
| D.E. Publicado em 31/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento às remessa necessária, tida por interposta, e apelação do INSS, para estabelecer que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos delineados em sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003111-21.2010.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por DAERCIO FELIZARDO ORLANDO, objetivando o aproveitamento de períodos laborativos de caráter especial e o deferimento de "aposentadoria especial".
Decisão determinando a produção de perícia judicial (fl. 55), com posterior juntada do laudo (fls. 81/206).
A r. sentença (fls. 220/236) julgou procedente a ação, reconhecendo a atividade laborativa especial de 21/03/1978 a 30/01/1991, 10/12/1991 a 19/08/2004, 16/11/2004 a 24/08/2007 e 01/07/2008 a 20/05/2010, condenando a autarquia previdenciária no pagamento de "aposentadoria especial" ao autor (totalizados 30 anos, 02 meses e 19 dias de atividades especiais), a partir da data da citação (31/05/2010), com incidência de correção monetária e juros de mora sobre o montante em atraso. O INSS restou condenado, ainda, no pagamento da verba advocatícia, estipulada em 10% sobre as parcelas vencidas, observada a Súmula 111 do C. STJ. Isenção das custas processuais. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela.
Inconformado, o INSS apelou (fls. 246/258 e 259), requerendo o recebimento do apelo também no efeito suspensivo, além do reexame necessário de toda a matéria desfavorável; por mais, arguindo a impossibilidade de reconhecimento da especialidade, à falta de documentação contemporânea à prestação laboral e comprobatória da exposição a agentes agressivos. Por mais, que não seria possível a conversão de períodos (especiais para comuns) após 28/05/1998. Em derradeiro argumento, sustentou que, uma vez deferida "aposentadoria especial", não pode haver permanência do labor especial, sendo que, se verificada tal simultaneidade - percepção de aposentadoria e exercício laborativo insalubre - deve ser descontado valor referente ao período. Alfim, requereu a redução do montante honorário e a alteração dos índices de juros de mora e atualização monetária.
Devidamente processado o recurso, sem o oferecimento de contrarrazões pela parte autora, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 20/05/2010 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 31/05/2010 (fl. 31) e a prolação da r. sentença aos 23/03/2012 (fl. 236), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Na peça vestibular, descreve a parte autora seus vínculos empregatícios supostamente especiais como sendo de 21/03/1978 a 30/01/1991, 10/12/1991 a 19/08/2004, 16/11/2004 a 24/08/2007 e 01/07/2008 a 20/05/2010, para os quais espera reconhecimento, tudo em prol da concessão, a si, de "aposentadoria especial".
De acordo com o artigo 475, § 2º, do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a implantar, em favor da parte autora, o benefício de "aposentadoria especial", desde a data da citação. E não havendo como se apurar o valor exato da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado, e da Súmula 490 do STJ.
Quanto ao pedido de suspensão da antecipação da tutela, consubstanciado no pleito do INSS, de recepção do recurso em ambos os efeitos - devolutivo e suspensivo - cumpre salientar que, nesta fase processual, a análise será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelo recurso, conjugado com a remessa necessária.
No mais, verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Do caso em tela.
As cópias de CTPS (fls. 17/26) revelam o ciclo laborativo do autor, podendo ser conferidos os vínculos empregatícios junto ao sistema informatizado CNIS (fls. 38/41).
Por sua vez, o resultado da perícia judicial (fls. 81/206) demonstra a sujeição da parte autora a agentes nocivos durante sua prática laboral, como segue:
* de 21/03/1978 a 30/01/1991, na condição de aprendiz de biscoiteiro, com exposição a agentes inflamáveis (derivados de petróleo), possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79;
* de 10/12/1991 a 19/08/2004, na condição de almoxarife, com exposição a hidrocarbonetos e outros derivados de carbono, possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79;
* de 16/11/2004 a 24/08/2007, na condição de encarregado de almoxarifado, com exposição a hidrocarbonetos e outros derivados de carbono, possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79;
* de 01/07/2008 a 20/05/2010, na condição de almoxarife, com exposição a ruído acima de 85 dB(A), possibilitando o acolhimento como labor de natureza especial, consoante itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Conforme planilha anexa, computando-se todos os intervalos laborativos da parte autora, de índole unicamente especial, constata-se que, na data do aforamento da demanda, em 20/05/2010, totalizava 30 anos, 02 meses e 19 dias de tempo de serviço exclusivamente especial, superada, assim, a marca dos exigidos 25 anos de dedicação exclusiva a tarefas de ordem especial.
Repilo a alegação do INSS, no sentido de que sejam descontados valores relativos a competências em que a parte autora auferira remuneração: a uma, porque não há nos autos indicativo de até quando o autor permanecera em labor e, sobretudo, se em labor especial; a duas, porque a norma contida no art. 57, §8º, da Lei de Benefícios, ao proibir o exercício de atividade especial quando o segurado estiver em gozo do benefício correspondente, visa proteger a integridade física do empregado, não devendo ser invocada em seu prejuízo, por conta da resistência injustificada do INSS.
O marco inicial do benefício fica mantido na data da citação (31/05/2010), momento da resistência inicial do INSS à pretensão do segurado.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser mantida no percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, dou parcial provimento às remessa necessária, tida por interposta, e apelação do INSS, para estabelecer que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos delineados em sentença.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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