Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1905707 / SP
0005049-33.2011.4.03.6138
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. SENTENÇA CITRA
PETITA. INTEGRAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. PROVA PERICIAL. PRECLUSÃO. MATÉRIA
PRELIMINAR. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. COMPROVAÇÃO PARCIAL. AGENTES
QUÍMICOS. EPI. ENQUADRAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. BENEFÍCIO INDEVIDO.
AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SENTENÇA INTEGRADA. PRELIMINAR
REJEITADA. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA EM PARTE, NO MÉRITO.
1 - A pretensão da parte autora resumir-se-ia aos reconhecimento de especialidade laboral
quanto aos intervalos de 15/05/1975 a 20/03/1980, 13/05/1982 a 12/10/1982, 23/04/1984 a
13/04/1989, 08/05/1989 a 17/04/1990, 23/04/1990 a 02/08/1991, 04/05/1992 a 18/05/1992 e
20/05/1992 até dias atuais, e concessão de "aposentadoria especial", desde 06/08/2010 - sendo
necessário esclarecer, aqui, que embora refira o autor a esta data como sendo a data da DER,
em realidade, a data do ingresso do requerimento do benefício corresponde a 07/07/2010 (sob
NB 154.166.058-4).
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante art. 492 do CPC/2015.
3 - Visível está dos autos que, ainda que a parte autora tenha pleiteado a análise de
insalubridade laboral no tocante aos interstícios de 15/05/1975 a 20/03/1980, 13/05/1982 a
12/10/1982, 23/04/1984 a 13/04/1989, 08/05/1989 a 17/04/1990, 23/04/1990 a 02/08/1991,
04/05/1992 a 18/05/1992 e 20/05/1992 até dias atuais (em prol do deferimento de "
aposentadoria especial"), infere-se da fundamentação da r. sentença que o d. Magistrado não
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
se debruçara sobre o exame dos lapsos de 13/05/1982 a 12/10/1982 e 04/05/1992 a
18/05/1992.
4 - Patente a condição da r. sentença como citra petita, eis que não examinara por completo o
pedido formulado, restando violado o princípio da congruência, insculpido no art. 460 do
CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
5 - É de ser integrada a sentença, procedendo-se à análise do pedido expressamente
formulado na inicial, porém não enfrentado pelo decisum.
6 - O d. Magistrado a quo indeferira a realização da prova pericial, porquanto, em seu entender,
a comprovação de tempo insalubre dar-se-ia por meio documental.
7 - Contra decisão proferida no curso do feito, na égide do CPC/73, o recurso cabível seria o de
agravo - na forma retida ou por instrumento - sendo que, na situação considerada, não houvera
impugnação do autor no tocante a tal indeferimento, operando-se, a toda evidência, a
preclusão. Logo, defeso trazer-se à tona debate sobre o tema, em sede de apelação.
8 - Rechaça-se a questão trazida em preliminar.
9 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
10 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
11 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, com
redação dada pela Lei nº 9.032/95.
12 - Até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a)
com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
13 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
14 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
15 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
16 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
17 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
18 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
19 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
20 - Observam-se dos autos documentos secundando a exordial e a íntegra do procedimento
administrativo de benefício, dentre os quais importam as cópias de CTPS do autor, donde se
extraem anotações acerca dos contratos empregatícios - a propósito, conferíveis do resultado
de pesquisa ao CNIS e da tabela confeccionada pelo INSS.
