APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006791-06.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO COIMBRA - SP171287-N
APELADO: ELIANA GUARNIERI VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006791-06.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO COIMBRA - SP171287-N
APELADO: ELIANA GUARNIERI VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por ELIANA GUARNIERI VIEIRA, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde 19.09.2014. Fixou correção monetária nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Condenou ambas as partes no pagamento dos honorários dos respectivos patronos, ante a sucumbência recíproca. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 103266320, p. 134-139).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a incapacidade da demandante é preexistente a seu ingresso no RGPS, não fazendo jus nem à aposentadoria por invalidez, nem ao auxílio-doença. Em sede subsidiária, requer a alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora, bem como seja observado o disposto na Súmula 111 do STJ quanto aos honorários advocatícios (ID 103266320, p. 147-154).
A parte autora apresentou contrarrazões (ID 103266320, p. 157-165).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006791-06.2013.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO COIMBRA - SP171287-N
APELADO: ELIANA GUARNIERI VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, com fundamento em exame realizado em 17 de setembro de 2013 (ID 103266320, p. 46-49), quando a demandante possuía 47 (quarenta e sete) anos, consignou:“
A autora apresenta incapacidade parcial. Não há incapacidade para a atividade habitual de auxiliar em restaurante, mas redução da capacidade para esta atividade. A autora exerce a atividade habitual há 10 anos e iniciou esta atividade após o início da doença. A epilepsia é prévia ao início da vida laboral
”.Diante de novos documentos médicos apresentados pela requerente aos autos, foi determinada a realização de outro exame por profissional médico distinto, já que o anterior havia se descredenciado perante à Justiça.
A nova
expert
, com base em exame realizado em 29.06.2015 (ID 103266320, p. 104-117), quando a demandante já contava com 49 (quarenta e nove) anos, destacou:“
A Autora realizou cirurgia neurológica para controle de Epilepsia refratária, com data de 10/02/2015, e atualmente seu pós-operatório evoluiu sem crises convulsivas e com uso de medicamentos anticonvulsivantes. Trata-se de incapacidade por doença ou lesão de evolução prolongada e incerta, devendo ser reexaminado após um prazo de 2 anos. Portanto, caracteriza incapacidade total e temporária
”Fixou, por fim, a data do início do impedimento na data da cirurgia, isto é, em fevereiro de 2015.
Assevero que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
A despeito de a última perita ter fixado a DII em tal data, tenho que o impedimento da autora já estava presente em período anterior a seu ingresso no RGPS.
Informações extraídas da Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujo extrato encontra-se acostado aos autos (ID 103266320, p. 56), dão conta que a demandante promoveu recolhimentos para o RGPS, na condição de contribuinte individual, de 09/2004 e 08/2013.
Se me afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 335 do CPC/1973, reproduzido no art. 375 do CPC/2015), que a autora tenha se tornado incapaz somente após a realização de cirurgia neurológica em fevereiro de 2015, a qual justamente conseguiu cessar com suas crises convulsivas.
Segundo seu próprio relato, desde os 14 (quatorze) anos de idade vem sofrendo convulsões em virtude de “epilepsia”. Referiu à ultima experta que após a eclosão da patologia com essa idade, se recuperou, porém, ao se casar aos 20 (vinte) anos, as crises epilépticas recrudesceram, ocorrendo a cada 2(dois)/3(dias) dias.
