
| D.E. Publicado em 23/01/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer do agravo retido e negar-lhe provimento, dar provimento à remessa necessária para extinguir o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015 e em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, diante da não comprovação do trabalho rural, restando prejudicada a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0035835-88.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Vistos em Autoinspeção.
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela parte autora, objetivando a concessão de benefício de aposentadoria por invalidez.
À fl. 41, o MM. Juízo a quo rejeitou a preliminar de ausência de interesse de agir, deduzida pelo INSS em contestação, tendo o ente autárquico interposto agravo retido contra referida decisão (fls. 48/51).
A r. sentença, de fls. 83/87, julgou procedente o pedido inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação. Condenou, ainda, o INSS no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sua prolação.
Em razões recursais, de fls. 89/109, preliminarmente, o INSS pugna pelo conhecimento do agravo retido interposto, reiterando suas alegações. No mérito, sustenta que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício ora vindicado. Subsidiariamente, requer a fixação da DIB na data da juntada aos autos do laudo pericial, bem como a alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora, e, ainda, a sua não condenação ao pagamento de despesas processuais.
Contrarrazões da parte autora às fls. 111/123.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, conheço do agravo retido interposto pelo INSS, eis que requerida sua apreciação nas razões de apelação, conforme determinava o art. 523, do CPC/1973, vigente à época da interposição dos recursos.
Sustenta, no recurso, a carência de ação decorrente de ausência de prévio requerimento administrativo. Entretanto, não prosperam suas alegações.
O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art. 5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do INSS em desfavor da pretensão do segurado e, por fim, se a autarquia ofereceu contestação.
O precedente restou assim ementado, verbis:
No caso em exame, malgrado trate-se de pedido concessivo de benefício, a demanda fora ajuizada anteriormente ao julgamento citado e o INSS ofereceu contestação opondo-se à pretensão inicial, razão pela qual incide a hipótese contemplada na alínea "ii" do item 6 do aresto em questão.
Superada a preliminar suscitada em recurso específico, avanço ao meritum causae.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame realizado em 31 de outubro de 2008 (fls. 63/64), consignou que a requerente "apresenta considerável redução da mobilidade da coluna vertebral. Faz uso de colete ortopédico torácico lombar. Há edema nos joelhos, direito e esquerdo".
Acrescentou que "após análise e exame físico, conclui-se que a examinada VALENTINA ALVES MARTINS sofre de artrose, no joelho, direito e esquerdo, escoliose lombar e osteoporose, que resultam em incapacidade definitiva para o exercício de suas atividades laborativas habituais (rurícolas), devido à redução da mobilidade e das dores que sente".
Apesar da incapacidade constatada, no entanto, tenho que a parte autora não comprovou a qualidade de segurada da Previdência Social, quando do surgimento do impedimento para o trabalho.
O perito não fixou a data de início da incapacidade (DII), porém, mesmo que se adote como marco inicial o surgimento das dores, conforme informação prestada pela própria requerente, é certo que esta não comprovou ser filiada ao RGPS naquele momento.
Com efeito, quando da realização da perícia, em outubro de 2008, disse ao expert que o quadro álgico teria começado aproximadamente há 4 (quatro) anos, ou seja, a partir de 2004, data que ora se adota para fins de se analisar a qualidade de segurada da autora no referido momento.
Na certidão de casamento, ocorrido em 28 de abril de 1973, a requerente já estava qualificada como "doméstica" e o seu esposo, SEBASTIÃO VIANA DE CASTRO, como "lavrador".
A autora acostou a sua Carteira de Trabalho e Previdência Social -CTPS, à fl. 13, porém, nela não consta sequer um único vínculo laboral.
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que ora faço anexar aos autos, dão conta que inexiste qualquer vínculo previdenciário registrado em seu nome.
Em verdade, nos autos, a demandante junta apenas documentos do seu esposo, os quais indicariam o trabalho rurícola dele, e, por extensão, também o dela, já que afirma sempre ter laborado ao lado de seu cônjuge.
Entretanto, inexiste prova do trabalho rural desenvolvido por seu esposo no ano de 2004. Na CTPS dele, acostada às fls. 16/19, o último vínculo na condição de rurícola em seu nome, junto a LUIZ ANTONIO BERETTA NOVAES, refere-se ao período de 02/01/1997 a 10/12/1997. Aliás, consta da Carteira que o último trabalho por ele desenvolvido, de maneira formal, era de natureza urbana ("servente"), junto à CONSTRUTORA SARTORI LTDA, e se deu entre 17/09/2002 e 01/10/2002.
