D.E. Publicado em 07/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e condenar o INSS a implantar o benefício de aposentadoria especial a partir da data do requerimento administrativo (27/04/2005) e dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS tão somente para determinar que os valores devidos sejam apurados nas fases liquidatória e de cumprimento de sentença, fixar os juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e para determinar que a correção monetária dos valores em atraso seja calculada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 27/06/2017 12:03:20 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002080-86.2007.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por ELISIO PEDRO DOS SANTOS, em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada em face do primeiro apelante, objetivando a concessão de aposentadoria especial, prevista no artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
A r. sentença de fls. 133/137-verso julgou parcialmente procedente a ação e condenou o INSS a reconhecer a atividade especial referente aos períodos de 29/04/1974 a 10/02/1981, 12/03/1985 a 02/10/1986, 21/10/1986 a 07/02/1993 e 01/09/1993 a 05/08/2004, bem como implantar aposentadoria especial em favor do autor, com data de início em 05/03/2007 (data do ajuizamento da ação).
Condenou a autarquia previdenciária, ainda, a pagar o valor relativo às diferenças de prestações vencidas, no importe de R$ 39.619,52, devidas a partir da data do ajuizamento da ação, respeitado o prazo prescricional quinquenal, apuradas até 09/2008, nos temos do Provimento 64/2005, da Corregedoria Regional da 3ª Região, acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês (consoante previsão do Código Civil Brasileiro - Lei 10.406/2002), a partir da citação válida (Súmula nº 204 do STJ).
Deferida a antecipação dos efeitos da tutela, determinando a implantação do benefício em favor do autor, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, sob as penas da lei, independentemente do trânsito em julgado.
Honorários fixados em 10% do total da condenação, excluídas as parcelas vincendas, ao teor da Súmula 111 do STJ.
Em razões recursais de fls. 145/167 o INSS pleiteia a suspensão dos efeitos da decisão que antecipou os efeitos da tutela, e, no mérito, a reforma da sentença, aos fundamentos, em síntese, de que a atividade não pode ser considerada especial pois as empresas forneciam equipamentos de proteção individual que minimizavam ou neutralizavam a ação nociva do agente agressivo ruído, que, após 28/05/1998, é expressamente vedada o enquadramento de atividade especial, que a exposição ao agente nocivo ruído se faz necessária a apresentação de laudo técnico e na impossibilidade de enquadramento por categoria profissional após a vigência da Lei 9.032/95.
O autor, por sua vez, também se insurgiu contra a r. sentença, e, em razões recursais de fls. 189/193, pleiteia que o benefício de aposentadoria especial lhe seja concedido desde a data do requerimento administrativo (27/04/2005) ou, alternativamente, desde 04/05/2005, data do protocolo do recurso na Junta de Recursos da Previdência Social.
Contrarrazões do INSS às fls. 199/201.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, insta salientar que nesta fase processual a análise do pedido de suspensão da antecipação da tutela será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelos recursos de apelação e pela remessa necessária.
Verifico que a autarquia previdenciária já reconheceu a especialidade do labor no período de 12/03/1985 a 02/10/1986, conforme cálculo de tempo de contribuição às fls. 79/84, assim, a controvérsia cinge-se ao reconhecimento do labor especial nos períodos de 29/04/1974 a 10/02/1981, 21/10/1986 a 07/02/1993 e 01/09/1993 a 05/08/2004.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
O formulário (fl. 71) e o laudo técnico pericial (fls. 72/74) comprovam que autor, nos períodos de 29/04/1974 a 10/02/1981, 21/10/1986 a 07/02/1993 e 01/09/1993 a 05/08/2004, exerceu o cargo de soldador, exposto, de modo habitual e permanente ao agente nocivo ruído de 88,2 decibéis, a agentes químicos graxa, solvente (thinner), vapores e gases (tintas), a calor de 26,4º C, poeira mineral e a fumos metálicos.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim, reputo enquadrado como especial o labor exercido nos períodos de 29/04/1974 a 10/02/1981, 21/10/1986 a 07/02/1993 e 01/09/1993 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 05/08/2004, por ter o autor desempenhado as atividades sempre exposto ao agente nocivo ruído de 88,2 decibéis, nível considerado insalubre pelos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 (código 1.1.6) e 3.048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.882/2003 (código 2.0.1).
Com relação ao período de 06/03/1997 a 18/11/2003, conforme o laudo técnico pericial de fls. 72/74, o autor exerceu o cargo de soldador e sua função consistia em "Cortar, encher, soldar peças e componentes de máquinas, em todo o Setor Fabril, sujando as mãos com graxas, usando vários tipos de eletrodos. Usar esmeril no acabamento das peças" e "Lixar peças com lixadeira manual. Laborar com eletrodo de grafite. Utilizar o oxiacetileno para os cortes e soldas elétrica e MIG. Pintar peças com revolver e limpas as mão com o solvente Thinner."
Ainda, conforme o laudo pericial, pelo levantamento de poeira realizado em 1997, referente à exposição à poeira mineral, "a pior exposição da pedreira foi a concentração de 29,79 mg/m3, na moagem do calcinado, cujo LT é de 4,21mg/m3" e, pelo mesmo levantamento, referente à exposição a fumos metálicos "a concentração de fumos metálicos foi de 22,91 mg/m3 / LT=4,44 mg/m3, Manganês foi de 1,04mg/m3 / LT=0,88mg/m3, Cobre foi de 0,36 mg/m3 / LT = 0,18mg/m3, Ferro foi de 12,83 mg/m3 / LT = 4.44mg/m3."
O período de 06/03/1997 a 18/11/2003, portanto, também deve ser considerado especial, dado que o trabalhador se encontrava exposto ao agente nocivo manganês, além do que a atividade desempenhada pode ser enquadrada nos códigos 1.0.14, do anexo do Decreto nº 2.172/97, e do anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
Conforme planilha anexa, somando-se os períodos de labor especial reconhecidos nesta demanda (29/04/1974 a 10/02/1981, 21/10/1986 a 07/02/1993 e 01/09/1993 a 05/03/1997, 06/03/1997 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 05/08/2004) acrescido àquele incontroverso (fls. 79/84) constata-se que o demandante possuía, em 27/04/2005, data do requerimento administrativo (fl. 27), 25 anos, 07 meses e 27 dias de tempo especial, suficiente a lhe assegurar o direito à aposentadoria especial.
Acerca do termo inicial, o benefício deve ser concedido a partir do requerimento administrativo, eis que se firmou consenso na jurisprudência que este se dá naquela data, ou na data da citação, na inexistência de requerimento administrativo. Nessa esteira, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
Quanto ao valor ou à sistemática de cálculo dos valores devidos representam incidente das fases liquidatória e de cumprimento de sentença, somente podendo lá ser apurado, conforme critérios pré-estabelecidos.
Os juros de mora, entretanto, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
A verba honorária foi adequada e moderadamente fixada, eis que arbitrada no percentual de 10% (dez por cento) dos valores devidos até a data da sentença, nos termos da súmula 111 do STJ.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do autor para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e condenar o INSS a implantar o benefício de aposentadoria especial a partir da data do requerimento administrativo (27/04/2005) e dou parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS tão somente para determinar que os valores devidos sejam apurados nas fases liquidatória e de cumprimento de sentença, fixar os juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e para determinar que a correção monetária dos valores em atraso seja calculada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
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