Tais assertivas são corroborados pelo sumário clínico da demandante, junto ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, datado de 20.08.2014 (ID 103266320, p. 90-92). Nele consta:
“No dia de sua menarca, aos 14 anos, apresentou crise convulsiva, que a mãe relatou como evento de perda de consciência seguida de queda ao solo com tremores, dos quatro membros, de duração aproximada de 1 min, seguida de curto período de confusão mental. Já nesse período foi introduzido PB, não apresentando outra crise até 20 anos. Utilizou apenas dois anos o PB. Com 20 anos, começou a apresentar eventos recorrentes a cada 2-3 dias, precedidos por rápida dormência ascendente ora no membro superior esquerdo ora no membro superior direito, ora em ambos simultaneamente, seguido de sensação de secura em boca, parada comportamental com olhos abertos, com perda de consciência, olhar vago, movimentos oromastigatórios e leve versão cefálica para direita, associados a automatismos da mão direita e postura de fechara mão esquerda. Após 10-15seg apresenta queda ao solo, adota postura em adução e flexão de MSE e abdução/extensão de MSD, com duração total de 1-3min, com período de confusão mental e fala desconexa após. Retornou uso de PB, foi associado CBZ, com controle parcial das crises. Continuou a apresentar crises, cada vez mais frequentes, até chegar a uma crise por dia, com raras generalizações, sendo necessária associação de outras drogas. Veio encaminhada ao grupo de Epilepsia do HC-FMUSP há 10 anos. Há 4 anos iniciou associação de LTG, CLB, PB e CBZ, reduzindo a frequência para 1-3 eventos convulsivos por mês. Nos últimos oito meses, notou nova piora na frequência (2-3 vezes por semana), duração e intensidade das crises, com generalizações frequentes. Internada no vídeo-EEG para investigação diagnostica e ajuste de medicações (...)”.
Pois bem, nota-se que o período de parcial melhora da autora durou de 2010 e 2014, porém, ainda durante este possuía de uma a 3 (três) convulsões mensais, o que indica a continuidade do quadro incapacitante inclusive neste interregno. Ou seja, desde os 20 (vinte) anos até fevereiro de 2015 a demandante estava impedida de laborar, não por outra razão disse à experta que “
nunca trabalhou e apenas cuida de sua casa em tarefas diárias
”.Em síntese, tem-se que decidiu a parte autora se filiar ao RGPS com o objetivo de buscar, indevida e oportunisticamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme vedações constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91, o que inviabiliza a concessão, seja de auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez.
Observo, por fim, que a sentença concedeu a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto,
dou provimento
à apelação do INSS para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a revogação da tutela anteriormente concedida.Inverto o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por cinco anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Oficie-se ao INSS.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial, concluiu que a parte autora está incapacitada de forma total e permanente para o exercício da atividade laboral, como se vê do laudo oficial.
E, nesse ponto, não há qualquer controvérsia, restringindo-se o inconformismo do INSS, em suas razões de apelo, às alegações de:
- que a incapacidade é anterior ao ingresso no regime;
- que os juros de mora e a correção monetária devem observar o disposto na Lei nº 11960/2009;
- que os honorários advocatícios devem ser fixados sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença.
Não há que se falar, no caso, de preexistência da incapacidade ao ingresso no regime em setembro de 2004.
Ao contrário, o perito judicial, ao concluir que a parte autora é portadora de Epilepsia refratária e está incapacitada de form total e temporária para o trabalho, afirmou expressamente, em seu laudo, que, não obstante ela já estivesse doente desde os 14 anos de idade, a sua incapacidade laborativa só teve início em 10/02/2015, ou seja, após a nova filiação, como se vê do laudo constante de fls. 95/108:
"A Autora realizou cirurgia neurológica para controle de Epilepsia refrataria data 10/02/2015, atualmente seu pos operatório evoluiu sem crises convulsivas e com uso de medicamentos anticonvulsivantes. Trata-se de incapacidade por doença ou lesão de evolução prolongada e incerta, devendo ser reexaminado após um prazo de 2 anos. Portanto caracteriza incapacidade total e temporária." (fl. 99)
"Portadora de Epilepsia desde os quatorze anos de idade e, no ano de 2014, as crises convulsivas pioraram." (fl. 100)
Evidente, pois, que a incapacidade resultou de agravamento e progressão da doença, aplicando-se, ao caso, a exceção às regras contida no parágrafo 2º do artigo 42 e no parágrafo único do artigo 59, ambos da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. (...).
Parágrafo 2º. A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
Art. 59. (...).
Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
A esse respeito, confiram-se os seguintes julgados desta Egrégia Corte:
... não merece prosperar a tese de doença preexistente pois, no presente caso, a segurada enquadra-se na hipótese exceptiva de incapacidade sobrevinda pela progressão ou agravamento da doença ou lesão (art. 42 da Lei 8.213/91).
(AC nº 0024680-10.2017.4.03.9999/SP, 8ª Turma, Relator Desembargador David Dantas, DE 19/10/2017)
Não há que se falar em doença preexistente à refiliação do autor aos quadros da previdência, pois se observa do conjunto probatório que a incapacidade decorreu do agravamento de sua moléstia, hipótese excepcionada pelo § 2º, do art. 42 da Lei nº 8.213/91.
(AC nº 0034596-20.2007.4.03.9999, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo Saraiva, e-DJF3 Judicial 1 22/01/2014)
O afastamento do trabalho deu-se em razão da progressão ou do agravamento de sua doença, fato este que afasta a alegação de doença preexistente e autoriza a concessão do benefício, nos termos do parágrafo 2º, do art. 42, da Lei nº 8.213/91.
(AC nº 0011381-73.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, e-DJF3 Judicial 1 22/01/2014)
E, se discordava da conclusão do perito judicial, deveria o INSS impugnar o laudo e, através de seu assistente técnico, demonstrar o contrário, o que não ocorreu.
Ademais, estivesse a parte autora, antes do seu ingresso no regime, realmente incapacitada para o trabalho, como alega o INSS, este não teria negado o benefício requerido em 08/04/2013, embasando-se na ausência de incapacidade (vide fl. 35).
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.
Considerando que a sentença condenou cada parte a arcar com os honorários do respectivo patrono, não se conhece do recurso, por ausência de interesse de recorrer, na parte em que requer a aplicação da Súmula nº 111/STJ.
Ante o exposto, divergindo do voto do Ilustre Relator, NEGO PROVIMENTO ao apelo e DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração de juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos no voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença recorrida.
É COMO VOTO.
/gabivi/asato
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. RECOLHIMENTOS COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RELATO DA PRÓPRIA DEMANDANTE QUE O MAL HAVIA SE INICIADO QUANDO POSSUÍA 14 ANOS E A INCAPACIDADE AOS 20. PRIMEIRO RECOLHIMENTO AOS 38 ANOS. EPILEPSIA. CRISES CONVULSIVAS. CESSAÇÃO AOS 48 ANOS, COM CIRURGIA NEUROLÓGICA. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE ATESTAM O INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA À FILIAÇÃO NO RGPS. INGRESSO OPORTUNISTA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA LEI Nº 8.213/91. VEDAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDOS. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, com fundamento em exame realizado em 17 de setembro de 2013 (ID 103266320, p. 46-49), quando a demandante possuía 47 (quarenta e sete) anos, consignou: “A autora apresenta incapacidade parcial. Não há incapacidade para a atividade habitual de auxiliar em restaurante, mas redução da capacidade para esta atividade. A autora exerce a atividade habitual há 10 anos e iniciou esta atividade após o início da doença. A epilepsia é prévia ao início da vida laboral”.9 - Diante de novos documentos médicos apresentados pela requerente aos autos, foi determinada a realização de outro exame por profissional médico distinto, já que o anterior havia se descredenciado perante à Justiça.
10 - A nova
expert
, com base em exame realizado em 29.06.2015 (ID 103266320, p. 104-117), quando a demandante já contava com 49 (quarenta e nove) anos, destacou: “A Autora realizou cirurgia neurológica para controle de Epilepsia refratária, com data de 10/02/2015, e atualmente seu pós-operatório evoluiu sem crises convulsivas e com uso de medicamentos anticonvulsivantes. Trata-se de incapacidade por doença ou lesão de evolução prolongada e incerta, devendo ser reexaminado após um prazo de 2 anos. Portanto, caracteriza incapacidade total e temporária”. Fixou, por fim, a data do início do impedimento na data da cirurgia, isto é, em fevereiro de 2015.11 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
12 - A despeito de a última perita ter fixado a DII em tal data, tem-se que o impedimento da autora já estava presente em período anterior a seu ingresso no RGPS.
