
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005051-23.2012.4.03.6120/SP
VOTO-VISTA
EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de ação movida por CELSO BERNASCONE em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reconhecimento de atividade exercida em condições especiais.
Processado o feito, na r. sentença, o pedido foi julgado parcialmente procedente, reconhecendo-se a atividade especial desenvolvida pelo autor de 01/01/2010 a 30/08/2011, determinando ao INSS as correspondentes conversão (com utilização de fator equivalente a 1,40) e averbação. Condenado o autor no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes últimos no importe de 10% sobre o valor atribuído à causa, ressalvando-se os efeitos da gratuidade da justiça deferida nos autos.
O autor apelou. Alegou preliminarmente, cerceamento de defesa, em razão do impedimento à realização de prova pericial. No mérito, aduziu a demonstração de tarefas desempenhadas sob agentes insalubres, nos intervalos de 17/10/1984 a 31/12/1986, como rurícola (sob calor e radiação não-ionizante), de 01/01/1987 a 12/01/1996, como carpinteiro (sob ruído, calor e poeira), e de 29/01/1996 a dias atuais, como mecânico (sob ruídos superiores aos limites legais de tolerância, além de graxas, óleos e solventes), concedendo-se o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Por outro lado, o INSS pugnou pela reforma da r. sentença, diante da utilização de EPI eficaz pelo autor, e da ausência de fonte de custeio prévia ao benefício.
O recurso foi levado a julgamento na sessão do dia 9 de setembro de 2019.
O e. Relator, Desembargador Federal Carlos Delgado, em seu judicioso voto, rejeitou a matéria preliminar e, quanto ao mérito, negou provimento à remessa necessária, tida por interposta e à apelação do INSS, dando parcial provimento ao apelo da parte autora, reconhecendo o intervalo de labor especial de 19/11/2003 a 30/08/2011, determinando à Autarquia Previdenciária que proceda à respectiva averbação, com a necessária conversão, estabelecendo a sucumbência recíproca.
Pedi vista para um exame mais aprofundado dos autos.
Peço vênia para divergir no que diz respeito à matéria preliminar.
Em suas razões, postula, preliminarmente, o autor que a r. sentença seja anulada, eis que configurado o cerceamento de defesa, diante do indeferimento da produção da prova pericial.
Observo que o autor pleiteou na inicial pela produção das provas pericial e testemunhal (fls. 02/20).
O INSS, em contestação, também requereu a produção de todo tipo de prova que se fizer necessária (fls. 39/96).
Em réplica à contestação, reiterou o pedido da produção da prova pericial no que tange aos períodos de 17.10.1984 a 12.01.1996 e de 29.01.1996 aos dias atuais e formulou quesitos (fls. 102/105).
Na sequência, o D. Juízo julgou a lide, promovendo a análise dos períodos especiais requeridos, julgando parcialmente procedente, reconhecendo-se a atividade especial desenvolvida pelo autor de 01/01/2010 a 30/08/2011, determinando ao INSS as correspondentes conversão (com utilização de fator equivalente a 1,40) e averbação.
Destaco que no que tange ao julgamento antecipado da lide, somente é cabível nas hipóteses previstas nos incisos do artigo 330 do CPC/1973 (vigente quando da prolação da sentença):
Ocorre que a parte autora pretendia produzir a prova pericial, uma vez que há períodos em que nos documentos obtidos não logrou comprovar a todos os agentes nocivos que esteve exposto nos períodos vindicados.
Com todos os elementos constantes nos autos, observo que o PPP relativo ao período de 17.10.1984 a 12.01.1996 (fl. 30) menciona que o autor exerceu a atividade rurícola, na qual fazia uso de defensivos com pistola manual para controle de pragas e a função de carpinteiro, contudo relata a exposição de aerossóis e a poeira de madeira, sem fazer menção específica aos elementos químicos a que esteve exposto.
