
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011424-15.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011424-15.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de período(s) trabalhado(s) em atividades especiais, sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em atividade(s) especial(ais) o(s) período(s) de 27/08/1986 a 31/08/1993, bem como para determinar sua conversão de tempo especial em tempo comum, ao fim de contagem de tempo de serviço. Condenou a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, nos termos do artigo 86, parágrafo único, do CPC, condicionando a cobrança à alteração de sua situação econômica, uma vez que é beneficiário da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, inciso IX, § 2º e 3º, do CPC.
Sentença não submetida à remessa necessária.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, preliminarmente, a necessidade de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. No mérito, sustenta a impossibilidade do enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como especiais no período admitido na sentença. Afirma a ausência de previsão legal de enquadramento por categoria profissional das atividades de eletricista, técnicos de telecomunicações, cabistas e outras assemelhadas, arguindo, ainda, que não restou demonstrada a exposição habitual e permanente da parte autora a tensões superiores a 250V. Aduz a inexistência de responsável técnico pelos registros ambientais no período reconhecido, o que seria exigível desde 14/10/1996. Por fim, prequestiona a matéria.
Apela a parte autora pugnando pelo reconhecimento como especial(is) do(s) período(s) de 01/09/1993 a 11/04/2008. Defende que se aplique aos fatos a legislação vigente à época da prestação dos serviços. Argumenta que a especialidade vindicada também tem esteio em laudo pericial produzido na Justiça do Trabalho, em litígio com a empregadora. Com a admissão do trabalho especial vindicado, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Contrarrazões pela parte autora.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011424-15.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE CLAUDIO FREITAS DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do(s) recurso(s).
Em relação ao pedido de recebimento do recurso no efeito suspensivo, verifico ausência de interesse recursal, vez que o apelo, naturalmente, já o possui, por não estar elencado em nenhuma das hipóteses do artigo 1.012, § 1º, do Código de Processo Civil. Pedido não conhecido.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 103/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda o artigo 162 da LOPS o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência." (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355)
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções serem assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física.
Comprovação da atividade especial
O reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e a forma da sua demonstração devem observar a legislação vigente à época da prestação do trabalho (“tempus regit actum”), conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A teor do art. 58 da Lei 8.213/91, na redação dada pelas Leis 9.528/97 e 9.732/98, “a relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.” (caput); “a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista.” (§1º); “do laudo técnico referido no parágrafo anterior deverão constar informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.” (§2º); “a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei.” (§3º); “a empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento.” (§4º).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado.” A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Para períodos laborados até 28/04/95, admite-se o enquadramento legal da atividade especial por categoria profissional do segurado, observada a classificação prevista nos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, mediante a apresentação de CTPS, formulários SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030, laudo técnico (LTCAT – Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho) ou PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário (IN INSS 128/28.03.2022, art. 274, I).
Para períodos compreendidos de 29/04/95 (data da publicação da Lei 9.032/95) a 31/12/2003, o reconhecimento da atividade especial exige a comprovação da exposição, de forma habitual e permanente, a agente nocivo durante o labor, mediante a apresentação de formulários SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030, laudo técnico ou PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário (IN INSS 128/28.03.2022, art. 274, II e III).
A partir de 01/01/2004, o labor em condições especiais deve ser comprovado exclusivamente por PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário (art. 274, IV, IN INSS 128/28.03.2022), preenchido e emitido na forma estabelecida pela IN INSS 99/2003.
Dispõe o art. 148, caput e §§ 9º e 14, da IN 99/2003 que: “A partir de 1º de janeiro de 2004, a empresa ou equiparada à empresa deverá elaborar PPP, conforme Anexo XV, de forma individualizada para seus empregados, trabalhadores avulsos e cooperados, que laborem expostos a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, ainda que não presentes os requisitos para a concessão desse benefício, seja pela eficácia dos equipamentos de proteção ,coletivos ou individuais, seja por não se caracterizar a permanência.”; §9º. O PPP deverá ser assinado por representante legal da empresa, com poderes específicos outorgados por procuração, contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica”; “§14. O PPP substitui o formulário para comprovação da efetiva exposição dos segurados aos agentes nocivos para fins de requerimento da aposentadoria especial, a partir de 1º de janeiro de 2004, conforme determinado pelo parágrafo 2º do artigo 68 do RPS, alterado pelo Decreto nº 4.032, de 2001.”
