
| D.E. Publicado em 06/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, dar parcial provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002175-87.2010.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por JOSÉ MARQUES TIAGO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial mediante o reconhecimento da atividade especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para reconhecer a natureza especial da atividade exercida no período de 24/10/1995 a 04/03/1997, resolvendo o mérito da demanda, deixando de condenar as partes ao pagamento da verba honorária, nos termos do artigo 21 do CPC/1973 e custas processuais ex lege.
Às fls. 271/275 o autor interpôs agravo retido em face da decisão de fls. 270 que indeferiu a produção de prova pericial.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Inconformado, o autor apelou da sentença, requerendo, de início, a apreciação do agravo retido nos autos e, no mérito, alega que exerceu atividades de natureza insalubre nos períodos indicados na exordial, totalizando mais de 25 (vinte e cinco) anos de atividade especial. Alega que juntou aos autos laudo técnico pericial realizado em condições idênticas, o que comprova a agressividade dos agentes a que esteve exposto, fazendo jus à concessão da aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição. Requer a reforma desta parte do decisum, ou, caso assim não entenda, pugna pelo retorno dos autos à origem para produção de prova pericial.
Também inconformado, o INSS ofertou apelação, alegando impossibilidade do reconhecimento da atividade especial, uma vez que não ficou comprovada nos autos a exposição do autor a agentes agressivos de modo habitual e permanente. Aduz ainda haver informação no PPP juntado aos autos sobre utilização de EPI eficaz, o que neutraliza a agressividade dos agentes, não permitindo reconhecer a atividade especial, requerendo a reforma do julgado e improcedência do pedido. Prequestionada a matéria para fins de eventual interposição de recurso junto à instância superior.
Com ambas as contrarrazões do autor, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
De início, conheço do agravo retido, pois nos termos do artigo 523, § 1º, do Código de Processo Civil/1973, a parte recorrente, nas razões recursais, requereu expressamente a apreciação da matéria anteriormente impugnada.
Contudo, nego-lhe provimento, pois cabe ao juiz determinar a realização das provas necessárias à instrução do feito e, tendo sido possível ao magistrado a quo formar seu convencimento através dos documentos juntados, não há que se falar em cerceamento de defesa.
Assim, passo à análise do mérito da demanda.
In casu, a parte autora requer a concessão da aposentadoria especial, prevista nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, alegando ter trabalhado por mais de 25 (vinte e cinco) anos em atividade especial.
Portanto, a controvérsia nos presentes autos se restringe ao reconhecimento da atividade especial nos períodos indicados pelo autor às fls. 12/16.
Atividade Especial:
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
Por sua vez, dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A).
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
Cumpre ressaltar que a parte autora teve seu pedido de produção de prova pericial indeferido durante a instrução processual, alegando a peculiaridade das empresas do ramo calçadista em Franca/SP e relatando dificuldades na obtenção de formulários, PPP e laudos técnicos para comprovar a especialidade das atividades desenvolvidas durante sua vida, juntou aos autos laudo técnico pericial realizado por solicitação do Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados em Franca/SP (fls. 104/154), no qual é relatada as condições de trabalho análogas aos funcionários das indústrias de calçados de Franca, colhido em visita e inspeção ambiental em estabelecimentos de porte e condições similares, com auxílio, inclusive, de especificações detalhadas dos produtos químicos utilizados por essas indústrias e rigorosos critérios de medição.