Informações extraídas do seu CNIS, que ora também faço anexar aos autos, corroboram o exposto na CTPS supra, além do que indicam que ele desempenhou a função de "trabalhador de serviços de limpeza e conservação de áreas públicas", junto ao MUNICÍPIO DE MERIDIANO/SP, entre 21/09/2009 e 12/2015.
Ressalta-se que declarações emitidas pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de FERNANDOPÓLIS/SP (fls. 20/22), que comprovam o trabalho rural desempenhado pelo cônjuge da requerente, são datados de 1978 e 1984, muito tempo antes, portanto, do surgimento da incapacidade da autora.
Há, ainda, comprovante de rescisão de contrato de trabalho rural, registrado no nome do seu marido, datado de 25/11/1998 (fl. 14).
Aliás, os documentos que demonstrariam a atividade de rurícola do seu esposo em período mais recente, isto é, recibos de fl. 15, datados de 2006, referem-se a terceiro estranho ao caso dos autos, SEBASTIÃO MAIA, que teria prestado serviços na propriedade rural de JOSÉ ROBLES GARCIA E OUTROS.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 21 de agosto de 2007 (fls. 41/44), foram colhidos o depoimento pessoal da autora e de pessoas por ela indicadas.
A demandante declarou que "possui 53 anos de idade e afirma que sempre trabalhou na lavoura, atividade que desempenhou desde o ano de 1984 até o ano de 2005, quando se tornou incapacitada para o trabalho. A declarante tem problemas na coluna e no joelho. Atualmente reside na zona urbana de Meridiano. A declarante já tomou remédios para dor na coluna, cujo nome não se recorda" (fl. 42).
ARQUIMEDES NEVES afirmou que "conhece a autora há muito tempo (mais de 20 anos), e pode afirmar que a mesma sempre trabalhou na lavoura. A autora trabalhou para os proprietários rurais, Ricardo Marão e Orlando Bereta. A autora tem problemas de saúde (coluna) há três anos. A autora parou de trabalhar há 03 anos". Questionado pelo patrono da requerente, respondeu que " já trabalhou com a autora na propriedade rural do Bereta e do Marão. A depoente trabalhava na propriedade do Bereta juntamente com o marido, fazendo cercas e retirando leite" (sic) (fl. 43).
AGNALDO RODRIGUES DA SILVA relatou que "o depoente conhece a autora há muito tempo (15 anos), e pode afirmar que a mesma sempre trabalhou na lavoura, o que fez por 20 anos, aproximadamente. A autora trabalhou para o proprietário rural Orlando Bereta. A autora tem problema de saúde (coluna) há um ano" (sic) (fl. 44).
Nota-se que os testemunhos são insuficientes para a comprovação do labor da autora nas lides campesinas, eis que, apesar de alegarem que a mesma sempre desempenhou referida atividade, se referiram mais precisamente ao trabalho desempenhado perante o empregador "Bereta" que, conforme CNIS e CTPS do cônjuge da demandante, se findou no ano de 1997, muito antes, frisa-se, do surgimento do mal incapacitante (2004).
Apesar da desnecessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período em que se pretende reconhecer em juízo, o substrato material deve ser minimamente razoável e harmônico com os depoimentos colhidos em audiência, sob pena de aceitação da comprovação do período laborado exclusivamente por prova testemunhal, em clara afronta ao disposto na Lei (Súmula 149 do STJ).
Por outro lado, a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, o que não é o caso dos autos, diante dos registros em CTPS como empregado rural do esposo da autora, além do que os depoimentos das testemunhas supra, repriso, que não encontraram substrato material suficiente, em tese se prestariam, tão somente, a indicar a atividade de diarista deste.
Assim, diante da não comprovação do trabalho rural da autora, quando do surgimento da incapacidade, resta inviabilizada a concessão de aposentadoria por invalidez e do auxílio-doença.
Por fim, também em razão desta não comprovação, imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola.
Nesse sentido, transcrevo o entendimento consolidado do C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973:
Ante o exposto, conheço do agravo retido interposto pelo INSS e nego-lhe provimento; dou provimento à remessa necessária para extinguir o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015 e em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, diante da não comprovação do trabalho rural; restando prejudicada a apelação do INSS.
Inverto o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 13/12/2017 18:51:45 |
