Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2029463 / SP
0006719-49.2013.4.03.6102
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REMESSA
NECESSÁRIA TIDA POR INTERPOSTA. ATIVIDADE ESPECIAL PARCIALMENTE
COMPROVADA. RUÍDO. SOLDADOR. TECELÃO. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL.
AGENTES QUÍMICOS. PPP. TEMPO SUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. JUROS DE MORA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer períodos laborados sob condições especiais.
2 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula
490 do STJ.
3 - Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria especial.
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
7 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Os períodos a serem analisados em razão dos recursos voluntários e da remessa
necessária, tida por interposta, são: 09/10/1973 a 22/12/1973, 02/09/1974 a 11/11/1974,
01/02/1977 a 22/01/1979, 05/12/1979 a 04/07/1983, 09/01/1985 a 22/10/1986, 15/12/1986 a
28/09/1988, 29/09/1992 a 11/01/1993, 12/01/1993 a 05/05/1993, 01/03/1994 a 14/02/1995,
17/08/1995 a 15/03/1996, 21/10/1996 a 05/03/1997, 06/03/1997 a 01/09/1997, 02/09/1997 a
04/11/1997, 12/01/1998 a 02/06/1998, 01/03/1999 a 20/01/2000, 26/01/2000 a 12/11/2000,
23/06/2001 a 05/12/2001, 24/01/2001 a 21/05/2001, 16/01/2002 a 31/03/2002, 27/01/2003 a
10/04/2003, 05/09/2003 a 02/05/2007, 23/10/2007 a 20/01/2008 e de 24/01/2008 a 20/02/2013.
14 - Em relação aos períodos de 09/10/1973 a 22/12/1973 e de 02/09/1974 a 11/11/1974,
laborados, respectivamente, para "Empresa José Giorgi S/A - Com. Ind. Construções" e para
"Tecelagem D'Oeste Ltda.", a CTPS (fl. 147 e mídia de fl. 98) e o Registro de Empregados de fl.
40/41 informam que o autor exerceu a atividade de "aprendiz de tecelão" e de "tecelão".
15 - Ressalta-se que a ocupação do autor, como tecelão, no setor de tecelagem, é passível de
reconhecimento como tempo especial pelo mero enquadramento da categoria profissional, a
despeito da ausência de previsão expressa nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e
83.080/79. É o que sedimentou a jurisprudência, uma vez que o Parecer nº 85/78 do Ministério
da Segurança Social e do Trabalho teria conferido caráter de atividade especial a todos os
trabalhos efetuados em tecelagens, cabendo ressaltar que tal entendimento aplica-se até
28/04/1995, data de promulgação da Lei nº 9.032. A partir de então, tornou-se indispensável a
comprovação da efetiva submissão a agentes nocivos, para fins de reconhecimento da
especialidade do labor.
16 - Quanto aos períodos de 01/02/1977 a 22/01/1979, 05/12/1979 a 04/07/1983, 09/01/1985 a
22/10/1986, 29/09/1992 a 11/01/1993 e de 01/03/1994 a 14/02/1995, laborados,
respectivamente, para "Empresa José Giorgi S/A", "Badoni - Metalmecânica S/A", "Gantus -
Agroindustrial Ltda.", "Lima & Krokowez Ltda.-ME" e "Assissal Vendas e Mont. de Equip", a
CTPS de fls. 148/150 e 155/156 e mídia de fl. 98 informa que o autor exerceu a função de
soldador. Dessa forma, é possível o reconhecimento da especialidade do labor por
enquadramento profissional no item 2.5.3 do Decreto nº 53.831/64 e no item 2.5.3 do Decreto
nº 83.080/79.
17 - Quanto ao período de 15/12/1986 a 28/09/1988, laborado para "Badoni - ATB Indústria
Metalmecânica S/A", na função de "soldador", o PPP de fls. 50/51 informa que o autor esteve
submetido a ruído de 89 dB, superando-se o limite previsto pela legislação.
18 - Em relação ao período de 12/01/1993 a 05/05/1993, laborado para "W.L. Caldeiraria e
Montagem Ltda.-ME", na função de "soldador", conforme o PPP de fls. 54/55, o autor esteve
exposto a "fumos de solda - Silício, manganês e ferro". Dessa forma, é possível o
reconhecimento da especialidade do período, uma vez que tal agente químico é enquadrado no
código 1.2.9 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no código 1.2.7 do Anexo I do Decreto nº
83.080/79.