Por outro lado, no intervalo de 29.01.1996 a 30.08.2011 (data de emissão do PPP - fls. 27/29), não obstante tenha exercido a atividade de mecânico de manutenção da Predilecta Alimentos, menciona apenas a exposição ao agente ruído, sem especificar os agentes químicos a que o autor afirma ter sido submetido no desempenho de suas atividades.
Assim, patente é a necessidade da realização da prova pericial, conforme requerido.
Nos termos do art. 427 do CPC de 1973, o Juiz somente poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes, o que não é o caso dos autos.
Assim, diante das profissões desenvolvidas pela parte autora (mormente em decorrência da provável exposição a ruído e agentes químicos) é imprescindível a realização de perícia técnica para elucidar a controvérsia trazida aos autos pelo autor, ademais o seu indeferimento não se baseou nas hipóteses descritas no art. 420 do CPC de 1973, in verbis:
Desta forma, impõe-se a anulação da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos. Nesse mesmo sentido, julgados desta Colenda Turma e Corte:
Desta feita, imposta a anulação da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos, devem os autos retornarem ao Juízo de origem para regular processamento, oportunizando-se a nomeação de perito judicial especializado para a produção da prova pericial, seja ela nas empresas onde foram desenvolvidas as atividades (Fazendas do Cambuhy Ltda. e Predilecta Alimentos), caso ainda se encontrem ativas ou por similaridade, cabendo às partes formularem os quesitos necessários ao deslinde dos lapsos laborais controvertidos de 17.10.1984 a 12.01.1996 e 29.01.1996 a 09.05.2012 (data do ajuizamento)
Ante o exposto, com a devida vênia, divirjo do Ilustre Relator, para dar provimento ao recurso da parte autora, para reconhecer o cerceamento de defesa e anular a r. sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem, para prosseguimento do feito, com a produção da prova pericial requerida, prejudicadas a apelação do INSS e a remessa oficial tida por interposta.
É como voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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| D.E. Publicado em 06/11/2020 |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. INCORREÇÃO DO PPP. CERCEAMENTO DE DEFESA. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA. SENTENÇA ANULADA.
- O julgamento antecipado da lide, somente é cabível nas hipóteses previstas nos incisos do artigo 330 do CPC/1973 (vigente quando da prolação da sentença).
- Ocorre que a parte autora pretendia produzir a prova pericial, uma vez que há períodos em que nos documentos obtidos não logrou comprovar a todos os agentes nocivos que esteve exposto nos períodos vindicados.
- Nos termos do art. 427 do CPC de 1973, o Juiz somente poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes, o que não é o caso dos autos.
- Assim, diante das profissões desenvolvidas pela parte autora (mormente em decorrência da provável exposição a ruído e agentes químicos) é imprescindível a realização de perícia técnica para elucidar a controvérsia trazida aos autos pelo autor, ademais o seu indeferimento não se baseou nas hipóteses descritas no art. 420 do CPC de 1973.
- Desta feita, impõe-se a anulação da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos, devendo os autos retornarem ao Juízo de origem para regular processamento, oportunizando-se a nomeação de perito judicial especializado para a produção da prova pericial, seja ela nas empresas onde foram desenvolvidas as atividades (Fazendas do Cambuhy Ltda. e Predilecta Alimentos), caso ainda se encontrem ativas ou por similaridade, cabendo às partes formularem os quesitos necessários ao deslinde dos lapsos laborais controvertidos de 17.10.1984 a 12.01.1996 e 29.01.1996 a 09.05.2012 (data do ajuizamento).
- Sentença anulada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso da parte autora, para reconhecer o cerceamento de defesa anular a r.sentença, restando prejudicadas a apelação do INSS e a remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relatora para o acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005051-23.2012.4.03.6120/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas, pelo autor CELSO BERNASCONE e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando o reconhecimento de labor especial, com vistas à concessão de "aposentadoria especial" ou, subsidiariamente, "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição".
