Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1695020 / SP
0044860-57.2011.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
13/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/05/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. ART. 523, §1º, DO
CPC/1973. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º, DO
CPC/2015. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE HABITUAL NÃO CONFIGURADA. LAUDOS PERICIAIS.
INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, DO CPC. ADOÇÃO DAS
CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE
JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM OS PARECERES DOS EXPERTOS.
VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. AGRAVO
RETIDO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDOS. APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE
VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS
VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA
JUSTIÇA. APELO DA PARTE AUTORA PREJUDICADO.
1 - Não conhecido o agravo retido do INSS, eis que não requerida sua apreciação em sede de
apelo, conforme determinava o art. 523, §1º, do CPC/1973, vigente à época da interposição dos
recursos.
2 - Não cabimento de remessa necessária no presente caso. A sentença submetida à
apreciação desta Corte foi proferida em 30/08/2016, sob a égide, portanto, do Código de
Processo Civil de 2015. No caso, o pedido foi julgado procedente para condenar o INSS na
concessão e no pagamento dos atrasados de benefício de aposentadoria por invalidez, desde a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
data do início da incapacidade, que se deu em 03/12/2007 (fl. 324).
3 - Informações extraídas dos autos, de fl. 464, dão conta que o benefício foi implantado com
renda mensal inicial de um salário mínimo.
4 - Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício (03/12/2007) até a data da
prolação da sentença - 30/08/2016 - passaram-se pouco mais de 104 (cento e quatro) meses,
totalizando assim 104 (cento e quatro) prestações no valor de um salário mínimo, que, mesmo
que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária, ainda se
afigura inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual (art. 496, §3º, do CPC/2015).
5 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
6 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência
exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for
considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
7 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
8 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o
prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e
vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação
(§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
9 - Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após
filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas
taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
10 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o
deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da
moléstia.
11 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por
24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos
termos do art. 15 e §1º da Lei.
12 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis)
contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência,
para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da
Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei 13.457, de 2017).
13 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo juízo a quo, com base
em exame pericial realizado em 06 de julho de 2016 (fls. 35/41), diagnosticou a autora como
portadora de "transtorno da personalidade histriônica (CID10-F60.4)". Assim sintetizou o laudo:
"Periciada comparece trajada e asseada de maneira adequada a situação vivenciada. Postura
teatral durante o ato médico, deitada no colo do marido, vitimizada. Atenta, orientada
globalmente, memória preservada. Fala de conteúdo lógico, sem alteração da velocidade. Nega
alteração do senso-percepção. Humor estável, afeto superficial. Juízo crítico da realidade
preservado. (...) Após avaliação cuidadosa da estória clínica, exame psíquico, relatórios,
atestados médicos e leitura do processo, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico
psiquiátrico a periciada Josefa de Fátima Donizetti, encontra-se CAPAZ de exercer toda e
qualquer atividade laboral incluindo a habitual (dona de casa) e/ou exercer os atos da vida cível.
O Transtorno de Personalidade Histriônica é um quadro de perturbação do funcionamento
mental que causa interferência nos relacionamentos afetivos íntimos, mas não interfere na
capacidade laborativa" (sic).
14 - Nova perícia, efetivada por médico do trabalho e especialista em cardiologia, com
fundamento em exame realizado em 14 de dezembro de 2010 (fls. 207/213), destacou que "a
autora não apresenta nenhuma patologia que a limite atualmente às funções exercidas".
15 - Diante da anulação da primeira sentença prolatada (fls. 279/280), foi determinada a
realização de novas perícias, por profissionais médicos distintos, das áreas de cardiologia e
ortopedia.
16 - Nessa senda, novo profissional, médico do trabalho, angiologista e cirurgião vascular, com
base em perícia efetivada em 13 de novembro de 2012 (fls. 316/331), asseverou que, "do ponto
de vista cardiológico, analisando o histórico da autora nos autos não consta nenhuma
internação hospitalar por queixa específica; no exame físico não há nenhum sinal de
insuficiência cardíaca, apresenta porém arritmia cardíaca e hipertensão arterial controlada.
Arteriograficamente não apresenta nenhuma lesão hemodinamicamente significativa e
apresenta uma pequena área da ponta do ventrículo esquerdo com discreta hipcontratilidade.
Por todos esses dados considero que a autora apresenta incapacidade parcial permanente".
17 - Por fim, médico perito ortopedista, com base em exame pericial efetuado em 05 de
fevereiro de 2016 (fls. 405/408), diagnosticou a demandante como portadora de "doença
osteodegenerativa de coluna lombossacra e patologia da coluna vertebral, que ocorre com o
passar da idade e pode causar dor em situações de esforço físico ou mal jeito em crises",
concluindo, também, pela inexistência de impedimento.
18 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente os pareceres do expertos. Atestados médicos,
exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem
tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso
concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto
probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis
Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima,
DJE. 12/11/2010.
19 - Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos nos órgãos
competentes, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnósticos com
base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem
como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo
conjunto probatório, referidas provas técnicas merecem confiança e credibilidade.
20 - Dos 4 (quatro) laudos periciais acostados aos autos, elaborados dentro de um período de 6
(seis) anos, 3 (três) não constataram qualquer óbice ao desempenho de atividade laboral pela
autora.
21 - O único, elaborado pelo terceiro médico (fls. 316/331), concluiu tão somente pela
incapacidade parcial da demandante, que a impede de exercer apenas atividades que
envolvam "grandes esforços", que não é o caso da sua atividade laboral habitual, de "faxineira".
O referido expert consignou que as lesões cardiológicas da autora são mínimas (artéria
descendente anterior com lesão discreta em terço proximal; ventrículo esquerdo com
hipocontratilidade discreta da parede antero-apical), atestando, ainda, "que não há nenhuma
área do coração com risco de sofrer infarto iminente, não havendo portanto necessidade de
correção cirúrgica (ponte de safena ou de artéria mamária); e não há comprometimento da
função contrátil nos demais segmentos", sendo que suas moléstias "são controláveis por
medidas preventivas e medicamentos". Aliás, em resposta ao quesito de nº 1 apresentado pela
própria demandante, afirmou que "a medicação em uso parece estar exercendo um controle
efetivo da pressão arterial".
22 - Dessa forma, tendo em vista a inexistência de incapacidade para sua atividade profissional
habitual, requisito indispensável à concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-
doença, como exigem os já citados artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento do
pedido.
23 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
24 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em
10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5
(cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a
concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º,
e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
25 - Agravo retido do INSS e remessa necessária não conhecidos. Apelação do INSS provida.
Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação
julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso.
Gratuidade da justiça. Apelo da parte autora prejudicado.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa
necessária e do agravo retido do INSS e dar provimento à sua apelação para reformar a r.
sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a revogação da tutela
anteriormente concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores
recebidos a esse título, restando prejudicado o apelo da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