21 - Para além, documentação específica, cuja finalidade precípua seria comprovar a sujeição
do litigante a agentes nocivos durante a prática laboral, o que assim restou demostrado: * de
15/05/1975 a 20/03/1980, na condição de aprendiz de fundição (setor usina): conforme PPP,
comprovando a exposição a agente agressivo, dentre outros, ruído de 90 dB(A), na forma dos
itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; * de 23/04/1984 a
30/11/1984, 01/05/1985 a 30/11/1985, 01/05/1986 a 30/11/1986, 01/05/1987 a 30/11/1987 e
01/05/1988 a 30/11/1988, ora na condição de auxiliar laboratório, ora de analista laboratório jr.,
ora de analista laboratório II: conforme PPP, associado ao LTCAT, comprovando a exposição a
agentes químicos: ácido sulfúrico, ácido nítrico, hidróxido de sódio, hidróxido de potássio, sub-
acetato de chumbo, soda cáustica, ácido clorídrico, ácido acético, amônia e álcool, na forma
dos itens 1.2.9 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.11 do Decreto nº 83.080/79; quanto aos demais
intervalos (entre um e outro período), ora não se os reconhece como especiais, porque,
segundo apontado na documentação, corresponderiam a períodos de entressafra, em que o
autor se encontrava desempenhando tarefas de coordenação do serviço de manutenção na
destilaria; * de 01/11/1992 até 14/12/1998, ora na condição de encarregado de laboratório
industrial, ora de líder de laboratório industrial: conforme PPP, comprovando a exposição a
agente químico sub-acetato de chumbo, na forma dos itens 1.0.19 do Decreto nº 2.172/97 e
1.0.19 do Decreto nº 3.048/99. Quanto ao período subsequente, a partir de 15/12/1998 e até
30/04/2003 (data consignada no documento), não se admite o reconhecimento da
especialidade, isso porque se infere a sujeição do autor a agentes de natureza química sob uso
eficaz de EPI (com menção expressa na documentação, neste sentido).
22 - O art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da Lei nº 9.732/98,
publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação acerca da
existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de atenuar a
intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da atividade
desempenhada.
23 - Ainda sobre a periodização discutida, diga-se, em arremate: da sujeição a ruído, o nível
informado na documentação - de 66,14 dB(A) e 76,22 dB(A) - impede o estabelecimento da
insalubridade, porque aquém dos limites de tolerância vigentes à época.
24 - O enquadramento por categoria profissional pretendido pelo autor - referente aos intervalos
de 13/05/1982 a 12/10/1982 (analista), 08/05/1989 a 17/04/1990 (técnico de açúcar e álcool),
23/04/1990 a 02/08/1991 (técnico de açúcar e álcool) e 04/05/1992 a 18/05/1992 (analista de
laboratório) - não pode vingar: a uma, porque as tarefas descritas não encontram guarida nos
róis relativos à insalubridade laborativa; a duas, porque não foram trazidos aos autos
documentos reveladores da sujeição a quaisquer agentes agressivos.
25 - Computando-se todos os intervalos laborativos do autor, de índole unicamente especial,
constata-se que, até 06/08/2010, totalizava 13 anos, 10 meses e 28 dias de tempo de serviço
exclusivamente especial, número aquém do necessário à consecução da "aposentadoria
especial".
26 - O pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia
previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 15/05/1975 a
20/03/1980, 23/04/1984 a 30/11/1984, 01/05/1985 a 30/11/1985, 01/05/1986 a 30/11/1986,
01/05/1987 a 30/11/1987, 01/05/1988 a 30/11/1988 e 01/11/1992 até 14/12/1998.
27 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida ao autor e por ser o INSS delas isento.
28 - Sentença citra petita integrada.
29 - Preliminar rejeitada. Apelação do autor parcialmente provida, no mérito.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, integrar a r.
sentença, citra petita, aos limites do pedido, rejeitar a arguição preliminar e, em mérito, dar
parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer a especialidade laborativa quanto aos
intervalos de 15/05/1975 a 20/03/1980, 23/04/1984 a 30/11/1984, 01/05/1985 a 30/11/1985,
01/05/1986 a 30/11/1986, 01/05/1987 a 30/11/1987, 01/05/1988 a 30/11/1988 e 01/11/1992 até
14/12/1998, a serem assim averbados pelo INSS, por fim decretando a sucumbência recíproca
entre as partes, autora e ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
