
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010351-89.2018.4.03.6112
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: NELSON KENJI HOSOMI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON KENJI HOSOMI
Advogados do(a) APELADO: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010351-89.2018.4.03.6112
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: NELSON KENJI HOSOMI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON KENJI HOSOMI
Advogados do(a) APELADO: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER (RELATORA):
Trata-se de ação distribuída em 13/12/2018. O feito foi extinto sem resolução do mérito quanto ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 01/04/1992 a 30/06/1999 e julgado procedente para declarar como trabalhado em atividade especial o período de 01/07/1999 a 17/05/2017 e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais ao autor por sentença proferida pela(o) Magistrada(o) da 1ª Vara Federal de Presidente Prudente em 04/12/2019 (id. 138511745).
A decisão monocrática negou provimento ao recurso de apelação da parte autora e da autarquia previdenciária mantendo a decisão de primeira instância nos termos em que proferida (id. 293555921).
O INSS, em agravo interno, alega, em síntese, que não cabe o julgamento monocrático no caso em apreço e que o PPP não traz informação de registro junto ao CREA ou ao CRM quanto ao responsável pelos registros ambientais em relação ao período reconhecido, de forma que não houve expressa análise desse fato à luz do art. 58º, § 1º, da Lei 8.213/1991, na redação dada pela Lei 9.732/1998. Requer não seja reconhecida a especialidade dos períodos de 08/12/1994 a 30/07/2001 e 01/08/2007 a 16/05/20217 (id. 293767357).
Com contrarrazões do autor ao agravo interno interposto pelo INSS (id. 294110435).
A parte autora, em agravo interno, requer o reconhecimento da especialidade do período entre 01/04/1992 a 30/06/1999 (id. 294106866).
Sem contrarrazões da autarquia previdenciária.
É o relatório.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: trata-se de agravos internos interpostos pelas partes em face da decisão monocrática, que negou provimento à apelação da parte autora e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mantendo a sentença com a extinção do processo, sem resolução do mérito, no tocante ao pedido de enquadramento do intervalo de 1º/4/1992 a 30/6/1999 e a procedência dos pedidos de reconhecimento da atividade especial do período de 1º/7/1999 a 17/5/2017 e de obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Não obstante os judiciosos fundamentos expostos no voto da nobre Relatora, deles ouso divergir parcialmente pelas seguintes razões.
A possibilidade de contagem de tempo de contribuição entre regimes de previdência social distintos (contagem recíproca) é assegurada no artigo 201, § 9º, da Constituição Federal vigente, nos seguintes termos:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
(...)
§ 9º Para fins de aposentadoria, será assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes próprios de previdência social, e destes entre si, observada a compensação financeira, de acordo com os critérios estabelecidos em lei.”
Nessa esteira, segundo se depreende do artigo 94 da Lei n. 8.213/1991, a contagem recíproca do tempo de contribuição a regimes distintos de previdência social pressupõe que o sistema no qual o interessado estiver filiado ao requerer o benefício seja compensado financeiramente pelos demais sistemas aos quais já esteve vinculado.
Sobre a questão ensinam Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior (g.n.):
“... a simples reflexão sobre a existência de regimes previdenciários distintos induz a conclusão de que cada regime deverá certificar o tempo no qual o interessado esteve nele filiado, pois somente quem possui os assentos funcionais é que poderá promover a apuração do tempo de serviço público, sendo procedida a contagem recíproca apenas no momento em que o interessado requer o benefício, no regime em que será deferido, nos termos do disposto no art. 99 da Lei de Benefícios. Assim, não cabe ao INSS reconhecer o tempo de serviço ou de contribuição prestado em outros regimes." (in: Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 14ª edição. São Paulo: Atlas, 2016, p. 523)
Efetivamente, somente ao órgão de origem cabe reconhecer a nocividade da atividade exercida em período a ele vinculado, competindo-lhe, ainda, ressarcir financeiramente o outro sistema em razão de possível contagem diferenciada decorrente desse reconhecimento.
Ademais, a Súmula Vinculante n. 33 garantiu textualmente que as regras do regime geral sobre a aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, III, da CF/1988, aplicam-se ao servidor público, no que couber:
"Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal, até edição de lei complementar específica.”
