
| D.E. Publicado em 11/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do relator, que foi acompanhado pela Desembargadora Federal Marisa Santos e, pela conclusão, pela Desembargadora Federal Ana Pezarini (que votou nos termos do art. 942 "caput" e § 1º do CPC). Vencido o Desembargador Federal Gilberto Jordan que lhe dava provimento.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013345-28.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Trata-se de agravo interno interposto pelo Ministério Público Federal em face da decisão monocrática que deu provimento à apelação, par julgar improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial de prestação continuada.
Requer o MPF a reforma do julgado, de modo a ser a matéria reexaminada pela Turma, porquanto a parte autora se subsume na condição de hipossuficiente e deficiente. Entende que a renda de todos os filhos devem ser desconsideradas e que a incapacidade apenas temporária não é óbice à concessão do benefício.
Dada ciência ao INSS.
Contraminuta não apresentada.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porque presentes os requisitos de admissibilidade, nos termos do artigo 1.021 e §§ do Novo CPC.
No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Primordialmente, reitera-se que, tal qual o pretérito 557 do CPC de 1973, a regra do artigo 932, IV e V, do Novo CPC reveste-se de plena constitucionalidade, ressaltando-se que alegações de descabimento da decisão monocrática ou nulidade perdem o objeto com a mera submissão do agravo ao crivo da Turma (mutatis mutandis, vide STJ-Corte Especial, REsp 1.049.974, Min. Luiz Fux, j. 2.6.10, DJ 3.8910).
Noutro passo, por obséquio à brevidade e à sustentabilidade ambiental, deixo de copiar e transcrever o inteiro teor da decisão monocrática agravada, limitando-me a abordar o caso concreto.
Ficam reiterados todos os fundamentos contidos às f. 145/148, quando se analisaram os conceitos de pessoa com deficiência, miserabilidade e subsidiariedade da assistência social.
Inicialmente, reitero que a parte autora não pode ser considerada pessoa com deficiência para os fins assistenciais.
O perito refere que a parte autora está incapacitada de forma total e temporária, por quatro meses, por conta dos males apresentados, na coluna, joelhos e hipertensão arterial (f. 30/35).
Todavia, resta indevida a concessão do benefício em tais circunstâncias, porque a parte autora está doente, não propriamente deficiente para fins assistenciais.
Trata-se de doenças assaz comuns na população, que não a impede de trabalhar em serviços leves.
Infelizmente, parece que em muito julgamento não se dá a devida atenção entre a diferença entre incapacidade e deficiência. As dificuldades, no caso, encontram-se no campo exclusivo do trabalho e não são barreiras, mas limitações.
Enfim, por conta de sua condição de saúde, a parte autora não sofre segregação típica das pessoas com deficiência. Trata-se de caso a ser tutelado pelo seguro social (artigo 201 da CF) ou pela saúde (artigo 196 da CF).
Enfim, a autora sofre de doenças, geradora de incapacidade temporária somente por quatro meses, risco social coberto pela previdência social até o advento da Lei nº 13.146/2013, cuja cobertura depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal, que têm a seguinte dicção (g.n.):
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)"
Entendimento diverso implica atribuir o protagonismo da cobertura dos eventos doença e invalidez à Assistência Social, numa interpretação inconstitucional, inclusive por ofender os princípios da seletividade e distributividade das prestações da seguridade social (artigo 194, § único, III, da Constituição Federal).
Pelo exposto, infere-se que a situação fática prevista neste processo não permite a incidência da regra do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93 (vide tópico IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, supra).
Quanto ao requisito da hipossuficiência, também não restou atendido.
O estudo social informa que a autora vivia com o marido, que percebia BPC no valor de um salário mínimo, mas este faleceu em 08/7/2014 e a autora passou a viver com o filho Benedito Gabriel de Jesus, casado e pai de três filhos. Ele trabalha e recebe R$ 950,00 ao mês.
Ocorre que a autora possui, no total, 6 (seis) filhos, todos residentes na cidade de Jacarei, sendo 4 (quatro) deles no mesmo bairro.
Evidente que o critério do artigo 20, § 3º, da LOAS não é taxativo, consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, devendo a hipossuficiência ser aferida caso a caso.
Mas no caso pretensão é indevida porque também não configurada a hipossuficiência para fins assistenciais, já que o sustento da autora pode ser provido por sua família (artigo 203, V, da Constituição Federal), que tem obrigação primária de auxílio.
A propósito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão realizada em 23/02/2017, em Brasília (autos nº 0517397-48.2012.4.05.8300).
Com efeito, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo. Logo, a proteção assistencial é subsidiária.
Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.
No caso, a técnica de proteção social prioritária no caso é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da Constituição Federal, in verbis: "Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade."
A despeito da orientação do RE n. 580963 (repercussão geral - vide supra), a autora não está desamparada.
Com efeito, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo.
Enfim, a apuração da miserabilidade não pode resumir-se à questão matemática, cabendo ao juiz aferir, sim, a real situação econômica dos interessados em viver à custa do Estado.
A concessão generosa de benefícios assistências gera graves distorções no sistema de seguridade social. São tantos os pobres que trabalham nas adversidades, e são estes, exatamente estes, que pagam seus impostos em proporção muito maior que os ricos, e abastecem os cofres da seguridade social (artigo 195 da CF).
Com efeito, numa sociedade sedenta de prestações sociais do Estado, mas sem mínima vontade de contribuir para o custeio do sistema de seguridade social, é preciso realmente discriminar quais são os casos que configuram "necessidades sociais".
Pois a assunção desmedida, pelo Estado, de atribuições cabíveis à própria sociedade, vai de encontro ao objetivo de garantir o desenvolvimento nacional (artigo 3º, II, da Constituição Federal), à medida que ocorre o extravasamento dos limites das possibilidades financeiras do sistema de seguridade social, gerando toda sorte de distorções, em prejuízo às gerações atual e futuras. Sem falar que retira o incentivo das pessoas ao trabalho.
Vide, no mais, o capítulo anterior deste julgado, sob a rubrica "SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL".
Diante do exposto, nego provimento ao agravo.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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