
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001969-06.2015.4.03.6111
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: APARECIDA LUZIANO MOURAO
Advogado do(a) APELANTE: ADALBERTO AUGUSTO SALZEDAS - SP205831
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001969-06.2015.4.03.6111
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: APARECIDA LUZIANO MOURAO
Advogado do(a) APELANTE: ADALBERTO AUGUSTO SALZEDAS - SP205831
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa idosa.
A sentença, prolatada em 13.10.2015, reconhecendo a ocorrência de coisa julgada julgou extinto o processo nos termos que seguem: “Diante do exposto, EXTINGO O FEITO sem exame do mérito, fazendo-o com fundamento no art. 267, V, do CPC. Sem honorários em desfavor da parte autora, vez que sequer estabelecida a relação processual. Indene de custas, diante da gratuidade deferida. No trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe.”
Apela a parte autora alegando para tanto que decorrido largo lapso temporal entre o ajuizamento deste feito e da demanda anterior, torna-se necessária a apreciação do pedido ora ajuizado.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001969-06.2015.4.03.6111
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: APARECIDA LUZIANO MOURAO
Advogado do(a) APELANTE: ADALBERTO AUGUSTO SALZEDAS - SP205831
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Consoante o disposto no artigo 301, §3º, do Código de Processo Civil/1973: "há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba mais recurso".
O caráter social do Direito Previdenciário, as questões de saúde que permeiam muitas das ações que versam sobre benefícios previdenciários e assistenciais - cuja melhora ou agravamento provocam a modificação dos fatos - e a variedade dos lapsos temporais que se verificam entre análise administrativa e à apreciação judicial (incluindo os momentos em que são realizadas as perícias médicas e/ou sociais), recomendam uma visão das normas processuais atenta a tais peculiaridades.
Nessa perspectiva, a princípio, cada requerimento administrativo inaugura um novo quadro fático e jurídico passível de ensejar o ajuizamento de nova ação judicial, salvo se verificado, de forma patente, que conteúdo do novo requerimento e da nova ação reproduz, integralmente, o conteúdo do requerimento e da ação anteriores.
Especialmente no que se refere à concessão do benefício de assistencial o Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Confira-se:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(STJ, Terceira Seção, REsp 1112557/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Na presente ação ajuizada em 27.05.2015, a parte autora pretende a concessão do benefício assistencial que lhe foi negado administrativamente em 12.03.2015 (ID 87778740 – pag. 18) vez que a renda familiar supera o limite legal.
Na ação anterior (processo nº 2007.61.11.005977-0) foi prolatada sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial à pessoa idosa, eis que não demonstrada a existência de miserabilidade. Em sede de julgamento do recurso interposto pela parte autora, em 22.01.2009, esta Corte Regional negou provimento à sua apelação, mantendo a sentença de improcedência. Nesta seara, em consulta ao sistema informatizado deste tribunal verifica-se que a decisão transitou em julgado em 10.02.2009.
Observa-se, portanto, que houve novo pedido administrativo do benefício de prestação continuada após o trânsito em julgado, e, embora as duas ações apresentem idênticas partes e tenham por objetivo a concessão do mesmo benefício, noticiado o agravamento do estado de saúde da autora com consequente alteração de suas condições socioeconômica, aponto que a natureza do benefício ora pleiteado faz com que seja necessário apurar se a nova condição por ela vivida enseja a concessão do benefício ora pleiteado, pelo que resta afastado, neste momento, a ocorrência da coisa julgada.
Observe-se lapso temporal de mais de sete anos entre o ajuizamento da ação anterior (29.11.2007) e o novo pedido administrativo (12.03.2015), cujo indeferimento deu origem a presente demanda.
