Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2067557 / SP
0000290-69.2014.4.03.6122
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. DUPLO GRAU
OBRIGATÓRIO. SENTENÇA ULTRA PETITA. REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. CALOR. COMPROVAÇÃO PARCIAL. CONVERSÃO
INVERSA. IMPOSSIBILIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO INSUFICIENTE.
AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR
INTERPOSTA, PROVIDA EM PARTE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. APELO DO AUTOR
PROVIDO EM PARTE.
1 - Descreve a parte autora seu histórico laborativo, revelando atividades de índole especial,
requerendo o reconhecimento judicial dos interstícios de 26/08/1986 a 26/02/1987, 02/02/1988
a 02/12/1988, 11/01/1989 a 25/09/1989, 11/01/1990 a 04/12/1990, 06/03/1997 a 23/03/2000,
05/04/2000 a 11/11/2000, 13/11/2000 a 09/06/2005, 02/01/2006 a 25/08/2006, 13/09/2006 a
12/05/2008 e 01/10/2008 a 17/05/2013, além da conversão - de comuns para especiais - dos
lapsos de 01/02/1977 a 31/12/1978, 02/01/1979 a 05/05/1981, 16/07/1981 a 09/01/1984,
15/03/1985 a 08/07/1985, 02/09/1985 a 20/08/1986, 09/03/1987 a 06/07/1987, 13/07/1987 a
30/01/1988 e 16/10/1989 a 13/12/1989, em prol da concessão de "aposentadoria especial", a
partir do pleito administrativo aos 17/05/2013. Acolhimento administrativo quanto ao intervalo
especial de 11/12/1991 a 05/03/1997, tornando-o verdadeiramente incontroverso nos autos.
2 - A r. sentença condenou o INSS a reconhecer e averbar tempo de serviço. Assim, trata-se de
sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro
mencionado, e da Súmula 490 do STJ.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
4 - O douto Magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido inaugural, ao determinar a
conversão, de comum para especial, dos lapsos de 17/01/1985 a 15/02/1985, 26/08/1986 a
26/02/1987, 02/02/1988 a 02/12/1988, 11/01/1989 a 25/09/1989 e 11/01/1990 a 04/12/1990,
quando, em verdade, o pedido da autora restringe-se a 01/02/1977 até 31/12/1978, 02/01/1979
a 05/05/1981, 16/07/1981 a 09/01/1984, 15/03/1985 a 08/07/1985, 02/09/1985 a 20/08/1986,
09/03/1987 a 06/07/1987, 13/07/1987 a 30/01/1988 e 16/10/1989 a 13/12/1989, enfrentando
tema que não integrou a pretensão efetivamente manifesta.
5 - Reduzida a sentença aos limites do pedido inicial, excluindo-se os interregnos não-indicados
pela parte autora como sendo de atividade comum para especial.
6 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
7 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
8 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, com
redação dada pela Lei nº 9.032/95.
9 - Até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a)
com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
10 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
11 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
12 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
13 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
14 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
15 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
16 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
17 - Observam-se documentos específicos (Perfis Profissiográficos - PPP's), cuja finalidade
seria demonstrar a exposição do autor a agentes nocivos, durante a prática laboral. E do exame
acurado de todos os documentos em referência, comprovou-se a sujeição à insalubridade: * de
26/08/1986 a 26/02/1987, sob agente nocivo ruído de 89 dB(A), consoante PPP fornecido pela
empresa Destilaria Brasilândia S.A - Debrasa, à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e
1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; * de 02/02/1988 a 02/12/1988, sob agente nocivo ruído de 89
dB(A), consoante PPP fornecido pela empresa Destilaria Brasilândia S.A - Debrasa, à luz dos
itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; * de 11/01/1989 a
25/09/1989, sob agente nocivo ruído de 89 dB(A), consoante PPP fornecido pela empresa
Destilaria Brasilândia S.A - Debrasa, à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.5 do
Decreto nº 83.080/79; * de 11/01/1990 a 04/12/1990, sob agente nocivo ruído de 89 dB(A),
consoante PPP fornecido pela empresa Destilaria Brasilândia S.A - Debrasa, à luz dos itens
1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; * de 02/01/2006 a 25/08/2006,
sob agente nocivo ruído de 88,5 dB(A), consoante PPP fornecido pela empresa Construlix -
Construção, Comércio e Serviços Ltda., à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do
Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99; * de
13/09/2006 a 12/05/2008, sob agente nocivo ruído de 85,67 dB(A), consoante PPP fornecido
pela empresa Parapuã - Agroindustrial S/A, à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5
do Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99; * de
01/10/2008 a 25/04/2013 (emissão documental), sob agente nocivo ruído de 93,60 dB(A),
consoante PPP fornecido pela empresa Unialco S/A - Açúcar e Álcool, à luz dos itens 1.1.6 do
Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 2.0.1 do
Decreto nº 3.048/99.
