
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023232-36.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: APARECIDA RODRIGUES CORNETI
Advogado do(a) APELANTE: DIEGO GONCALVES DE ABREU - SP228568-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023232-36.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: APARECIDA RODRIGUES CORNETI
Advogado do(a) APELANTE: DIEGO GONCALVES DE ABREU - SP228568-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por APARECIDA RODRIGUES CORNETTI, em ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de trabalho exercido em condições especiais.
A r. sentença (ID 99662600 - págs. 193/195) reconheceu a litispendência e julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, não havendo condenação no pagamento dos honorários advocatícios, em razão da incidência da Lei n. 1060/50.
Em razões recursais (ID 99662600 - págs. 200/204), a parte autora alega que não restou configurada a litispendência, tendo em vista a inexistência de identidade entre as causas de pedir e os pedidos formulados na demanda ajuizada no Juizado Especial Federal e na presente contenda. Argumenta que o acolhimento deste pleito pouparia o ingresso de ação rescisória para a obtenção do benefício. Afirma que exerceu atividade insalubre por mais de 25 anos, motivo pelo qual requer a concessão da aposentadoria especial.
Intimada a autarquia, não apresentou contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023232-36.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: APARECIDA RODRIGUES CORNETI
Advogado do(a) APELANTE: DIEGO GONCALVES DE ABREU - SP228568-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991.
Embora inexistente a identidade tríplice entre as demandas (partes, pedido e causa de pedir), parte do objeto delas é coincidente, o que cabe apurar em primeiro momento.
No ano de 2010, foi aforada demanda no Juizado Especial Federal de Ribeirão Preto, processo n. 0010810-72.2010.4.03.6302, na qual a parte autora buscava obter o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, por meio da admissão da especialidade de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 28/04/2009 (ID 99662600 - págs. 70/77). Em primeiro grau, foi julgada parcialmente procedente, sendo apenas reconhecido o trabalho especial de 01/04/1975 a 31/08/1976 (ID 99662600 - págs. 85/91). Interposto recurso inominado, em consulta ao sistema informatizado deste Tribunal, observa-se que lhe foi negado provimento, tendo o mesmo ocorrido com as diversas tentativas recursais de levar a questão para os Tribunais Superiores, ocorrendo o trânsito em julgado em 11/05/2018.
Ajuizada esta contenda em 2012, a parte autora, no intuito de obter a aposentadoria especial, traz como fundamento do seu pedido, o trabalho por mais de 25 anos em atividades especiais, o que teria se dado nos interregnos de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 06/08/2012, como se depreende do tempo de serviço contabilizado na inicial, inclusive pela fundamentação deduzida, que aduz a insalubridade no exercício atividades de tecelagem (01/04/1975 a 31/08/1976) e de recepcionista (01/12/1988 a 06/08/2012).
Desta feita, não há dúvida acerca dá identidade parcial do objeto discutido, é dizer, o trabalho especial de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 28/04/2009 já está revestido pela definitividade da coisa julgada material. Por outro lado, permanece a controvérsia quanto ao exame da especialidade do labor de 29/04/2009 a 06/08/2012, a saber, ainda, se o recorrente faz jus ao benefício pretendido.
É certo que, em situações como a presente, na qual há plena condição de ser julgada a demanda, especificamente quanto ao pedido especial de 29/04/2009 a 06/08/2012 e de obtenção do benefício especial, demonstra-se perfeitamente cabível a aplicação da teoria da causa madura, nos termos do artigo 515, §3º, do CPC/1973 (1013, §3º, I, do CPC/2015). O Novo Código de Processo Civil - ressalta-se - expressamente permite o julgamento do mérito em segunda instância quando a decisão de extinção recorrida estiver fundada nas hipóteses do artigo 485 do novel diploma, entre as quais, o reconhecimento de litispendência ou coisa julgada. É o caso dos autos.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Período Trabalhado | Enquadramento | Limites de Tolerância |
Até 05/03/1997 | 1. Anexo do Decreto nº 53.831/64. 2. Decretos nºs 357/91 e 611/92 | 80 dB |
De 06/03/1997 a 18/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original | 90dB |
A partir de 19/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03 | 85 dB |
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
(...)
a segunda tese
fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte:na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador
, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP),no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria
" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29, de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos).Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Do caso concreto
.Quanto ao período trabalhado na "Sociedade Beneficente de Cravinhos - Santa Casa" de 29/04/2009 a 06/08/2012, o laudo pericial produzido em juízo (ID 99662600 - págs. 163/172) não atestou com segurança o exercício de atividades insalubres pela requerente, tendo em vista que ora certificou a exposição a agentes biológicos e, em outro momento, respondeu expressamente que no mencionado interregno não ficou exposta a qualquer agente nocivo.
Além disso, as funções desempenhadas pela apelante, no cargo de recepcionista, consoante descrição feita no laudo, não sugerem qualquer tipo de risco a que estivesse exposta e fosse capaz de trazer prejuízo à sua saúde, mesmo realizadas em âmbito hospitalar: “recepcionava e prestava serviços de apoio aos pacientes, realizava atendimento telefônico no hospital "Santa Casa" de Cravinhos, marcava consultas e recebia os pacientes, averiguava suas necessidades e os dirigia aos lugares corretos. Tinha como dever, observar as normas internas de segurança, conferindo os documentos e idoneidade dos clientes, notificando a segurança sobre a presença de pessoas estranhas, organizando informações e por fim o planejamento do trabalho no cotidiano.”
Assim sendo, à vista do conjunto probatório, afastada a especialidade no período de 29/04/2009 a 06/08/2012. Consequentemente, a parte autora também não faz jus à aposentadoria especial.
