
| D.E. Publicado em 29/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015782-76.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora em face da decisão monocrática que deu provimento à apelação para julgar improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial de prestação continuada, cassando a tutela específica.
Requer a parte autora a reforma do julgado, de modo a ser a matéria reexaminada pela Turma, sob o fundamento de que se subsume na condição de hipossuficiente e pessoa com deficiência, fazendo jus ao benefício. Exora ainda o restabelecimento da tutela específica.
Dada ciência ao INSS.
Contraminuta não apresentada.
O Ministério Público Federal nada requereu.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porque presentes os requisitos de admissibilidade, nos termos do artigo 1.021 e §§ do Novo CPC.
No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Por obséquio à brevidade e à sustentabilidade ambiental, deixo de copiar e transcrever o inteiro teor da decisão monocrática agravada, limitando-me a abordar o caso concreto.
Ficam reiterados todos os fundamentos contidos às f. 158/159.
A decisão monocrática deve ser mantida.
A parte autora é idosa para fins assistenciais, porquanto nascida em 12/6/1945, consoante se observa dos documentos acostados aos autos.
Quanto à hipossuficiência, todavia, não restou configurada.
O estudo social datado 11/11/2013 (f. 56/59) informa que a requerente reside com o esposo e dois netos (Igor Bruno Rocha Chicarelli, nascido em 07/8/1996, e Vitor Rocha Chicarelli, nascido em 18/8/1998), que foram deixados com os avós por um filho que morava com eles, mas que se casou de novo e foi morar com a mulher.
A renda da família é oriunda do trabalho de vendedor de laranja do marido da autora, percebendo quantia média de R$ 30,00 (trinta reais) por dia. A família não paga aluguel porquanto a casa é cedida pelos filhos.
Não há informações no laudo sobre o porquê de o pai dos netos da autora, Valdinei Domingos Chicarelli, não prestar auxílio aos mesmos. Além de Vandinei, a autora possui outros 3 (três) filhos, de modo que todos eles possuem o dever primário de auxiliar os pais financeiramente.
A propósito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão realizada em 23/02/2017, em Brasília (autos nº 0517397-48.2012.4.05.8300).
Impera registrar que os dois netos não podem ser consideradas para fins de composição do grupo familiar, isso porque o artigo 20, § 2º, da LOAS só considera membro da família o menor tutelado.
Entendo, portanto, não configurada a miserabilidade jurídica, pois a renda mensal per capita é superior a meio salário mínimo.
O quanto exposto basta, só pro só, para a improcedência do pleito da parte autora.
Outrossim, a autora contribuiu, como contribuinte individual, desde 05/2008 até a presente data (vide CNIS). E o marido da autora, Antonio Chicarelli, também contribui como contribuinte individual desde 04/2016 (vide CNIS).
Chegou-se, assim, à situação insólita de a assistência social financiar a própria filiação da família à previdência social, o que implica clara inversão de valores.
Nesse sentido, prelecionou Celso Bastos, in verbis: "A assistência Social tem como propósito satisfazer as necessidades de pessoas que não podem gozar dos benefícios previdenciários, mas o faz de uma maneira comedida, para não incentivar seus assistidos à ociosidade. Concluímos, portanto, que os beneficiários da previdência social estão automaticamente excluídos da assistência social. O benefício da assistência social, frise-se, não pode ser cumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o de assistência médica" (Celso Bastos e Ives Gandra Martins, in Comentários à Constituição do Brasil, 8o Vol., Saraiva, 2000, p. 429).
Enfim, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo.
No caso, a técnica de proteção social prioritária no caso é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da Constituição Federal, in verbis: "Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade."
Vale dizer, não deve o Estado substituir a sociedade em situações onde esta consegue, ela própria, mediante esforço, resolver suas pendências, sob pena de se construir uma sociedade de freeloaders, cada vez mais dependente das prestações do Estado e incapaz de construir um futuro social e economicamente viável para si própria.
A propósito, o conceito de família hospedado no artigo 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93 não pode ser "taxativo", assim como não pode ser "taxativo" o critério do artigo 20, § 3º, da mesma lei.
Nesse diapasão, a proteção social baseada na solidariedade legal não tem como finalidade cobrir contingências encontradas somente na letra da lei (dever-ser) e não no mundo dos fatos (ser). Cabe, em casos que tais, à sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência aos próximos.
Pertinente, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário Wagner Balera, quando pondera a respeito da dimensão do princípio da subsidiariedade: "O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos e dos indigentes exigindo que sejam, por todos respeitados os direitos dos pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã - o Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir, nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'Rerum Novarum', a 'Quadragésimo Anno', pontos 79-80)." (Centenárias Situações e Novidade da 'Rerum Novarum', p. 545).
Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto para, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.
Diante do exposto, nego provimento ao agravo.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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