o ensino médio exclusivamente em
escolas públicas, não havendo espaço para abrigaralunooriundo de instituições de
ensinoparticular,mesmo aquele que tenha cursado o ensino médio na condição
debolsista.Precedentes. 2. No presente caso, o fato de a agravante ter cursado em
escolaparticular,porém com bolsa de 50%, retira-lhe a possibilidade de concorrer a vagas
reservadas conforme estabelecido por referido diploma, haja vista que o discrímen não é a
condição de ter sidobolsistaem instituiçãoparticular,mas, sim, preencher o requisito de ter
realizado integralmente o ensino médio em escola pública . 3. Agravo desprovido.(TRF 3ª
Região, TERCEIRA TURMA, AI 00018068920164030000, Desembargador Federal NELTON
DOS SANTOS, julgado em 17/03/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 30/03/2016)
Desta feita, deve prevalecer o entendimento de que o regime de cotas nãocomportaexceções,
vez que pode desestruturar o próprio sistema de distribuição de vagas.
Isto posto, deve a r. sentençaa quoser reformada, nos termos desta fundamentação.
Ante o exposto,douprovimento à apelação do Instituto requerido, com o fim de reformar a r.
sentença de origem, para indeferir o pedido exordial,revogar a tutela antecipada outrora
conferida em favor da autora, bem como inverter o ônus da sucumbência.
Publique-se. Intime-se."

A parte agravada apresentou contrarrazões.

É o relatório do essencial.








PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região6ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000673-37.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
RELATOR P/ACÓRDÃO: Gab 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO
APELANTE: G. A. C.
REPRESENTANTE: EDSON CALSE
Advogado do(a) APELANTE: LUIGGI ROGGIERI - SP342895-A
APELADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DE SAO
PAULO

OUTROS PARTICIPANTES:





V O T O
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo:

Cinge-se a controvérsia sobre a negativa de matrícula de GIOVANNA ALVES CALSE no curso
técnico de informática integrado com o ensino médio, no INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO – IFSP, em razão de a autora ter
cursado a primeira série do ensino fundamental em escola particular.
1. A agravante não pôde ingressar na escola pública de Capivarí/SP porque, conforme
informado pela secretaria de educação municipal, “Segundo lista de matrículas de aluno da
Secretaria Escolar Digital da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, plataforma on-
line que centraliza as operações da administração escolar envolvendo as esferas estadual e
municipal, a aluna Giovanna Alves Calse, nascida em 21 de abril de 2004, cursou o 1º ano do
ensino fundamental especificamente no ano de 2010, conforme documento anexo. Ocorre que
2010 foi o prazo para que todos os sistemas de ensino implantassem o ensino fundamental de
nove anos, conforme a Lei nº 11.274/06 e de acordo com a orientação do Parecer CNE/CEB nº
04/2008, também anexo, prevendo data-corte de matrícula o ‘início do ano letivo’. Sendo assim,
entende-se que a aluna procurou a rede municipal de ensino para matrícula no ano específico
de 2010, cuja regulamentação esteve sob as normas da legislação acima citada e as diretrizes
da Resolução SEMEC nº 01/2010, também anexa, que determinava a garantia de matrícula na
pré-escola, e anos subsequentes, até 28 de fevereiro no ano da referida matrícula.
Esclarecemos, portanto, que diante das informações prestadas, a interessada, que não contava
com 6 anos completos até fevereiro de 2010, recebeu orientação oficial de não ter matrícula
realizada no 1º ano na rede municipal de ensino de Capivari”. (destaquei).
Ao sentenciar, o d. Magistrado assim fundamentou seu convencimento favorável à impetrante-
agravante “... a autora comprova que a negativa à sua matrícula decorreu exclusivamente do
fato de haver cursado a primeira série do Ensino Fundamental em escola privada.Também não
se revela razoável que o Estado invoque em desfavor do estudante um fato a que ele mesmo,
em passado distante, tenha dado causa”.
Ora, está claro que a agravante cursou apenas um ano de escola privada em 2010 por conta da
negativa de acesso à rede pública municipal ensejada pela burocracia da educação, que volta-
e-meia prejudica a vida dos alunos.
É claro, também, que a aluna não ingressou na escola privada para lá permanecer ou porque a
família queria; a renda “per capita” da família em 2018, quando a menor tentou seu ingresso no
estabelecimento agravado era de pouco mais de seiscentos reais, pelo que se verifica que é
arrematado absurdo supor que em 2010 a família tinha renda suficiente para manter a filha na
rede privada. Só se passassem fome.

