Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2004769 / SP
0029361-28.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
09/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR DE
NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. ATIVIDADE ESPECIAL. CORTADOR DE CANA-DE-
AÇÚCAR. RUÍDO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. RECONHECIMENTO PARCIAL.
TEMPO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA
NECESSÁRIA DESPROVIDAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Rejeitada a preliminar de nulidade da sentença em razão do alegado cerceamento de defesa
por ausência de produção probatória, eis que a prova documental juntada aos autos mostra-se
suficiente para o julgamento da causa, sendo, portanto, desnecessária a realização da perícia
requerida. Precedente.
2 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
3 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
4 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
5 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
6 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
7 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
8 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
9 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento
não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C.
STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que
integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
10 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
11 - Durante as atividades realizadas na "Usina São Martinho S/A" e na "Agropecuária Monte
Sereno SA" de 03/11/1975 a 15/04/1976, 16/07/1977 a 30/11/1977, 01/12/1977 a 15/04/1978 e
16/05/1978 a 31/10/1978, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982, 03/05/1982 a
23/10/1982, 03/11/1982 a 31/03/1983, 18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984,
23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 a
15/05/1986 e 27/05/1986 a 14/06/1986, as cópias da CTPS juntadas às fls. 25/28 e os Perfil
Profissiográfico Previdenciário de fls. 85/89, com indicação dos responsáveis pelos registros
ambientais, indicam que o requerente trabalhou desempenhando atividades no corte de cana-
de-açúcar.
12 - Com efeito, a insalubridade do corte de cana-de-açúcar é inquestionável, eis que,
conhecidamente, a atividade envolve desgaste físico excessivo, sujeita a horas de exposição ao
sol e a produtos químicos, além do contato direto com os malefícios da fuligem, exigindo-se,
inclusive, alta produtividade dos trabalhadores e em lamentáveis condições antiergonômicas de
trabalho. Esse também é o entendimento desta Sétima Turma: APEL 0026846-
88.2012.4.03.9999/SP, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, v. u., julgado em 13/02/2017.
13 - Ainda para comprovar o exercício de atividades especiais, o autor trouxe a juízo os Perfis
Profissiográficos Previdenciários de fls. 85/89, 99/100, 109 e 111/112, com indicação dos
responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, que atestam a sua
exposição a ruído de: a) 83,1dB, no período de 29/04/1995 a 03/12/2001, trabalhado na "Usina
São Martinho SA"; b) 86,2dB, no interregno de 15/04/2002 a 30/04/2002, laborado na "Usina da
Barra SA Açúcar e Álcool"; c) 67,9dB a 81,9dB, de 29/01/2007 a 08/04/2010, trabalhado na
empresa "Usina Santa Adélia - Pereira Barreto".
14 - Observa-se, ainda, que no período trabalhado na empresa "Pro Metalurgia SA" de
01/06/1976 a 22/02/1977, consoante revela o PPP de fls. 90, o autor estava sujeito a pressão
sonora de 93,8dB.
15 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
03/11/1975 a 15/04/1976, 01/06/1976 a 22/02/1977, 16/07/1977 a 30/11/1977, 01/12/1977 a
15/04/1978 e 16/05/1978 a 31/10/1978, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982,
03/05/1982 a 23/10/1982, 03/11/1982 a 31/03/1983, 18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a
31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985,
11/11/1985 a 15/05/1986, 27/05/1986 a 14/06/1986, 29/04/1995 a 05/03/1997.
16 - Afastada, portanto, a especialidade no período de 06/03/1997 a 03/12/2001, 15/04/2002 a
30/04/2002 e 29/01/2007 a 08/04/2010, tendo em vista que o autor estava exposto a ruído
inferior ao limite de tolerância legal à época da prestação dos serviços (90dB para os dois
primeiros períodos e 85dB para o derradeiro).
17 - No que se refere ao trabalho desempenhado na "Empreiteira Santo Antônio Ltda.", na
"Usina Santa Adélia SA", na "Usina Açucareira de Jaboticabal SA", e na "Transportadora Falcão
Ltda." de 10/01/1980 a 31/10/1980, 08/01/1981 a 18/04/1981, 06/05/2002 a 18/11/2002,
09/04/2003 a 20/10/2003 e 21/11/2003 a 21/11/2005, no exercício das funções de ajudante de
mecânico, servente de pedreiro e de motorista, os formulários apresentados às fls. 146 e 96,
assim como o PPP de fls. 111/112, não demonstram que o autor estivesse exposto a atividades
insalubres, registrado que a simples menção a alteração climáticas se demonstra insuficiente
para a admissão da especialidade.
18 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda, verifica-se que a parte
autora contava com 16 anos, 8 meses e 2 dias de atividade desempenhada em condições
especiais, por ocasião da data da entrada do requerimento administrativo (27/05/2010 - fls.
123/134), portanto, tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do
artigo 57 da Lei nº 8.213/1991.
19 - Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente provida. Remessa necessária e
apelação do INSS desprovidas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar
arguida no recurso de apelação da parte autora, e no mérito, dar-lhe parcial provimento, para
admitir a especialidade de 03/11/1975 a 15/04/1976, 16/07/1977 a 30/11/1977, 01/12/1977 a
15/04/1978 e 16/05/1978 a 31/10/1978, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982,
03/05/1982 a 23/10/1982, 03/11/1982 a 31/03/1983, 18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a
31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985,
11/11/1985 a 15/05/1986, 27/05/1986 a 14/06/1986, e negar provimento à remessa necessária
e à apelação do INSS, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED LEI-5890 ANO-1973***** LOPS-60 LEI ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-9 ART-31LEG-FED DEC-53831 ANO-1964***** RBPS-79
REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-2172
ANO-1997LEG-FED DEC-9528 ANO-1997
Resumo Estruturado
APOSENTADORIA ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL, ATIVIDADE PENOSA, CANA-DE-
AÇUCAR.
Precedentes
PROC: APCIV 0026846-88.2012.4.03.9999/SP ÓRGÃO: SÉTIMA TURMA JUIZ:
DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO AUD: 13/02/2017
DATA: 24/02/2017