A r. sentença prolatada (fls. 107/114) julgou parcialmente procedente a ação, reconhecendo a atividade especial desenvolvida pelo autor de 01/01/2010 a 30/08/2011, determinando ao INSS as correspondentes conversão (com utilização de fator equivalente a 1,40) e averbação. Condenado o autor no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes últimos no importe de 10% sobre o valor atribuído à causa (de R$ 30.000,00 - fl. 35), ressalvando-se os efeitos da gratuidade da justiça deferida nos autos (fl. 36).
Recorreu a parte autora (fls. 117/140), defendendo a decretação de nulidade da r. sentença, sustentando a ocorrência de cerceio a seu direito à defesa, haja vista o impedimento da produção pericial requerida. Já em mérito, aduzindo a demonstração de tarefas desempenhadas sob agentes insalubres, de 17/10/1984 a 31/12/1986, como rurícola (sob calor e radiação não-ionizante), de 01/01/1987 a 12/01/1996, como carpinteiro (sob ruído, calor e poeira), e de 29/01/1996 a dias atuais, como mecânico (sob ruídos superiores aos limites legais de tolerância, além de graxas, óleos e solventes). Espera, assim, pelo reconhecimento da excepcionalidade do labor e pelo deferimento de aposentadoria - quer especial, quer por tempo de contribuição.
Em suas razões de recurso (fls. 141/150), o INSS pugnou pela reforma da r. sentença, diante da utilização de EPI eficaz pelo autor, e da ausência de fonte de custeio prévia ao benefício.
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (fls. 152/156), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em 09/05/2012 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 17/05/2013 (fl. 37) e a prolação da r. sentença aos 26/02/2014 (fl. 118vº), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Extrai-se da exordial a pretensão do autor como sendo o reconhecimento de labor especial correspondente aos intervalos de 17/10/1984 a 12/01/1996 e 29/01/1996 até tempos hodiernos, com vistas à concessão de "aposentadoria especial" ou, em caráter subsidiário, de "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição" (com renda mensal inicial - RMI correspondendo a 100% do salário-de-benefício), a partir do requerimento administrativo, em 23/02/2012 (sob NB 154.704.848-1, fl. 26).
Merece ênfase o intervalo cuja especialidade já fora adotada, administrativamente: de 29/01/1996 a 05/03/1997 (fl. 100).
Da remessa tida por interposta
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a averbar período laborativo especial reconhecido. E assim, considera-se a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Da arguição preliminar
Com efeito, o juiz é o destinatário natural da prova, cabendo-lhe indeferir a produção daquela que considerar inútil em face da existência de dados suficientes para o julgamento da causa, podendo, doutra via, determinar de ofício a produção de outras que se façam necessárias à formação do seu convencimento. Em suma: o Magistrado pode indeferi-la, nos termos dos arts. 370 e art. 464, ambos do Novo Código de Processo Civil, sem que isso implique cerceamento de defesa.
Consignando no bojo da r. sentença, em fl. 107vº, o d. Magistrado a quo entendera desnecessária a providência requerida pelo autor - de produção de prova pericial - haja vista a apresentação, nos autos, de documentos referentes aos períodos laborados em atividades supostamente especiais, restando clara a convicção do Juízo, de que o caderno probatório ofertado nos autos seria suficiente à formação de seu convencimento, acerca da especialidade (ou não) do labor do autor.
De tudo isso, não se houvera percalço no ato do magistrado, a importar cerceamento de defesa, do que repilo a arguição preliminar.
Do meritum causae
Prosseguindo, observa-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
Do labor especial
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
A demanda foi instruída com documentos secundando a exordial (fls. 23/32), dentre os quais cópia de CTPS (fls. 31/32) - cujas anotações empregatícias são passíveis de cotejo com o sistema informatizado CNIS (fls. 97/99) e a tabela confeccionada pela autarquia (fl. 100).