A menor, nascida em 2004, tentou a rede privada – acredito que com os sacrifícios
mencionados na inicial – para não atrasar a sua vida escolar, já que a rede municipal não
aceitava crianças como ela.
Foi justa a escolha da família por colocá-la um ano na escola privada, sendo certo que o
fizeram para assegurar o início da educação formal da criança “oportuno tempore”, já que se
achava impedida de iniciá-la na rede pública por determinação do próprio Poder Público.
O absurdo revelado neste processo é completo e doloroso: uma criança é impedida de
frequentar a escola fundamental por ato do Poder Público – a família consegue fazê-la estudar
em escola privada para que a criança não seja prejudicada na sua formação educacional –
muitos anos depois o Poder Público nega-lhe (por lei) acesso a instituição federal de ensino
médio-técnico porque a menina precisou cursar um único ano de escola particular.
É o nonsense total, bem característico da impertinência na área educacional brasileira, que vem
de décadas.
Cabe ao Judiciário prestigiar a decisão de 1º grau que buscou colmatar essa balbúrdia.
2. Um segundo ponto merece reflexão diante do princípio da segurança jurídica, tão alardeado
nos tempos que vivemos (normalmente em favor das empresas e dos que se dão bem na vida)
e que deve se estender a todos os brasileiros, especialmente aos desvalidos de fortuna.
Ocurso médio técnicoalmejado pela agravante dura três anos e, ao se formar nesse tipo
decurso, o aluno recebe dois certificados: o certificado de conclusão do ensino médio e o
diploma detécnico. Aduraçãodocurso técnicointegrado é de três anos e a escolha da formação
técnica precisa ser feita logo no processo seletivo.
Sucedeu que a menor foi aprovada e chamada para o curso técnico de informática. Recebeu
protocolo de matrícula em 15.01.2019; a matrícula foi indeferida, houve recurso e a decisão foi
proferida em 29.01.2019.
As aulas iniciaram-se em 04/02/2019.
Em 15.02.2019 o d. Juízo, em plantão, deferiu a tutela de urgência (art. 300 do CPC), que foi
noticiada ao réu em 18.02.2019.
A decisão foi efetivamente cumprida, com a matrícula da interessada, conforme ofício datado de
20.02.2019.
Ora, se a menor foi matriculada em fevereiro de 2019 no curso de duração máxima de três
anos, é óbvio que até a data presente (29.04.2021) ela já se encontra bem avançada no
período escolar, não tendo qualquer sentido truncar a vida discente de uma jovem que confiou
no tirocínio do Judiciário. Qual o sentido de, quase dois anos depois, expurgá-la do corpo
discente da instituição escolar federal, negando-lhe o direito de completar seus estudos,
obrigando-a a sair à cata de outros lugares para estudar, sabido que se trata de moça de
origem humilde, a quem o Estado deve amparar e não prejudicar?
Pelo exposto, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO pararestaurarintegralmente a
sentença de primeiro grau.











APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000673-37.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: G. A. C.
REPRESENTANTE: EDSON CALSE
Advogado do(a) APELANTE: LUIGGI ROGGIERI - SP342895-A
APELADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DE SAO
PAULO

OUTROS PARTICIPANTES:





V O T O



Mantenho a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos.

Ressalto que a vedação insculpida no art. 1.021, §3º do CPC/15 contrapõe-se ao dever
processual estabelecido no §1º do mesmo dispositivo, que determina:

Art. 1.021. (...) § 1o Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os
fundamentos da decisão agravada.

Assim, se a parte agravante apenas reitera os argumentos ofertados na peça anterior, sem
atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão que ora se objurga, com
fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali manifestada, decerto não há que se
falar em dever do julgador de trazer novéis razões para rebater alegações genéricas ou
repetidas, que já foram amplamente discutidas.

Diante do exposto, voto por negar provimento ao agravo interno.

É como voto.











E M E N T A


PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CPC/2015. CURSO TÉCNICO
INTEGRADO COM O ENSINO MÉDIO. BUROCRACIA DA EDUCAÇÃO. PRINCÍPIO DA
SEGURANÇA JURÍDICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO.
1. Trata-se de AGRAVO INTERNO interposto por GIOVANNA ALVES CALSE, nos termos do
artigo 1.021 do CPC/2015, contra decisão monocrática proferida em 27/7/2020 que deu
provimento à apelação do INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
DE SÃO PAULO, com o fim de reformar a r. sentença de procedência, e indeferir o pedido de
matrícula da autora em curso técnico integrado com o ensino médio.
2. Restou demonstrado nos autos que a agravante, no propósito de não atrasar a sua trajetória
escolar e não ser prejudicada em sua formação educacional, cursou somente o primeiro ano do
ensino fundamental em escola privada, no ano de 2010, por conta da negativa de acesso à rede
pública municipal ensejada pela burocracia da educação, sendo um verdadeiro absurdo que,
muitos anos depois, o Poder Público lhe negue acesso à instituição federal de ensino médio-
técnico por esse motivo.
3. Se a menor foi matriculada em fevereiro de 2019 no curso de duração máxima de três anos,
é óbvio que até a data presente (29.04.2021) ela já se encontra bem avançada no período
escolar, não tendo qualquer sentido truncar a vida discente de uma jovem que confiou no
tirocínio do Judiciário. Não há o menor sentido em, quase dois anos depois, expurgá-la do
corpo discente da instituição escolar federal, negando-lhe o direito de completar seus estudos,
obrigando-a a sair à cata de outros lugares para estudar, sabido que se trata de moça de
origem humilde, a quem o Estado deve amparar e não prejudicar.
4. Agravo interno provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A sexta turma, por
maioria, em julgamento nos moldes do art. 942 do CPC, deu provimento ao agravo interno para
restaurar integralmente a sentença de 1º grau, nos termos do voto do Desembargador Federal
Johonsom Di Salvo, acompanhado pelos votos dos Desembargadores Federais Toru
Yamamoto, Diva Malerbi e Carlos Muta, vencido o Relator que negava provimento ao agravo

interno. Lavrará o acórdão o Desembargador Federal Johonsom Di Salvo, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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