No mesmo sentido é a tese jurídica fixada no julgamento do Tema n. 942 da Repercussão Geral, a qual dispõe que as regras do regime geral sobre conversão de tempo especial em comum aplicam-se ao servidor público:
"Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República." (STF, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Redator para o acórdão Min. EDSON FACHIN, Leading Case (RE 1014286), DATA DE PUBLICAÇÃO DJe 24/09/2020, ATA Nº 160/2020, DJe nº 235, divulgado em 23/09/2020)
Nessa toada, a Portaria MPS n. 154/2008 garante a contagem recíproca de atividades especiais entre regimes de previdência distintos, conforme a seguinte disposição (g.n.):
"Art. 5º O setor competente da União, do Estado, do Distrito Federal e do Município deverá promover o levantamento do tempo de contribuição para o RPPS à vista dos assentamentos funcionais do servidor.
Parágrafo único. Até que leis complementares federais disciplinem as aposentadorias especiais previstas no § 4º do art. 40 da Constituição Federal, a informação na CTC sobre o tempo de contribuição reconhecido como tempo especial está restrita às hipóteses de: (Incluído pela Portaria MF nº 393, de 31/08/2018).
I - servidor com deficiência, com amparo em decisão judicial; (Incluído pela Portaria MF nº 393, de 31/08/2018)
II - exercício de atividades de risco, conforme Lei Complementar nº 51, de 20 de dezembro de 1985, ou com amparo em decisão judicial; e (Incluído pela Portaria MF nº 393, de 31/08/2018)
III - exercício de atividades sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, nos limites da Súmula Vinculante nº 33 ou com amparo em decisão judicial. (Incluído pela Portaria MF nº 393, de 31/08/2018)."
Portanto, as atividades especiais exercidas no RGPS ou no RPPS deverão estar expressamente dispostas na Certidão de Tempo de Contribuição (CTC).
Quanto à conversão da atividade especial em comum, o artigo 96, IX, da Lei n. 8.213/1991 dispõe:
“Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;
III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;
IV - o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento.
V - é vedada a emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) com o registro exclusivo de tempo de serviço, sem a comprovação de contribuição efetiva, exceto para o segurado empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e, a partir de 1º de abril de 2003, para o contribuinte individual que presta serviço a empresa obrigada a arrecadar a contribuição a seu cargo, observado o disposto no § 5º do art. 4º da Lei nº 10.666, de 8 de maio de 2003;
VI - a CTC somente poderá ser emitida por regime próprio de previdência social para ex-servidor;
VII - é vedada a contagem recíproca de tempo de contribuição do RGPS por regime próprio de previdência social sem a emissão da CTC correspondente, ainda que o tempo de contribuição referente ao RGPS tenha sido prestado pelo servidor público ao próprio ente instituidor;
VIII - é vedada a desaverbação de tempo em regime próprio de previdência social quando o tempo averbado tiver gerado a concessão de vantagens remuneratórias ao servidor público em atividade;
IX - para fins de elegibilidade às aposentadorias especiais referidas no § 4º do art. 40 e no § 1º do art. 201 da Constituição Federal, os períodos reconhecidos pelo regime previdenciário de origem como de tempo especial, sem conversão em tempo comum, deverão estar incluídos nos períodos de contribuição compreendidos na CTC e discriminados de data a data.”
O artigo 125, § 1º, do Decreto n. 3.048/1999 e o artigo 11 da Portaria MPS n. 154/2008 dispõem da mesma forma (g.n.):
"Art. 125. Para efeito de contagem recíproca, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social ou proteção social se compensarão financeiramente, fica assegurado: (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
I - o cômputo do tempo de contribuição na administração pública e de serviço militar exercido nas atividades de que tratam os art. 42, art. 142 e art. 143 da Constituição, para fins de concessão de benefícios previstos no RGPS, inclusive de aposentadoria em decorrência de tratado, convenção ou acordo internacional; e (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
(...)
§ 1º Para os fins deste artigo, é vedada: (Redação dada pelo Decreto nº 8.145, de 2013)
I - conversão do tempo de contribuição exercido em atividade sujeita à condições especiais, nos termos do disposto no art. 66;"
"Art. 11. É vedada a emissão de CTC: (Redação dada pela Portaria MF nº 567, de 18/12/2017)
I - com contagem de tempo de contribuição de atividade privada com a de serviço público ou de mais de uma atividade no serviço público, quando concomitantes; (Redação dada pela Portaria MF nº 567, de 18/12/2017)
II - em relação a período que já tiver sido utilizado para a concessão de aposentadoria em qualquer regime de previdência social; (Redação dada pela Portaria MF nº 567, de 18/12/2017)
III - com contagem de tempo fictício; (Redação dada pela Portaria MF nº 567, de 18/12/2017); e
IV - com conversão de tempo de serviço exercido sob condições especiais em tempo de contribuição comum; (Redação dada pela Portaria MF nº 567, de 18/12/2017)."
