
| D.E. Publicado em 26/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação da parte autora, mantendo, na íntegra, a r. sentença de Primeira Jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009072-38.2008.4.03.6102/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por DALVA DOS SANTOS PEREIRA, em ação previdenciária em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de "aposentadoria especial", mediante o reconhecimento de trabalho desempenhado sob condições especiais.
A r. sentença (fls. 200/204) julgou improcedente a ação, condenando a parte autora no pagamento de custas processuais e verba advocatícia, esta última correspondente a R$ 1.500,00, suspensa a exigibilidade de tais valores em virtude da justiça gratuita anteriormente lhe concedida (fl. 65).
Apelou a parte autora (fls. 209/225), arguindo, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, porquanto não se houvera a designação de audiência para oitiva de testemunhas, devidamente requerida à fl. 190; para além, requer a reforma integral do julgado, sob alegação de que a documentação reunida nos autos comprovaria o desempenho de sua atividades laborativas (em cozinha industrial localizada em restaurante universitário) sob agentes agressivos frio, calor, umidade, ruído e agentes químicos, de modo habitual e permanente, do que faria jus à concessão do benefício vindicado.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões pelo INSS (fls. 232/234), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 18/08/2008 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 29/09/2008 (fl. 92vº) e a prolação da r. sentença aos 28/09/2009 (fl. 204vº), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Conforme narrada na inicial, a pretensão da parte autora resumir-se-ia ao reconhecimento do intervalo laborativo especial de 17/03/1983 a 20/05/2008, visando à concessão de "aposentadoria especial", a partir do requerimento administrativo formulado em 07/03/2008 (sob NB 147.378.100-8 - fl. 30).
Da matéria preliminar arguida.
Em linhas introdutórias, em sede recursal, defende a demandante a decretação de nulidade da r. sentença, ao argumento de que não teria sido realizada a audiência requerida ainda na fase de instrução (em fl. 190), para colheita de depoimentos.
A meu ver, inocorrente o alegado cerceio, haja vista que a prova requerida redundaria em inocuidade, porquanto a discussão nos autos gravita sobre a (hipotética) especialidade de vínculo empregatício, cuja demonstração dar-se-á por meio de elementos exclusivamente documentais.
Superada a discussão preliminar, passa-se à análise do mérito recursal.
Do meritum causae.
Prosseguindo, a aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso em tela.
Os autos foram instruídos com vasta documentação, observando-se, dentre tal, a cópia de CTPS da parte autora (fls. 17/29) e a íntegra do procedimento administrativo de benefício (fls. 68/90), além de documentação específica, cuja finalidade seria demonstrar a sujeição a agentes nocivos durante a prática laboral - no caso presente, consubstanciada no PPP (fls. 42/43) emitido pela empresa Universidade de São Paulo - Prefeitura do Campus Administrativo de Ribeirão Preto.
Ainda, constata-se a presença de laudo pericial produzido por ordenação do Juízo a quo (fls. 147/157, complementado em fls. 176/185), e de parecer redigido por assistente técnico vinculado à parte autora (fls. 163/167).
E do exame acurado de todos os documentos em referência, a conclusão a que se chega é a de que a parte autora, durante seu ciclo laborativo perante comentada empresa (ora como copeira, ora como cozinheira, ora como técnico operacional), não estivera sob o manto da especialidade.
Senão vejamos.
No PPP, as tarefas descritas (de forma pormenorizada) constam como realizar a cocção de alimentos; executar a limpeza de sua área de serviço; preparar e abastecer os recipientes levados à distribuição de refeições; orientar o pessoal do pré-preparo de alimentos; executar o preparo de alimentos, escolhendo cerais, descascando, lavando e picando verduras, legumes, tubérculos e frutas.
E a peça pericial (resultado de perícia realizada in loco, nas instalações onde laboraria a parte autora, em cozinha industrial), por certo não destoa do conteúdo acima, destacando os afazeres da autora no ambiente de trabalho, como ocupações notadamente culinárias, alternadas com tarefas de asseio (limpeza) de utensílios, equipamentos e máquinas utilizados no preparo dos mantimentos - não se olvidando, ainda, da própria higienização dos alimentos a serem processados - tendo sido mencionadas, também, as tarefas orientativas da parte autora, norteando funcionários a si subordinados.
Assim sendo, com a clara diversificação das tarefas prestadas pela parte autora, restaram evidentes a ocasionalidade e a intermitência quanto à possível sujeição a agentes nocivos, afastando, por completo, o reconhecimento da especialidade do labor.
E eis que, sem o reconhecimento do tempo laborativo pretendido, depreende-se que a parte autora não faz jus à benesse, de caráter exclusivamente especial, considerada, portanto, irretocável a r. sentença prolatada.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo, na íntegra, a r. sentença de Primeira Jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 19/06/2018 19:38:47 |