Desse modo, com base em laudo técnico elaborado em 20/04/2010 (fls. 104/154) por engenheiro de segurança do trabalho, devidamente identificado e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividade especial nos seguintes períodos: 01/04/1976 a 18/04/1977 (sapateiro), 02/05/1977 a 02/04/1979 (sapateiro), 18/05/1979 a 20/11/1979 (moldador), 01/02/1980 a 03/08/1981 (auxiliar acabamento), 02/11/1981 a 11/08/1982 (sapateiro), 01/10/1982 a 21/01/1983 (sapateiro), 22/02/1983 a 04/05/1987 (sapateiro), 18/05/1987 a 19/08/1990 (chefe - seção acabamento), 20/08/1990 a 19/03/1993 (chefe - seção acabamento), 06/04/1993 a 06/09/1993 (chefe - seção acabamento), 08/09/1993 a 30/09/1993 (supervisor - sol/acab/plancheamento), 11/04/1994 a 17/08/1995 (chefe acabamento), 24/10/1995 a 12/11/1997 (supervisor de área), 04/05/1998 a 30/10/1998 (supervisor de acabamento), 21/10/1998 a 25/10/2000 (encarregado amostra), 23/11/2000 a 01/10/2001 (supervisor produção), 01/10/2002 a 04/03/2003 (gerente de produção), 01/04/2003 a 04/05/2004 (desenvolvedor amostra), 06/09/2006 a 23/06/2008 (encarregado de seção) e 11/08/2008 a 21/10/2009 (encarregado seção), vez que ficou exposto de modo habitual e permanente a cola de tolueno e acetona, adesivos para calçados (cola de sapateiro) acima dos limites de tolerância legalmente previstos (acetona 561% até 627% e tolueno - toluol, 65 até 106% e 631% a 813% - fls. 118), enquadrado no código 1.2.11, anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.2.10, Anexo I do Decreto nº 83.080/79, código 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
Quanto ao período de 06/10/1993 a 31/03/1994, no qual o autor trabalhou em supervisão de montagem, observo que a função foi desenvolvida em empresa de "artefatos e acessórios de couro" (fls. 70), diversa do ramo de atividade avaliado na perícia técnica juntada às fls. 104/154 (indústria de calçados), devendo assim ser considerado como tempo de serviço comum.
Portanto, entendo ser o laudo técnico apresentado aos autos documento hábil a demonstrar potencial insalubridade decorrente do uso de produtos químicos que envolvem todo o processo de fabricação em indústria de calçados, uma vez que foi realizada in loco em empresas ainda ativas e por "similaridade" à atividade exercida pelo autor, devem os períodos ser computados como atividade especial, nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Nesse sentido decidiu o Colendo STJ, in verbis:
Desse modo, computando-se apenas os períodos de atividades especiais ora reconhecidos até a data do requerimento administrativo (18/06/2010 - fls. 90) perfaz-se 27 (vinte e sete) anos, 10 (dez) meses e 19 (dezenove) dias, conforme planilha anexa, suficientes para a concessão da aposentadoria especial, nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Portanto, cumpridos os requisitos legais, faz jus o autor à concessão da aposentadoria especial a partir de 21/10/2009 (fls. 183), momento em que o INSS ficou ciente da pretensão.
No tocante aos juros e à correção monetária, note-se que suas incidências são de trato sucessivo e, observados os termos dos artigos 322 e 493 do CPC/2015, devem ser considerados no julgamento do feito. Assim, corrigem-se as parcelas vencidas na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e ainda de acordo com a Súmula n° 148 do E. STJ e n° 08 desta Corte, observando-se o quanto decidido pelo C. STF quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Quanto aos juros moratórios, incidem de uma única vez e pelo mesmo percentual aplicado à caderneta de poupança (0,5%), consoante o preconizado na Lei nº 11.960/2009, artigo 5º. Adite-se que a fluência respectiva dar-se-á de forma decrescente, a partir da citação (12/11/2010 - fls. 105vº), termo inicial da mora autárquica (art. 219 do CPC), até a data da conta definitiva de liquidação.
A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (art. 85, § 2º e 3º, do NCPC), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar as custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996, art. 24-A da Lei nº 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/1993).
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei, uma vez que o autor percebe aposentadoria por tempo de contribuição, concedida pelo INSS em 21/08/2015 (NB 42/169.603.648-5) (art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
Ante o exposto, nego provimento ao agravo retido, dou parcial provimento à apelação do autor, para lhe conceder a aposentadoria especial e nego provimento à apelação do INSS, na forma da fundamentação.
É o voto.
TORU YAMAMOTO
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