
| D.E. Publicado em 29/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar, conhecer do agravo retido do INSS para, no mérito, negar-lhe provimento, negar provimento também à apelação da parte autora, dar parcial provimento ao apelo do INSS para fixar a DIB na data da cessação do benefício de auxílio-doença de NB: 532.784.205-0, ocorrida em 29/03/2009 (fls. 90/91) e, por fim, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 22/05/2018 15:46:14 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028387-59.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela primeira, objetivando o restabelecimento de auxílio-doença e, caso preenchidas as condições legais, sua conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença, de fls. 135/137-verso, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS no restabelecimento e no pagamento dos atrasados de benefício de auxílio-doença, desde a data do requerimento administrativo ou da cessação do referido benefício. Fixou correção monetária e juros de mora, nos termos da Lei 11.960/09. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada.
Em razões recursais de fls. 140/150, a parte autora pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez, ante sua incapacidade permanente para o trabalho.
O INSS também interpôs recurso de apelação, de fls. 155/165, no qual pugna, preliminarmente, pela análise de agravo retido anteriormente interposto. Ainda em sede de preliminar, requer a anulação da sentença, diante da imprestabilidade do laudo juntado aos autos, sendo necessária a realização de novo exame pericial. No mérito, sustenta que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão dos benefícios ora vindicados. Subsidiariamente, pleiteia esclarecimentos quanto a fixação da DIB, se esta deve ser determinada na data da cessação do benefício de NB: 532.784.205-0 (29/03/2009) ou na data da cessação do benefício de NB: 535.295.678-0 (20/07/2009).
Contrarrazões do INSS, às fls. 166/168, e da parte autora, às fls. 170/177.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, conheço do agravo retido interposto pelo INSS, eis que requerida sua apreciação, em sede de razões de apelação, conforme determinava o art. 523, §1º, do CPC/1973, vigente à época da interposição dos recursos.
O ente autárquico alegou, no agravo, a ocorrência de cerceamento de defesa, pois o Juízo a quo fixou a data da perícia médica em um sábado, sendo certo que seu assistente técnico não poderia comparecer na referida data.
A alegação não prospera.
Com efeito, foi oportunizada às partes a possibilidade de impugnação do laudo pericial, momento em que o assistente técnico poderia ter elaborado parecer sobre o exame do perito do Juízo. Aliás, o profissional, não só poderia ter se manifestado em sequência, como também ter efetuado exame no demandante em outro momento.
Por outro lado, é notório que o INSS possui vínculo com vários médicos-peritos. Assim sendo, o fato de um deles não poder comparecer em determinada data e local, para acompanhamento de perícia judicial, não impede a indicação de outro assistente técnico para tanto.
Ainda em sede de preliminar de apelação, o INSS sustentou a ocorrência de cerceamento de defesa, agora, não por causa de a perícia ter sido realizada no sábado, como constou do agravo retido, mas em razão de suposta imprestabilidade do laudo médico.
No entanto, a prova técnica acostada aos autos se mostrou suficiente, a meu ver, à formação da convicção do magistrado a quo.
A perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise do histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes.
Por fim, cumpre lembrar que a realização de nova perícia não é direito subjetivo da parte, mas sim faculdade do juízo, quando não se sentir convencido dos esclarecimentos técnicos prestados, conforme expressamente dispõe o art. 437 do CPC/1973, aplicável ao feito à época, reproduzido pelo atual art. 480 do CPC/2015.
Passo à análise do mérito.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo juízo a quo, com base em exame pericial realizado em 31 de julho de 2010 (fls. 111/115), consignou:
"O exame físico especial revela alterações morfológicas e funcionais que ali estão descritas e são mostradas aos exames subsidiários que caracterizam um processo degenerativo.
Estas alterações impedem que exerça, no momento qualquer atividade laborativa.
Portanto, o Autor deverá ficar afastado do trabalho para tratamento por tempo indeterminado, devendo ser reavaliado após a alta definitiva" (sic).
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Dessa forma, reconhecida a incapacidade absoluta, contudo, temporária para o trabalho, se mostra de rigor a concessão apenas de auxílio-doença ao autor, nos exatos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
No que se refere à necessidade de reabilitação, ressalta-se que esta só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para a realização de outro trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional.
Uma vez concedido e dada a sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença realmente pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia.
Bem por isso, descabe cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei.
Como já dito no despacho de fl. 202, eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.
Por outro lado, restaram incontroversos os requisitos atinentes à qualidade de segurado do autor e o cumprimento da carência legal, eis que a presente ação visa o restabelecimento de benefício de aposentadoria por invalidez (NB: 523.784.205-0), de modo que o ponto controvertido restringe-se a alta médica dada pelo INSS, em 29/03/2009 (fls. 90/91). Neste momento, de fato, é inegável que o requerente era segurado da Previdência Social, nos exatos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a persistência do quadro incapacitante, quando da cessação de benefício de auxílio-doença (NB: 532.784.205-0), de rigor a fixação da DIB no momento do seu cancelamento indevido, já que desde a data de entrada do requerimento até a sua cessação (29/03/2009 - fls. 90/91), o autor efetivamente estava protegida pelo Sistema da Seguridade Social.
Destaco, ainda, diante das alegações deduzidas pelo INSS em seu apelo, se a DIB deveria ser fixada no momento do cancelamento do benefício de NB: 532.784.205-0 (29/03/2009) ou do de NB: 535.295.678-0 (20/07/2009), que deve ser fixada na primeira data, eis que este é o objeto da pretensão deduzida na inicial (fl. 9).
No entanto, por óbvio, deverão os atrasados serem compensados com as quantias já pagas ao autor, seja em razão do deferimento na via administrativa do auxílio-doença de NB: 535.295.678-0, seja em razão da tutela antecipada concedida nestes autos.
Por outro lado, os valores, correspondentes ao período entre a cessação do benefício de NB: 532.784.205-0 (29/03/2009) e o início do de NB: 535.295.678-0 (06/04/2009) são devidos, eis que certamente nesse interregno o autor permaneceu incapacitado para o trabalho. Com efeito, se me afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece (art. 335 do CPC/1973 e art. 375 do CPC/2015), tenha o demandante se recuperado por menos de 10 (dez) dias de patologia ortopédica de caráter degenerativo, e após tal lapso, tenha novamente se tornado incapaz para o trabalho.
Alie-se, por fim, que o fato de o demandante ter trabalhado por um curto período, após o início da incapacidade e até após a fixação da DIB, não permite o desconto dos valores dos atrasados correspondentes a tal período laboral.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime. Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar, conheço do agravo retido do INSS para, no mérito, negar-lhe provimento, nego provimento também à apelação da parte autora, dou parcial provimento ao apelo do INSS para fixar a DIB na data da cessação do benefício de auxílio-doença de NB: 532.784.205-0, ocorrida em 29/03/2009 (fls. 90/91) e, por fim, de ofício, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E.
É como voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 22/05/2018 15:46:11 |