19 - Em relação aos períodos de 17/08/1995 a 15/03/1996, 21/10/1996 a 05/03/1997,
06/03/1997 a 01/09/1997, 26/01/2000 a 12/11/2000 e de 23/06/2001 a 05/12/2001, laborados
para "Juvenal João de Lima Lins", na função de "soldador", conforme o PPP de fls. 58/59, o
autor esteve exposto a ruído de 93,7 dB, ultrapassando o limite previsto pela legislação.
20 - Quanto ao período de 02/09/1997 a 04/11/1997, laborado para "JBS S.A.", na função de
"mecânico de manutenção", verifica-se no PPP de fls. 60/61, que o autor esteve exposto a
"hidrocarbonetos aromáticos", sem o uso de EPI eficaz, o que permite o reconhecimento da
especialidade, uma vez previsto o agente agressivo no item 1.2.11 do Anexo do Decreto nº
53.831/64 e no item 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79.
21 - Em relação ao período de 12/01/1998 a 02/06/1998, trabalhado para "Rita de Cassia
Rodrigues de Lima", na função de "soldador", o PPP de fls. 62/63 informa que o autor esteve
submetido a ruído de 93,7 dB, superando o limite previsto pela legislação.
22 - Quanto ao período de 01/03/1999 a 20/01/2000, laborado para "Irmãos Rebucci Ltda. Me",
na função de "soldador", o PPP de fls. 64/65 informa que o autor esteve submetido a ruído de
93,7 dB, superando o limite estabelecido pela legislação.
23 - Em relação aos períodos de 24/01/2001 a 21/05/2001, 16/01/2002 a 31/03/2002 e de
27/01/2003 a 10/04/2003, laborados para "Sermongil Montagens Industriais e Transportes
Ltda.", na função de "soldador", conforme o PPP de fls. 66/67, o autor esteve exposto a ruído
de 93,7 dB, ultrapassando o limite previsto pela legislação.
24 - Quanto ao período de 05/09/2003 a 02/05/2007, trabalhado para "Equipac S/A Açúcar e
Álcool", na função de "soldador industrial sênior", o PPP de fls. 69/71 informa que o autor
esteve exposto a ruído de 93,7 dB, superando o limite previsto pela legislação.
25 - Em relação ao período de 23/10/2007 a 20/01/2008, laborado para "Temporama Empregos
Efetivos e Temporários Ltda.", na função de "soldador", o PPP de fls. 72/73 informa que o autor
esteve submetido a ruído de 97,4 dB, superando o limite estabelecido pela legislação.
26 - Por fim, quanto ao período de 24/01/2008 a 20/02/2013, trabalhado para "Sermatec
Indústria e Montagens Ltda.", na função de "soldador", o PPP de fls. 74/75 informa que o autor
esteve exposto a ruído de 90,7 dB, ultrapassando o limite estabelecido pela legislação. Todavia,
a especialidade somente poderá ser reconhecida até 28/01/2013 (data do PPP).
27 - Assim, enquadrados como especiais os períodos de 09/10/1973 a 22/12/1973, 02/09/1974
a 11/11/1974, 01/02/1977 a 22/01/1979, 05/12/1979 a 04/07/1983, 09/01/1985 a 22/10/1986,
15/12/1986 a 28/09/1988, 29/09/1992 a 11/01/1993, 12/01/1993 a 05/05/1993, 01/03/1994 a
14/02/1995, 17/08/1995 a 15/03/1996, 21/10/1996 a 05/03/1997, 06/03/1997 a 01/09/1997,
02/09/1997 a 04/11/1997, 12/01/1998 a 02/06/1998, 01/03/1999 a 20/01/2000, 26/01/2000 a
12/11/2000, 23/06/2001 a 05/12/2001, 24/01/2001 a 21/05/2001, 16/01/2002 a 31/03/2002,
27/01/2003 a 10/04/2003, 05/09/2003 a 02/05/2007, 23/10/2007 a 20/01/2008 e de 24/01/2008
a 28/01/2013.
28 - Conforme a planilha anexa, considerando-se a atividade especial reconhecida nesta
demanda com aquela reconhecida administrativamente (Resumo de Documentos para Cálculo
de fls. 78/84), verifica-se que a parte autora contava com 25 anos, 08 meses e 08 dias de
atividade desempenhada em condições especiais, por ocasião da data do requerimento
administrativo (20/02/2013 - fl. 86), fazendo jus, portanto, à concessão da aposentadoria
especial vindicada.
29 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(20/02/2013 - fl. 86).
30 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
31 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
32 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
33 - Apelação da parte autora provida. Apelação do INSS e remessa necessária, tida por
interposta, parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
da parte autora e dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por
interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
