
| D.E. Publicado em 19/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta para, mantendo o reconhecimento da especialidade laboral apenas quanto aos intervalos de 12/08/1985 a 26/08/1996 e de 12/10/1996 a 02/08/2010, a serem averbados pela Autarquia Previdenciária, julgar improcedente o pedido de concessão de "aposentadoria especial", alfim decretando a sucumbência recíproca, na forma da fundamentação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001575-38.2011.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por CILENE DA SILVA SANTOS MORIJO objetivando o aproveitamento de labor especial, à concessão de "aposentadoria especial".
A r. sentença (fls. 124/131) julgou parcialmente procedente a ação, declarando a atividade laborativa especial da autora desde 12/08/1985 até 04/05/2011 (dia imediatamente anterior à propositura da ação), e condenando a autarquia previdenciária no pagamento de "aposentadoria especial", a partir da data da citação (08/06/2011), com o pagamento de atrasados em parcela única, incidindo juros de mora e correção monetária sobre referido saldo, considerados, ainda, para apuração da renda mensal de início, os salários-de-contribuição indicados em fls. 59/60. Ademais, condenado o ente previdenciário em verba honorária no importe de 15% sobre as prestações havidas até a decisão singular, nos exatos termos da Súmula 111 do C. STJ. Determinados custas no formato da lei e reexame obrigatório da sentença.
Recorreu o INSS (fls. 135/137), revelando irresignação quanto ao acolhimento da especialidade em sentença, aduzindo que não houvera comprovação, nos autos, da exposição habitual e permanente da trabalhadora a agentes agressivos (não demonstrado o contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas), destacando que o laudo carreado às fls. 95/119 guardaria relação com matéria de ordem trabalhista, não previdenciária, revelando-se, assim, inapto nesta demanda. Em derradeiro argumento, sustentou que, uma vez deferida "aposentadoria especial", não poderia haver permanência do labor especial, sendo que, se verificada tal simultaneidade - percepção de aposentadoria e exercício laborativo insalubre - deveria ser descontado valor referente ao período, em obediência ao preceituado no art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Alfim, requereu a redução do percentual honorário para 5%.
Devidamente processado o recurso, sem o oferecimento de contrarrazões pela parte autora, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 05/05/2011 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 08/06/2011 (fl. 68) e a prolação da r. sentença aos 23/08/2012 (fl. 131), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Na peça vestibular, descreve a parte autora seu ciclo laborativo constituído de tarefas especiais desempenhadas desde 12/08/1985 e até dias atuais, assim pretendendo a concessão de "aposentadoria especial", com renda mensal inicial - RMI equivalente a 100% do salário-de-benefício, utilizando-se, para tanto, os salários-de-contribuição relacionados no informativo fornecido pela empregadora.
Da remessa necessária tida por interposta.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a implantar, em favor da parte autora, o benefício de "aposentadoria especial", desde a data da citação. E não havendo como se apurar o valor exato da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado, e da Súmula 490 do STJ.
Da aposentadoria especial.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Do caso dos autos.
Foram carreadas cópias de CTPS (fls. 30/45) e documentação específica, cuja finalidade seria demonstrar a sujeição da parte autora a agentes nocivos durante sua prática laboral, observadas, ainda, laudas de pesquisa ao sistema informatizado CNIS (fls. 65/66 e 74/79), e "carta de concessão/memória de cálculo" de "aposentadoria por tempo de contribuição" deferida administrativamente à segurada, a partir de 14/08/2015 (sob NB 173.688.127-0, fl. 148).
E do exame acurado de todos os documentos em referência - especialmente do Perfil Profissiográfico - PPP (fls. 47/51) fornecido pela empresa Fundação Municipal Ensino Superior de Marília - a conclusão a que se chega é a de que a parte autora estivera sob o manto da especialidade, de 12/08/1985 a 26/08/1996 e de 12/10/1996 a 02/08/2010 (data-fim consignada no PPP), na condição de atendente/auxiliar de enfermagem, exposta a agentes biológicos, em virtude do contato com sangue, excreção e secreção, possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.3.2 e 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64, 1.3.4 e 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79, 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Diga-se, quanto ao lapso não adotado, de 27/08/1996 a 11/10/1996, que a percepção de "auxílio-doença" pela parte autora (sob NB 103.421.103-7, fls. 65 e 74vº) impede o reconhecimento de prestação laborativa especial, haja vista a falta de sujeição a agente agressivo.
Conforme planilha anexa, computando-se todos os intervalos laborativos da parte autora, de índole unicamente especial, constata-se que, em 02/08/2010, totalizava 24 anos, 10 meses e 06 dias de tempo de serviço especial, número de anos aquém do exigido ao deferimento da aposentadoria especial (mínimo de 25 anos de labor).
Cumpre ressaltar que a limitação do tempo especial levada a efeito na tabela que segue o presente decisum - não ultrapassando a data de 02/08/2010 - equivale à indicação expressa no PPP, como data assinalada, a ser documentalmente considerada como demarcação do labor especial.
Por outro lado, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 12/08/1985 a 26/08/1996 e de 12/10/1996 a 02/08/2010, considerado improcedente o pedido formulado pela parte demandante, de concessão de "aposentadoria especial".
Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a gratuidade da justiça conferida à parte autora (fl. 63) e por ser o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta para, mantendo o reconhecimento da especialidade laboral apenas quanto aos intervalos de 12/08/1985 a 26/08/1996 e de 12/10/1996 a 02/08/2010, a serem averbados pela Autarquia Previdenciária, julgar improcedente o pedido de concessão de "aposentadoria especial", alfim decretando a sucumbência recíproca, na forma da fundamentação.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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