Assim, a partir de 01/01/2004, o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário, instituído pela Lei 9.528/97, passou a ser o documento comprobatório da atividade especial (art. 68, §3º, Decreto 3.048/99), em substituição aos antigos formulários, emitido pela empresa empregadora ou a ela equiparada, devendo ser preenchido na forma determinada pelo art. 148, §9º, IN 99/2003, com indicação do responsável técnico pelos registros ambientais. Nesse sentido, o julgado desta E. Sétima Turma, de minha relatoria: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5077649-67.2024.4.03.9999, julgado em 07/03/2025, DJEN DATA: 17/03/2025.
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece a disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo E. Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013), cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos (tema 694/STJ).
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80 dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90 dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia. Neste sentido: ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5256548-29.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 18/08/2020, Intimação via sistema DATA: 21/08/2020.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664.335 (tema 555/STF), da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Registre-se, a propósito, a tese firmada no julgamento do tema 1.090/STJ (REsp n. 2.080.584/PR, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Primeira Seção, julgado em 9/4/2025, DJEN de 22/4/2025):
“I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor.”
Portanto a indicação no PPP de uso de EPI eficaz descaracteriza, em tese, o tempo especial, ressalvadas, no entanto, as hipóteses excepcionais, como à exposição ao agente ruído, para a qual o C. STF consolidou o entendimento acerca da inexistência de proteção totalmente eficaz para sujeição ao ruído excessivo (tema 555/STF).
No mais, o E. STJ ratificou o entendimento anteriormente firmado no tema 213 TNU, no sentido de que cabe ao segurado impugnar a informação de eficácia do EPI presente no PPP, mediante a comprovação da(o) ausência de adequação ao risco da atividade, inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade, descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização, ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação, ou qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI, sendo que na dúvida sobre a real eficácia do EPI, deve ser reconhecida a atividade especial em favor do segurado.
Nesse particular, observe-se o quanto disposto no art. 291 da Instrução Normativa 128/2022 do INSS, in verbis:
“Art. 291. Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da Medida Provisória nº 1.729, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância:
I - da hierarquia estabelecida na legislação trabalhista, ou seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou provisoriamente até a implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;
II - das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às condições de campo;
III - do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do Ministério do Trabalho e Previdência ou do órgão que venha sucedê-la;
IV - da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais, comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e
V - da higienização.
Parágrafo único. Entende-se como prova incontestável de eliminação ou neutralização dos riscos pelo uso de EPI, citado no Parecer CONJUR/MPS/Nº 616/2010, de 23 de dezembro de 2010, o cumprimento do disposto neste artigo.”
Portanto, é imperativo comprovar a eliminação ou neutralização dos riscos para que o Equipamento de Proteção Individual (EPI) seja considerado eficaz, de forma inequívoca, em conformidade com os requisitos estabelecidos pela administração previdenciária. Em caso de divergência ou dúvida quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor, em observância ao standard probatório rebaixado, conforme orientação estabelecida pelo C. Supremo Tribunal Federal (Tema 555 da Repercussão Geral, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 4 /12/2014).
Agentes químicos
Considera-se especial o labor desempenhado de forma habitual e permanente com exposição a agentes químicos, conforme previsto na legislação previdenciária, entre eles:
- Hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos - no item 1.2.11 do Quadro do Decreto nº 53.831/64; nos itens 1.2.10 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Poeiras minerais - no item 1.2.10 do Decreto 53.831/64, item 1.2.12 do Quadro I, do Decreto nº 83.080/79, e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Fumos metálicos - no item 1.2.9 do Decreto 53.831/64;
- Agentes cancerígenos previstos no Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99.
Consoante estabelecido no Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes químicos tem sua intensidade aferida a partir de análise qualitativa ou quantitativa.
Quanto aos agentes hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos, em que a análise é qualitativa, prescinde, portanto, de quantificação da concentração da substância para caracterização da especialidade da atividade, bastando a comprovação do contato físico com o agente nocivo durante o labor.
Neste sentido: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5287730-33.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 13/12/2022, Intimação via sistema DATA: 15/12/2022.
