Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2033035 / SP
0001608-22.2011.4.03.6113
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/05/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL OU POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO. LEI Nº 8.213/1991. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CARÁTER
PERSONALÍSSIMO. CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. ATIVIDADE ESPECIAL.
AGENTES QUÍMICOS. LAUDO DO SINDICATO PROFISSIONAL CALÇADISTA. RUÍDO.
RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE PARA O BENEFÍCIO ESPECIAL. EC
Nº 20/1998. REQUISITO ETÁRIO E "PEDÁGIO" NÃO CUMPRIDOS. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NÃO CONCEDIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DO
INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - A verba honorária (tanto a contratual como a sucumbencial) possui caráter personalíssimo,
detendo seu titular, exclusivamente, a legitimidade para pleiteá-los, vedado à parte fazê-lo, na
medida em que a decisão não lhe trouxe prejuízo. Em outras palavras, não tendo a parte autora
experimentado qualquer sucumbência com a prolação da decisão impugnada, ressente-se,
nitidamente, de interesse recursal. Apelo não conhecido nesse particular.
2 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
3 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
decreto do Poder Executivo.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
5 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
6 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
7 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
8 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Pretende o autor o reconhecimento da especialidade nos períodos de 04/08/1980 a
01/03/1989 (auxiliar de sapateiro), de 02/03/1989 a 09/07/1994 (lustrador), de 19/10/1994 a
17/11/1994 (moldador), de 01/12/1994 a 14/02/1995 (moldador), de 18/01/1995 a 23/03/1995
(moldador), de 29/03/1995 a 03/07/1995 (sapateiro), de 04/07/1995 a 30/12/1998 (moldador),
de 06/07/1999 a 17/12/1999 (embonecador), de 22/03/2000 a 20/12/2000 (moldador), de
02/07/2001 a 15/08/2001 (moldador de mocassim), de 27/08/2001 a 06/01/2002 (sapateiro), de
01/02/2002 a 25/07/2007 (moldador) e de 14/04/2008 a 01/09/2010 (escalador).
13 - Observa-se que o requerente apresentou Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPP (fls.
84/94), os quais indicam que o autor trabalhou exposto ao ruído de 86dB, na empresa
"Calçados Netto Ltda", pelo ínterim de 29/03/1995 a 03/07/1995 (fl. 89); e à intensidade sonora
de 85dB, no lapso de 03/07/1995 a 30/12/1998, trabalhado em prol do empregador "Calçados
Samello S/A" (fl. 90). Logo, com base na legislação de regência às épocas, é possível o
reconhecimento da especialidade dos períodos de 29/03/1995 a 03/07/1995 e de 04/07/1995 a
05/03/1997.
14 - Para perquirir a especialidade do labor, foi também determinada a realização de perícia
técnica, direta, na empresa "Acrux Calçados Ltda" e, indireta, nas empresas "Calçados Samello
S/A" e "Francaflex Ind de Calçados Ltda - ME".
15 - No aspecto, saliente-se que é pacífico o entendimento desta Turma no sentido da
possibilidade de realização de prova pericial indireta, desde que demonstrada a inexistência da
empresa, com a aferição dos dados em estabelecimentos paradigmas, observada a
similaridade do objeto social e das condições ambientais de trabalho.
16 - Para comprovar o labor especial exercido nos demais períodos, a parte autora coligiu aos
autos laudo técnico pericial elaborado pelo Sindicato dos Empregados nas Indústrias de
Calçados de Franca/SP, o qual reputa-se válido para comprovar o desempenho de atividade
especial, com base na jurisprudência da 7ª Turma deste E. TRF da 3ª Região, revendo o
entendimento anteriormente firmado.
17 - Registre-se, porque de todo oportuno, que o laudo pericial em questão somente será, aqui,
utilizado, no tocante aos lapsos temporais que não vieram secundados por qualquer Formulário,
Laudo ou PPP fornecidos pela respectiva empregadora, até porque, na hipótese da existência,
nos autos, de documentação válida, esta, por óbvio, prefere àquela, por retratar de forma
individualizada as condições laborais do empregado
18 - Atestado pelo laudo pericial que autor, na execução das funções de sapateiro, moldador,
embonecador e moldador de mocassim, trabalhou em contato com os compostos químicos
agressivos à saúde, tolueno (ou metil-benzeno, hidrocarboneto) e acetona (cetona), de acordo
com os itens 1.2.11, Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10, Anexo I do Decreto nº
83.080/79 e 1.0.3, Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99.
19 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda, verifica-se que o autor
contava com 23 anos, 11 meses e 24 dias de atividade desempenhada em condições especiais,
por ocasião da data da entrada do requerimento administrativo (01/09/2010), portanto, tempo
insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº.
8.213/1991.
20 - Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum,
independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da
conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
21 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 - Somando-se os períodos comuns aos especiais, reconhecidos nesta demanda, convertidos
em comuns, verifica-se que o autor alcançou 29 anos, 2 meses e 11 dias de serviço na data do
requerimento administrativo (20/01/2010), no entanto, à época não havia completado o requisito
etário (53 anos) e o "pedágio" (34 anos, 4 meses e 12 dias) para fazer jus à aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, conforme disposição do art. 9º, §1º, da Emenda
Constitucional nº 20/98.
23 - Observa-se que a sentença concedeu a tutela antecipada. Tendo em vista que a eventual
devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora
revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição
dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema cuja análise se
encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema
afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da
duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro
momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao
andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo
da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
24 - Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro
lado, não foi concedida a aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, restando
vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, honorários advocatícios por compensados
entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e sem condenação de
qualquer delas no reembolso das custas, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e
o INSS delas isento.
25 - Remessa necessária e apelações, do INSS e da parte autora, parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer parcialmente da
apelação da parte autora e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, para declarar que
trabalhou em condições especiais de 06/07/1999 a 17/12/1999, de 22/03/2000 a 20/12/2000 e
de 02/07/2001 a 15/08/2001 e dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do
INSS, para afastar a especialidade dos períodos de 04/08/1980 a 01/03/1989, de 02/03/1989 a
09/07/1994, de 06/03/1997 a 30/12/1998 e de 14/04/2008 a 01/09/2010 e julgar improcedente o
pedido de concessão de aposentadoria, com revogação da tutela anteriormente deferida,
observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse título,
determinar que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de
mora na forma da fundamentação bem como para reconhecer a sucumbência recíproca, dando
os honorários advocatícios por compensados, mantendo, no mais, a r. sentença, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
