
| D.E. Publicado em 20/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo retido do autor para deferir a tutela antecipada e determinar que a autarquia, em 45 dias a partir da ciência desta, emita a Certidão por Tempo de Contribuição, contabilizando-se inclusive o período comum decorrente da conversão do período especial de 10/12/1975 a 18/12/1992 e negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, mantendo, na íntegra, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002851-36.2008.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação previdenciária em que o autor almeja a expedição de certidão de tempo de serviço mediante o reconhecimento da especialidade do período de 10/12/1975 a 18/12/1992 e a conversão deste em comum, para fins de contagem recíproca junto ao regime estatutário.
Da tutela indeferida às fls.63/64, o autor interpôs agravo retido de fls.67/70, postulando pela expedição da Certidão de Tempo de Contribuição com inclusão de todos os períodos registrados em CTPS, bem como o período laborado em condições especiais, em regime celetista, perante a Prefeitura Municipal de São José dos Campos.
Às fls.117/133, a sentença julgou "procedente o pedido para declarar como exercido em condições especiais o trabalho do autor na Prefeitura Municipal de São José dos Campos, no período entre 10/12/1975 a 18/12/1992 (sob regime celetista), e para determinar ao INSS que proceda à respectiva averbação, convertendo-o em tempo de serviço comum, expedindo Certidão de Tempo de Contribuição com menção deste período convertido ao lado daqueles que constam registrados na CTPS do autor". Tutela antecipada não concedida ao fundamento de que a obtenção da certidão pode "dar azo à constituição de relações jurídicas outras, perante o Regime de Previdência do Servidor Municipal". Autarquia condenada no pagamento das despesas, atualizadas nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, desde o desembolso efetuado pelo autor, bem como no pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa atualizado. Sentença submetida ao reexame necessário.
Na apelação de fls.138/142, a autarquia requer a reforma do julgado argumentando: a) não ser mais possível o enquadramento por atividade profissional, passando a exigir que o segurado comprove a exposição aos agentes nocivos mediante apresentação de laudo técnico expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; b) legalmente vedada está a conversão de tempo de serviço especial em comum, desde 28/05/1998, quando da promulgação da Medida Provisória nº 1.663/14, convertida na Lei nº 9.711/98; c) o disposto no art. 96 da Lei nº 8.213/91 obsta a pretensão do autor, trazendo os precedentes jurisprudenciais do STJ; d) a conversão em comum de tempo de trabalho sob condições especiais somente é possível aos períodos posteriores ao advento da Lei nº 6.887/80.
Em sede de contrarrazões, o autor pede a apreciação do agravo retido de fls. 67/70.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda se verificou em 04/06/2008 perante o Juízo Federal da 2ª Vara de São José dos Campos, com a posterior citação da autarquia em 20/03/2009 (fl. 76) e a prolação da r. sentença em 18/01/2011 (fls. 117/133), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De início, conheço do agravo retido interposto pelo autor, eis que requerida sua apreciação, em sede de contrarrazões de apelação, conforme determinava o art. 523, §1º, do CPC/1973, vigente à época da interposição dos recursos, deixando claro que o respectivo mérito será apreciado em conjunto com o da remessa necessária e do apelo interposto pela autarquia.
O autor pretende obter o reconhecimento da especialidade do período de 10/12/1975 a 18/12/1992, durante o qual laborou, como "Técnico de Raio X" para a Prefeitura Municipal de São José dos Campos, em regime celetista, postulando ainda pela expedição da Certidão de Tempo de Contribuição constando nela a conversão deste período em comum, para que possa apresentá-la à averbação junto ao Instituto da Previdência do Servidor Municipal.