No que tange aos agentes químicos sujeitos à análise quantitativa, o reconhecimento da especialidade depende de sua quantificação, nos termos do Anexo IV da Decreto nº 3.048, de 1999.
Vale dizer que a exposição aos agentes cancerígenos prescinde de análise qualitativa ou quantitativa para configurar condição especial de trabalho, vez que a substância integra o rol de agentes cancerígenos, cujo risco potencial de agressão à saúde, impõe o reconhecimento da insalubridade (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000745-28.2019.4.03.6136, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 16/12/2022, Intimação via sistema DATA: 28/12/2022).
A partir da vigência da Lei n.º 9.732/98, exigiu-se a elaboração de laudo técnico dispondo sobre a existência e utilização de tecnologia de proteção coletiva ou individual, passível de diminuir a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.
Assim, a partir de 14/12/1998 o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição ao agente nocivo durante o labor; se o uso de EPI for capaz de neutralizar a nocividade do agente, não haverá respaldo legal à percepção da aposentadoria especial.
No julgamento do ARE 664.335/SC com repercussão geral (Relator Ministro Luiz Fux, DJe 12/2/2015), o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que (I) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (II) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (III) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Consoante jurisprudência desta Corte, a ausência da informação da habitualidade e permanência no PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) não impede o reconhecimento da especialidade, porquanto o PPP é formulário padronizado pelo próprio INSS, a teor do § 1º do artigo 58 da Lei 8.213/91, sendo de competência da autarquia a adoção de medidas para reduzir as imprecisões no preenchimento do PPP pelo empregador; como os PPPs não apresentam campo específico para indicação de configuração de habitualidade e permanência da exposição ao agente, o ônus de provar a ausência desses requisitos é do INSS (AR 5009211-23.2018.4.03.0000, 3.ª Seção, Relator Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 1 7/5/2020).
Não se desconhece o julgamento do Tema 298 da TNU, no qual houve a deliberação no sentido de que a indicação genérica de exposição a agentes químicos “hidrocarbonetos” e “óleos e graxas” não é suficiente para caracterizar a especialidade da atividade.
No entanto, remanesce dissenso na jurisprudência desta Corte acerca da matéria, assim, compartilho o entendimento no sentido de que “óleos e graxas” utilizados nos processos industriais são enquadrados como hidrocarbonetos derivados do petróleo, substâncias tidas, inclusive, como potencialmente cancerígenas (Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9/2014 – LINACH).
Anoto que o Anexo nº 13 da NR-15, traz como hipótese de insalubridade de grau máximo o exercício de atividade profissional com a manipulação de óleos minerais, tendo em vista a exposição a substâncias que contêm hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, restando caracterizada a nocividade para fins de enquadramento especial.
Nesse sentido os seguintes julgados: TRF3, 9ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL - 5000088-03.2020.4.03.6120, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 19/04/2023, DJEN DATA: 26/04/2023; AC 5004102-82.2019.4.03.6114, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, 7ª Turma, Intimação via sistema em 29/4/2022; APELREEX nº 0000858-22.2013.4.03.6122, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Lucia Ursaia, v.u., j. 19/04/16, DJe 27/04/16.
Eletricidade
Consoante julgamento do Recurso Especial n.º 1.306.113/SC (tema 534/STJ), representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível reconhecer a especialidade de labor com exposição à tensão elétrica de 250 volts mesmo com a supressão do agente do rol do Decreto n.º 2.172/97.
Com efeito, embora a eletricidade não conste expressamente do rol de agentes nocivos previstos nos Decretos nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99, sua condição especial permaneceu reconhecida pela Lei nº 7.369/85, pelo Decreto nº 93.412/86, e pela Lei nº 12.740/12.
O nível de eletricidade deve constar expressamente nos documentos comprobatórios, não sendo presumível a exposição à alta tensão, em razão da atividade de eletricista.
A ausência de comprovação do caráter permanente da exposição à eletricidade não impede o reconhecimento da atividade especial. Nesse sentido, já decidiu esta Corte Regional: "Em se tratando de exposição a altas tensões elétricas, que tem o caráter de periculosidade, a caracterização em atividade especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador, justificando o enquadramento especial." (Décima Turma, APELREEX 0001107-72.2014.4.03.6110, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, julgado em 12/04/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2016).