Confira-se a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REMESSA OFICIAL E COISA JULGADA NÃO RECONHECIDAS. IDOSO. HIPOSSUFICIÊNCIA COMPROVADA. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS REDUZIDOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Inicialmente, por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
2 - Nesse passo, embora não seja possível mensurar exatamente o valor da condenação, considerando o termo inicial do benefício (27/11/2013) e a data da sentença (15/02/2016), verifica-se, de plano, que a benesse concedida não ultrapassa o valor de 60 salários mínimos, não havendo que se falar em remessa oficial, nos termos do artigo 475, §2º, do CPC/1973. 3
- Ainda em sede preliminar, não há que se falar em violação à coisa julgada. Embora a autora tenha ingressado anteriormente com demanda semelhante, tratando-se de benefício assistencial, que necessariamente é lastreado em exame de fatos suscetíveis de alteração no tempo, para que reste configurada a coisa julgada faz-se necessário a constatação da manutenção do mesmo contexto fático que embasou a ação anterior. Dito isso, deve ser afastada de plano a coincidência do contexto fático entre as demandas, tendo em vista que se trata de benefício requerido por pessoa idosa (a autora no momento da propositura da ação constava com 71 anos, e seu marido, único provedor do grupo familiar, com 79 anos), tendo se passado mais de 03 anos entre uma demanda e outra. Nesse cenário, há que se considerar que a vulnerabilidade é mais sensível e sujeita a abruptas intercorrências, tendendo a se agravar com o passar dos anos de forma potencialmente progressiva.
4 - A parte autora comprovou o requisito etário pelos documentos acostados aos autos, nos quais se verifica a data de seu nascimento em 26/03/1943.
5 - Analisando o estudo social em comento, em harmonia às especiais condições do requerente, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta. A autora é idosa, e já no primeiro estudo social foi constatada que sofria de problemas de saúde decorrentes da idade, tais como pressão alta, problemas na tireoide, coluna, osteosporose, labirintite e esôfago, os quais, naturalmente, tendem a se agravar com a passar dos anos. O marido e único provedor da família, havia sofrido um infarto, quatro meses antes do último estudo social, fazendo uso de medicamentos contínuos e fisioterapia.
6 - Embora a renda per capita ultrapasse o valor de 1/4 do salário mínimo, conforme fundamentado acima, este parâmetro objetivo não pode ser considerado de forma absoluta para afastar o amparo social dos necessitados.
7 - Diante dos fatos e das provas produzidas, considerando a idade avançada do casal e a saúde delicada de ambos, gradativamente prejudicada com o passar dos anos, entendo que parte autora demonstrou preencher os requisitos legais, notadamente, os que dizem respeito à idade e hipossuficiência econômica, comprovando estar em situação de vulnerabilidade, fazendo jus ao benefício assistencial requerido.
8 - Mantido o termo inicial fixado na sentença, haja vista que havendo requerimento prévio administrativo, é nesta data que deve ser fixado o inicio do benefício, uma vez que foi neste momento que a autarquia teve ciência da pretensão da autora, denegando-o indevidamente.
9 - Sem perder de vista o nobre trabalho do causídico, mas considerando o moderado grau de complexidade dos fatos, os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual de 10% sobre o valor da condenação, que consiste no valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ. 10 - Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam: juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e correção monetária segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E. 11 - Preliminares rejeitadas. Recurso do INSS parcialmente provido. Critérios de aplicação dos consectários determinados de ofício.
(Número 0038576-57.2016.4.03.9999/00385765720164039999, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2204133, Relator(a) JUÍZA CONVOCADA GISELLE FRANÇA, TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO, SÉTIMA TURMA, Data 18/06/2018, Data da publicação 20/08/2018 e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/08/2018)
Assim, anulo a sentença e, considerando que o feito não está suficientemente instruído, deixo de aplicar a regra do artigo 1.013, §3º, III, da norma processual, e determino a devolução dos autos à vara de origem para regular processamento.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora para anular a sentença, e determino o retorno dos autos à vara de origem para regular seguimento do feito.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. ALTERAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE SAÚDE E SOCIOECONÔMICAS. POSSIBILIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. INSTRUÇÃO INSUFICIENTE. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. PROCESSAMENTO DA AÇÃO.
1. Consoante o disposto no artigo 301, §3º, do Código de Processo Civil/1973: "há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba mais recurso".
2. Concessão do benefício de prestação continuada à idoso.
3. Noticiada alteração das condições socioeconômicas e de saúde da parte autora. Necessidade de instrução processual.
4. Sentença anulada.
5. Instrução probatória insuficiente. Autos devolvidos à vara de origem para regular processamento.
6. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
