
| D.E. Publicado em 11/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017935-48.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de agravo interno interposto pelo Ministério Público Federal em face da decisão monocrática que negou provimento à apelação interposta pela parte autora.
Requer o MPF a reforma do julgado, de modo a ser a matéria reexaminada pela Turma, porquanto se subsume na condição de hipossuficiente, consoante os termos do RE 580963.
Dada ciência ao INSS.
Contraminuta não apresentada.
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso, porque presentes os requisitos de admissibilidade, nos termos do artigo 1.021 e §§ do Novo CPC.
No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Primordialmente, reitera-se que, tal qual o pretérito 557 do CPC de 1973, a regra do artigo 932, IV e V, do Novo CPC reveste-se de plena constitucionalidade, ressaltando-se que alegações de descabimento da decisão monocrática ou nulidade perdem o objeto com a mera submissão do agravo ao crivo da Turma (mutatis mutandis, vide STJ-Corte Especial, REsp 1.049.974, Min. Luiz Fux, j. 2.6.10, DJ 3.8910).
Noutro passo, por obséquio à brevidade e à sustentabilidade ambiental, deixo de copiar e transcrever o inteiro teor da decisão monocrática agravada, limitando-me a abordar o caso concreto.
Ficam reiterados todos os fundamentos contidos às f. 211/213, com os acréscimos a seguir apresentados.
A controvérsia limita-se à questão da hipossuficiência, que de fato não está presente.
O estudo social revela que a parte autora reside em casa própria, com o marido e uma filha, nascida em 1963. Ele recebe aposentadoria, a filha recebe auxílio-doença.
Evidente que o critério do artigo 20, § 3º, da LOAS não é taxativo, consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, devendo a hipossuficiência ser aferida caso a caso.
A despeito da orientação do RE n. 580963 (repercussão geral - vide supra), situação da autora não é de vulnerabilidade social, pois tem acesso aos mínimos sociais, já que a renda per capita "real" é de 2/3 do salário mínimo.
Consta do estudo social que a casa está em bom estado de conservação, possuem TV LED de 32 polegadas e veículo automotor. A autora vive humildemente, mas não pode ser considerada miserável.
Ademais, a própria filha, que recebe auxílio-doença, não pode ser considerada deficiente para fins de exclusão da sua renda, de modo que não se aplica a regra do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso em relação a ela.
A propósito, não há informações no estudo social a respeito da existência de outros filhos, todos eles obrigados pela constituição a colaborar no sustento dos pais (artigo 229 da CF).
Com efeito, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo.
Enfim, a apuração da miserabilidade não pode resumir-se à questão matemática, cabendo ao juiz aferir, sim, a real situação econômica dos interessados em receber o benefício de amparo social.
A concessão generosa de benefícios assistências gera graves distorções no sistema de seguridade social. São tantos os pobres que trabalham nas adversidades, e são estes, exatamente estes, que pagam seus impostos em proporção muito maior que os ricos, e abastecem os cofres da seguridade social (artigo 195 da CF).
O benefício assistencial - que tem o mesmo valor da maior parte das aposentadorias pagas no Brasil, de 1 (um) salário mínimo, aposentadorias concedidas mediante contribuições exigidas dos segurados durante vários anos - não pode ser concedido com base em pretensões lamuriosas, pois ao final das contas esse proceder voltar-se-á contra os mesmos pobres que a Assistência Social visa a proteger.
Vale, aqui, mutatis mutandis, a preciosa lição de Elcir Castelo Branco, segundo a qual a técnica de proteção social (no caso, aqui, a assistência social) deve ser aplicada de forma criteriosa, sob pena de geração de graves distorções no sistema, com prejuízo de todos os necessitados:
"A previdência em si já é um instrumento social, por isso não vinga o pretexto de aplicar a lei com vista no interesse social. Este raciocínio é falso. O interesse social maior é que o seguro funcione bem, conferindo as prestações a que se obrigou. Se lhe é transmitida uma carga acima do previsto, compromete-se a sua liquidez financeira: ponto nevrálgico da eficiência de qualquer seguro. O prius que se outorga sairá do próprio conjunto de segurados, em virtude da pulverização do risco entre eles. Nesta circunstância o seguro se torna custoso e socialmente desinteressante, indo refletir no preço dos bens produzidos, influindo de maneira maléfica sobre os demais contribuintes, os quais têm de suportar o que se outorga alargando as obrigações do órgão segurador em favor de pretensões lamuriosas" (Elcir Castello Branco, Segurança Social e Seguro Social, 1º volume, Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda, 1975, São Paulo, páginas 127/128).
Com efeito, numa sociedade sedenta de prestações sociais do Estado, mas sem mínima vontade de contribuir para o custeio do sistema de seguridade social, é preciso realmente discriminar quais são os casos que configuram "necessidades sociais".
Pois a assunção desmedida, pelo Estado, de atribuições cabíveis à própria sociedade, vai de encontro ao objetivo de garantir o desenvolvimento nacional (artigo 3º, II, da Constituição Federal), à medida que ocorre o extravasamento dos limites das possibilidades financeiras do sistema de seguridade social, gerando toda sorte de distorções, em prejuízo às gerações atual e futuras. Sem falar que retira o incentivo das pessoas ao trabalho.
Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.
Vide, no mais, o capítulo anterior deste julgado, sob a rubrica "SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL".
A propósito, decidiu este e. TRF 3.ª Região: "O benefício de prestação continuada não tem por fim a complementação da renda familiar ou proporcionar maior conforto ao beneficiário, mas sim, destina-se ao idoso ou deficiente em estado de penúria" (AC 876500. 9.ª Turma. Rel. Des. Fed. Marisa Santos. DJU, 04.09.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao agravo.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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