
| D.E. Publicado em 20/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para reconhecer como tempo especial os períodos de 01/01/1978 a 18/02/1980, 01/03/1980 a 28/02/1981, 01/06/1981 a 15/03/1982, 21/10/1982 a 02/03/1983, 01/10/1983 a 06/01/1986, 01/07/1986 a 28/02/1987, 01/07/1987 a 30/11/1987, 01/12/1987 a 01/10/1992 e 01/06/1993 a 28/04/1995, dando por compensado os honorários advocatícios entre as partes, ante a sucumbência recíproca, mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020401-93.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por AMAURY DO NASCIMENTO, em ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade nos períodos trabalhados como motorista de caminhão, comprovados por meio de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS e de PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário.
A r. sentença de fls. 76/78 julgou improcedente o pedido, mediante a justificativa de que não ficou comprovado o trabalho em atividade especial de forma permanente. Condenou a parte autora no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% "sobre o valor da ação", observado que o autor é beneficiário da justiça gratuita.
Em razões recursais de fls. 82/92, a parte autora alega que a especialidade restou comprovada pelos documentos trazidos a juízo. Afirma que a profissão de motorista foi prevista como atividade insalubre nos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo que antes da edição da Lei nº 9.032/95 não havia necessidade de habitualidade para caracterizar o trabalho como especial, bastando o mero enquadramento profissional. Pugna pela reforma da sentença, para que seja reconhecido o seu pleito inicial.
Intimada a autarquia, apresentou contrarrazões (fls. 95/98).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial, previsto no artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Do caso concreto.
Para comprovar que suas atividades foram exercidas em condições especiais, nos períodos entre 01/01/1978 a 18/02/1980, 01/03/1980 a 28/02/1981, 01/06/1981 a 15/03/1982, 21/10/1982 a 02/03/1983, 01/10/1983 a 06/01/1986, 01/07/1986 a 28/02/1987, 01/07/1987 a 30/11/1987, 01/12/1987 a 01/10/1992 e 01/06/1993 a 28/04/1995, o autor trouxe cópias de sua Carteira de Trabalho (fls. 21/25) que demonstram que trabalhou no transporte rodoviário, como "motorista" / "motorista carreteiro".
É assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrado como especiais os períodos de 01/01/1978 a 18/02/1980, 01/03/1980 a 28/02/1981, 01/06/1981 a 15/03/1982, 21/10/1982 a 02/03/1983, 01/10/1983 a 06/01/1986, 01/07/1986 a 28/02/1987, 01/07/1987 a 30/11/1987, 01/12/1987 a 01/10/1992 e 01/06/1993 a 28/04/1995, devido ao enquadramento legal da profissão do requerente no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
Com relação ao período subsequente vindicado (01/09/1996 a 28/03/2007), no entanto, o pedido de especialidade não merece prosperar, cuja conclusão decorre da análise do PPP de fls. 26/27 apresentado pelo recorrente, como se observa na sequência.
Particularmente quanto ao agente ruído, a pressão sonora de 73,4dB é inferior ao limite de tolerância legal em todos os períodos de prestação dos serviços (80db/90dB/85dB).
A exposição ao calor, medida em 22ºC (fl.26), demonstra-se insuficiente para a caracterização da insalubridade, eis que no Anexo do Decreto 53.831/64 exigia-se sujeição acima de 28ºC e no Anexo I do Decreto 83.080/79 a atividade profissional resguardada relaciona-se a "indústria metalúrgica e mecânica" e "alimentação de caldeiras".
Por sua vez, de acordo com a NR-15, da Portaria nº 3.214/78, de observância imperativa consoante determinam os Anexos IV do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99, a insalubridade deve levar em consideração não só o IBUTG, mas também o tipo de atividade exercida (leve, moderada ou pesada), sendo que quanto mais dinâmica for a atividade, menor a intensidade de temperatura exigida, conforme tabela abaixo: (Quadro n.º 1. Tipo de atividade - anexo nº 3, da NR15):
Cumpre notar que não há qualquer regime de trabalho considerado insalubre até 25 IBUTG´S e, repiso, a única informação constante no PPP é a exposição do requerente a 22ºC, portanto, afastada a nocividade do calor para todos os períodos.
No mais, a atividade de motorista de caminhão, por si só, não implica em contato do autor com os demais agentes agressivos (umidade, vibração e RNI-UV).
O Anexo do Decreto 53.831/64 trouxe a previsão da umidade como agente prejudicial à saúde, no entanto, apenas para os "trabalhos em contato direto e permanente com água".
Já o fator de risco vibração/trepidação sempre foi previsto como atividade especial apenas para as situações de "trabalhos com perfuratrizes e marteletes pneumáticos".
Por derradeiro, a radiação não ionizante (RNI-UV) sequer consta dos normativos mais recentes (Anexos IV do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99), sendo que a razão de sua previsão, contemplada no Anexo do Decreto 53.831/64, é direcionada aos trabalhos "para fins industriais, diagnósticos e terapêuticas", ou seja, atividades que em nada se assemelham às tarefas desempenhadas por um motorista de caminhão.
Conforme planilha anexa, somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda (01/01/1978 a 18/02/1980, 01/03/1980 a 28/02/1981, 01/06/1981 a 15/03/1982, 21/10/1982 a 02/03/1983, 01/10/1983 a 06/01/1986, 01/07/1986 a 28/02/1987, 01/07/1987 a 30/11/1987, 01/12/1987 a 01/10/1992 e 01/06/1993 a 28/04/1995), verifica-se que, até a data do ajuizamento (15/06/2007 - fl. 02), a parte autora contava com 14 anos, 4 meses e 20 dias de atividade desempenhada em condições especiais, tempo insuficiente para lhe assegurar o direito à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.
Esclareço que se sagrou vitoriosa a parte autora ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro lado, não foi concedida a aposentadoria especial, restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, dou os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para reconhecer como tempo especial os períodos de 01/01/1978 a 18/02/1980, 01/03/1980 a 28/02/1981, 01/06/1981 a 15/03/1982, 21/10/1982 a 02/03/1983, 01/10/1983 a 06/01/1986, 01/07/1986 a 28/02/1987, 01/07/1987 a 30/11/1987, 01/12/1987 a 01/10/1992 e 01/06/1993 a 28/04/1995, dando por compensado os honorários advocatícios entre as partes, ante a sucumbência recíproca, mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
Desembargador Federal
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