Processo
PUILCiv - PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI CÍVEL / SP
0000316-29.2020.4.03.9300
Relator(a)
Juiz Federal MONIQUE MARCHIOLI LEITE
Órgão Julgador
Turma Regional de Uniformização
Data do Julgamento
02/03/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/03/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL DO EXERCÍCIO DE LABOR RURAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DOCUMENTAL DO LABOR RURAL ANO A ANO. POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DA
EFICÁCIA OBJETIVA DO DOCUMENTO PELA PROVA ORAL. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES DO STJ E DA TNU. QUESTÃO QUE NÃO IMPÕE REVOLVIMENTO DE
MATÉRIA FÁTICA. QUESTÃO DE ORDEM Nº 02 DA TRU3. RESTITUIÇÃO DOS AUTOS À
ORIGEM PARA ADEQUAÇÃO. AGRAVO PROVIDO. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO
REGIONAL DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL CONHECIDO E PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurma Regional de Uniformização da 3ª Região
Turma Regional de Uniformização
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI CÍVEL (457) Nº0000316-
29.2020.4.03.9300
RELATOR:17º Juiz Federal da TRU
AUTOR: MARIA JOAQUINA BONFIM
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Advogado do(a) AUTOR: RODRIGO ROSOLEN - SP200505-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMA REGIONAL DE
UNIFORMIZAÇÃO
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI CÍVEL (457) Nº0000316-
29.2020.4.03.9300
RELATOR:17º Juiz Federal da TRU
AUTOR: MARIA JOAQUINA BONFIM
Advogado do(a) AUTOR: RODRIGO ROSOLEN - SP200505-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo interposto em face de decisão que negou seguimento a incidente de
uniformização suscitado pela parte autora em face de acórdão proferido por Turma Recursal
dos Juizados Especiais Federais de São Paulo.
Por meio da referida decisão deixou-se de conhecer o PUR com base no enunciado da súmula
n. 42 da TNU, segundo a qual não se conhece de incidente de uniformização que implique
reexame de matéria de fato.
Não houve retratação do Juízo.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMA REGIONAL DE
UNIFORMIZAÇÃO
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI CÍVEL (457) Nº0000316-
29.2020.4.03.9300
RELATOR:17º Juiz Federal da TRU
AUTOR: MARIA JOAQUINA BONFIM
Advogado do(a) AUTOR: RODRIGO ROSOLEN - SP200505-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os requisitos de admissibilidade do agravo, conheço-o.
Saliento, de início, que o caso não é de aplicação da Súmula 42 da TNU. A questão a ser
apreciada – extensão da eficácia probatória da prova material tanto para o período anterior
quanto para o período posterior à data do documento apresentado, desde que corroborada por
robusta prova testemunhal – não demanda qualquer revolvimento de matéria fática.
Também deve ser superada a tese de que o acórdão não contrariou entendimento consolidado
do STJ pelo mero fato de mencioná-lo no decisum.
De fato, consoante se verá a seguir, o acórdão é contraditório ao mencionar a possibilidade de
extensão da eficácia probante do início de prova material para os períodos posterior e anterior à
data do documento, para depois deixar de aplicar tal entendimento sem fundamentação
razoável.
Ultrapassada a questão, passo ao exame da admissibilidade recursal.
Examino o pedido de uniformização regional interposto com base no art. 14, §1º, da Lei n.
10.259/2001, c.c. art. 40 e seguintes da Resolução CJF3R n. 3/2016 (RITR3R).
Noto que a parte recorrente aponta divergência entre o acórdão recorrido proferido pela 11ª
Turma Recursal de São Paulo e o acórdão paradigma proferido pela 8ª Turma Recursal de São
Paulo no processo n. 0001358-38.2016.4.03.6331.
