
| D.E. Publicado em 19/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação do INSS, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade nos períodos de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009, bem como conceder ao autor o benefício de aposentadoria especial, com data de início do benefício a partir da data do requerimento administrativo (29/06/2011), acrescidas as parcelas em atraso de juros de mora, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e de correção monetária, de acordo com o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, e julgar prejudicada a análise da remessa necessária e da apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 05/09/2017 16:30:35 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0012774-62.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelações interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e pela parte autora, em ação previdenciária ajuizada por JOÃO ALVES FERREIRA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria integral por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento da especialidade nos períodos de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/07/1989 a 27/04/2009.
A r. sentença de fls. 151/156 julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo os períodos de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009 como tempo exercido em atividade especial, e condenou a autarquia "efetuar a nova contagem de tempo do autor para fins de aposentadoria e, se presentes todos os requisitos, incluindo o tempo, conceder-lhe a aposentadoria pleiteada", a partir da data do requerimento administrativo, bem como no pagamento das prestações atrasadas, acrescidas de correção monetária e juros de mora, nos termos da legislação vigente, observada a Lei n. 11.960/2009. Condenou-a, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação até a data da sentença, "se for ao caso de concessão da aposentadoria ou, em caso negativo, no valor de R$ 800,00". Sentença sujeita ao reexame necessário.
Em razões recursais de fls. 159/166, a parte autora pleiteia a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, sustentando que completou o lapso temporal necessário para fazer jus ao benefício pretendido. Pleiteia o reconhecimento, como tempo de serviço, do somatório dos contratos de trabalho anotados na CTPS, além da antecipação da tutela da aposentadoria.
O INSS, por sua vez, às fls. 169/179, arguindo a prolação de sentença condicional, pleiteia o decreto de sua nulidade. Subsidiariamente, afirma que a decisão recorrida deve ser reformada, dada a impossibilidade do reconhecimento dos períodos especiais postulados. Alega que, no interregno de 23/10/1979 a 03/11/1986, no tocante ao agente ruído, o PPP não foi conclusivo e específico sobre a sua nocividade, insurgindo-se contra a ausência de laudo contemporâneo aos fatos discutidos, mencionando, ainda, que o uso dos EPIs descaracteriza a insalubridade. No tocante ao período de 01/07/1989 a 01/03/2009, sustenta que a exposição à eletricidade não era permanente, o que impõe a negativa de sua especialidade.
Apenas a parte autora apresentou contrarrazões (fls. 181/182).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial, previsto no artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
Em sua decisão, o juiz a quo, apesar de reconhecer a especialidade nos períodos de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009, determinou que a autarquia procedesse à contagem do tempo de serviço, condicionando a concessão do benefício à presença da totalidade dos requisitos, o que deveria ser averiguado pelo INSS. Condenou-a, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, de acordo com o resultado da análise administrativa.
Desta forma, está-se diante de sentença condicional, eis que expressamente não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil:
"A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
(...)
§ 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:
(...)
II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir".
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passo ao exame do mérito da demanda.
Quanto ao período trabalhado na empresa "São Paulo Alpargatas S/A" entre 23/10/1979 a 03/11/1986, o formulário DSS-8030, com remissão ao laudo ambiental protocolado perante a autarquia, assinado pelo engenheiro Sr. Fábio Cantusio, demonstra que o autor estava exposto a ruído de 86dB.
No interregno temporal laborado na Prefeitura Municipal de Mogi Mirim de 01/10/1990 até 27/04/2009, o Perfil Profissiográfico Previdenciário juntado às fls. 112/113, com indicação do profissional responsável pelos registros ambientais, demonstra que o autor trabalhou no cargo de eletricista, com "exposição a tensão superior a 250 volts", consistindo a sua atividade em "instala e faz manutenção de equipamentos e fiação elétrica; executa reparos ou substitui equipamentos elétricos com problemas; faz operações em locais com eletricidade onde há perigo de vida, executando abertura e fechamento de chave de alta tensão".
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, reputo enquadrados como especiais os períodos laborados de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009.
Já no período compreendido entre 01/07/1989 a 30/09/1990, trabalhado pelo autor na função de funileiro, na Prefeitura Municipal de Mogi Mirim, não há justificativa para o reconhecimento do trabalho especial por ausência probatória do desempenho de atividade insalubre, carecendo de qualquer elementos nesse sentido no Perfil Profissiográfico de fls. 112/113, além da impossibilidade de enquadramento das atividades exercidas pelo requerente nos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, importante ser dito que restou superada a questão relacionada à supressão do agente "eletricidade" do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Conforme planilha anexa, somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda (23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009), verifica-se que, até a data do requerimento administrativo (29/06/2011 - fl. 61), o autor contava com 25 anos, 7 meses e 8 dias de atividade desempenhada em condições especiais, o que lhe assegura o direito à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.
O requisito carência restou também completado, consoante o extrato CNIS anexo.
O termo inicial do benefício deve ser estabelecido na data do requerimento administrativo (29/06/2011), procedendo-se, de todo modo, a compensação dos valores pagos a título de aposentadoria por tempo de contribuição, concedido em favor do autor com data de início de benefício em 27/06/2014, conforme CNIS.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação do INSS, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade nos períodos de 23/10/1979 a 03/11/1986 e 01/10/1990 a 29/04/2009, bem como conceder ao autor o benefício de aposentadoria especial, com data de início do benefício a partir da data do requerimento administrativo (29/06/2011), acrescidas as parcelas em atraso de juros de mora, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e de correção monetária, de acordo com o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, e julgo prejudicada a análise da remessa necessária e da apelação do autor.
É como voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 05/09/2017 16:30:32 |
