Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5764546-25.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 27/10/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC.
ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA
MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO
EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO.
INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA AO INGRESSO NO RGPS.
INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA LEI Nº 8.213/91.
VEDAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDOS. APELAÇÃO
DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE
VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS
VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA
JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com
fundamento em exame realizado em 23 de abril de 2018, quando a demandante - de profissão
habitual “empregada doméstica” - possuía 58 (cinquenta oito) anos de idade, consignou o
seguinte: “A periciada apresenta sintomas de dor devido à patologia: transtorno dos discos
lombares. Devido a tal enfermidade, deve evitar atividades que exijam grande esforço físico e se
reservar àquelas de menor esforço. Sua capacidade para o trabalho está diminuída em relação a
outra pessoa com a mesma função e idade”. Por fim, questionado acerca da data de início da
incapacidade laborativa da autora, respondeu que, “segundo informa a periciada, suas dores se
tornaram incapacitantes há cerca de 3 (três) anos”.
9 - Todavia, em sede de esclarecimentos complementares, retificou a sua posição quanto à DII,
senão vejamos: “Levando-se em consideração a idade da periciada, suas queixas, histórico
relatado, exame físico, exames complementares apresentados (em 5 de abril de 2014, a
ressonância n. magnética de coluna cervical já apresentava alterações degenerativas) e
anexados ao laudo apresentados à época da perícia (23/04/2018), é possível concluir que a data
de início da incapacidade ocorreu a partir dos últimos quatro anos”.
10 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou
quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão,
salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser
o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a
exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
11 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico
da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises
que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica
merece confiança e credibilidade.
12 - Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujos extratos
seguem anexos aos autos, dão conta que a requerente verteu seus primeiros recolhimentos para
o RGPS, na condição de segurada empregada, em janeiro de 2015, mantendo as contribuições
até março de 2017.
13 - Portanto, fixada a DII no início do ano de 2014, se mostra inequívoco que a incapacidade da
autora é preexistente ao seu ingresso no RGPS, o que inviabiliza a concessão, seja de auxílio-
doença, seja de aposentadoria por invalidez, conforme vedações constantes dos artigos 42, §2º e
59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91.
14 - Ainda que se desconsidere a conclusão pericial, na medida em que o experto disse que o
impedimento teria surgido “a partir dos últimos quatro anos”, é de se supor, com razoável grau de
certeza, que ainda assim este precedeu o ingresso da requerente no Sistema Previdenciário ou
ao menos até ela completar a carência legal (01/2016).
15 - O seu primeiro recolhimento se deu em janeiro de 2015, quando já possuía mais de 55
(cinquenta e cinco) anos. É certo que tal filiação se deu como segurada empregada, o que, a
princípio, afastaria a hipótese de preexistência do seu impedimento. Contudo, a empresa para a
qual supostamente começou a trabalhar - CHIQUINHO COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES
ESTRELA D’OESTE LTDA. - tem como uma das suas sócias sua filha, KELI SINEIA GOMES
LISBOA.
16 - Aliás, se figura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que a incapacidade da demandante tenha
se iniciado apenas após sua filiação ao RGPS ou mesmo após o implemento da carência,
também porque é portadora de mal degenerativo ortopédico típico em pessoas com idade
avançada, que se caracteriza justamente pelo seu desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
Repisa-se, outrossim, que ressonância magnética de sua coluna cervical, de abril de 2014, já
havia identificado alterações degenerativas.
17 - Em suma, tem-se que, de fato, decidiu a parte autora se refiliar ao RGPS com o objetivo de
buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, sendo mesmo medida de
rigor a decretação da improcedência do feito.
18 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
19 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
20 - Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de valores.
Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de
pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5764546-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NAIDE DE FATIMA VERGILIO
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5764546-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NAIDE DE FATIMA VERGILIO
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em
ação ajuizada por NAIDE DE FÁTIMA VERGÍLIO, objetivando a concessão de aposentadoria
por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da apresentação de requerimento
administrativo, que se deu em 16.08.2017. Fixou correção monetária conforme o INPC e juros
de mora nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09.
Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez
por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por
fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada
(ID 71294419).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a
incapacidade da demandante é preexistente a seu ingresso no RGPS, não fazendo jus nem à
aposentadoria por invalidez, nem ao auxílio-doença. Subsidiariamente, requer a alteração dos
critérios de aplicação da correção monetária (ID 71294425).
A parte autora apresentou contrarrazões (ID 71294535).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5764546-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NAIDE DE FATIMA VERGILIO
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com fundamento
em exame realizado em 23 de abril de 2018 (ID 71294216), quando a demandante - de
profissão habitual “empregada doméstica” - possuía 58 (cinquenta oito) anos de idade,
consignou o seguinte:
“A periciada apresenta sintomas de dor devido à patologia: transtorno dos discos lombares.
Devido a tal enfermidade, deve evitar atividades que exijam grande esforço físico e se reservar
àquelas de menor esforço. Sua capacidade para o trabalho está diminuída em relação a outra
pessoa com a mesma função e idade”.
Por fim, questionado acerca da data de início da incapacidade laborativa da autora, respondeu
que, “segundo informa a periciada, suas dores se tornaram incapacitantes há cerca de 3 (três)
anos”.
Todavia, em sede de esclarecimentos complementares (ID 71294410), retificou a sua posição
quanto à DII, senão vejamos:
“Levando-se em consideração a idade da periciada, suas queixas, histórico relatado, exame
físico, exames complementares apresentados (em 5 de abril de 2014, a ressonância n.
magnética de coluna cervical já apresentava alterações degenerativas) e anexados ao laudo
apresentados à época da perícia (23/04/2018), é possível concluir que a data de início da
incapacidade ocorreu a partir dos últimos quatro anos”.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre
convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou
científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000,
Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo
Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujos extratos
seguem anexos aos autos (ID 71294365, p. 03), dão conta que a requerente verteu seus
primeiros recolhimentos para o RGPS, na condição de segurada empregada, em janeiro de
2015, mantendo as contribuições até março de 2017.
Portanto, fixada a DII no início do ano de 2014, se mostra inequívoco que a incapacidade da
autora é preexistente ao seu ingresso no RGPS, o que inviabiliza a concessão, seja de auxílio-
doença, seja de aposentadoria por invalidez, conforme vedações constantes dos artigos 42, §2º
e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91.
Ainda que se desconsidere a conclusão pericial, na medida em que o experto disse que o
impedimento teria surgido “a partir dos últimos quatro anos”, é de se supor, com razoável grau
de certeza, que ainda assim este precedeu o ingresso da requerente no Sistema Previdenciário
ou ao menos até ela completar a carência legal (01/2016).
Com efeito, o seu primeiro recolhimento se deu em janeiro de 2015, quando já possuía mais de
55 (cinquenta e cinco) anos. É certo que tal filiação se deu como segurada empregada, o que, a
princípio, afastaria a hipótese de preexistência do seu impedimento. Contudo, a empresa para a
qual supostamente começou a trabalhar - CHIQUINHO COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES
ESTRELA D’OESTE LTDA. - tem como uma das suas sócias sua filha, KELI SINEIA GOMES
LISBOA (ID’s 71294385, 71294388 e 71294390).
Aliás, se me figura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que a incapacidade da demandante tenha
se iniciado apenas após sua filiação ao RGPS ou mesmo após o implemento da carência,
também porque é portadora de mal degenerativo ortopédico típico em pessoas com idade
avançada, que se caracteriza justamente pelo seu desenvolvimento paulatino ao longo dos
anos. Repisa-se, outrossim, que ressonância magnética de sua coluna cervical, de abril de
2014, já havia identificado alterações degenerativas.
Em suma, tem-se que, de fato, decidiu a parte autora se refiliar ao RGPS com o objetivo de
buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, sendo mesmo medida
de rigor a decretação da improcedência do feito.