Assinalo que: i) o recurso é tempestivo; ii) restou demonstrada a divergência sobre o direito
material referido entre Turmas Recursais distintas desta mesma Região; e iii) foram juntadas
cópias dos acórdãos paradigmas (art. 40, caput e §1º, da Resolução CJF3R n. 3/2016), os
quais guardam similitude fática e jurídica com o acórdão recorrido.
O pedido de uniformização regional deve, portanto, ser conhecido.
Passo a analisar a questão suscitada.
A suscitante discute, em síntese, a possibilidade de extensão da eficácia probatória da prova
material tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento
apresentado, desde que corroborada por robusta prova testemunhal.
O Acórdão recorrido decidiu a matéria nos seguintes termos:
(...) “10. Para fins de contagem de efetivo tempo de serviço rural, a mera origem rural da família
da autora não é suficiente. Logo, não basta a condição de proprietário rural de seu pai, sendo
necessária comprovação de atividade rural efetiva pela autora.
11. A jurisprudência admite que os documentos referentes ao esposo lavrador aproveitem à
esposa, uma vez que se presume que esta acompanha aquele no labor rural. Súmula 6, TNU:
"A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador
rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.(DJ Data
25.09.2003, pg. 00493)”. Posto isso, a certidão de casamento trazida aos autos pela autora, em
que consta a profissão de lavrador de seu esposo, corroborada pela prova oral produzida,
comprova o labor rural no ano de 1971.
12. No mais, ainda que se considere o entendimento firmado pelo STJ, quanto à possibilidade
de reconhecimento do tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo e, pois,
posterior ao mais recente, desde que amparado em convincente prova testemunhal, entendo
que, no caso em tela, não há elementos probatórios aptos a permitir o reconhecimento de todo
o período rural pretendido pela parte autora. A legislação em vigor não permite a comprovação
de atividade sem início de prova material (artigo 55, parágrafo 3º da Lei nº 8.213/91). SUMULA
149, STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola,
para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
13. Assim, excluído o período rural de 05.07.1965 a 31.12.1970 e de 01.01.1972 a 30.08.1973,
a parte autora não possui carência/tempo suficiente à aposentadoria pretendida. (...)
O acórdão paradigma colacionado pela suscitante, porém, trata o assunto de forma diversa:
“ (...) Para que fique caracterizado o início de prova material, não é necessário que os
documentos apresentados comprovem cada ano que o segurado tenha laborado no campo,
isso porque, quando corroborados pela prova testemunhal, se deve presumir a continuidade do
trabalho, haja vista que é inerente à informalidade do trabalho rural a escassez documental.
A TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais
tem permitido a extensão da eficácia temporal do início de prova material em face da prova
testemunhal. Nesse sentido, transcrevo o PEDILEF 50023189420124047211:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO – PREVIDENCIÁRIO – AVERBAÇÃO DE PERÍODO DE
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR – ALEGAÇÃO DE QUE A TURMA
RECURSAL DE ORIGEM RECONHECEU PERÍODO DE ATIVIDADE CAMPESINA À REVELIA
DE UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEO – INOCORRÊNCIA – ARESTO
RECORRIDO QUE NÃO DESTOA DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DA TNU – DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO – INCIDÊNCIA DO ART. 15, I, DO RI/TNU, E DO
ART. 14, DA LEI 10.259/01 – PEDILEF NÃO CONHECIDO.