E da aludida documentação - minuciosamente examinada - restara comprovada a insalubridade laboral por meio do PPP fornecido pela empresa Predilecta Alimentos Ltda. (fls. 27/29), no intervalo de 19/11/2003 a 30/08/2011 (data da emissão documental), na tarefa de mecânico de manutenção sob ruídos desde 80 dB(A) até 90 dB(A), nos moldes dos códigos 1.1.5 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.6 do Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 - cumpre enfatizar que, no concernente a 06/03/1997 a 18/11/2003, o nível de pressão sonora deveria superar 90 dB(A).
Ainda que a aferição represente forma variável, merece reconhecimento a especialidade laboral.
Nesse particular, é certo que, até então, vinha aplicando o entendimento no sentido da impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente.
Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão jurisprudencial, a qual adiro, para admitir a possibilidade de se considerar, como especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo setor.
Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe 13/03/2015).
Esta 7ª Turma, em caso análogo, assim decidiu:
Já no tocante ao intervalo de 17/10/1984 a 31/12/1986, na condição de rurícola nas Fazendas do Cambuhy Ltda., o formulário (fl. 30) descreve as tarefas do autor como sendo, resumidamente, nas lavouras e nos tratos culturais dos pomares da empresa, sem indicar, de modo concreto e preciso, agente potencialmente agressivo a que sujeito o trabalhador.
Decerto que a atividade exercida exclusivamente na lavoura é absolutamente incompatível com a ideia de especialidade, eis que não exige, sequer, o recolhimento de contribuições para o seu reconhecimento. Neste sentido, aliás, é a orientação jurisprudencial do Colendo STJ e desta Eg. 7ª Turma, in verbis:
E os fatores de risco mencionados no recurso autoral - calor e radiação não-ionizante - não lhe socorrem (ao autor) na especialidade buscada, porquanto somente calor decorrente de fonte artificial é que justificaria a contagem especial para fins previdenciários, sendo que a previsão, como fator de insalubridade, recairia apenas sobre radiações ionizantes, à luz do item 1.1.3 do Decreto nº 83.080/79.
Colaciona-se excerto de julgado proveniente desta Corte:
Por derradeiro, a atividade de carpinteiro - no interstício de 01/01/1987 a 12/01/1996 - não detém previsão de enquadramento profissional, não encontrando guarida nos róis legais condizentes com a matéria sob análise. Tampouco houvera, no formulário colacionado (fl. 30), apontamento específico de agente nocivo (havida somente menção genérica a agentes químicos aerosóis (sic) sólidos e poeira de madeira: aqueles primeiros, inaveriguáveis, dada a indeterminação; e esta última, não elencada como agente de risco).
Da aposentadoria especial
Eis que, com o reconhecimento do tempo laborativo supradescrito, conforme tabela em anexo, alcança o autor 08 anos, 10 meses e 19 dias de dedicação exclusiva a tarefas de ordem especial, aquém do exigido à concessão da "aposentadoria especial".
Do pedido subsidiário - da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Conforme planilha anexa, procedendo-se ao cômputo do labor especial reconhecido, acrescido dos períodos considerados comuns, verifica-se que a parte autora, na data do pedido administrativo (23/02/2012), contava com 30 anos, 10 meses e 14 dias de serviço, tempo notadamente insuficiente à concessão de "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição".
Desta feita, resta improcedente a demanda quanto ao deferimento de quaisquer dos benefícios.
Por outro lado, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 19/11/2003 a 30/08/2011.
Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a gratuidade da justiça conferida ao autor e por ser o INSS delas isento.
Ante o exposto, rejeito o tema preliminar e, quanto ao mérito, nego provimento às remessa necessária, tida por interposta, e apelação do INSS, e dou parcial provimento ao apelo da parte autora, reconhecendo o intervalo de labor especial de 19/11/2003 a 30/08/2011, determinando à Autarquia Previdenciária que proceda à respectiva averbação, com a necessária conversão, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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