
| D.E. Publicado em 19/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer apenas o período de 01/01/2004 a 09/10/2008 como laborado sob condições especiais Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Deixo de condenar qualquer das partes nas custas e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas se encontra isento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 05/09/2017 16:50:47 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003153-28.2009.4.03.6104/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por AMADEU DAVI em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de tempo de serviço laborado em atividade especial, no período compreendido entre 06/03/1997 e 16/10/2008.
A r. sentença de fls. 85/87 julgou improcedente o pedido inicial e condenou o autor no pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor atribuído à causa, corrigido monetariamente, com execução suspensa enquanto perdurar a situação de hipossuficiência, pelo prazo máximo de cinco anos.
Em razões recursais de fls. 91/106, o autor pugna pela reforma da r. sentença ao fundamento de que, no seu entender, trabalhou 25 anos com exposição ao agente nocivo ruído. Alega que labora na empresa COSIPA exposto a ruído excessivo desde 01/08/1980 e que a autarquia previdenciária considerou a atividade como especial somente até 05/03/1997, mesmo sem que houvesse qualquer modificação nas condições de trabalho.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial, com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais.
Para a comprovação do labor especial, na empresa Companhia Siderurgica Paulista - COSIPA, o autor apresentou os seguintes documentos:
- Período de 01/03/1997 a 31/12/2003 - Formulário DIRBEN-8030 (fl. 33), laudo técnico das condições ambientais de trabalho - LTCAT (fls. 34/35) e transcrição dos níveis de pressão sonora extraídos do laudo técnico pericial para fins de aposentadoria (fls. 36/37), que demonstram que o autor esteve exposto "a níveis de pressão sonora (ruído), superiores a 80 dB(A), já considerando a atenuação acústica proporcionada pelos equipamentos de proteção".
- Período de 01/01/2004 a 09/10/2008 - Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (fls. 38/39), que atesta que o autor esteve exposto a ruído de 114 dB(A).
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Observo que, em relação ao período de 01/03/1997 a 31/12/2003, consoante destacado no laudo técnico (fls. 34/35), o autor desempenhou diversas atividades no período discutido, exercendo as funções de "ajud. manutenção elétrica", "eletricista de manutenção", "eletricista especializado" e "líder manutenção elétrica", constando do laudo apenas a conclusão de que estava submetido a ruídos acima de 80dB, o que, inclusive, também foi reforçado na parte final dos documentos de fls. 36/37, nos quais foram transcritos os níveis de ruído relacionados às atividades desenvolvidas pelo requerente, portanto, figurando este como único parâmetro seguro para aferir a insalubridade.
De forma pormenorizada, as funções desenvolvidas pelo autor na empresa "Companhia Siderúrgica Paulista - COSIPA" foram descritas nos documentos de fls. 34/35, nos seguintes termos:
"AJUD. MANUTENÇÃO ELÉTRICA:
- auxiliar nos trabalhos simples de manutenção elétrica em equipamentos e instalações.
- utilizar instrumentos de medidas simples.
- ler e interpretar esquemas elétricos elementares de corrente contínua e alternada.
ELETRICISTA DE MANUTENÇÃO:
- executar os serviços de manutenção em equipamentos elétricos, reparando ou substituindo circuitos elétricos.
- desmontar as partes defeituosas, total ou parcialmente, utilizando chaves e ferramentas apropriadas, para proceder aos reparos e/ou substituição da peça defeituosa, bem como as regulagens necessárias.
- efetuar testes de funcionamento nos equipamentos reparados, efetuando ajustes necessários.
ELETRICISTA ESPECIALIZADO:
- localizar, analisar e corrigir defeitos mais complexos em máquinas, equipamentos e painéis de corrente continua e alternada, utilizando-se de aparelhos apropriados para tal serviço como: voltímetros, amperímetros, medidores de isolamento e outros tipos de instrumentos.
- decidir e definir sobre os padrões de execução quanto aos componentes do conjunto elétrico.
- ter o domínio do equipamento em função do processo de produção.
- inspecionar o comportamento dos equipamentos elétricos em operação, anotando todas as suas irregularidades.
- especificar materiais elétricos e eletrônicos típicos de sua área de trabalho.
- coordenar serviços de execução elétrica, conforme o programa de manutenção.
LIDER MANUTENÇÃO ELÉTRICA:
- orientar e efetuar os serviços de desmontagem, reparo, montagem e substituição de partes elétricas de equipamentos para permitir as condições normais de funcionamento.
- orientar e executar instalações de novos equipamentos elétricos, processando de acordo com os padrões e normas estabelecidas."
Assim, pela análise detida das atividades executadas, também não se vislumbra a possibilidade de reconhecimento da especialidade pleiteada pelo recorrente, pela ausência de enquadramento das funções laborais exercidas nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79.