Verifico que o pleito formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Acresça-se que até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatada exposição à tensão elétrica superior a 250 volts em períodos posteriores ao laborado pelo autor, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Do caso concreto
Compulsando os autos, verifica-se através do perfil Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 30, emitido em 29/05/2007 (fls.30/31), corroborando pelo teor dos laudos técnicos de fls. 32/40, que o autor, enquanto laborou junto à Prefeitura Municipal de São José dos Campos em regime celetista, demonstrou o exercício de atividade especial, nos seguintes períodos de:
- 10/12/1975 a 31/03/1978, no cargo de "Auxiliar de Raio X" no Pronto Socorro Municipal, atendendo "a pacientes, radiografando regiões traumatizadas ou qualquer outro órgão, operando aparelhos de abreugrafia, radioscopia e radiografia de acordo com a orientação e prescrição médica";
- 01/04/1978 a 10/02/1992, no cargo de "Técnico de Raio X", no Pronto Socorro Municipal, executando "exames radiológicos, sob supervisão do médico radiologista, posicionando adequadamente o paciente e acionando aparelhos de abreugrafia, radioscopia e radiografia de acordo com a orientação e prescrição médica";
- 11/02/1992 a 18/12/1992, no cargo de "Técnico de Raio X", na Divisão Hospitalar, executando igualmente os "exames radiológicos, sob supervisão do médico radiologista, posicionando adequadamente o paciente e acionando aparelhos de abreugrafia, radioscopia e radiografia de acordo com a orientação e prescrição médica".
Vale lembrar que a controvérsia referente à possibilidade de reconhecimento de tempo de serviço prestado em condições especiais sob o regime celetista, para fins de contagem recíproca com tempo de serviço público, encontra-se pacificada na jurisprudência do colendo Supremo Tribunal Federal:
Nessa mesma toada, as seguintes decisões monocráticas daquela Corte Superior: ARE 953015, Relator: Min. Dias Toffoli, julgado em 01/08/2017, publicado em 10/08/2017, RE 1068026, Relatora: Min. Rosa Weber, julgado em 28/08/2017, publicado em 06/09/2017 e RE 968486, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 16/03/2017, publicado 22/03/2017.
Este também o posicionamento desta Egrégia Corte Regional, conforme ementas que seguem:
Consigne-se que a Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXIV, assevera ser direito fundamental individual a obtenção de certidões perante o Poder Público, de modo que a expedição de Certidão de Tempo de Serviço é manifestação de tal preceito, configurando declaração do Poder Público acerca da existência (ou inexistência) de relação jurídica pré-existente. Importante ser dito que o conteúdo de tal certidão não comporta qualquer tipo de ressalva no tocante à extensão de sua utilidade no sentido de que ela não poderá ser utilizada para fins de contagem recíproca.
Dessa forma, diante de um legítimo interesse (qual seja, declaração judicial a respeito de tempo de serviço exercido sob condições especiais nos termos da legislação aplicável), somente é possível ao julgador, após reconhecer e asseverar a existência desse tal direito, impor que se expeça a certidão (sob o pálio do direito fundamental individual anteriormente descrito), o que não significa que, de posse dela, automaticamente seu detentor obtenha direito à percepção de benefício previdenciário, sendo necessário, ainda, o adimplemento dos requisitos legais a ser perquirido no momento em que pugnada a benesse (inclusive se a adição de tempos de filiação em regimes diversos restou suficiente).
Conforme já acenado nos julgados acima transcritos, cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social emitir a certidão de tempo de serviço - mencionando os lapsos especiais reconhecidos ao segurado - e, ao órgão a que estiver vinculado o servidor, a averbação do conteúdo certificado e a soma do tempo de labor para fins de concessão da aposentadoria.
Portanto, o autor faz jus à expedição de certidão de tempo de serviço, para fins de contagem recíproca, inclusive quanto à conversão em comum, pelo fator 1,40, do período de 10/12/1975 a 18/12/1992, cuja especialidade se encontra reconhecida nesta demanda.
Por conta da apreciação do mérito do agravo retido interposto pelo autor, defiro a antecipação dos efeitos da tutela para determinar que o INSS, em 45 dias, emita, a favor do autor, a Certidão de Tempo de Contribuição, fazendo nela constar o resultado da conversão em comum do período especial de 10/12/1975 a 18/12/1992, pelo fator 1,40.
Isenta é a autarquia do pagamento das custas nos termos do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/92. Mantida a condenação dos honorários fixados pelo juízo a quo.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo retido do autor para deferir a tutela antecipada e determinar que a autarquia, em 45 dias a partir da ciência desta, emita a Certidão por Tempo de Contribuição, contabilizando-se inclusive o período comum decorrente da conversão do período especial de 10/12/1975 a 18/12/1992 e nego provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, mantendo, na íntegra, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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