Observo, por fim, que a sentença concedeu a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória
deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado,
conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema
cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo
(STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia
constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o
derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo
ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo
juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença e julgar
improcedente o pedido deduzido na inicial, com a revogação da tutela anteriormente concedida.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento
das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no
pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo
85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente
atualizado (art. 85, §2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º
do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Oficie-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC.
ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA
MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO
EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO.
INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA AO INGRESSO NO RGPS.
INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA LEI Nº 8.213/91.
VEDAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDOS.
APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA.
DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO.
GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com
fundamento em exame realizado em 23 de abril de 2018, quando a demandante - de profissão
habitual “empregada doméstica” - possuía 58 (cinquenta oito) anos de idade, consignou o
seguinte: “A periciada apresenta sintomas de dor devido à patologia: transtorno dos discos
lombares. Devido a tal enfermidade, deve evitar atividades que exijam grande esforço físico e
se reservar àquelas de menor esforço. Sua capacidade para o trabalho está diminuída em
relação a outra pessoa com a mesma função e idade”. Por fim, questionado acerca da data de
início da incapacidade laborativa da autora, respondeu que, “segundo informa a periciada, suas
dores se tornaram incapacitantes há cerca de 3 (três) anos”.
9 - Todavia, em sede de esclarecimentos complementares, retificou a sua posição quanto à DII,
senão vejamos: “Levando-se em consideração a idade da periciada, suas queixas, histórico
relatado, exame físico, exames complementares apresentados (em 5 de abril de 2014, a
ressonância n. magnética de coluna cervical já apresentava alterações degenerativas) e
anexados ao laudo apresentados à época da perícia (23/04/2018), é possível concluir que a
data de início da incapacidade ocorreu a partir dos últimos quatro anos”.
10 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames
ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal
aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso
concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto
probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis
Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima,
DJE. 12/11/2010.
11 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente,
o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
12 - Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujos extratos
seguem anexos aos autos, dão conta que a requerente verteu seus primeiros recolhimentos
para o RGPS, na condição de segurada empregada, em janeiro de 2015, mantendo as
contribuições até março de 2017.
13 - Portanto, fixada a DII no início do ano de 2014, se mostra inequívoco que a incapacidade
da autora é preexistente ao seu ingresso no RGPS, o que inviabiliza a concessão, seja de
auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez, conforme vedações constantes dos artigos
42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91.
14 - Ainda que se desconsidere a conclusão pericial, na medida em que o experto disse que o
impedimento teria surgido “a partir dos últimos quatro anos”, é de se supor, com razoável grau
de certeza, que ainda assim este precedeu o ingresso da requerente no Sistema Previdenciário
ou ao menos até ela completar a carência legal (01/2016).
15 - O seu primeiro recolhimento se deu em janeiro de 2015, quando já possuía mais de 55
(cinquenta e cinco) anos. É certo que tal filiação se deu como segurada empregada, o que, a
princípio, afastaria a hipótese de preexistência do seu impedimento. Contudo, a empresa para a
qual supostamente começou a trabalhar - CHIQUINHO COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES
ESTRELA D’OESTE LTDA. - tem como uma das suas sócias sua filha, KELI SINEIA GOMES
LISBOA.
16 - Aliás, se figura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que a incapacidade da demandante tenha
se iniciado apenas após sua filiação ao RGPS ou mesmo após o implemento da carência,
também porque é portadora de mal degenerativo ortopédico típico em pessoas com idade
avançada, que se caracteriza justamente pelo seu desenvolvimento paulatino ao longo dos
anos. Repisa-se, outrossim, que ressonância magnética de sua coluna cervical, de abril de
2014, já havia identificado alterações degenerativas.
17 - Em suma, tem-se que, de fato, decidiu a parte autora se refiliar ao RGPS com o objetivo de
buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, sendo mesmo medida
de rigor a decretação da improcedência do feito.
18 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
19 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
20 - Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de
valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência.
Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença e julgar
improcedente o pedido deduzido na inicial, com a revogação da tutela anteriormente concedida,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
