Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2014219 / SP
0002907-24.2013.4.03.6126
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE
INTERESSE DE AGIR. NÃO OCORRÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA TIDA POR
INTERPOSTA. ATIVIDADE ESPECIAL. ENFERMAGEM. COMPROVAÇÃO. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. JUROS DE MORA.
CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDAS.
1 - Rejeita-se a preliminar de ausência de interesse de agir alegada pelo INSS, em razão do
não cumprimento pelo autor das exigências apresentadas à fl. 137, cuja finalidade era a
comprovação de vínculos empregatícios junto a determinadas empresas. Verifica-se, de fato,
que nos autos do processo administrativo foi apresentada a CTPS do autor (fls. 121/128), com o
registro dos períodos impugnados pela autarquia, bem como os respectivos PPPs emitidos
pelas empregadoras, existindo, portanto, elementos suficientes para a análise e eventual
concessão do benefício pela autarquia, em sede administrativa.
2 - É assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente
afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme
assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho. E, relativamente ao
recolhimento de contribuições previdenciárias, em se tratando de segurado empregado, essa
obrigação fica transferida ao empregador, devendo o INSS fiscalizar o exato cumprimento da
norma. Logo, eventuais omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que
não deve ser penalizado pela inércia de outrem.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer períodos laborados sob condições especiais.
4 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula
490 do STJ.
5 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
6 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
7 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
8 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - Os períodos a serem analisados em função da remessa necessária, tida por interposta, e
dos recursos voluntários são: 01/09/1986 a 01/06/1989, 01/07/1989 a 01/07/1990, 06/10/1990 a
31/01/1992, 13/04/1992 a 14/04/1994, 03/05/1994 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 20/06/1995 e
06/10/1995 a 04/12/2012.
14 - Quanto ao período de 01/09/1986 a 01/06/1989, laborado para "Santa Casa de
Misericórdia de Passos", na função de "atendente de enfermagem", o PPP de fls. 41/41-verso
informa que o autor estava exposto a "microorganismos (bactérias, vírus, fungos, protozoários,
helmintos, etc.)". Dessa forma, nesse período é possível reconhecer a especialidade do labor,
previsto no código 1.3.4 do Anexo I e código 2.1.3 do Anexo II, ambos do Decreto 83.080/79,
ainda que por equiparação, e nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº
3.048/99.
15 - Em relação ao período de 01/07/1989 a 01/07/1990, trabalhado para "Fund. Benef. S. J.
Escócia - Hospital Otto Krakauer", na função de "aux. enfermagem", conforme o PPP de fls.
36/37, era função do autor "auxiliar usuários no banho (...) verificar sinais vitais e auxiliar nas
manobras de PCR (parada cardíaca respiratória); realizar curativos, inalações, coleta de
material para exames (...)". Sendo assim, é possível reconhecer a especialidade do labor, por
enquadramento profissional, uma vez que a atividade é prevista no código 1.3.4 do Anexo I e
código 2.1.3 do Anexo II, ambos do Decreto 83.080/79, ainda que por equiparação.
16 - Quanto ao período de 06/10/1990 a 31/01/1992, laborado para o "Hospital Regional de
Franca S/A", na função de "enfermeiro supervisor", de acordo com o PPP de fls. 34/35, o autor
esteve exposto a microrganismos, uma vez que dentre suas atribuições estava a de "Planeja(r)
e executa(r) atividades assistenciais e administrativas em todos os setores. Visita aos leitos dos
pacientes, analisando a situação clínica e necessidades do paciente (...)". Dessa forma, é
possível reconhecer a especialidade do labor, uma vez que a atividade do autor é prevista no
código 1.3.4 do Anexo I e código 2.1.3 do Anexo II, ambos do Decreto 83.080/79.
17 - Em relação ao período de 13/04/1992 a 14/04/1994, laborado para "Irmandade da Santa
Casa de Misericórdia de São Paulo", na função de "enfermeiro", de acordo com o PPP de fls.
29/29-verso, o autor esteve exposto a "sangue, secreção e excreção", sendo possível o
reconhecimento da especialidade do labor previsto no código 1.3.4 do Anexo I e código 2.1.3 do
Anexo II, ambos do Decreto 83.080/79.
18 - Quanto ao período de 03/05/1994 a 20/06/1995, trabalhado para "Hospital e Maternidade
Dr. Christovão da Gama S/A", na função de "enfermeiro supervisor", de acordo com o PPP de
fls. 22/23, o autor esteve exposto a "micro organismo", uma vez que tinha por função
"desempenhar atividades de enfermagem; preparar e aplicar medicamentos; (...) atender os
pacientes que estão nos quartos, separar material para descarte, lavar utensílios na sala de
expurgo (...)". Logo, a atividade é considerada especial, uma vez prevista no código 1.3.4 do
Anexo I e código 2.1.3 do Anexo II, ambos do Decreto 83.080/79.
19 - Por fim, quanto ao período de 06/10/1995 a 04/12/2012, laborado para "Fundação de
Assistência à Infância de Santo André", na função de "enfermeiro I", de acordo com o PPP de
fls. 18/20, o autor esteve exposto a agentes biológicos (vírus, bactérias etc), uma vez que
dentre as suas funções está a de "executa(r)medicação e demais cuidados de enfermagem".
Sendo assim, no período de 06/10/1995 a 04/10/2012 (data do PPP) é possível reconhecer a
especialidade do labor, previsto no código 1.3.4 do Anexo I e código 2.1.3 do Anexo II, ambos
do Decreto 83.080/79 e nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
20 - Como cediço, todos os cargos de denominação auxiliar ou técnica -que não constam
literalmente na legislação destacada-, na prática cotidiana, são ocupados por profissionais que
efetivamente exercem as mesmas funções dos enfermeiros, os quais, na maioria das vezes,
apenas coordenam e supervisionam a sua equipe, a permitir, neste caso, uma visão mais
abrangente do Decreto, de acordo com a realidade, impondo aludida equiparação entre a
função de enfermeiro e dos profissionais que o auxiliam.
21 - Nos casos em que resta comprovada a exposição do profissional à nocividade do agente
biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização
de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional. Precedentes.
22 - Enquadram-se como especiais os períodos de 01/09/1986 a 01/06/1989, 01/07/1989 a
01/07/1990, 06/10/1990 a 31/01/1992, 13/04/1992 a 14/04/1994, 03/05/1994 a 28/04/1995,
29/04/1995 a 20/06/1995 e 06/10/1995 a 04/10/2012.
23 - Conforme planilha anexa, procedendo ao cômputo do labor especial reconhecido nesta
demanda, verifica-se que a parte autora contava com 25 anos, 02 meses e 17 dias de labor na
data do requerimento administrativo (05/11/2012 - fl. 139), fazendo jus, portanto, à
aposentadoria especial pleiteada.
24 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(05/11/2012 - fl. 139).
25 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
26 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
27 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
28 - Apelação da parte autora provida. Remessa necessária, tida por interposta, e apelação do
INSS desprovidas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
da parte autora e negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por
interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