Como se nota, na CTC devem estar indicados os períodos de atividade especial, mas é vedado constar a conversão do tempo de serviço especial em comum.
Compete, assim, ao órgão de destino da CTC a análise de possível conversão de tempo.
É o que deliberou a Turma Nacional de Uniformização (TNU) ao apreciar o Tema n. 278:
"I – O(A) segurado(a) que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, tem direito à expedição de certidão desse tempo identificado como especial, discriminado de data a data, ficando a conversão em comum e a contagem recíproca à critério do regime de destino, nos termos do art. 96, IX, da Lei n.º 8.213/1991;
II – Na contagem recíproca entre o Regime Geral da Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio da União, é possível a conversão de tempo especial em comum, cumprido até o advento da EC n.º 103/2019."
Em resumo, a CTC deve ser expedida pelo regime de previdência de origem com indicação do tempo especial, sem a conversão do período. A forma de utilização desse tempo especial, como a possível conversão desse tempo em comum, contudo, compete ao regime instituidor da aposentadoria.
No tocante ao intervalo em debate, de 1º/4/1992 a 30/6/1999, considerada a vinculação a regime próprio previdenciário (“Prefeitura Municipal de Rancharia”), não compete à autarquia previdenciária o exame da especialidade aventada, senão ao próprio ente federativo no qual desenvolveu as atribuições vinculadas ao regime próprio de previdência social (RPPS) atestar a insalubridade.
Ademais, nas hipóteses de controvérsia da especialidade de serviço prestado sob regime próprio, deve o requerente aforar a contenda na Justiça Estadual bandeirante em face órgão ao qual estava vinculado, a fim de fazer valer o direito invocado (TRF/3ª Região; APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0002678-03.2004.4.03.9999/SP; 2004.03.99.002678-7/SP; RELATORA: Des. Federal EVA REGINA; D.E. Publicado em 14/2/2011).
Com efeito, somente ao órgão de origem do servidor compete o reconhecimento da nocividade da atividade exercida em período a ele vinculado, forte inclusive no Tema 942 do STF, bem como o respectivo ressarcimento ao sistema destinatário em razão de possível contagem diferenciada decorrente desse enquadramento.
Assim, desponta a ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade reclamada, uma vez que o trabalho supostamente exercido sob condições especiais não ocorreu sob as normas do Regime Geral da Previdência Social, mas sob as do Regime Próprio de Previdência.
Desse modo, impõe-se a manutenção da extinção do processo, sem resolução de mérito, em conformidade com a decisão agravada, no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial da atividade vinculada ao RPPS, exercida no período de 1º/4/1992 a 30/6/1999, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC.
Por conseguinte, desconsiderada a especialidade do referido interregno, o decisum impugnado resta mantido integralmente.
Nesse contexto, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data da citação (27/2/2019), com a soma total de 40 (quarenta) anos, 11 (onze) meses e 21 (vinte e um) dias de tempo de contribuição e renda mensal de 100% do salário d -benefício, sem a incidência do fator previdenciário (artigo 29-C, da Lei n. 8.213/1991), conforme planilha anexa à sentença (id. 138511748).
Diante do exposto, nego provimento aos agravos internos das partes.
É o voto.
Desembargadora Federal DALDICE SANTANA
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010351-89.2018.4.03.6112
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: NELSON KENJI HOSOMI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON KENJI HOSOMI
Advogados do(a) APELADO: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, RHOBSON LUIZ ALVES - SP275223-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER (RELATORA):
Trata-se de agravo interno interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e pela parte autora em face de decisão monocrática que manteve a sentença de extinção sem resolução do mérito quanto ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 01/04/1992 a 30/06/1999 e declarou como trabalhado em atividade especial o período de 01/07/1999 a 17/05/2017, bem como concedeu a aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais ao autor.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Ao instituir a possibilidade do julgamento monocrático, o Código de Processo Civil intensifica a necessidade de observância dos princípios constitucionais da celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.