18 - Quanto aos interstícios de 06/03/1997 a 23/03/2000 e 13/11/2000 a 09/06/2005, o PPP
fornecido pela empregadora Branco Peres Açúcar e Álcool S.A. refere à sujeição do trabalhador
a: a) ruído de 85 dB(A) - visivelmente abaixo dos limites de tolerância em vigor às épocas
descritas; b) radiações não ionizantes - a previsão, como fator de insalubridade, recai apenas
sobre radiações ionizantes, à luz do item 1.1.3 do Decreto nº 83.080/79; c) graxas, óleo e
produtos químicos em geral - a exposição ao fator de risco químico dera-se, a toda evidência,
em quantidades irrisórias, de sorte que sequer fora possível sua mensuração, resultando no
preenchimento do item 15.4 - "Intensidade/Concentração" do PPP com a sigla NA "não
aplicável", na forma estabelecida no Anexo XV da Instrução Normativa PRES/INSS n.º 77/2015.
19 - Afastando-se-os, o agente a ser adotado como verdadeiramente nocivo é o remanescente
calor de 39 centígrados.
20 - O agente físico calor, inicialmente contemplado no código 1.1.1 do Anexo III do Decreto nº
53.831/64, exige medição técnica para todos os períodos, devendo partir de fontes artificiais
(excluem-se as "intempéries"), sendo que a previsão inicial de enquadramento por exposição a
temperatura superior a 28° Centígrados/Celsius, extraída da CLT, foi, com o advento do
Decreto nº 2.172/97 (vide código 2.0.4 do Anexo IV), substituída por uma sistemática complexa
de medição, aferida por IBUTG - "Índice de Bulbo Úmido - Termômetro de Globo", disciplinada
no Anexo 3 da NR 15, aprovada pela Portaria/MTb nº 3.214, de 08/06/78, o que foi mantido pelo
Decreto nº 3.048/99.
21 - Infere-se a exposição ao agente agressivo calor acima do limite de tolerância estabelecido
na NR. 15, da Portaria nº 3.124/78 (26,0 ibutg, no desempenho de atividade moderada).
22 - No tocante ao interregno de 05/04/2000 a 11/11/2000, o nível de pressão sonora informado
no PPP - equivalente a 88,5 dB(A) - encontra-se aquém dos limites de tolerância impostos pela
matéria de regência, sendo que os indicadores ergonômicos e de ferimentos e correlatos não se
encontram nos róis relativos à insalubridade laboral. Trata-se de lapso que não pode ser
considerado excepcional.
23 - A pretensão de conversão de tempo comum em especial, com a aplicação fator 0.71,
denominada "conversão inversa", não merece prosperar. Isso porque o Superior Tribunal de
Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.310.034/PR, em sede de recurso
representativo de controvérsia repetitiva, firmou o entendimento no sentido de que a lei vigente
por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço
especial e comum, inclusive quanto ao fator de conversão, independente do regime jurídico à
época da prestação do serviço, restando inaplicável a regra que permitia a conversão de
atividade comum em especial aos benefícios requeridos após a edição da Lei nº 9.032/95.
24 - Computando-se todos os intervalos laborativos exclusivamente especiais, constata-se que,
na data do pleito administrativo, em 17/05/2013, totalizava o autor 22 anos, 08 meses e 10 dias
de tempo de serviço especial, insuficientes à concessão de "aposentadoria especial".
Improcedente a demanda neste ponto específico.
25 - Pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia
previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 26/08/1986 a
26/02/1987, 02/02/1988 a 02/12/1988, 11/01/1989 a 25/09/1989, 11/01/1990 a 04/12/1990,
06/03/1997 a 23/03/2000, 13/11/2000 a 09/06/2005, 02/01/2006 a 25/08/2006, 13/09/2006 a
12/05/2008 e 01/10/2008 a 17/05/2013.
26 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida ao autor e por ser o INSS delas isento.
27 - Sentença ultra petita reduzida aos limites do pedido.
28 - Remessa necessária, tida por interposta, provida em parte. Apelo do INSS provido.
Apelação do autor provida em parte.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
remessa necessária, tida por interposta, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos
limites do pedido, dar provimento à apelação do INSS, para afastar da condenação a conversão
de tempo comum em especial, e dar parcial provimento ao apelo do autor, para reconhecer a
especialidade dos interregnos de 26/08/1986 a 26/02/1987, 02/02/1988 a 02/12/1988,
11/01/1989 a 25/09/1989, 11/01/1990 a 04/12/1990, 06/03/1997 a 23/03/2000, 13/11/2000 a
09/06/2005, 02/01/2006 a 25/08/2006, 13/09/2006 a 12/05/2008 e 01/10/2008 a 17/05/2013, por
fim decretando a sucumbência recíproca entre as partes autora e ré, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-490***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-492LEG-FED LEI-5890 ANO-1973 ART-9***** LOPS-60
LEI ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-31LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-1.1.6 ITE-
1.1.1***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.1.5 ITE-1.1.3***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-2172
ANO-1997 ITE-2.0.1 ITE-2.0.4LEG-FED LEI-9528 ANO-1997***** RPS-99 REGULAMENTO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ITE-2.0.1LEG-FED INT-77 ANO-2015LEG-FED PRT-3124
ANO-1978
NR-15***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-21
Veja
STJ RESP 1.310.034/PRREPETITIVOTEMA 546.
