Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2040159 / SP
0046194-65.2011.4.03.6301
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL OU
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SOLDADOR.
AGENTES NOCIVOS QUÍMICOS EM QUANTIDADES IRRISÓRIAS. APOSENTADORIA
PROPORCIONAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. REMESSA NECESSÁRIA E
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
3 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
13 - Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum,
independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da
conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
14 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do
Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
15 - A r. sentença reconheceu o labor comum nos períodos de 01/04/1985 a 14/03/1986, de
17/03/1986 a 28/07/1986, de 25/08/1986 a 29/09/1991, de 01/10/1991 a 09/10/1992, de
13/10/1992 a 13/12/1992 e de 19/04/1993 a 07/11/1995 e o labor exercido sob condições
especiais nos períodos de 06/06/1977 a 01/02/1978, de 05/04/1978 a 12/05/1978, de
16/05/1978 a 07/05/1979, de 25/06/1979 a 26/06/1980, de 03/11/1980 a 02/04/1982, de
11/05/1982 a 15/09/1982, de 04/01/1983 a 08/05/1984, de 21/11/1995 a 30/10/2005 e de
11/11/2005 a 31/03/2011, e condenou o INSS a implantar, em favor do autor, o benefício de
aposentadoria por tempo de serviço/contribuição integral, desde a DER, ou seja, a partir de
18/07/2011.
16 - Ressalte-se que os períodos de labor comum de 01/04/1985 a 14/03/1986, de 17/03/1986 a
28/07/1986, de 25/08/1986 a 29/09/1991, de 01/10/1991 a 09/10/1992, de 13/10/1992 a
13/12/1992 e de 19/04/1993 a 07/11/1995 já foram reconhecidos administrativamente pelo INSS
(fls. 130/131), razão pela qual são incontroversos.
17 - Conforme cópias da CTPS e CNIS: no período de 06/06/1977 a 01/02/1978, laborado na
Companhia Brasileira de Pavimentação Cobrapa, o autor exerceu o cargo de "soldador",
atividade profissional enquadrada no código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no
código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 - CTPS de fl. 37 e CNIS de fl. 58; no período
de 05/04/1978 a 12/05/1978, laborado na empresa Norteminas Indústria de Minérios e Argilas
do Nordeste Ltda, o autor exerceu o cargo de "soldador", atividade profissional enquadrada no
código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº
83.080/79 - CTPS de fls. 37 e 140; no período de 16/05/1978 a 07/05/1979, laborado na
empresa ENARQ - Engenharia e Arquitetura Ltda, o autor exerceu o cargo de "soldador",
atividade profissional enquadrada no código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no
código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 - CTPS de fl. 38 e CNIS de fl. 58; no período
de 25/06/1979 a 26/06/1980, laborado na empresa Filtros Mann Ltda, o autor exerceu o cargo
de "soldador", atividade profissional enquadrada no código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº
53.831/64 e no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 - CTPS de fl. 38 e CNIS de fl.
58; no período de 03/11/1980 a 02/04/1982, laborado na empresa JABERT Máquinas
Hidráulicas Ltda, o autor exerceu o cargo de "soldador", atividade profissional enquadrada no
código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº
83.080/79 - CTPS de fl. 39 e CNIS de fl. 58; no período de 11/05/1982 a 15/09/1982, laborado
na empresa Tempermetal - Têmpera de Metais S/A, o autor exerceu o cargo de "soldador",
atividade profissional enquadrada no código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no
código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 - CTPS de fl. 39 e CNIS de fl. 58; no período
de 04/01/1983 a 08/05/1984, laborado na Refrigeração Atenas Ltda, o autor exerceu o cargo de
"soldador", atividade profissional enquadrada no código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº
53.831/64 e no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 - CTPS de fl. 40.
18 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de
06/06/1977 a 01/02/1978, de 05/04/1978 a 12/05/1978, de 16/05/1978 a 07/05/1979, de
25/06/1979 a 26/06/1980, de 03/11/1980 a 02/04/1982, de 11/05/1982 a 15/09/1982 e de
04/01/1983 a 08/05/1984.
19 - No tocante aos demais períodos, o autor apresentou Perfis Profissiográficos
Previdenciários - PPPs (fls. 28/29 e 31/32) demonstrando que, no período de 21/11/1995 a
30/10/2005, laborado na Fundação Tropical de Pesquisa Tecnológica André Tosello, e no
período de 11/11/2005 a 31/03/2011, laborado na empresa CPTI - Cooperativa de Serviços e
Pesquisas Tecnológicas e Industriais, esteve exposto a agentes nocivos químicos em
quantidades irrisórias, de sorte que sequer fora possível sua mensuração, resultando no
preenchimento do item 15.4 - "Intensidade/Concentração" do PPP com a sigla NA "não
aplicável", na forma estabelecida no Anexo XV da Instrução Normativa PRES/INSS n.º 77/2015.
20 - Ressalta-se que a nocividade dos agentes químicos indicados é estabelecida por critério
quantitativo, previsto na NR 15 aprovada pela Portaria MTB n.º 3.214/1978, de sorte que a
exposição a quantidades inferiores aos limites de tolerância ali estabelecidos não caracteriza
atividade de natureza insalubre.
21 - Assim, impossível o reconhecimento da especialidade do labor nos referidos períodos.
22 - Com o advento da emenda constitucional 20/98, extinguiu-se a aposentadoria proporcional
para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998),
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
23 - Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de
forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema
por ocasião da alteração legislativa em comento.
24 - Desta forma, conforme tabela anexa, convertendo-se os períodos de atividade especial
reconhecidos nesta demanda em tempo comum, aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e
somando-os aos demais períodos comuns já reconhecidos administrativamente pelo INSS (fls.
130/131 e 257), verifica-se que, na data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998), o autor
contava com 21 anos, 5 meses e 26 dias de tempo de atividade; insuficiente para a concessão
do benefício de aposentadoria.
25 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do requerimento
administrativo (18/07/2011 - fl. 26), o autor contava com 33 anos, 11 meses e 29 dias de tempo
de atividade; suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo
de contribuição, a partir desta data.
26 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
27 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
remessa necessária e à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento da especialidade do
labor nos períodos de 21/11/1995 a 30/10/2005 e de 11/11/2005 a 31/03/2011 e para
determinar a implantação, em favor do autor, do benefício de aposentadoria proporcional por
tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (18/07/2011), com
parcelas em atraso acrescidas de correção monetária calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de
mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual; mantendo, no
mais, o julgado proferido em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** TR-JEF-3R SÚMULA DA TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª
R
LEG-FED SUM-13***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70 PAR-1LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-
611 ANO-1992 ART-292***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-58LEG-FED DEC-53831 ANO-1964
ITE-2.5.3***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-2.5.3LEG-FED LEI-6887 ANO-1980LEG-FED MPR-1523
ANO-1996
REEDIÇÕES E EDIÇÃO 13LEG-FED MPR-1596 ANO-1997
EDIÇÃO 14LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED DEC-2172 ANO-1997LEG-FED LEI-9711
ANO-1998 ART-28LEG-FED INT-77 ANO-2015
INSSLEG-FED PRT-3214 ANO-1978
MT - MINISTÉRIO DO TRABALHO / NR-15LEG-FED EMC-20 ANO-1998LEG-FED LEI-11960
ANO-2009
Veja
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810.