13 - Informações extraídas da Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujo extrato encontra-se acostado aos autos (ID 103266320, p. 56), dão conta que a demandante promoveu recolhimentos para o RGPS, na condição de contribuinte individual, de 09/2004 e 08/2013.
14 - Se afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 335 do CPC/1973, reproduzido no art. 375 do CPC/2015), que a autora tenha se tornado incapaz somente após a realização de cirurgia neurológica em fevereiro de 2015, a qual justamente conseguiu cessar com suas crises convulsivas. Segundo seu próprio relato, desde os 14 (quatorze) anos de idade vem sofrendo convulsões em virtude de “epilepsia”. Referiu à ultima experta que após a eclosão da patologia com essa idade, se recuperou, porém, ao se casar aos 20 (vinte) anos, as crises epilépticas recrudesceram, ocorrendo a cada 2(dois)/3(dias) dias.
15 - Tais assertivas são corroborados pelo sumário clínico da demandante, junto ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, datado de 20.08.2014 (ID 103266320, p. 90-92). Nele consta: “No dia de sua menarca, aos 14 anos, apresentou crise convulsiva, que a mãe relatou como evento de perda de consciência seguida de queda ao solo com tremores, dos quatro membros, de duração aproximada de 1 min, seguida de curto período de confusão mental. Já nesse período foi introduzido PB, não apresentando outra crise até 20 anos. Utilizou apenas dois anos o PB. Com 20 anos, começou a apresentar eventos recorrentes a cada 2-3 dias, precedidos por rápida dormência ascendente ora no membro superior esquerdo ora no membro superior direito, ora em ambos simultaneamente, seguido de sensação de secura em boca, parada comportamental com olhos abertos, com perda de consciência, olhar vago, movimentos oromastigatórios e leve versão cefálica para direita, associados a automatismos da mão direita e postura de fechara mão esquerda. Após 10-15seg apresenta queda ao solo, adota postura em adução e flexão de MSE e abdução/extensão de MSD, com duração total de 1-3min, com período de confusão mental e fala desconexa após. Retornou uso de PB, foi associado CBZ, com controle parcial das crises. Continuou a apresentar crises, cada vez mais frequentes, até chegar a uma crise por dia, com raras generalizações, sendo necessária associação de outras drogas. Veio encaminhada ao grupo de Epilepsia do HC-FMUSP há 10 anos. Há 4 anos iniciou associação de LTG, CLB, PB e CBZ, reduzindo a frequência para 1-3 eventos convulsivos por mês. Nos últimos oito meses, notou nova piora na frequência (2-3 vezes por semana), duração e intensidade das crises, com generalizações frequentes. Internada no vídeo-EEG para investigação diagnostica e ajuste de medicações (...)”.
16 - Nota-se que o período de parcial melhora da autora durou de 2010 e 2014, porém, ainda durante este possuía de uma a 3 (três) convulsões mensais, o que indica a continuidade do quadro incapacitante inclusive neste interregno. Ou seja, desde os 20 (vinte) anos até fevereiro de 2015 (momento da cirurgia neurológica), a demandante estava impedida de laborar, não por outra razão disse à experta que “nunca trabalhou e apenas cuida de sua casa em tarefas diárias”.
17 - Em síntese, tem-se que decidiu a parte autora se filiar ao RGPS com o objetivo de buscar, indevida e oportunisticamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme vedações constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91, o que inviabiliza a concessão, seja de auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez.
18 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
19 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
20 - Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS PARA REFORMAR A R. SENTENÇA E JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO DEDUZIDO NA INICIAL, COM A REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTERIORMENTE CONCEDIDA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E A DES. FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, VENCIDOS A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA E O DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO QUE NEGAVAM PROVIMENTO AO APELO E DETERMINAVAM, DE OFÍCIO, A ALTERAÇÃO DE JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA.LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.