De acordo com a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, ao proferir decisão monocrática, o relator não viola o princípio da colegialidade, ante a previsão do agravo interno para submissão do julgado ao Órgão Colegiado. Nesse sentido:"...Consoante a jurisprudência deste STJ, a legislação processual (art. 932 do CPC c/c a Súmula nº 568 do STJ) permite ao relator julgar monocraticamente recurso inadmissível ou, ainda, aplica a jurisprudência consolidada deste Tribunal. Ademais, a possibilidade de interposição de recurso ao órgão colegiado afasta qualquer alegação de ofensa ao princípio da colegialidade. Precedentes... (STJ, AgInt no REsp n. 1.831.566/PR, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 12/9/2022, DJe de 14/9/2022.)
A autarquia previdenciária requer seja revisto o reconhecimento da especialidade dos períodos de 08/12/1994 a 30/07/2001 e 01/08/2007 a 16/05/2017 em virtude de ausência de registro junto ao CREA ou ao CRM quanto ao responsável pelos registros ambientais.
Como cediço, o laudo ambiental hodiernamente utilizado para particularização das condições de trabalho do segurado é o “Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP”, por sua vez, estabelecido pelo Regulamento da Previdência Social (Decreto 3.048/99), documento este que deve estar devidamente subscrito por engenheiro ou médico de segurança ocupacional.
Contudo, se houver indicação de responsável técnico no PPP para período posterior àquele em discussão, bem como estiver demonstrado que a parte autora sempre desenvolveu as mesmas atribuições, e, considerando ainda que a evolução tecnológica faz presumir serem as condições ambientais de trabalho pretéritas mais agressivas ou ao menos idênticas do que no momento da execução dos serviços, entendo que a ausência de indicação de responsável técnico no PPP não pode ser utilizada para prejudicar o segurado.
Anote-se, por oportuno, que o PPP não contém campo próprio para indicação de permanência e habitualidade aos agentes nocivos nele declarado, de forma que a ausência de tal informação, não leva à conclusão de que tal situação não prospera no caso concreto, mormente quanto isso se puder dessumir da descrição das atividades e dos agentes nocivos aos quais o segurado esteve exposto, bem como nas hipóteses em que é a exposição inevitável à produção do bem da vida na atividade na qual se insere o segurado.
Observe-se que, no caso de constar no PPP o uso de EPI, tal elemento não tem o condão de descaracterizar a natureza especial da atividade laborativa, ante a ausência de qualquer prova técnica a certificar a sua real eficácia.
Ao contrário das alegações do ente autárquico, o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP emitido pela empregadora foi elaborado com base em laudos técnicos emitidos pelos profissionais legalmente habilitados. Destarte, do PPP id 138511667 - pág 38, consta indicação do CREA dos engenheiros María Elídia Vicente, Wilson Tsunomachi e Adilson Brait Wolff, o que infirma o argumento autárquico quanto a inexistência de profissional habilitado para firmar PPP.
Dessa forma, verifica-se que o INSS não trouxe tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado na decisão monocrática recorrida, sendo incabível a retratação.
Em relação ao agravo interno interposto pela parte autora, para que seja reconhecida a especialidade do período entre 01/04/1992 a 30/06/1999, período em que trabalhou junto à Prefeitura Municipal de Rancharia, submetida a regime próprio de previdência social, a decisão de extinção sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva deve ser reformada.
Como é cediço, a legislação previdenciária assegura a Contagem Recíproca de Tempo de Serviço entre regimes previdenciários, de modo que o servidor abrangido por Regime Próprio de Previdência Social possa aproveitar períodos trabalhados no Regime Geral de Previdência Social para aposentação e fruição de vantagens naquele regime (Art. 201, parágrafo 9º da CRFB/1988).
Em que pese a Ordem Constitucional outorgue tal garantia ao Administrado, se extrai da expressão contida no citado dispositivo “(...) de acordo com os critérios estabelecidos em lei” que a Carta da República o faz como norma de eficácia contida, isto é, confere a legislação ordinária a possibilidade de restringir hipóteses certificação e aproveitamento entre regimes.