Por conseguinte, condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Diante do exposto,
dou parcial provimento ao apelo da autora
, paraanular
a r. sentença de 1º grau de jurisdição, especificamente quanto ao reconhecimento do pedido especial de 29/04/2009 a 06/08/2012 e de obtenção da aposentadoria especial, e, nos termos dos arts. 515, §3º, do CPC/1973 e 1.013, §3º, do CPC/2015, adentro no mérito da demanda, ejulgo improcedente os pedidos
, condenando-a no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observado o disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. IDENTIDADE APENAS PARCIAL DE OBJETOS ENTRE DEMANDAS. COISA JULGADA. NULIDADE PARCIAL DA SENTENÇA. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO IMEDIATO. TEORIA DA CAUSA MADURA. ATIVIDADE ESPECIAL. RECEPCIONISTA. NÃO DEMONSTRADA EXPOSIÇÃO A AGENTE BIOLÓGICO. NÃO ADMISSÃO. SENTENÇA ANULADA EM PARTE. ANÁLISE DO MÉRITO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1 – Embora inexistente a identidade tríplice entre as demandas (partes, pedido e causa de pedir), parte do objeto delas é coincidente, o que cabe apurar em primeiro momento. No ano de 2010, foi aforada demanda no Juizado Especial Federal de Ribeirão Preto, processo n. 0010810-72.2010.4.03.6302, na qual a parte autora buscava obter o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, por meio da admissão da especialidade de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 28/04/2009 (ID 99662600 - págs. 70/77). Em primeiro grau, foi julgada parcialmente procedente, sendo apenas reconhecido o trabalho especial de 01/04/1975 a 31/08/1976 (ID 99662600 - págs. 85/91). Interposto recurso inominado, em consulta ao sistema informatizado deste Tribunal, observa-se que lhe foi negado provimento, tendo o mesmo ocorrido com as diversas tentativas recursais de levar a questão para os Tribunais Superiores, ocorrendo o trânsito em julgado em 11/05/2018.
2 - Ajuizada esta contenda em 2012, a parte autora, no intuito de obter a aposentadoria especial, traz como fundamento do seu pedido, o trabalho por mais de 25 anos em atividades especiais, o que teria se dado nos interregnos de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 06/08/2012, como se depreende do tempo de serviço contabilizado na inicial, inclusive pela fundamentação deduzida, que aduz a insalubridade no exercício atividades de tecelagem (01/04/1975 a 31/08/1976) e de recepcionista (01/12/1988 a 06/08/2012).
3 - Desta feita, não há dúvida acerca dá identidade parcial do objeto discutido, é dizer, o trabalho especial de 01/04/1975 a 31/08/1976 e 01/12/1988 a 28/04/2009 já está revestido pela definitividade da coisa julgada material. Por outro lado, permanece a controvérsia quanto ao exame da especialidade do labor de 29/04/2009 a 06/08/2012, a saber, ainda, se o recorrente faz jus ao benefício pretendido.
4 - É certo que, em situações como a presente, na qual há plena condição de ser julgada a demanda, especificamente quanto ao pedido especial de 29/04/2009 a 06/08/2012 e de obtenção do benefício especial, demonstra-se perfeitamente cabível a aplicação da teoria da causa madura, nos termos do artigo 515, §3º, do CPC/1973 (1013, §3º, I, do CPC/2015). O Novo Código de Processo Civil - ressalta-se - expressamente permite o julgamento do mérito em segunda instância quando a decisão de extinção recorrida estiver fundada nas hipóteses do artigo 485 do novel diploma, entre as quais, o reconhecimento de litispendência ou coisa julgada. É o caso dos autos.
5 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
6 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
7 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
8 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
9 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
10 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
11 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
12 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
13 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
14 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
15 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
16 – Quanto ao período trabalhado na "Sociedade Beneficente de Cravinhos - Santa Casa" de 29/04/2009 a 06/08/2012, o laudo pericial produzido em juízo (ID 99662600 - págs. 163/172) não atestou com segurança o exercício de atividades insalubres pela requerente, tendo em vista que ora certificou a exposição a agentes biológicos e, em outro momento, respondeu expressamente que no mencionado interregno não ficou exposta a qualquer agente nocivo.
17 - Além disso, as funções desempenhadas pela apelante, no cargo de recepcionista, consoante descrição feita no laudo, não sugerem qualquer tipo de risco a que estivesse exposta e fosse capaz de trazer prejuízo à sua saúde, mesmo realizadas em âmbito hospitalar: “recepcionava e prestava serviços de apoio aos pacientes, realizava atendimento telefônico no hospital "Santa Casa" de Cravinhos, marcava consultas e recebia os pacientes, averiguava suas necessidades e os dirigia aos lugares corretos. Tinha como dever observar as normas internas de segurança, conferindo os documentos e idoneidade dos clientes, notificando a segurança sobre a presença de pessoas estranhas, organizando informações e por fim o planejamento do trabalho no cotidiano.”
18 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, afastada a especialidade no período de 29/04/2009 a 06/08/2012. Consequentemente, a parte autora também não faz jus à aposentadoria especial.
19 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
20 – Apelação da parte autora provida. Sentença anulada. Pedido julgado improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao apelo da autora, para anular a r. sentença de 1º grau de jurisdição, especificamente quanto ao reconhecimento do pedido especial de 29/04/2009 a 06/08/2012 e de obtenção da aposentadoria especial, e, nos termos dos arts. 515, §3º, do CPC/1973 e 1.013, §3º, do CPC/2015, adentrar no mérito da demanda, e julgar improcedente os pedidos, condenando-a no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observado o disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
