Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1546284 / SP
0004345-95.2006.4.03.6105
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. INTERESSE DE
AGIR PRESENTE ANTE A CONCESSÃO DE BENEFÍCIO NA VIA ADMINISTRATIVA.
JULGAMENTO DA CAUSA. ARTIGO 515, § 3º, DO CPC/73. APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE URBANA COM REGISTRO EM CTPS. AVERBAÇÃO.
ATIVIDADE RURAL RECONHECIDA PELO INSS. ATIVIDADE ESPECIAL. FORMULÁRIOS.
SOLDADOR. OPÇÃO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA. PEDIDO JULGADO
PROCEDENTE.
1. O regular desenvolvimento da relação jurídico-processual é formado pelo binômio interesse-
necessidade, de modo que a intervenção do Poder Judiciário apenas se revela necessária
quando há resistência de uma parte em submeter à pretensão requerida pela parte adversa. A
sentença entendeu pela perda superveniente do interesse de agir do autor e extinguiu o feito
sem resolução do mérito tendo em vista concessão do benefício na via administrativa.
2. Não há que se falar em ocorrência de carência superveniente em face de desaparecimento
do interesse processual, no que diz respeito à implantação do benefício da aposentadoria
integral ao autor. Persiste o interesse processual quanto à discussão sobre o direito ao
benefício, pois, segundo afirma, possui direito adquirido ao benefício da aposentadoria
anteriormente à edição da Emenda Constitucional 20/98, e o benefício deve ser deferido na
data do segundo requerimento administrativo, qual seja, 30/09/2002.
3. Anulação da sentença. Reconhecimento da persistência do interesse processual.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. A legislação autoriza o julgamento imediato do processo quando presentes as condições
para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil (antigo art. 515,
§3º, do CPC/73).
5. Os períodos de atividade rural, de 01/01/63 a 31/12/63 e 01/01/68 a 31/12/71 já foram
reconhecidos administrativamente pelo INSS, conforme julgamento realizado na 13ª Junta de
Recursos.
6. As anotações dos contratos de trabalho na CTPS do autor comprovam todos os vínculos
laborais, datas anteriores ao ajuizamento da ação.
7. É assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente
afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme
assentado no Enunciado nº 12/TST. E, relativamente ao recolhimento de contribuições
previdenciárias, em se tratando de segurado empregado, essa obrigação fica transferida ao
empregador, devendo o INSS fiscalizar o exato cumprimento da norma. O INSS não se
desincumbiu do ônus de comprovar eventuais irregularidades existentes nos registros apostos
na CTPS da autora (art. 333, II, CPC/73 e art. 373, II, CPC/15).
8. À vista do conjunto probatório juntado aos autos, devem ser reconhecidos os vínculos de
01/02/72 a 23/03/73, 03/04/73 a 10/07/73, 07/02/75 a 05/04/75, 05/05/75 a 20/07/81, 01/02/82 a
15/05/83, 16/05/83 a 31/08/84, 01/11/84 a 18/12/86, 17/06/87 a 10/11/88 e 17/11/88 a 16/04/93,
todos constantes na CTPS, alguns inclusive já constam do CNIS.
9. Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
10. Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831/64, e
nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080/79, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de
julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a
desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para
ruído e calor.
11. Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de
Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
12. O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
13. Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
14. Até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou
pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova. Depois é
defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário
comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de
formulário-padrão fornecido pela empresa. E a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição
aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por
profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações
extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros
ambientais ou pela monitoração biológica.
15. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de
habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como
especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação
anterior.
16. É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos
termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99. Orientação do STJ.
17. Da leitura dos formulários juntados pelo autor, denota-se que a atividade desenvolvida pelo
requerente, de soldador, é passível de reconhecimento do caráter especial pelo mero
enquadramento da categoria profissional. Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 (código 2.5.3) e
do Decreto 83.080/79 (código 2.5.3).
18. No que se refere aos períodos de 01/02/82 a 15/05/83 e 17/11/88 a 16/04/93, embora não
conste dos autos formulário, verifica-se do registro do contrato de trabalho em CTPS que, em
ambos os casos, a atividade foi exercida também na função de soldador. Possível, portanto, o
reconhecimento da especialidade.
19. Quanto ao período de 07/02/75 a 05/04/75, o mesmo foi considerado insalubre pelo próprio
INSS, nos termos do código 1.2.11 do anexo III do Decreto 53.831/64, conforme se verifica de
decisão tomada pela 13ª Junta de Recursos/SP. Além disso, o formulário atesta que, no
desempenho de suas funções, o autor esteve exposto a "resíduos de gás liquefeito de petróleo,
de modo habitual e permanente". O agente nocivo encontra-se previsto no Código 1.2.11 do
Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 1.2.10 do Anexo I do Decreto 83.080/79, de
modo que a atividade laboral em questão é passível de reconhecimento como especial.