Cito, ainda, acerca desta matéria, recente precedente da Sétima Turma julgadora deste Egrégio Tribunal: “(...) 17 – No mais, importante ser dito que restou superada a questão relacionada à supressão do agente eletricidade do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 18 - Quanto ao período laborado na “IBM Brasil -Indústria de Máquinas e Serviços Ltda." de 01/03/1978 a 05/03/1997, o PPP trazido a juízo (ID 160111683, p. 7/11), com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, demonstra que o requerente estava exposto à tensão elétrica de 85 a 400V, o que permite o reconhecimento da especialidade, com fundamento no item 1.1.8 do Anexo do Decreto nº 53.831/64.19 - A ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário. Precedente.20 - Ademais, ressalte-se que os requisitos de "habitualidade" e "permanência" devem ser interpretados cumgranus salis. Exigir-se do trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes agressivos, por toda a sua jornada de trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem sua saúde esmigalhada. Habitualidade pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com o exercício cotidiano de determinado trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou, até mesmo, alternado não são auto-excludentes da ideia de habitualidade. A questão da permanência deve ser encarada da mesma forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura, capaz de prejudicar a saúde do trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir esse raciocínio, somente faria jus à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta razão, é que a situação de intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a exposição se dê rotineiramente, de maneira duradoura (...)” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000675-91.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 03/03/2023, DJEN DATA: 09/03/2023).
Por se tratar de atividade periculosa, o uso de EPI não seria capaz de elidir os riscos decorrentes das atividades exercidas pele parte autora.
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca da especialidade das atividades trabalhadas no(s) período(s) de 27/08/1986 a 31/08/1993 e 01/09/1993 a 11/04/2008, objeto de impugnação no(s) recurso(s).
Atividade especial
1 – 27/08/1986 a 31/08/1993 e 01/09/1993 a 11/04/2008
Empresa: Telefônica Brasil SA
Atividades/funções: auxiliar de redes/técnico de telecomunicações
Agente(s) nocivo(s): Tensão elétrica superior a 250 volts
Enquadramento legal: Código 1.1.8 do Decreto nº 53.831/64 (Resp. nº 1.306.113/SC, Lei nº 7.369/85, Decreto nº 93.412/86 e Lei nº 12.740/12.)
Prova(s): Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP emitido em 13/02/2017, apresentado na via administrativa (ID 332784067, p. 6/8) e laudo pericial produzido na Justiça do Trabalho (ID 332784068, p. 1/16).
Particularmente neste caso, o laudo produzido na esfera laboral revela particular importância, na medida que o Perfil Profissiográfico Previdenciário traz expressamente em seu corpo, no campo observações, a seguinte informação: “Documento emitido exclusivamente para atender determinação judicial do Processo 00940004420095150095 da 08ª Vara do Trabalho de Campinas SP”. E, exatamente no mencionado processo, que foi produzido o laudo pericial trabalhista citado. Cabe destacar, inclusive, que o responsável pelos registros ambientais anotado no referido PPP é o próprio perito judicial, o que impõe a leitura em conjunto dos documentos trazidos a juízo.
Em análise do laudo trabalhista, observa-se que houve maior detalhamento das funções exercidas pelo requerente ao longo de todo o tempo em que esteve na empresa. Constou que “foi admitido em 27/08/1986, registrado na função de Técnico em Telecomunicações, sendo desligado do quadro funcional da empresa em 11/04/2008”. Afirmou o perito que o “reclamante realizava serviços de instalação e manutenção de equipamentos de comunicação de dados, trabalhando nas ruas, junto aos postes de distribuição de energia elétrica, tendo como base de apoio a Sala de Supervisão GTD – Grupo de Transmissão de Dados, hoje desativada”. Relatou, ainda, que o “reclamante subia nos postes de distribuição de energia elétrica, onde colocava uma escada, cerca de 15 vezes por semana, em média, pois havia dias em que não subia nos postes e dias em que precisava subir mais de 5 vezes, permanecendo junto a estes postes durante o período de 10 minutos a 2 horas, dependendo do serviço a ser realizado.”