VOTO Trata-se de incidente de uniformização nacional de jurisprudência suscitado pelo INSS,
pretendendo a reforma de decisão proferida por Turma Recursal da Seção Judiciária de Santa
Catarina. Resumidamente, o requerente aduz que a Turma Recursal de origem, para o período
de 09/06/1977 e 30/10/1988, considerou que a parte autora ostentava a condição de segurado
especial, a despeito de inexistir início de prova material contemporâneo à época dos fatos a
provar. Afirma que aquele Colegiado reconheceu período de atividade campesina com base em
prova exclusivamente testemunhal. Sustenta que esse entendimento está em rota de colisão
com a jurisprudência do E. STJ e desta Turma de Uniformização. Dessa forma, o Instituto reúne
diversos precedentes da Corte Cidadã no sentido de que, para o reconhecimento do tempo de
serviço do trabalhador rural, é preciso que haja início de prova material contemporâneo aos
fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova
testemunhal, o qual amplie sua eficácia probatória. Enfim, o INSS postula que o presente
Pedido de Uniformização seja conhecido e provido, a fim de que seja reformado o acórdão
recorrido, julgando-se improcedente o pedido de averbação de tempo rural no período de
09/06/1977 a 30/10/1988. Relatei. Passo a proferir o VOTO. No presente caso trazido à
colocação e conforme se depreende da fundamentação da sentença, pretendia o autor o
reconhecimento do tempo de atividade rural, na condição de segurado especial, entre
01.01.1966 a 30.10.1988. Para tanto, valeu–se de provas testemunhais e dos seguintes
documentos como início de prova material: – Matrícula Imobiliária nº. 29.906, expedida pelo
Oficial do Registro de Imóveis da Comarca de Campos Novos/SC, comprovando a aquisição de
imóvel rural pelo pai do Autor, em 1950, em decorrência de herança recebida de seus avós; –
Certificado de Dispensa de Incorporação, expedido em 18/08/1971, oportunidade em que
declarou ser LAVRADOR; – Certidão de Casamento do Autor, datada de 08.06.1977,
oportunidade em que este declarou ser LAVRADOR. O MM juiz sentenciante reconheceu o
trabalho rural em regime de economia familiar, mas apenas até 08/06/1977, porque o último
documento prestável como início de prova material (certidão de casamento) foi produzido
naquela data. A Turma Recursal de Santa Catarina, reformando parcialmente a sentença,
estendeu o reconhecimento até a data final requerida, i.e., até 30.10.1988, porque já é da
jurisprudência pacífica que não se exige um documento para cada ano de atividade rural a ser
provado, além do que, no caso, inexiste nenhuma razão para quebrar a presunção de
continuidade do labor rural (não há mudança de endereço, não há vínculo urbano que o
interrompa. Além disso, as testemunhas foram enfáticas no sentido de que a recorrente
trabalhou na agricultura até por volta de 1988). Com base nessas informações, entendo que,
além de o Colegiado de Santa Catarina agir com total acerto, pois certamente a prova
testemunhal possibilita a extensão da eficácia temporal do início de prova material; na vertente,
podemos concluir que a Turma Recursal catarinense nem de longe reconheceu período de
trabalho rurícola à revelia de um início de prova documental contemporâneo, mas tão só
concedeu–lhe a extensão de sua eficácia com suporte nos testemunhos colhidos em audiência,
o que está em consonância com a jurisprudência do STJ e desta Casa. Ainda que assim não se
entendesse – o que admito por mera concessão à dialética – entendo que a pretensão neste
Incidente demandaria, necessariamente, adentrar na esfera do reexame de prova, notadamente
através da reanálise do acervo documental para averiguar a existência ou inexistência de início
razoável de prova material contemporâneo aos fatos que se pretende provar, o que é
juridicamente inadmissível, conforme pacífico entendimento materializado na Súmula 42/TNU.
Ante o exposto, entendo por não demonstrado o dissídio jurisprudencial, conseqüentemente,
VOTO por NÃO CONHECER DO PEDILEF, com fulcro no Art. 15, I, do RI/TNU, e art. 14, da Lei
10.259/01. Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Pela leitura e análise da sentença recorrida, verifico que a questão discutida nos autos foi
decidida em conformidade com as provas produzidas e, ainda, segundo critérios previstos em
Lei, na Constituição Federal e na jurisprudência pacificada no âmbito de nossos Tribunais. (...)
Assiste razão à suscitante.
Como bem mencionado no acórdão paradigma, a jurisprudência já se pacificou no sentido de
permitir a extensão da eficácia objetiva do início de prova material tanto para o período anterior
quanto para o período posterior à data do documento apresentado.