Cumpre notar, ainda, que o laudo de fls. 36/37 faz referência à pressão sonora em todos os setores de atuação do autor na empresa:
"CENTRAL TERMOELÉTRICA (CASA DE FORÇA)
- sala de máquinas - 90 a 92 dB
- área dos filtros de sucção turbo soprador ½ - 113 a 114 dB
- sala de controle tubo soprador - 3 - 80 a 82 dB
- turbo geradores nº 1, 2 e 3 - 90 a 93 dB
- mesanino - 92 a 99 dB
- área equipamentos auxiliares lado norte - 89 dB
- sala de óleo combustível - 85 dB
- área do condensador do turbo gerador - 3 - 89 a 92 dB
- área do condensador do turbo gerador - 2 - 89 dB
- área das bombas ¾ das caldeiras - 94 a 98 dB
- área de equipamentos auxiliares - 90 a 93 dB
- área do compressor 4 - 88 dB
- turbo-bombas 7/8 das caldeiras - 94 a 96 dB
- turbo soprador - 3 - condensador - 98 a 100 dB
CALDEIRAS
- caldeira nº 2 - 91 a 98 dB
- caldeira nº 3 - 90 a 99 dB
- caldeira nº 4 - 90 a 102 dB
- caldeira nº 5 - 90 a 109 dB
- caldeira nº 6 - 90 a 106 dB
CASA DE BOMBAS
- área das bombas - 94 a 95 dB
- corredores - 92 a 94 dB
ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA
- dosadores de cal - 81 a 82 dB
- área de bombas - 86 dB
TORRES DE RESFRIAMENTO
- torre da laminação de chapas grossas - 90 a 95 dB
- torres da coqueria 1 e 2 - 90 a 93 dB
- torre da fábrica de oxigênio - 92 a 94 dB
- torre da coqueria - 83 a 91 dB
- torre da laminação - 93 a 96 dB
SALA DE COMPRESSORES
- sala de compressores nº 1 - 94 a 95 dB
- sala de compressores nº 2 - 92 dB
- sala de compressores nº 3 - 90 a 91 dB
- sala de compressores nº 4 - 91 dB
- sala de compressores nº 7 - 88 a 89 dB
- sala de compressores nº 8 - 93 a 96 dB
BOOSTER
- booster M-1 - 92 a 93 dB
- booster M-2 - 93 a 94 dB
- booster M-3 - 96 a 98 dB
- booster M-4 - 98 a 99 dB
- sala nova - 95 a 99 dB
- sala velha - 91 a 94 dB
- sala de controle - 83 a 84 dB
- mesa de anotações - 96 a 98 dB
- subsolo dos booster tanque de creosoto - 95 a 96 dB
- tanque de óleo do booster M2 - 91 a 93 dB
- tanque de drenagem - 92 a 94 dB
- pote de selo das máquinas - 95 a 97 dB
- indicadores de pressão - 99 a 102 dB"
Entretanto, ante a impossibilidade de constatação de tempo de exposição em cada um desses setores, bem como ante a carência de elementos de individualização da situação do requerente, tenho por não demonstrado a quais níveis de pressão sonora ele estava efetivamente submetido de modo habitual e permanente.
Por fim, considerada ainda a informação do laudo técnico (fl. 35), de que "os protetores auditivos individuais fornecidos pela Empresa (...) podem atenuar de 05 a 20 dB(A)", ainda assim não resta materialmente constatada a especialidade no período pretendido. Isso porque, diante da conclusão do laudo acerca da existência de ruídos acima de 80 dB, a depender da variação dos valores de diminuição do ruído proporcionada pelo uso dos EPIS (05 a 20 dB), não é possível assegurar a sujeição a pressão sonora superior a 90 dB.
Quanto ao período de 01/01/2004 a 09/10/2008, possível o reconhecimento de sua especialidade, eis que o autor esteve exposto a ruído de 114 dB(A).
Assim, somando-se o período de atividade especial reconhecido nesta demanda (01/01/2004 a 09/10/2008) ao período já reconhecido administrativamente pelo INSS (fls. 50/52), verifica-se que, na data do requerimento administrativo (16/10/2008 - fl. 54), o autor alcançou 20 anos, 7 meses e 3 dias de tempo total especial; insuficiente à concessão de aposentadoria especial.
Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Deixo de condenar qualquer das partes nas custas e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas se encontra isento.
Diante o exposto, dou parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer apenas o período de 01/01/2004 a 09/10/2008 como laborado sob condições especiais Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Deixo de condenar qualquer das partes nas custas e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas se encontra isento.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 05/09/2017 16:50:44 |