Nesta tocada, considerando que os regimes previdenciários possuem critérios de concessão de benefícios e controle financeiro e atuarial distintos entre si, e, sobretudo ante a pluralidade de Regimes Próprios existentes, é que a legislação infraconstitucional vedou expressamente a certificação de períodos de contagem “em dobro ou em outras condições especiais”, conforme giza o artigo 96, inciso I da Lei 8.213/91.
Outrossim, o artigo 515, parágrafo único da Instrução Normativa INSS/PRES 128, de 28/03/2022 dispõe que os períodos reconhecidos pelo INSS como de tempo de atividade exercida em condições especiais deverão ser incluídos na CTC e discriminados de data a data, sem conversão em tempo comum.
Não obstante a regulamentação trazida pela legislação ordinária, é de se sopesar que por ocasião do julgamento do Mandado de Injunção nº 721/DF, o C. STF firmou o entendimento de que, prosperando mora legislativa quando aos parâmetros de aposentação especial para servidores submetidos ao regime estatutário de certos Entes da Administração, devem prevalecer as regras aplicáveis aos filiados ao Regime Geral de Previdência Social, quais sejam, os critérios de análise e conversão previstos na Lei 8.213/91 e no Decreto 3.048/99.
Nesse contexto, não se reveste de razoabilidade que o filiado a Regime Jurídico Estatutário e Regime Próprio de Previdência Social, tenha que demandar duplamente, primeiro em face da própria Administração a qual esteve vinculado a fim de lograr obter acréscimo de tempo contributivo de tempo especial nos estritos moldes do decidido no MI 721/DF, e, em segundo momento, judicializar novamente em face do próprio INSS, como ora filiado ao Regime Geral, para impor que o tempo especial convertido sejam assim utilizado neste regime.
Assim, sopesando o contexto geral das normas inerentes à análise de períodos especiais e compensação recíproca existentes no ordenamento, é de privilegiar a interpretação sistemática das normas nele contidas em detrimento da exegese puramente gramatical, maximizando sua eficácia no mundo dos fatos, já que, considerando que devem ser utilizadas as normas inerentes ao RGPS para caracterização da atividade especial de servidores do RPPS, não se mostra razoável que a avaliação de especialidade não possa ser feita pela própria Autarquia administradora daquele Regime de Previdência, legitimando-a ao polo passivo da lide.
Nessa ordem de ideias, a atividade exercida pelo autor como servidor da Prefeitura Municipal de Rancharia entre 01/04/1992 a 30/06/1999, comporta enquadramento especial, pois exposto a agentes biológicos e, nesta condição, enquadra-se nos códigos 1.3.2 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; 1.3.4 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79; 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 2.172/97; e 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 3.048/99.
Ante o exposto, impositivo o provimento do recurso da parte autora para reconhecer a especialidade do período de 01/04/1992 a 30/06/1999 e conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Considerando que a parte autora integraliza 40 anos, 04 meses e 4 dias de contribuição na DER e 95,4 pontos na DER, é de reconhecer o direito da parte autora a exclusão do fator previdenciário na apuração da RMI do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo interno interposto pela autarquia previdenciária e DOU PROVIMENTO ao agravo interno interposto pela parte autora, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE. PPP. LAUDOS TÉCNICOS. PROFISSIONAIS LEGALMENTE HABILITADOS. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL NO RPPS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RECURSOS NÃO PROVIDOS.
- De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao proferir decisão monocrática, o relator não viola o princípio da colegialidade, ante a previsão do agravo interno para submissão do julgado ao Órgão Colegiado.
- Ao contrário das alegações da autarquia, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) emitido pela empregadora (relativo a atividade vinculada ao RGPS) foi elaborado com base em laudos técnicos emitidos por profissionais legalmente habilitados.
- A Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) deve ser expedida pelo regime de previdência de origem com indicação do tempo especial.
- A forma de utilização desse tempo especial, como a possível conversão desse tempo em comum, contudo, compete ao regime instituidor da aposentadoria.
- Desponta a ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade durante trabalho sob normas de Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Precedente.
- Manutenção da extinção do processo, sem resolução de mérito, em conformidade com a decisão agravada, no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial da atividade vinculada ao RPPS, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC.
- Desconsiderada a especialidade do interregno de atividade vinculada ao RPPS, o decisum impugnado resta mantido integralmente.
- A parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data da citação, sem a incidência do fator previdenciário (artigo 29-C, da Lei n. 8.213/1991).
- Agravos internos das partes desprovidos.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