Aliás, o próprio acórdão recorrido faz menção ao entendimento jurisprudencial já consolidado,
porém estranhamente conclui em sentido diametralmente oposto, ao recusar objetivamente a
extensão da eficácia probatória da certidão de casamento da autora para os anos anteriores e
posteriores à data do documento, reconhecendo como período de exercício de atividade rural
apenas o ano de 1971 (ano em que celebrado o casamento).
Note-se, ainda, que o acórdão fundamenta a exclusão do período rural de 05.07.1965 a
31.12.1970 e de 01.01.1972 a 30.08.1973 na impossibilidade de reconhecimento da atividade
rural com base em prova exclusivamente testemunhal, o que reforça a posição daquele
colegiado no sentido da impossibilidade de extensão da prova material para períodos anteriores
e posteriores, ao menos no caso telado.
Desse modo, o incidente deve ser provido para que efetivamente seja considerada na análise
das provas pela instância de origem a premissa de que a certidão de casamento datada do ano
de 1971, considerada início de prova material do exercício de atividade rural, pode ter ampliada
a sua eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do
documento apresentado.
Neste mesmo sentido já se manifestou esta Turma Regional de Uniformização, quando do
julgamento do PUR 0001059-10.2018.403.9300, de relatoria do eminente Juiz Federal João
Carlos Cabrelon de Oliveira, julgado em 19/02/2020, acórdão publicado em 10/03/2020. Na
oportunidade se fixou a seguinte tese:
O início de prova material contemporâneo possui eficácia probatória tanto para o período
anterior quanto para o posterior à sua data, desde que corroborado por prova testemunhal
robusta, convincente e harmônica.
Por fim, registro que avançar na análise do caso implicaria violação ao disposto na Súmula 42
da TNU, por demandar análise da prova testemunhal quanto os períodos de 05.07.1965 a
31.12.1970 e de 01.01.1972 a 30.08.1973, o que deverá ser feito na origem. Ademais, o INSS
apresentou outros argumentos em seu recurso inominado cuja análise restou prejudicada pelo
acolhimento da tese ora rechaçada, os quais também deverão ser enfrentados pela 11ª Turma
Recursal de São Paulo.
Desse modo, por estar o acórdão recorrido em desacordo com o entendimento dominante da
Turma Regional de Uniformização, o caso é de aplicação da Questão de Ordem nº 2 deste
colegiado, para determinar o retorno dos autos à Turma de Origem para adequação do acórdão
à seguinte tese da TRU3: "O início de prova material contemporâneo possui eficácia probatória
tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data, desde que corroborado por
prova testemunhal robusta, convincente e harmônica" (Assunto 55/2020, PUR 0001059-
10.2018.403.9300, rel. Juiz Federal João Carlos Cabrelon de Oliveira, sessão de 19/02/2020).
Por todo o exposto, voto pelo conhecimento e provimento do agravo e, por consequência, pela
admissão do pedido de uniformização regional, ao qual dou provimento, com determinação de
restituição dos autos à Turma Recursal de origem para adequação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL DO EXERCÍCIO DE LABOR RURAL. NECESSIDADE DE
COMPROVAÇÃO DOCUMENTAL DO LABOR RURAL ANO A ANO. POSSIBILIDADE DE
EXTENSÃO DA EFICÁCIA OBJETIVA DO DOCUMENTO PELA PROVA ORAL.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DA TNU. QUESTÃO QUE NÃO IMPÕE
REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICA. QUESTÃO DE ORDEM Nº 02 DA TRU3.
RESTITUIÇÃO DOS AUTOS À ORIGEM PARA ADEQUAÇÃO. AGRAVO PROVIDO. PEDIDO
DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL CONHECIDO E
PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma Regional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais da Terceira Região, por maioria, decidiu
conhecer e dar provimento ao agravo para receber o pedido de uniformização regional
interposto, ao qual também se deu provimento, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