Precedente desta Corte.
20. Reconhecida a especialidade do labor nos períodos de 01/02/72 a 23/03/73, 03/04/73 a
10/07/73, 07/02/75 a 05/04/75, 05/05/75 a 20/07/81, 01/02/82 a 15/05/83, 16/05/83 a 31/08/84,
01/11/84 a 18/12/86, 17/06/87 a 10/11/88 e 17/11/88 a 16/04/93.
21. Comprovado o exercício de labor submetido a condições prejudiciais à saúde e à
integridade física, o fato de ter o autor exercido, em determinados períodos, atividades
concomitantes de natureza comum não configura impedimento ao reconhecimento pretendido
nesta demanda. Precedente desta Corte.
22. Conforme planilha anexa, somando-se os vínculos empregatícios constantes no CNIS, bem
como os reconhecidos nesse voto, verifica-se que o autor contava com 36 anos, 07 meses e 03
dias de tempo de serviço em 30/09/2002, o que lhe garante o direito à percepção do benefício
de aposentadoria integral por tempo de contribuição, pelas regras posteriores à Emenda
Constitucional nº 20/98.
23. Verifica-se, por sua vez, que na data da EC 20/98, 16/12/98, o autor contava com 32 anos,
09 meses e 19 dias de tempo de serviço, o que lhe garante o direito à percepção do benefício
de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com direito adquirido às regras
anteriores à EC 20/98. Ressalto que não era necessário o cumprimento do requisito da idade
mínima antes da emenda.
24. A parte autora recebe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, concedido
administrativamente, com DIB em 13/08/2008, referente a requerimento formulado pelo
segurado em 01/09/2008. Sendo assim, faculta-se ao demandante a opção pela percepção do
benefício que se lhe afigurar mais vantajoso: aquele que já recebe administrativamente ou a
aposentadoria proporcional por tempo de contribuição pelas regras anteriores à EC 20/98 ou a
aposentadoria integral pelas regras posteriores à Emenda.
25. É vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da
Lei nº 8.213/91, e, com isso, condicionada a execução dos valores atrasados à opção pelo
benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados
concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente
representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é
vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C.
Supremo Tribunal Federal (RE nº 661.256/SC).
26. O termo inicial do benefício, seja a integral ou proporcional, deverá ser fixado na data do
requerimento administrativo (30/09/2002), ocasião em que a entidade autárquica tomou
conhecimento da pretensão.
27. A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
28. Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
29. Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111/STJ.
30. Apelação do autor provida para anular a sentença. Pedido julgado procedente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso
de apelação do autor para anular a r. sentença em razão da extinção sem resolução do mérito
do feito, e, com fundamento nos artigos 515, §3º, do CPC/1973 (1013, §3º, I c/c 485, I, ambos
do CPC/2015), julgar procedente o pedido deduzido na inicial, extinguindo o feito com resolução
do mérito, para reconhecer o tempo de serviço rural nos períodos de 01/01/63 a 31/12/63 e
01/01/68 a 31/12/71, bem como os vínculos de 01/02/72 a 23/03/73, 03/04/73 a 10/07/73,
07/02/75 a 05/04/75, 05/05/75 a 20/07/81, 01/02/82 a 15/05/83, 16/05/83 a 31/08/84, 01/11/84 a
18/12/86, 17/06/87 a 10/11/88 e 17/11/88 a 16/04/93 e, ainda, reconhecer a especialidade do
labor nos períodos de 01/02/72 a 23/03/73, 03/04/73 a 10/07/73, 07/02/75 a 05/04/75, 05/05/75
a 20/07/81, 01/02/82 a 15/05/83, 16/05/83 a 31/08/84, 01/11/84 a 18/12/86, 17/06/87 a 10/11/88
e 17/11/88 a 16/04/93, condenando o INSS na implantação e pagamento do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição, conforme opção do autor, a partir da data do
requerimento administrativo (30/09/2002), sendo que sobre os valores em atraso incidirá
correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada
pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de
acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a Autarquia, no pagamento da verba
honorária, fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da
sentença, facultando ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso,
e, por maioria, decidiu condicionar a execução dos valores atrasados à necessária opção por
aquele cujo direito foi reconhecido em Juízo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-1013 PAR-3 INC-2 ART-373 INC-2 ART-485 INC-1 ART-
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3***** TST SÚMULA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
LEG-FED ENU-12***** TR-JEF-3R SÚMULA DA TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL
FEDERAL DA 3ª R
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LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70 PAR-1LEG-FED DEC-611 ANO-1992 ART-292LEG-
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LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-124 INC-2 ART-18 PAR-2LEG-FED
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LEG-FED SUM-111
Veja
STF RE 661.256/SCREPERCUSSÃO GERALTEMA 503;
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810.
