Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2016646 / SP
0035164-89.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REMESSA
NECESSÁRIA TIDA POR INTERPOSTA. INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE
DE AGIR. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL PARCIALMENTE COMPROVADA.
TEMPO INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA
EXECUÇÃO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - No caso, o INSS foi condenado a conceder o benefício de aposentadoria especial.
2 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula
490 do STJ.
3 - Verifica-se a aptidão da peça inaugural, a qual preenche os requisitos previstos no artigo
282 do CPC/73, encontrando-se devidamente instruída com os documentos indispensáveis à
propositura da ação (nos quais constam os períodos em que o trabalhador foi exposto a
insalubridade), não se vislumbrando defeitos ou irregularidades, capazes de dificultar o
julgamento do mérito. Com efeito, foi formulado pedido certo e determinado, aferindo-se da
leitura da inicial que a parte autora pretende o reconhecimento de tempo especial, concedendo-
lhe o benefício de aposentadoria especial.
4 - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido
nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio
requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art.
5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o
Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção
de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do
INSS em desfavor da pretensão do segurado e, por fim, se a autarquia ofereceu contestação.
5 - No caso em exame, malgrado trate-se de pedido concessivo de benefício, a demanda fora
ajuizada anteriormente ao julgamento citado, e o INSS ofereceu contestação opondo-se à
pretensão inicial, razão pela qual incide a hipótese contemplada na alínea "ii" do item 6 do
aresto em questão.
6 - Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria especial.
7 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
9 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
10 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
11 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
12 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
13 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
14 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
15 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
16 - Pretende a parte autora o reconhecimento da especialidade dos períodos laborados a partir
de 01/09/1973.
17 - Os PPPs de fls. 22/39 não podem ser admitidos como prova da especialidade do labor,
uma vez que não apresentam os responsáveis pelos registros ambientais.
18 - No entanto, a perícia judicial às fls. 72/83 é prova apta a atestar a especialidade do labor
da parte autora nos períodos de 01/09/1973 a 29/08/1974, 01/07/1976 a 05/10/1977,
01/05/1978 a 18/08/1980, 18/03/1981 a 30/06/1981, 01/07/1981 a 11/01/1991, 01/06/1992 a
24/11/1992, 01/12/1992 a 12/04/1994, 11/04/1994 a 03/04/1996, 02/09/1996 a 10/02/1997,
02/02/1998 a 05/06/1998, 10/11/2005 a 20/01/2007, 05/02/2007 a 21/12/2007 e de 13/05/2008
a 31/08/2008 (data do laudo).
19 - Todavia, não é possível reconhecer a especialidade dos períodos de 21/01/1991 a
02/05/1991, 01/07/1991 a 28/12/1991, 01/05/1992 a 02/06/1992, de 03/03/1997 a 31/05/1997,
21/05/1997 a 23/11/1997, 03/05/1999 a 01/11/1999, 08/03/2000 a 25/12/2000, 03/12/2001 a
02/09/2002, 23/06/2003 a 10/01/2004 e de 23/03/2004 a 01/06/2005, nos quais a parte autora
exerceu, respectivamente, as funções de "carregador", "trabalhador rural braçal", "auxiliar de
tratador", "aux. agrícola", "trabalhador na cultura de cana de açúcar", "trabalhador rural braçal",
"colhedor" e de "serviços gerais" (CTPS de fls. 14, 16 e 18/21), visto que estas atividades, por
si, não permitem o enquadramento profissional para fins de reconhecimento de especialidade,
uma vez não previstas no rol do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79, bem como
não há documento nos autos que comprove a exposição a agentes agressivos.
20 - Conforme planilha anexa, considerando-se a atividade especial reconhecida nesta
demanda, verifica-se que a parte autora contava com 20 anos, 09 meses e 28 dias de atividade
desempenhada em condições especiais, por ocasião da data do ajuizamento da ação
(25/09/2007 - fl. 02), não fazendo jus, portanto, à concessão da aposentadoria especial
vindicada.
21 - Sagrou-se vitoriosa a parte autora ao ver reconhecida parte do período especial vindicado.
Por outro lado, não foi concedido o benefício de aposentadoria especial, restando vencedora
nesse ponto a autarquia. Desta feita, os honorários advocatícios são compensados entre as
partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixa-se de condenar qualquer
delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da
justiça gratuita e o INSS delas isento.
22 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
23 - Apelação do INSS e remessa necessária, tida por interposta, parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