Não há dúvidas, portanto, que o autor esteve exposto a altas tensões (superiores a 250V) em suas atividades, como constou na documentação reunida, impondo considerar que a periculosidade estava presente em toda a sua jornada laboral, já que não há qualquer distinção feita nesse sentido pelo expert no laudo pericial, documento que serviu como base para a elaboração do PPP.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 27/08/1986 a 31/08/1993 e 01/09/1993 a 11/04/2008, em decorrência da exposição à tensão elétrica acima do limite permitido.
Destarte, reconheço o labor em condições especiais no(s) período(s) de 27/08/1986 a 31/08/1993 e 01/09/1993 a 11/04/2008.
Considerando o tempo de serviço especial reconhecido nos autos, bem como o tempo comum reconhecido na via administrativa, verifica-se que à época da data do requerimento administrativo (30/03/2017), a parte autora já havia preenchido o tempo de serviço necessário à concessão do benefício e cumprido a carência mínima exigida pela Lei de Benefícios.
Sendo assim, verifica-se que a parte autora ultrapassou os 35 anos exigidos para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
Ressalto que para os segurados filiados ao RGPS antes da promulgação da EC 103/2019, ou seja, até 12.11.2019, e que, até aquela data cumpriram os requisitos para concessão da aposentadoria por tempo de contribuição/especial, deve ser observado o direito adquirido, independente da data do requerimento administrativo.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (30/03/2017), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado, ora fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015, da Súmula 111 e do Tema 1105 do C. STJ.
Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado em 2% (dois por cento) da condenação estabelecida nesta decisão.
Ante o exposto, não conheço de parte do recurso de apelação do INSS e, na parte conhecida, nego-lhe provimento e, com fulcro no §11 do art. 85 do CPC, majoro os honorários de advogado em 2% (dois por cento) sobre o valor arbitrado na sentença e dou provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o labor em condições especiais no(s) período(s) de 01/09/1993 a 11/04/2008 e condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (30/03/2017), fixando os consectários legais nos termos explicitados na decisão, mantida, no mais, a sentença recorrida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. USO DE EPI. TEMA 555/STF. TEMA 1090/STJ. ELETRICIDADE. EXPOSIÇÃO PERMANENTE. PRÉVIO CUSTEIO. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Ausência de interesse recursal quanto à(ao) pedido de efeito suspensivo. Pedido não conhecido.
2. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração (“tempus regit actum”).
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95); por meio da confecção de informativos/formulários ou laudo técnico (no período de 29/04/95 a 31/12/2003); a partir de 01/01/2004 por Perfil Profissiográfico Previdenciário, preenchido e emitido na forma estabelecida pela IN INSS 99/2003 (art. 58 da Lei 8.213/91, na redação dada pelas Leis 9.528/97 e 9.732/98, c/c IN INSS 128/28.03.2022, art. 274).
5. Para o agente ruído, considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80 dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90 dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85 dB.
6. O uso de Equipamento de Proteção Individual – EPI para o agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, não descaracteriza o tempo de serviço especial.
7. Necessária a comprovação da eliminação ou neutralização dos riscos para que o Equipamento de Proteção Individual (EPI) seja considerado eficaz, de forma inequívoca, conforme estabelecido pela IN INSS 128/2022, art. 291. Em caso de divergência ou dúvida quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor, em observância ao standard probatório rebaixado, conforme orientação estabelecida pelo C. Supremo Tribunal Federal (Tema 1090/STJ, Tema 555/STF).
8. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não pode ser por isso prejudicado.
9. A exposição à tensão elétrica superior a 250 volts enseja o reconhecimento do exercício do trabalho em condições especiais (Resp. nº 1.306.113/SC, Lei nº 7.369/85, Decreto nº 93.412/86 e Lei nº 12.740/12.)
10. O nível de eletricidade deve constar expressamente nos documentos comprobatórios, não sendo presumível a exposição à alta tensão, em razão da atividade de eletricista.
11. A ausência de comprovação do caráter permanente da exposição à eletricidade não impede o reconhecimento da atividade especial.
12. O autor cumpriu o requisito temporal e a carência prevista na Lei de Benefícios, fazendo jus à aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
13. DIB na data do requerimento administrativo.
14. Juros e correção monetária. Aplicação dos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
15. Honorários de advogado. Inversão do ônus da sucumbência.
16. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
17. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS parcialmente conhecida e não provida. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal
